Artigo, J.R.Guzzo, Revista Oeste - Corruptor sem corrupto

O empreiteiro Marcelo Odebrecht é, para o Supremo Tribunal Federal, um corruptor que não corrompeu ninguém


O empreiteiro de obras Marcelo Odebrecht, uma das principais estrelas do sistema de corrupção em massa do governo Lula, está no centro de uma situação realmente prodigiosa - dessas que só mesmo a alta Justiça brasileira, como ela funciona hoje, poderia fornecer. Marcelo, condenado por crime de corrupção na Operação Lava Jato, e atualmente cumprindo os momentos finais de sua sentença (em regime aberto, é claro), foi agraciado pelo ministro Edson Fachin com uma redução da pena - mais a liberação de uma conta de US$ 11 milhões no exterior que estava bloqueada pela Justiça.

Mas aí é que está a beleza da história toda, inédita nos anais do Judiciário: o empresário recebeu esses mimos porque Fachin considerou que a sua delação premiada, na qual deixou a nu a roubalheira descontrolada da era Lula, foi “efetiva”, ou seja, rendeu o que se esperava dela. A delação de Marcelo era uma espécie de “contrato de performance”: se suas acusações realmente provassem a prática de crimes por parte dos delatados, o prêmio seria maior, em termos de redução da sua própria pena. A suprema Justiça brasileira, agora, decreta que Marcelo cumpriu a sua parte, ou seja, que falou a verdade ao delatar crimes de corrupção - mas também decreta, ao mesmo tempo, que a ajuda que prestou não serve para rigorosamente nada, já que não aconteceu rigorosamente nada com os ladrões denunciados por ele.


Fachin acaba de criar, com a sua decisão, um formidável desafio doutrinário aos mais agudos cérebros jurídicos do planeta - a figura do corruptor sem corrupto. Imaginava-se, até agora, que essas coisas vinham juntas: para corromper, o corruptor precisa de alguém que aceita ser corrompido. Não mais. Para o Supremo Tribunal Federal brasileiro, Marcelo Odebrecht é um corruptor certificado por fé pública, tanto que acaba de ser premiado, por sentença judicial, pela delação que fez. Mas é, segundo nossa suprema corte, um corruptor que não corrompeu ninguém.

Como assim? Simples: o mesmo STF, através do mesmíssimo Fachin, recusa-se oficialmente a punir o principal delatado pelo empreiteiro - o ex-presidente Lula. Tempos atrás, numa das decisões mais dementes jamais tomadas na História do Direito Universal, o ministro anulou, sem o mínimo fundamento em qualquer fato relevante, as quatro ações penais que existiam contra Lula, incluindo sua condenação pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro - condenação em terceira e última instância, como resultado das decisões de nove juízes diferentes.

Temos no Brasil, assim, o crime de corrupção sem o corrupto. Ou melhor: sabe-se perfeitamente quem foi denunciado por Marcelo Odebrecht como sendo o corrupto. Ele tem nome, endereço, CPF e é candidato a presidente da República. Até outro dia, aliás, tanto ele próprio como os seus devotos achavam que já tinham ganhado a eleição, no primeiro turno, e com mais de 100% dos votos; estavam brigando, naquela altura, por cargos no ministério. É este o Brasil que o STF criou.


Artigo, João Francisco Rogowski - O perdão presidencial é legal ?

Em 1974 o presidente Gerald Ford concedeu perdão à Richard Nixon envolvido no escândalo Watergate.

Neste artigo, abstraindo-se de questões políticas, o autor analisa unicamente a questão jurídica sobre a legalidade ou ilegalidade, do perdão concedido pelo presidente Jair Bolsonaro ao deputado federal Daniel Silveira.



O presidente da República, Jair Bolsonaro, assinou na quinta-feira (21) decreto concedendo indulto (graça ou perdão) ao deputado federal Daniel Silveira condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF),  no âmbito da Ação Penal nº 1.044, a oito anos e nove meses de reclusão em regime inicial fechado, pelos crimes de tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes e coação no curso do processo.


Como fundamentação do perdão, o presidente argumentou, entre outras coisas, que "a prerrogativa presidencial para concessão de indulto individual é medida fundamental à manutenção do Estado democrático de direito e que a liberdade de expressão é pilar essencial da sociedade em todas as suas manifestações".


O alcance do ato presidencial se extrai de excerto do decreto in verbis: "A graça de que trata este decreto é incondicionada e será concedida independentemente do trânsito em julgado da sentença penal condenatória." Segundo o presidente, o indulto inclui as penas privativas de liberdade, multa e restritivas de direitos.


Abster-me-ei de considerações políticas, minha análise se limita à questão jurídica unicamente. Indubitavelmente, a Constituição de 1988 concedeu ao Presidente da República, quem quer que seja ele, a prerrogativa de conceder indulto e comutar penas.


É medida constitucional conforme já decidiu o colendo Supremo Tribunal Federal pela voz, inclusive, do ínclito ministro Alexandre de Moraes.


Perdão presidencial (graça - indulto) é normal em países civilizados. Lembremo-nos que em 1974 o presidente Gerald Ford, concedeu perdão presidencial à Richard Nixon acusado da prática de crimes no caso Watergate.


O proprio Nixon, em 1971, ordenou a libertação do tenente do Exército William Calley, condenado à prisão perpétua pela Justiça Militar pelo suposto assassinato de 22 aldeões sul-vietnamitas em My Lai em março de 1968.


Um perdão federal nos Estados Unidos se estende a todos os crimes federais, é ato privativo do Presidente que anula completamente a punição por um crime federal. A cultura do perdão remonta aos primordios do nascimento da nação marcada pela influência do puritanismo cristão protestante. É um poder tão absoluto que o  presidente pode perdoar a si mesmo, exceto em casos de impeachment.