O tempo dos outros, Glauco Fonseca

Pouco se sabe sobre o tempo, como defini-lo em termos matemáticos. Diferentemente do espaço, que pode ser contado em pés num lugar ou em metros em outro, ou da velocidade, que pode ser em quilômetros ou milhas por hora, os segundos, minutos e horas são contados da mesma forma em todo o planeta. Tempo é, portanto, uma medida comum a todos, que não pode ser parado ou acelerado. Pode-se voltar de um caminho andado, é possível andar mais rápido ou mais lentamente, mas o tempo passa igual pra todo mundo.


Em uma perspectiva humana, a medida do tempo se dá, muitas vezes, pela percepção dos costumes, dos acontecimentos, das experiências. O tempo dos bondes é posterior ao das carruagens, mas muito anterior ao dos biquinis de duas peças. Nossos avós diziam que seus tempos eram bons, mas apenas bem depois de vividos. Muito provavelmente, reclamavam de seus tempos atuais como todos fazemos nos nossos tempos atuais. O tempo, é, portanto, o tempo das mudanças, das rupturas e das consolidações. Sempre opera mudanças desejadas ou nem tanto. Tempo é, portanto, mudança.


O tempo promove em todos nós um fenômeno interessante: à medida em que vamos envelhecendo, começamos a observar acontecimentos que vão ficando mais e mais difíceis de serem facilmente aceitos. Para os que já viveram bastante, a incorporação de tabus, a destruição de preconceitos e as novidades sociais que o tempo trás se mostra como um “medidor” de que o nosso tempo está se findando. E quando se finda o nosso, começa o tempo dos próximos, dos outros, de nossos filhos e netos e assim por diante. 


Os sinais são implacáveis. Coisas que fazem enorme sentido para os mais vividos, passam despercebidas pelos mais jovens. O que nos incomoda é, muitas vezes, o pano de fundo de prazeres futuros. A música que nos irrita, é a trilha sonora dos “próximos”, seu ritmo próprio. O tempo dos outros é apenas dos outros, dos próximos. Não é mais dos velhos e, ainda mais notavelmente, precisa ser entendido tanto quanto possível, para que se possa aproveitar essa vida até o máximo permitido por Deus.


Observar o tempo, nesta perspectiva, tem me dado paz e prazer. Dia após dia, uso meu tempo de modo a compreender e facilitar o tempo dos próximos. Ainda vivo o meu tempo, mas ele não é mais só meu, pois se mistura com o daqueles que chegaram. Aquilo que eu relutava em entender e aceitar, agora percebo mais claramente se tratar de um pacote de mudanças que o tempo instiga, provoca. Mudanças boas ou ruins? Não importa. Só o tempo dirá. E quando disser, não será mais meu e sim dos próximos.


Decidi, portanto, usar sempre apenas um relógio, pois o sujeito com um relógio sabe a hora certa, mas um sujeito com dois ou mais relógios, nunca está certo de absolutamente nada. Sei, portanto, do meu tempo e continuarei aprendendo a respeitar o que se torna cada vez mais difícil de entender, respeitando o tempo dos próximos, o tempo dos outros.