Lama no ventilador
A delação premiadíssima dos irmãos Batista, com toda a
carga de suspeitas que levantou, teve ao menos um efeito colateral positivo:
obrigou o procurador-geral Rodrigo Janot a desengavetar denúncias que lá
estavam há quase dois anos.
As denúncias contra os quadrilhões do PT e do PMDB
misturam fatos antigos com outros recentes. Foi o meio que Janot encontrou de
enquadrar o presidente da República, Michel Temer, que a lei exime de prestar
contas de atos alheios e anteriores a seu mandato.
Mas a pressa, ainda que necessária, que Janot exibiu em
relação a Temer, não a teve em relação a Lula, Dilma et caterva.
O caso Aluízio Mercadante, por exemplo, que tentou
comprar o silêncio do ex-senador Delcídio do Amaral, que preparava delação
premiada (a seguir feita), veio a público em março de 2016. Só agora Janot a
encaminhou ao STF. Por quê?
Mercadante, que cometeu o mesmo delito que levou Delcídio
à prisão sumária e à perda do mandato, não foi incomodado e exerceu seu cargo
de ministro da Educação até a saída de Dilma.
Janot, a rigor, não incomodou nenhum dos governos do PT,
pelos quais foi nomeado e renomeado.
Chegou a ser visto como um procurador do PT. Não
explicou, até agora, por que incinerou a delação do ex-presidente da OAS, Leo
Pinheiro, que tratava em minúcias de Lula e de um ministro do STF, Antonio Dias
Toffoli. Sua atuação, até os 44 minutos do segundo tempo, esteve longe de
mostrar isenção.
Ao sair, porém, em meio às trapalhadas (eufemismo de
coisa bem mais séria) da delação dos irmãos Batista – e do comportamento que
agora criminaliza de seu braço direito na PGR, Marcelo Miller -, decidiu jogar
lama no ventilador.
E haja lama. O contribuinte, lesado por tudo quanto veio
à tona, agradece. O problema é que a extensão do que remeteu ao STF faz prever
encaminhamento lento e problemático. Por serem amplas demais, e documentadas de
menos, as denúncias perdem clareza e objetividade. A defesa dos acusados
agradece.
Janot viverá dias difíceis. Arranjou inimigos poderosos
em todos os partidos. Mas o modo como o fez, de última hora e sem transparência
em suas motivações, não o tornou um herói popular. Muito pelo contrário, o
colocou sob suspeição.
Não terá, pois, a contrapartida que tem um Sérgio Moro,
de compensar a ira dos poderosos com o apoio entusiástico da opinião pública.
Inversamente, terá muito o que explicar, para fora e para dentro da PGR. Seu
entorno na instituição está todo citado nos áudios de Joesley Batista e Ricardo
Saud.
Ele, que inicialmente defendeu a probidade de Marcelo
Miller, terminou por pedir-lhe a prisão. Tal como Lula, alegou que não sabia de
nada, embora, por força do cargo que ocupava, devesse sabê-lo.
É a teoria do domínio do fato, que a PGR sustentou, com
êxito, no Mensalão contra José Dirceu, levando-o à condenação.
O fato concreto é que, se o país já estava quase órfão de
referências institucionais, agora ficou sem nenhuma. Os três Poderes estão,
para dizer o mínimo, chamuscados com o que se extraiu das fitas de Joesley e
Saud. E há mais, muito mais por vir, em áudios ainda não decodificados, em
posse do STF.
Disso resultam urgências políticas, decorrentes da
anomalia de um presidente da República, acusado de comandar uma quadrilha,
continuar no cargo, em contraste com o rito judicial, lento, complexo e pouco
confiável, incumbido de selar-lhe o destino.
O PT, que está em situação bem pior, já que sua quadrilha
ficou com a parte do leão na rapina ao Estado, não hesita em insistir no “Fora,
Temer!”. Pretende levá-lo com mais força às ruas, acreditando que até os
antipetistas serão sensíveis ao apelo.
O certo é que a semana termina com extensa lista de ações
da Justiça: O depoimento desastroso de Lula a Sérgio Moro; o agravamento da
pena de José Dirceu e João Vaccari, no TRF 4 (para 40 anos), pendente ainda do
voto de minerva; a rejeição unânime pelo STF da tentativa de Temer de colocar
Janot sob suspeição; a prisão de Wesley Batista; a prisão do ex-governador
Garotinho; a evidência de que Marcelo Miller era agente duplo (participava,
inclusive, de um grupo no WhatsApp com o pessoal da JBS para tratar da delação junto
à PGR). E a busca e apreensão no apartamento funcional do ministro da
Agricultura, Blairo Maggi, acusado também de corrupção.
Diante de tal cenário, é absolutamente inviável especular
sobre as eleições de 2018. Falta um ano – e até lá não se sabe quais serão os
atores dessa peça de horrores a que o país assiste. Não se sabe sequer que
partidos haverá - ou mesmo se haverá eleições.
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