Íntegra da interpelação judicial feita pelo editor contra o deputado Marlon Santos


EXCELENTISSIMO SR. DR. DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL


POLIBIO ADOLFO BRAGA, brasileiro, casado, Jornalista e Advogado inscrito na OAB/RS sob número 8.771, com escritório e residência à Rua Eça de Queiroz, 819, Porto Alegre, RS, neste ato representando-se a si mesmo, vem à presença de Vossa Excelência apresentar o presente

                       PEDIDO DE EXPLICAÇÕES
Com base no artigo 144 do Código Penal, 55, Parágrafo 1º e Inciso II, da Constituição Estadual, e 726 a 729 do Código de Processo Civil, em face de MARLON ARATOR SANTOS DA ROSA       , mais conhecido como MARLON ROSA, Deputado Estadual do Partido Democrático Trabalhista atualmente exercendo as funções de Presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, com gabinete, portanto, no Palácio Farroupilha, Praça da Matriz, relacionadamente aos pontos a seguir nominados, no prazo de 48 horas, sob pena de, não os fazendo, ficar-lhe constituída em mora, com as combinações legais:
I)                   DA COMPETÊNCIA
        A competência para processamento do referido Pedido de Explicações é do Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 55, parágrafo 1º da Constituição Estadual, uma vez que tem por origem aas declarações e atos praticados por Deputado Estadual em pleno exercício do cargo e apresentando-se como tal no caso objeto desta interpelação.
                Conforme ensina Júlio Fabrini Mirabete, “por ser medida cautelar preparatória da ação penal, o pedido de explicações deve ser formulado perante o Tribunal competente quando se tratar de agente que detém o foro por prerrogativa de função”.
     Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do nosso Tribunal:
    “INTERPELAÇAO JUDICIAL CONTRA PROMOTOR DE JUSTIÇA”.
     COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Correta a decisão judicial, ao afirmar que, considerando o foro especial dos Promotores de Justiça, deverá a parte interessada, querendo, ajuizar o presente pedido de explicações diretamente no Tribunal de Justiça do Estado. Mesmo a medida cautelar preparatória da ação penal, como ensina a doutrina, deve ser formulada perante o Tribunal competente quando se tratar de agente que detém o foro por prerrogativa de função. DECISÃO: Recurso conhecido e desprovido. Unânime. (Outro feito Nº 70009262668, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, julgado em 23/01/2006).
II)                DA FINALIDADE LEGAL DO PEDIDO DE EXPLICAÇÕES
Dispõe o art. 144 do Código Penal que:

“Se, de referências, alusões ou frases, infere-se calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a critério do juiz, não as dá satisfatório, responde pela ofensa”.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal confirma a previsão legal supracitada:
“Trata”-se de pedido de explicações formulado pelas advogadas Anna Claudia Pardini VAZZOLER E Mariana Levy Piza Fontes, integrantes do Escritório Modelo Dom PAULO Evaristo Arns, ligado á Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, fundado no artigo 144 do Código Penal. Figuram como interpelante o Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social, cuja representante legal é Beatriz Costa Barbosa e como interpelado o Ministro das Comunicações Hélio Costa.
Requer, em síntese, seja o interpelado notificado a fim de esclarecer as manifestações transcritas à fl. 5, proferidas em 28 de maio de 2007, em audiência na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados.
O Código Penal assegura que “se de referências, alusões ou frases, se infere calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido deve pedir explicações em juízo”.
O Tribunal Pleno do Superior Tribunal Federal já admitiu a possibilidade de as pessoas jurídicas figurarem no polo passivo do delito de difamação (Pt-AgR 2491. BA, Rel. Min. Mauricio Corrêa).
Ante o exposto, notifique-se Excelentíssimo Ministro Hélio Costa para que, no prazo legal, e se assim desejar, preste as explicações que reputar cabíveis. Publique-se, Brasília, 16 de agosto de 2007. (PETIÇÃO 4.065-1, PROCED: DISTRITO FEDERAL, RELATOR: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI, REQTE: INTERVOZES – COLETIVO BRASIL DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, ADV. ANNA CLÁUDIA PARDINI VAZZOLER E OUTROS, REQDO. HÉLIO COSTA).
No mesmo sentido, seguem inúmeras outras decisões do Supremo Tribunal Federal, esclarecendo os requisitos e características do pedido de explicações: Pet 1249 AgR, Relator (a); Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 08/04/1994.
Ensina o sempre lembrado mestre Nélson Hungria, quando enfrentou o mesmo tema, que:
“A ofensa pode ser equívoca (não manifesta, encoberta, ambígua), quer quanto ao seu conteúdo, quer quanto ao seu destinatário. É o que ocorre quando há o emprego de palavras de duplo sentido, frases vagas ou reticentes, alusões veladas ou imprecisas, referências dissimuladas, antífrases irônicas, circunlóquios ou rodeios de camuflagem” (in Código Penal, v. VI. 117 número 143).
Trata-se assim, de um direito de exigir explicações da Interpelada, a fim de se inferir a existência de animus injuriandi, caluniandi ou difamandi, tendo em vista que, conforme visto na lição acima, a equivocidade tanto pode se referir ás palavras como também as pessoas a quem estas são dirigidas.
Busca-se, assim, garantir a oportunidade ao Interpelado de esclarecer cabalmente e de maneira isenta de dúvidas, quais são os significados e o alcance das declarações e ações, inclusive exposições de textos obtidos junto à 3ª Vara da Justiça Federal de Santa Maria, sob compromisso solene de mantê-los sob sigilo, justamente para proteger partes não objeto do protesto, jamais citadas, ouvidas, acusadas ou defendidas, mas, ainda assim, na sessão extraoficial da CPI já referida, dia 10 de setembro, na Assembleia Legislativa do rio Grande do Sul, o que levou a ampla repercussão na mídia, nos meios políticos e sociais do Rio Grande do Sul.
Em razão disso, para o bem da sociedade que se pretende seja conhecedora dos fatos, que se esclareçam as coisas, estabelecendo-se a verdade. Ou, então, que se abandonem definitivamente os caminhos escusos da irresponsabilidade pública, para que a sociedade livre possa avançar rumo á transparência e á responsabilidade de todos os cidadãos, sobretudo de representantes legítimos do eleitorado, mesmo os que não honram o seu mandato.

III)              DOS FATOS
       O interpelante é Jornalista e edita o blog WWW.polibiobraga.com.br há 20 anos, já tendo trabalhado nos principais jornais, emissoras de rádio e de TV de Porto Alegre, RS. Seu blog é considerado pelo Google Analytics como o mais importante e de maior credibilidade entre todos os blogs independentes do Estado. Também é Advogado, inscrito na OAB do RS sob número 8771, em situação absolutamente ativa, mas trabalhando exclusivamente nos casos em que é demandado ou demanda em ações relacionadas com liberdade de imprensa e de expressão. Também possui vários livros publicados, entre os quais “Herança Maldita, os 16 anos do PT em Porto Alegre”; “A Casa Civil”, sobre sua experiência de Governo; “Cabo de Guerra”, a respeito do Governo Yeda Crusius; e “Diários de uma Prisão Política”, sobre suas diversas prisões ao tempo do regime militar.
      No dia 29 de janeiro, conforme postagem feita no You Tube, em reprodução de vídeo publicado no Face book do referido Deputado https://www.youtube.com/watch?v=5JHqXagRols&feature=youtu.be(doc. 1) o requerido desferiu uma série de injúrias e difamações contra o requerente, sendo uma das mais graves a que segue, ipsis literis:
       Agora, cara (o requerente), não tenta fazer água, bicho, não tenta fazer negociata às minhas custas, porque esse tipo de coisa doida não tem fundamento, cara.
       Na mesma fala de 16 minutos, o interpelado faz insinuações sobre a condição sexual do interpelante, despejando considerações preconceituosas e injuriosas, além de mentirosas:
       Eu não preciso da política, não, Políbio. Eu estou na política para proteger o Centro Mediúnico de Cachoeira do Sul. Eu nunca neguei isso, porque gente assim, no estilo pederasta, no estilo predador, é que faz esse tipo de coisa, tentando desmoralizar a moral da gente.
      O interpelante também anexa transcrição literal da fala do interpelado (doc.1) para facilitar o exame do texto indigitado. 
      A fala do interpelado está relacionada com nota que o interpelante publicou no seu blog, dia 2 de janeiro deste ano (doc. 2), cujo texto é reproduzido a seguir:

Novo presidente da Assembleia do RS ataca o novo acordo e propõe dar calote na União
Vocês terão que dançar com ele durante um ano. Na foto, Laura, na época em que Marlon era prefeito de Cachoeira do Sul. A namorada anterior, Fernanda, chegou a acusá-lo de assedio.
O novo presidente da Assembleia do RS, Marlon Santos, PDT, tal como o atual, Edegar Preto, PT, faz oposição cerrada à proposta de adesão do governo do RS ao RRF dos Estados.
A proposta irá a votação em convocação extraordinária que ocorrerá dia 29, três dias antes da posse de Marlon.
O que disse o deputado do PDT, ontem, na  Rádio Guaíba, falando para os jornalistas Juremir Machado e Taline Oppitz:
- Não posso acreditar como um plano que proíbe contratar pessoal e impõe uma intervenção administrativa pode ser bom para o Estado.
As alternativas para ajustar as contas públicas estaduais, segundo Marlon Santos, estão todas inscritas naquilo que os caloteiros mais apreciam, que é fazer dívidas e não pagá-las. O que ele propõe, em linguagem chula:
-Temos que nos lixar para essa história de dívida e para os rentistas.

         O texto e as 62 opiniões de leitores podem ser acessadas através do endereço eletrônico http://polibiobraga.blogspot.com.br/2018/01/novo-presidente-da-assembleia-do-rs.html

IV)             DOS FATOS QUE DEVEM SER EXPLICADOS OU ESCLARECIDOS
         
       Olhos postos  nos estreitos limites do presente pedido de explicações, o interpelante busca esclarecer as questões a seguir, sobre as manifestações do Deputado Marlon Santos no caso em tela:

1.     Deixe claro se a manifestação objeto desta interpelação foi efetivamente pronunciada pelo interpelado com o objetivo de disponibilizá-la nas redes sociais.
2.     Esclareça se o objetivo da disponibilização foi exclusivamente destinado a veiculação no Facebook do próprio interpelado ou também em outras mídias das  redes sociais e em quais delas.
3.     No caso da Facebook do interpelado e em relação ao caso em tela, se o interpelado sabe quantas visualizações alcançou o material publicado.
4.       Diga se a manifestação em questão foi feita na qualidade de parlamentar, de pessoa física ou do médico alemão Dr Richard Dwannees Stein, que diz incorporar nas sessões mediúnicas que promove em Cachoeira do Sul, RS, conforme os três vídeos a seguir:
https://www.youtube.com/watch?v=Z9cAICGcsro  videos marlon santos cirurgia retirada de neuroma no pescoço.
https://www.youtube.com/watch?v=WT4_fn2IoBs  videos marlos santos cirurgia adenoma nas costas.
https://www.youtube.com/watch?v=iVDsDmdRStM  videos marlon santos cirurgia de retirada de lipoma e fibroma
5.     Esclareça inequivocamente o objetivo que pretendia alcançar ao criticar nota publicada no blog do interpelante.
6.     Quando fala que “não gostaria, assim, que a minha popularidade se espraiasse para um tipo de matéria insensata como a que ele fez”, o interpelado deve esclarecer de que “popularidade” fala e que trecho considera “insensato” na nota publicada no blog do interpelante.
7.     O que o interpelado entende por “retrocesso jornalístico” e “total imperícia” no trabalho jornalístico do interpelante, trecho do final do terceiro parágrafo do seu comentário.
8.     Esclareça que tipo de “vergonha na cara” o interpelante deve ter, conforme frase da primeira linha do quarto parágrafo da fala do interpelado.
9.     Nomine as “pessoas sérias” que recebem “pedradas” por parte do interpelante, conforme penúltima frase do quarto parágrafo da fala do interpelado.
10.         Reafirme se nunca foi de fato acusado por assédio por parte de nenhuma das conhecidas do interpelado, conforme explica no sexto parágrafo da sua fala.
11.         O interpelante também quer saber a que  reportagem da Rádio Guaíba o interpelante acusa o interpelado de ter usado para sua nota, citando título, texto ou áudio,  e data da veiculação.
12.         No 12º parágrafo da sua fala, o interpelado afirma que o interpelante “atira pedrinha para todo lado” e por isto o interpelante quer que o interpelado nomine a quais colegas ele se refere.
13.         O interpelado quer que o interpelado confirme se é ao interpelado que dirige sua afirmação oblíqua e covarde do 13º parágrafo, no qual afirma: nunca neguei (trabalho para o Centro Mediúnico de Cachoeira do Sul) porque gente assim, no estilo pederasta, no estilo predador, é que faz esse tipo de coisa, tentando desmoralizar a moral da gente”, e se considera que pederasta é indivíduo de segunda classe e não tem o direito de trabalho na mídia.
14.        O interpelante requer que o interpelado liste os nomes dos cursos e das três Faculdades que diz ter cursado, bem como o da quarta Faculdade que diz estar cursando, conforme 15º parágrafo.
15.          O interpelado terá que explicar qual o tipo de “negociata” que o interpelante tenta fazer “às minhas custas, porque esse tipo de coisa doida não tem fundamento, cara”. Além disto, terá que esclarecer claramente se existe alguma referência ao manejo de verbas ou de vagas que tem à disposição como Deputado ou que teria como novo Presidente da Assembleia Legislativa.
16.         O interpelante quer que o interpelado confirme que o interpelado costuma escrever sem confirmar informações e, se confirmar, que indique quais as notícias que teria lido com este formato.
17.         No 18º parágrafo, o interpelado refere-se ao interpelante de modo velhaco, dizendo o seguinte: “Responsabilidade, meu velho, responsabilidade, vergonha na cara, isso não faz mal para ninguém”. O interpelante quer que o interpelado confirme se o considera irresponsável e sem vergonha na cara, nominando pelo menos uma situação na qual achou que isto aconteceu.
18.         O interpelado terá que explicar por que razão trata o interpelante por diminutivos como “Polibinho”; apelações que só namorados ou amantes usam entre si, como “Meu querido” “Beijo, Políbio”; ou por expressões usadas normalmente entre rapaziada alegre, como é o caso de “Bicho” ou “Cara”, já que o interpelante não tem qualquer relação social, amorosa ou de amizade com o Deputado do PDT. Tudo no parágrafo 23.
19.         O interpelante quer saber que tipo de “ameaça” o interpelado faz, que tipo de ação fará, quando ordena no parágrafo 40 que “tu, ao invés de escrever bobagem, consulte antes de escrever, cara”, e mais adiante, repetindo a ordem, ao afirmar no parágrafo 43 que “eu não sou como os outros, não, viu, que se escondem, assim, que resolvem simplesmente cruzar os braços”.

V)                DO PEDIDO
           
          Diante de todo o exposto, é a presente para requerer que V. Exa. Se digne:

a)     Determinar com urgência, no prazo de 48 horas:

 A notificação o interpelado, a fim de que, no prazo legal, ofereça as devidas explicações, sob pena de uma vez não as fazendo ser, em tese, eventualmente responsabilizado pelas práticas dos crimes de injúria e difamação, em competente ação penal privada a ser proposta tempestivamente.
b)    Que após se exaurir o prazo concedido para que o interpelado ofereça as devidas explicações, antes de se encerrar o presente, seja concedida nova vista dos autos ao interpelante, a fim de que este possa, na eventualidade, pleitear as medidas que entender cabíveis e oportunas.
c)     Que o interpelado seja condenado ao pagamento de eventuais honorários advocatícios e eventuais custas processuais.

       ANTE O EXPOSTO, com base nas razões de fato e de Direito acima, pede a V. Exa, determinar a intimação do interpelado no endereço supra. Requer, ainda, após cumpridas a presente, sejam os autos entregues ao interpelante, independentemente de traslado.

         Valor da causa: R$ 1.004,00.

         Termos em que pede deferimento.

        
Porto Alegre, 8 de março de 2018.



POLIBIO ADOLFO BRAGA
OAB-RS 8771
Fone celular: 9-8434. 4403
Porto Alegre - RS


      



Artigo, Marco Antonio Villa, O Globo - O tenentismo quer voltar


Artigo, Marco Antonio Villa, O Globo - O tenentismo quer voltar

Estamento militar quer se recolocar na política. Tenta construir projeto intervencionista. Não sabe de onde partir

Em outubro de 1891, Joaquim Nabuco, em carta enviada ao amigo Aníbal Falcão, escreveu: “Já lhe respondi que se quisesse entrar novamente em política, primeiro assentaria praça (é um pouco tarde, não lhe parece?) por estar certo de que o melhor governo que a República pudesse dar ao país seria incapaz de receber direção que não partisse dos próprios quartéis. Vocês, republicanos, substituíram a monarquia pelo militarismo sabendo o que faziam, e estão convencidos de que a mudança foi um bem. Eu […] pensei sempre que seria mais fácil embarcar uma família do que licenciar um exército.”

Até 1889, os militares tinham papel pouco relevante na cena nacional. O militarismo era um mal platino. A sucessão de golpes de Estado, típica da região, era inexistente no Brasil. No Segundo Reinado (1840-1889), a maioria dos ministros do Exército e da Marinha foi civil. As atribuições das Forças Armadas estavam determinadas nos artigos 145 a 150 da Constituição. A obediência ao Poder Executivo era clara: “a força militar é essencialmente obediente; jamais se poderá reunir sem que lhe seja ordenado pela autoridade legítima.” (artigo 147)

As Forças Armadas foram arrastadas à política, agindo corporativamente, quando da Questão Militar. Os liberais foram os principais agentes naquele processo. Estimularam a desobediência castrense acreditando que, dessa forma, enfraqueceriam seus adversários, os conservadores. Ironicamente, em novembro de 1889, foram derrubados — e com eles, a monarquia — por um golpe militar.

A entrada dos militares na política foi nociva ao país e às Forças Armadas. Na maioria dos estados — antigas províncias — a República foi proclamada pelas guarnições militares. O entusiasmo pela política foi tão grande que para a Assembleia Constituinte, escolhida em setembro de 1890, foram eleitos 54 constituintes militares: 40 deputados e 14 senadores. Desde então, tiveram papel permanente na política, participando ativamente dos embates eleitorais e agindo como uma corporação que estaria acima das instituições, como uma espécie de reserva moral da nação, um caricato Poder Moderador.

Nos anos 1920, o militarismo renasceu como elemento renovador da política. O tenentismo serviu como receptáculo reunindo a insatisfação militar da jovem oficialidade com os rumos do país. Tinha apoio civil. Mas, na sua essência, desprezavam a política e os “casacas”, forma depreciativa como se referiam à elite dirigente. O salvacionismo levou às rebeliões de 1922, 1924 e à Coluna Prestes. E, em 1930, chegou ao poder sob direção — ironia da história — de um civil. Tomaram e expandiram o aparelho de Estado.

Determinaram os rumos do país tanto nos momentos democráticos, como nos autoritários. Basta recordar que durante o populismo (1945-1964), nas quatro eleições presidenciais, sempre houve candidatos militares. Mesmo assim — ou apesar disso — estiveram presentes nas conspirações e golpes ocorridos no período, como na pressão contra a posse de Getúlio Vargas, em 1951, na crise de agosto de 1954, nos dois golpes de Estado de novembro de 1955, nas revoltas de Jacareacanga e Aragarças no governo Juscelino Kubitschek, na crise da renúncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, e, finalmente na derrubada de João Goulart, em abril de 1964.

De 1964 a 1985, o militarismo nunca foi tão dominante. Determinou o rumo do país, inclusive do processo de transição para o regime civil. Centenas de militares ocuparam postos na estrutura estatal. As polêmicas castrenses ocuparam o espaço da política. Tudo era definido de acordo com os interesses das Forças Armadas. Os cidadãos eram meros espectadores, pois havia brasileiros mais iguais que outros. Isto foi absolutamente nocivo ao aperfeiçoamento profissional das três armas e — por mais paradoxal que seja — à segurança nacional, tão propalada pelos generais-presidentes.

Os governos civis não conseguiram colocar os militares nas funções constitucionais e muito menos elaborar uma doutrina que definisse claramente o papel das Forças Armadas. Também — forçoso reconhecer — as lideranças castrenses não souberam produzir propostas que pudessem ser debatidas pela sociedade destacando, por exemplo, a importância de um país com as dimensões do Brasil ter um orçamento militar adequado. Ficaram na defensiva tentando legitimar os atos dos anos 1964-1985. Perderam tempo. Este não era o principal embate. Optaram pelo discurso, ao invés da ação.

Agora, ainda sem clareza do que fazer, o estamento militar quer se recolocar na política. Tenta construir um projeto intervencionista. Não sabe de onde partir, nem como fazer. Buscar no guarda-roupa da história a roupagem tenentista vai transformar a ação das Forças Armadas numa comédia pastelão. As sucessivas declarações políticas de altos oficiais violam o regulamento disciplinar das três forças. E não passam de respostas desesperadas, símbolos da esterilidade corporativa.

Pior será se os militares forem seduzidos pelas novas vivandeiras que rondam os quartéis. São os oportunistas de sempre. Para as Forças Armadas, quanto mais distantes da política partidária, melhor. Mais ainda do atual processo eleitoral para a Presidência da República. Desenterrar o modelo do soldado-cidadão, que serviu para justificar o golpe militar republicano e as diversas intervenções ao longo do século XX, conduzirá o país e as Forças Armadas a uma grave crise política e institucional. A advertência de Joaquim Nabuco está de pé. Não foi ouvida em 1889. Espero que seja ouvida agora.