Cristianismo na berlinda

Bolsonaro passou toda a sua campanha para a presidência da república repetindo a citação de João, 8: 32: E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.

Na inquisição do bem, protagonizada por representantes da esquerda (até extrema) do senado federal que tem como único objetivo alijar Bolsonaro da disputa de 2022, foi convocado no dia 29/09 o empresário Otávio Fakhoury, e as menções ao cristianismo se tornaram um tópico de destaque.

Falou sobre o cristianismo o senador Fabiano Contarato em seu discurso banhado de lágrimas, falou Renan Calheiros, falou Omar Aziz e, magistralmente, falou o alegre senador Randolfe Rodrigues.

Sua frase é digna de um estudo, não sei se exegético ou psiquiátrico. Senão vejamos:

“Já foi dito aqui pela senadora Eliziane o que é ser cristão. Eu também sou católico, vim das pastorais sociais, vim das comunidades eclesiais de base, acho que faltou a leitura do Evangelho segundo Jesus Cristo...”

O que será que o senador quis dizer com isto? Evangelho segundo Jesus Cristo?

Evangelho segundo Jesus Cristo é um livro de José de Saramago que nada tem a ver com os evangelhos canônicos ou o que é pregado pela igreja católica da qual o senador diz, com muito orgulho, fazer parte.

Neste livro, apenas para relembrar alguns trechos, José saiu de sua casa uma noite noite para se aliviar e foi hipnotizado por uma luz celestial, possivelmente o anjo Gabriel que lhe mandou manter relações sexuais com sua mulher Maria porque Deus havia decidido que ele seria o pai do messias. Tomado de grande paixão, José voltou para dentro de casa e deitou-se com Maria a qual acabou concebendo aquele que viria a se tornar Jesus de Nazaré.

Segundo Saramago, Jesus não conseguiu impedir que seu pai José fosse crucificado, e retornando abatido para casa, passou em frente a um prostíbulo no qual entrou e onde permaneceu por uma semana nos braços de Maria Madalena que viria a se tornar sua amante. Jesus dizia que a amava porque ela o chamava de meu Deus. Jesus tinha verdadeiro horror do Criador a tal ponto que foi ao deserto se aconselhar com o demônio em quem confiava muito mais e com o qual mantinha mais estreitos laços de afinidade.

Por fim, por sua vez pregado na cruz, antes de expirar abriram-se os céus e apareceu a figura do próprio Deus, o que levou Jesus a dizer, olhando para as pessoas que o cercavam e referindo-se ao Deus Pai: “Homens perdoai-lhe porque Ele não sabe o que faz”.

Não sei exatamente a qual destas passagens do Evangelho segundo Jesus Cristo quis se referir o senador DPVAT, mas com certeza conseguiu demonstrar sua total ignorância a respeito das sagradas escrituras. Lamentável.

E para complementar o assunto cristianismo na berlinda, gostaria de lembrar uma frase que nunca é dita, mas que é seguida à risca pelo senado federal em relação ao supremo tribunal federal e, reciprocamente pelo supremo tribunal em relação ao senado:

“Não julgueis para que não sejais julgados”. Mateus, 7 1-5.

Resumindo, como dizia o ator Gero Camilo em seu magistral papel no filme Carandiru, inspirado na obra homônima de Drauzio Varella, aquele que foi o primeiro a dizer que a Covid-19 não passava de uma gripezinha:

Sem chance.  


Fabio Freitas Jacques. Engenheiro e consultor empresarial, Diretor da FJacques – Gestão através de Ideias Atratoras e autor do livro “Quando a empresa se torna azul – o poder das grandes ideias”.


Justiça Eleitoral e Solidariedade "fake" com as mulheres, por Renato Sant'Ana


  Justiça Eleitoral e Solidariedade "fake" com as mulheres, por Renato Sant'Ana


 

O dinheiro do contribuinte está sendo usado para pagar a difusão em emissoras de rádio de uma peça publicitária da Justiça Eleitoral que visa sobretudo a "fazer a cabeça" do eleitorado feminino.

É uma voz de mulher que fala: "A violência política de gênero acontece quando uma mulher eleita não está segura nem mesmo no plenário, quando o apoio do partido nunca vem, quando somos julgadas e atacadas pela nossa imagem. Chega! É hora de ocupar o nosso lugar. Mais mulheres na política! Sem violência de gênero! A gente pode, o Brasil precisa! Justiça Eleitoral, a justiça da democracia!"

O que ela pede é "mais mulheres na política", isto é, mais mulheres no poder; não pede "mais mulheres politicamente esclarecidas". Só faltou dizer "temos direito a fazer as mesmas porcarias dos homens".

Para decifrar o que está sendo veiculado, convém examinar três dimensões do discurso, aquilo que Aristóteles aponta como "os três pilares da retórica": logos, pathos e ethos.

Logos é a situação alegada, é a premissa da qual parte o argumento. O problema é que o logos pode mostrar-se verdadeiro, distorcido ou totalmente falso, conforme o interesse do freguês.

É claro que o feminino ainda é encarado com preconceito (inclusive por muitas mulheres). O erro é falar como se estivéssemos no século XIX.

Com efeito, a propaganda quer plantar na mente do ouvinte a falsa ideia de que, para mulheres com mandato político, é um padrão o constrangimento, a vulnerabilidade, inclusive quando estão em plenário, e a falta de apoio até do partido pelo qual se elegeram.

O texto diz "Chega! (...) Mais mulheres na política! Sem violência de gênero!", como se fosse uma constante a violência contra mulheres com mandato político. Quem lembra um só caso? Efetivamente, não é um padrão.

Fácil é lembrar o caso da senadora que se impôs fisicamente para arrancar uma pasta das mãos de um colega (01/02/2019); e o do grupo de deputadas e senadoras que, sabendo-se intocável, invadiu o plenário do Senado para interditar a mesa da presidência e impedir na marra uma votação (11/07/2017).

O segundo aspecto é pathos, valores e sentimentos explícitos ou insinuados no discurso: o dramatúrgico tom de vítima com que o texto é lido no rádio incita especialmente o eleitorado feminino a ter "solidariedade" e a fazer "justiça" votando em mulheres.

O terceiro elemento é ethos, isto é, credibilidade e confiança para convencer o ouvinte: "Justiça Eleitoral, a justiça da democracia!" Caspita! Quem vai pôr em dúvida a honorabilidade desse poder?

Não se trata de adivinhar o fluxo de consciência de quem mandou difundir essa propaganda nem o de quem a elaborou, mas de analisar o fenômeno.

Afinada pelo diapasão do "vitimismo", o texto distorce a realidade, surfa na onda do "politicamente correto" e propõe uma solução de ilusória defesa das mulheres.

Se excluído o feminino, não há melhorias sociais. Porém, a participação efetiva do feminino só se dá com a presença de mulheres esclarecidas, honestas, equilibradas e atuantes, premissa ignorada na tal propaganda.

Acaso a política de hoje está melhor que a do passado? Será que a classe política ficou mais confiável? Não e não! No entanto, nunca houve tantas mulheres na política como atualmente, prova de que, para as mudanças desejadas, não basta quantidade, tem que ter qualidade.

E o que esse blá-blá-blá oficial faz é massificar uma nova e maliciosa categoria semântica, a "violência política de gênero", um "conceito líquido" (como diria Bauman) que há pouco foi enfiado na lei 14.192/2021 e virou mais um instrumento gerador de insegurança jurídica.

É uma aposta em dois desvios éticos: egoísmo e omissão.

Nem todas as mulheres se iludem com essa farsa. Mas haverá as que, olhando com olhos egoístas, veem nela alguma forma de vantagem. Haverá também homens e mulheres que, embora percebendo o engodo mas temendo o politicamente correto, ficam em silêncio e se omitem.

Precisamos, sim, evoluir no quesito "respeito às diferenças", o que nada tem a ver com a rivalidade rancorosa das bandeiras identitárias, que dividem a sociedade, jogam uns contra outros e pavimentam o caminho para a implantação de regimes totalitários.

O comportamento abusivo não depende de sexo, idade, cor da pele, escolaridade nem religião, sendo um erro estabelecer como critério de escolha eleitoral sexo, idade, cor da pele, escolaridade ou religião.

Apesar disso, a Justiça Eleitoral, em vez de estimular as mulheres a buscarem um conhecimento esclarecido e responsável da política, opta por oferecer-lhes o limitante papel de vítima e propor-lhes que, à semelhança das condutas masculinas, tomem o poder.

 

Renato Sant'Ana é Advogado e Psicólogo. 

E-mail  sentinela.rs@outlook.com