Arrtigo, Adão Paiani - A raiz de todos os males

Na noite do último domingo fiz algo fora da rotina. Desperdicei alguns minutos para assistir ao “Fantástico”, da Rede Globo de Televisão, a exemplo de milhões de brasileiros. Dentre esses, possivelmente, estava um jovem de 29 anos, chamado Luiz Carlos Gomes da Silva Júnior.
Em pouco mais de quinze minutos quem estivesse assistindo ao programa recebeu três informações sobre o país e a sociedade onde vivem. Ao menos na visão ideológica da mídia nacional.
A primeira matéria mostrou um “experimento social”. Diversas crianças, negras, foram colocadas frente a uma jovem igualmente negra, para a qual deveriam dirigir comentários racistas. A maioria das crianças não consegui repetir as frases olhando para a interlocutora. Moral da história: “O Brasil é um país racista, que ensina seus filhos a serem racistas e onde brancos e negros odeiam-se mutuamente”.
 Na sequência, outra matéria. Um estudante da UFRJ foi encontrado morto. O motivo do homicídio, de acordo com a reportagem: homofobia. E lembram que o jovem assassinado foi mais uma vítima da sociedade homofóbica. Moral da história: “No Brasil, homossexuais são mortos por serem homossexuais. O país é culturalmente homofóbico”.
Ao fim, um grupo de mães é levada a pintar corações vermelhos em calçada do centro do Rio, contando as histórias de seus filhos, negros, pobres e da periferia, assassinados devido a ações violentas da polícia. Moral da história: “A polícia brasileira é violenta, opressora e assassina, e se dedica a matar jovens, negros e da periferia”.
Ao desligarem a TV na noite de domingo, muitos talvez estivessem convencidos de que o racismo não é fruto de condutas individuais, mas sim da cultura nacional. Isso num dos países mais miscigenados do mundo, onde todos, invariavelmente são étnica e/ou culturalmente negros.
Ao se recolherem naquela noite, outros tantos talvez acreditassem que o Brasil; um dos países mais violentos do mundo, onde a cada ano se registram mais de 60 mil homicídios; é um lugar onde se matam mais homossexuais do que outras pessoas.
A dormirem naquela noite, inúmeros talvez acreditassem que a polícia; que vive uma realidade de baixos salários, falta de condições de trabalho, desprestígio e criminalização de seus agentes; é violeta, truculenta, mata e reprime com violência cidadãos inocentes, e não merece a confiança da sociedade.
Na segunda-feira, na zona sul de Porto Alegre, Luiz Carlos Gomes da Silva Júnior, policial militar, foi assassinado ao abordar um veículo onde estavam três criminosos. Todos, vítima e algozes, jovens, pobres e moradores da periferia.
Moral da história: Colocar brancos contra negros, heteros contra gays, criminalizar policiais e vitimizar criminosos não vai fazer deste um país melhor. Acreditar nisso está na raiz de todos os nossos males. E aquilo que a mídia quer fazer você acreditar não é, necessariamente, a verdade.

*Advogado, de Brasília/DF.

Artigo, Antonio Delfim Netto - Olhem o câmbio

A economia tem duas características interessantes. A primeira é que, diferentemente das ciências "duras", em que o conhecimento não altera a natureza, nela ele modifica o comportamento da sociedade. A segunda é que nela os avanços não são "novos" problemas produzidos por respostas cada vez mais profundas, como nas ciências "duras", mas "novas" respostas dadas aos mesmos e velhos problemas, porque a realidade mudou.
O que explica o desenvolvimento econômico? Por que os níveis da atividade e do emprego flutuam? Por que há inflação? A história do pensamento econômico é a descrição de como uma realidade mutante e a evolução das instituições levaram os economistas a encontrar "novas" respostas aos mesmos "velhos" problemas.
A escolha do regime cambial é paradigmática a esse respeito. Não existe um regime "ótimo", independentemente das circunstâncias. Quando não se admite liberdade de movimento de capitais, a taxa de câmbio é o preço relativo que iguala os valores dos fluxos de exportação e importação. Quando ela é admitida, a taxa de câmbio é outro animal: é o preço de um ativo financeiro manipulável pela modificação do diferencial entre a taxa de juro real interna e externa. Pode atender às conveniências do mercado financeiro, mas não atender às conveniências mais importantes da economia real.
A taxa de câmbio é um dos "canais" de comunicação dos efeitos da variação do juro real da economia. São dois fatores essenciais ao desenvolvimento porque controlam o investimento e a exportação. Nos últimos 20 anos, usamos o câmbio para ajudar no combate à inflação.
Graças a isso destruímos amplos setores da economia nacional, particularmente um sofisticado setor industrial, que está com 35% de capacidade ociosa. Mais recentemente, graças à taxa de câmbio, parece dar pálidos sinais de recuperação. Uma boa parte do nosso medíocre crescimento se deve à murcha do setor industrial, do qual a valorização do câmbio roubou a demanda interna e externa.

É preciso repetir. É mais do que duvidoso que, na teoria ou na prática, o enorme diferencial de juro interno e externo com que convivemos possa sugerir que o melhor regime para o nosso arranjo cambial seja a livre e plena flutuação. Ao nosso Banco Central não faltam competência e sensibilidade para nos livrar de repetir a tragédia a que fomos submetidos na última década. Fico aliviado quando o presidente do BC, o competente Ilan Goldfajn, declara: "não acredito que o câmbio seja uma âncora para inflação", e completa, "não sou advogado de câmbio flutuante puro".

Artigo, Astor Wartchow - Capturado e algemado

Mais do que nunca, como em tempo algum  de nossa história, o estado brasileiro encontra-se tão "capturado" e, consequentemente, o povo tão "algemado". Retomo um tema aqui várias vezes tratado. Desde os primeiros artigos da coluna.
 Assim entre aspas, “captura” significa - na administração pública e teoria política - a subordinação, a submissão, o “sequestro” da coisa pública, do órgão e função de Estado, aos interesses corporativos e privados.
 Através de atos de omissão, de prevaricação e de corrupção ativa e passiva. É a tomada do poder nas diversas esferas públicas e sua transformação em vantagem e valor econômico particular.
 A "captura" e as consequências danosas se apresentam de modo proporcional a dimensão da intervenção do Estado nas relações sociais e econômicas. .
São inúmeras as áreas e ações públicas que poderiam estar privatizadas e atuando em ambiente competitivo e concorrencial.
Municípios, Estados e União não têm que ser dono de coisa alguma. Têm, isso sim, que ser fortes e coercitivos. Regulamentadores e fiscalizadores, principalmente. 
A sempre lembrada (e eleitoreira!) preservação de interesses estratégicos não depende de exploração estatal. São interesses que podem e devem ser operados em termos de mercado competitivo.
Este assunto “estatização versus privatização” é uma pauta superada pela decadência dos modelos, pela aceleração do sistema mundial de trocas, pela globalização econômica e financeira, e pela competitividade e abertura comercial.
Pagamos um preço imenso para manter estes feudos de privilégios e irregularidades. Aliás, de competitividade, produtos e serviços precários e discutíveis. E de notória e desavergonhada utilização e exploração político-partidária.
Conjunto de atos e natureza de fatos que, de algum  modo, explica nosso atraso no concerto mundial das principais nações do mundo, e a imensidão de problemas a resolver.
Se continuarmos neste impasse, níveis de idéias e debates superados, nossas dificuldades não diminuirão. Basta lembrar o que tem sido dito demagogicamente nas campanhas eleitorais.
Porém, honesta e inocentemente, muitos cidadãos realmente acreditam que o “petróleo é nosso”. E que determinados bancos são do Brasil.

E, pasmem, "algemados" pelas idéias, ainda se surpreendem com a corrupção e as negociatas. Como se uma coisa fosse independente da outra!