TITO GUARNIERE
SOLITÁRIO E INCONSEQUENTE
Você não precisa gostar de Renan Calheiros. Eu não gosto. Mas a crise da semana passada teve um único responsável, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF. O ministro, em decisão solitária, voluntarioso e inconsequente, acolheu um pedido de liminar para destituir Renan da presidência do Senado, porque se tornara réu de ação penal. Criou um caso e tanto.
Não falta quem dê razão a Mello. Talvez porque se trate de Renan. Mas decisões judiciais são tomadas em função da lei e não da pessoa. A todos os que querem – com justa razão – o couro de Renan, tenham um pouco mais de paciência, a hora dele chegará. O ministro Mello não tinha porque adiantar o expediente. Na afoiteza, se deu mal.
Se um ministro do Supremo pode, sozinho, em liminar, destituir o presidente de outro poder, então ele pode também destituir José Ivo Sartori, Rodrigo Maia, Michel Temer, o delegado de polícia, o guarda da esquina e o treinador do Inter. Desde 2008 foram aposentados compulsoriamente 48 juízes e desembargadores, pela prática de delitos como a venda de sentenças. Nenhum deles foi afastado do exercício da magistratura de uma canetada, mas através de processo regular, demorado e penoso.
Sargento do Exército não destitui o comandante da Marinha. É o cavaleiro que amarra o cavalo, entra no “saloon” e pede um uísque no balcão e não o contrário. Há certa ordem na natureza e na vida e não convém desafiá-la.
Mello agiu sozinho. Não combinou com ninguém, como se desejasse para si todos os louros. Fez seus cálculos: Renan tinha sido execrado um dia antes nas manifestações de rua, estava mal na parada. À decisão liminar só caberia, de imediato, um pedido de reconsideração, endereçado a ele mesmo. Fora dessa hipótese, a medida só poderia ser modificada no pleno do STF. Mas – deve ter pensado – ninguém marcaria para o dia seguinte uma reunião no pleno para reapreciar a liminar.
Renan, acuado, nada tendo a perder, cangaceiro velho, resistiu. Ganhou tempo suficiente para que os demais ministros do Supremo, ou a maioria, se dessem conta que estavam no meio do tiroteio que não provocaram, um conflito de poderes, cenário de crise institucional, ação impensada de um dos seus membros.
A maioria consciente dos riscos iminentes, a começar pela presidente Carmem Lúcia, e ministros de estatura como Celso Melo e Teori Zavascki, buscou uma solução negociada, a mais elevada possível, na circunstância. Combinaram entre si uma saída. Marco Aurélio perdeu para a maioria e principalmente perdeu para si mesmo.
Não, Renan não saiu vencedor. Se houve vitória, foi de Pirro. Está em fim de mandato. Estamos às vésperas do recesso. Depois o seu poder murchará, como uma flor – das que não se cheiram - ao final do seu ciclo de vida. Será um personagem de tragédia que, quase de um dia para outro, se verá despojado de todas as glórias e homenagens, para entrar no beco lamacento e no inferno astral de um , dois, cinco, dez processos penais. A próxima morada de Renan, salvo melhor juízo, é Curitiba.
titoguarniere@terra.com.br
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