Ex-ministro avalia crise causada pelo coronavírus: "É preciso colocar dinheiro no caixa das pessoas e das empresas"

Ex-ministro avalia crise causada pelo coronavírus: "É preciso colocar dinheiro no caixa das pessoas e das empresas"

O repórter Leonardo Vieceli ouviu o ex-ministro do governo FHC, do qual foi derrubado depois que uma conversa sua vazou (uma conversa sobre privatizações, na qual o ministro tinha toda razão) Luiz Carlos Mendonça de Barros, que afirmou para o jornal Zero Hora, que publicou a entrevista neste final de semana, que governo Bolsonaro deve aumentar gastos para socorrer economia

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O economista Luiz Carlos Mendonça de Barros avalia que não resta outra saída ao governo Jair Bolsonaro a não ser intensificar medidas para garantir recursos a empresas e famílias durante a crise do coronavírus. Na entrevista a seguir, o ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também aponta diferenças e semelhanças do atual momento frente à turbulência financeira de 2008. Além de comandar o BNDES, Mendonça de Barros atuou nos anos 1990 como ministro das Comunicações na gestão Fernando Henrique Cardoso (FHC).

Como o senhor descreve o atual momento da economia?
Tenho 50 anos de profissão e nunca passei por isso. É algo extraordinário. Já vi várias crises no Brasil e no Exterior, mas não com esta complexidade. Brinquei com meus netos ao dizer que esta é a primeira coisa que vivemos juntos pela primeira vez. O que acontecerá com a economia dependerá da situação da saúde. Tem gente que acha que o problema será passageiro, tem gente que acha que vai demorar mais.

As notícias são de que, na China, o cenário está se normalizando. O presidente chinês, Xi Jinping, passou por período de questionamento pela forma como o país lidou com a crise do coronavírus na fase inicial. O que acontece durante o problema é um colapso da economia, tanto pelo lado da oferta quanto pelo lado da demanda. A crise na saúde é o que chamamos de cisne negro, ou seja, algo que ninguém esperava.

O atual tem alguma semelhança com a turbulência registrada em 2008?
A crise atual é nova em razão de sua origem. Mas tem alguns componentes parecidos com a de 2008. Um deles é o pânico no mercado financeiro.

Quais são as ações necessárias neste momento para amenizar as perdas na economia?
É preciso jogar dinheiro no sistema financeiro. O Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos) fez isso, o governo americano lançou um pacotaço, com dinheiro para todo mundo, para evitar a quebradeira de empresas. É assim. Tem de ser assim. É preciso colocar dinheiro no caixa das pessoas e das empresas. Se estiver certo, e espero estar, esta é uma crise de três, quatro meses. Se os governos agirem corretamente, vai passar.

Como o senhor avalia a atuação do governo Bolsonaro para atenuar os prejuízos na economia?
O Banco Central cuida do mercado financeiro, fez isso corretamente aqui no Brasil, diminuiu compulsórios, criou uma série de facilidades. Mas não resolve o problema. O Paulo Guedes (ministro da Economia) é um monetarista de Chicago, não aceita a análise keynesiana de jogar dinheiro para empresas e pessoas. O Banco Central tem de evitar a quebradeira de bancos, mas a política monetária não chega a empresas e pessoas agora.

Por quê?
A população sofre por falta de renda, e as empresas sentem falta de recursos. Tem de botar dinheiro nelas. É uma pena o que aconteceu com o BNDES. O erro é amarrar o banco deste jeito. O BNDES sempre foi importante em momentos assim.

Quais são as medidas adotadas no Exterior que poderiam servir de exemplo para o Brasil?
O país tem de olhar para o pacote da Inglaterra, que tem governo ultraconservador. Lá existe um programa muito radical, para dar dinheiro nas mãos das pessoas. O governo americano fechou um pacote de trilhões de dólares. Tem de pegar essas ideias e trazer para cá.

Arttigo - O tranco vem aí

O tranco vem aí. E ninguém poderá alegar surpresa

A Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (@FGVDAPP) detectou uma novidade esta semana nas redes sociais: certa agregação de perfis que ela considera de esquerda e de centro. Vamos então aceitar para efeitos didáticos a classificação, pois aponta um movimento de razoável importância no público.

As ações do presidente da República para reagrupar e anabolizar a base mais próxima dele na guerra de opiniões da Covid-19 tiveram um custo: juntaram contra ele, pelo menos nas redes sociais, quem não se juntava há tempos para nada. Não existe mesmo almoço grátis, apesar de esse rearranjo na internet não ter até o momento maior implicação política.

O custo em imagem ainda precisa ser medido nas pesquisas, mas os dados digitais fazem deduzir que a base bolsonarista fiel continua preservada na essência. E duas coisas jogam a favor do presidente na correlação de forças: não há condições objetivas para protestos de rua em massa e tampouco o Congresso Nacional parece propenso a enveredar por um confronto aberto contra o Planalto.

Tirando os pontos fora da curva, por exemplo a suspensão dos contratos de trabalho sem contrapartida, a disposição no Legislativo é aprovar as medidas governamentais de combate às crises sanitária e econômica, aqui especialmente as de caráter anticíclico. Até porque de repente todos viraram keynesianos: economistas, empresários e jornalistas especializados.

E um Congresso que só pode reunir por teleconferência não chega a ser propriamente ameaça. Nesta condição, é pouco provável deputados e senadores colocarem para rodar qualquer coisa afastada do consenso. E se há um consenso nas duas Casas é não bater de frente com Jair Bolsonaro. Em vez de esticar a corda, dar corda para o presidente.

Nas últimas horas a sensação é de um movimento centrípeto governamental. Os ministros da Saúde e da Fazenda falaram à vontade no sábado para garantir que planos para a defesa contra o coronavírus estão aí e irão funcionar. Mostraram estar confiantes nas cadeiras. É pouco provável terem feito a aparição pública sem combinar com o chefe.

Mas nada servirá de escudo se duas coisas não funcionarem bem: se o dinheiro para empresas e trabalhadores não chegar na ponta e se o sistema de saúde não aguentar o tranco que vem aí nas próximas semanas. Os ministros responsáveis pelas duas áreas pareceram neste sábado confiantes de que os dois desafios serão equacionados.

Ninguém se engane. Ainda não saímos da etapa dos bate-bocas. Que têm hora para dividir o palco com os fatos duros. O tsunami vem aí. E o governo será julgado pelos resultados. Inclusive porque teve tempo de se preparar. O lockdown em Wuhan tem mais de dois meses, e a agudização na crise na Europa já vem há várias semanas. Ninguém poderá alegar surpresa.

Deu tempo suficiente para aprender com os erros dos outros. Vamos aguardar, e rezar, para termos aprendido.

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Depois desta epidemia vai ficar muito difícil a vida de quem deseja enfraquecer o Sistema Único de Saúde. Se ele funcionar como prometem, e nada indica que não vá (tem um pouco de torcida nisso), estará aberta a estrada para atacar de vez o problema do subfinanciamento.
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Alon Feuerwerker (+55 61 9 8161-9394)
alon.feuerwerker@fsb.com.br

Medidas

- Serão zerados impostos sobre 67 produtos que previnem e combatem o Coronavírus.

- Presidente sugeriu e a Anvisa liberou que todas as farmácias de manipulação produzam álcool gel.

- Liberação de R$ 60 bilhões para a manutenção de empregos.

- Antecipação da primeira parcela do 13° para abril e a segunda para maio para aposentados e pensionistas do INSS.

- Ministério da Educação libera R$ 450 milhões para ajudar escolas na compra de itens de saúde como álcool gel e sabonete.

- Suspensão de visitas nos Presídios Federais.

- Substituição de aulas presenciais por aulas a distância.

- Restrição à entrada de estrangeiros por fronteiras do país. - Projeto de simplificação temporária de regras trabalhistas.

- Trabalhador e empregador poderão celebrar acordos individuais, respeitados os limites da Constituição.

- Auxílio emergencial de R$ 15 bilhões p/trabalhadores informais. - R$5bi p/pequenas e microempresas.

- Facilitação e renegociação de créditos.

- Desburocratização para importação de insumos e matéria-prima.

- Prorrogação do prazo de pagamento do FGTS, injetando R$ 30 bi na economia.

- Adiamento do pagamento do Simples Nacional, c/economia de R$ 22,2 bilhões p/pequenas e médias empresas. - Redução de 50% nas contribuições p/o Sistema S, beneficiando empregadores. - +5 mil médicos p/reforço no combate ao vírus.

- Instalação de mais 2 mil leitos no Brasil p/atendimento a pacientes.

- Distribuição de 30 mil kits para diagnóstico do Coronavírus.

- R$ 432 milhões para os estados. - Repasse de R$ 4,5 bilhões do fundo do DPVAT p/combate ao coronavírus.

- Suspensão da prova de vida por 120 dias, s/interrupção dos pagamentos -INSS.

- Antecipação do abono salarial p/junho, injetando R$12,8 bilhões na economia.

- Inclusão de mais 1 milhão de pessoas no Bolsa Família, com liberação de R$ 3,1 bilhões

- R$ 5 bilhões para pequenas e microempresas. - Criação do Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos do Covid-19.

- Criação do Comitê de Especialistas Rede Vírus, p/promover pesquisas relacionadas ao coronavírus.

- Liberação de R$ 147 bilhões para reduzir os efeitos do coronavírus, sendo:

.R$83,4bi p/a população mais vulnerável;

.R$59,4bi p/manutenção de empregos;

R$5bi no combate à pandemia.

Não se sabe cura do vírus que acomete a política, diz Xico Graziano

Agricultores seguem trabalhando; Não se para de comer na crise

Estou na fazenda, longe desse vírus maldito. Já que era para ficar isolado do mundo, resolvi vir trabalhar na roça. Tem um problema: aqui a internet pega mal. Chega a dar angústia ficar desconectado a maior parte do dia, ainda mais em dias agitados como esses. Por outro lado, desligar-se da internet parece um calmante. Uma benção.

Faz falta, porém, como instrumento de trabalho. Isso é horrível. Existe uma sútil discriminação entre o campo e a cidade nessa matéria: a conexão desaparece quando se ruma para o interior agrário do país. Uma sacanagem do século 21 contra o agricultor.

Todos meus colegas, engenheiros agrônomos, foram se esconder na fazenda, sua ou de alguém, nesses dias tormentosos do coronavírus. Chega a ser um privilégio, curtir o isolamento social perto da um produção rural. Foi isso que, entre nós, combinamos: vamos superar essa crise trabalhando.

Colhendo soja ou cana-de-açúcar, plantando milho, vacinando bezerro, apartando gado, combatendo pragas, cortando erosão, cada um de nós na sua labuta.

A virtude do agricultor é a sorte do citadino: ninguém para de comer, seja a crise que for. Você corta a diversão, deixa de comprar roupa nova, diminui o consumo de muitas coisas. Mas da comida, não. E ela não vai faltar por conta dessa desgraça, que será momentânea.

Seria uma ilusão total achar que o agro não será prejudicado nessa crise global. Reflexos serão sentidos, variando em função do setor de produção. A floricultura, por exemplo, está arrasada. A olericultura está capenga devido à fraqueza de seus canais de comercialização, como os Ceasas.

Haverá sofrimento no agro. Empresas e pessoas passarão apertado. Muita cautela se exige. Mas vamos sair logo dessa enrascada. Prevejo que em 60 dias o acelerador do agro estará ligado novamente.

Nós, agricultores, sofremos com doenças repentinas nas lavouras e nas criações há séculos. Tristeza da laranja, ferrugem do café, aftosa no gado, bicudo no algodoeiro, vassoura-de-bruxa no cacau, sigatoka na bananeira: a cada vírus, ou inseto, ou fungo, ou bactéria que surge, nós nos acostumamos a acreditar na força do conhecimento científico. Sempre que disseram que iríamos soçobrar, vencemos a desgraça da doença agrícola porque contamos com a ajuda da tecnologia. E seguimos em frente, com produtividade crescente.

Tiramos da nossa história do agro a lição: os pesquisadores científicos, médicos extraordinários, descobrirão um remédio, uma vacina, um jeito de escapar dessa covid-19.

O que mais dói nessa crise é ver os governantes disputando quem é mais bacana. Uns bancam os inventores mágicos, outros se parecem abutres. Aqui distante, no suor da roça e no sossego do campo, eu diria: o pior vírus acomete a política.

Desse nós não sabemos a cura.