Tito Guarniere - O julgamento do TSE

TITO GUARNIERE
O JULGAMENTO DO TSE
Não há razões para escândalo. O Tribunal Superior Eleitoral-TSE decidiu por maioria de votos, quatro contra três, que não havia razões suficientes para cassar a chapa Dilma-Temer. Julgou como quis, de forma soberana. Havia bons argumentos para ambos os lados. Mas é impressionante como existe gente que só ouve o apelo de suas próprias convicções. Ai dos fatos se eles saem diferentes do que eles imaginavam e queriam!
Então, tudo passa a ser "uma vergonha", tudo vai "acabar em pizza". Os "réus foram absolvidos por excesso de provas", a decisão do TSE "desmoraliza a Justiça brasileira": vai por aí o chororô cívico dos donos da verdade, dos justiceiros de plantão. Para esses, é preciso que corra sangue e só é virtuosa a decisão que coincida com suas inabaláveis certezas.
Mas se é assim, se o único resultado justo seria a cassação da chapa, então para que, mesmo, o julgamento? Para que um tribunal composto de sete juízes? Para que procuradores, advogados, doutrina, leis, tratados, pareceres e relatórios, votos exarados em centenas de páginas? Este é o jogo, senhores. Nem sempre as coisas acontecem ao nosso gosto e feição.
Vejam a Associação Nacional dos Procuradores da República-ANPR. A entidade emitiu nota de repúdio à fala do ministro Gilmar Mendes, em que ele, como presidente do TSE, criticou o Ministério Público Federal. O MP, diz a nota, tem independência funcional e não recebe ordens de ninguém. Também lembra a função de zelar pelo regime democrático e de "forjar a têmpera(?) das instituições". Muito bem, apesar do voo meio condoreiro de "forjar a têmpera das instituições".
Entretanto, de quais pontos específicos os procuradores não gostaram, a nota não informa. Revidam o ministro, discorrem sobre as suas próprias prerrogativas, mas não respondem a nenhuma das críticas formuladas. É como se fossem imunes.
Os procuradores podem tudo, ou quase tudo. Podem criticar a decisão do TSE, o ministro Gilmar Mendes, os políticos, as empresas doadoras de dinheiro de campanha. Podem celebrar acordo com Joesley Batista, réu confesso de delitos a granel, para que ele grave em segredo a mais alta autoridade da República. Em troca, podem conceder-lhe o salvo-conduto para uma vida mais do que confortável, de luxo, no exterior.
Podem fazer isso tudo sem dar satisfações a ninguém. Podem tomar tais resoluções entre si, fechados em seus gabinetes, e sejam elas quais forem, do lado de fora, terão cobertura e apoio da grande imprensa, em geral. Contra si, um ou outro jornalista, como Reinaldo Azevedo, da Rede TV, um ou outro juiz, como Gilmar Mendes. Nem mesmo as suas vítimas preferenciais - os políticos - podem reclamar: será dito que só querem livrar a cara e acabar com a Lava Jato.
Mas a decisão do colegiado de um tribunal, tomada diante de todos, filmada pela televisão, com cada juiz votando e justificando o voto, isso não pode. Isso é conspiração contra a Lava Jato e contra o Brasil. Até onde iremos nesse desvario?

titoguarniere@terra.com.br

Augusto Nunes, Veja - A maior vitória do ministro que se promoveu a Juiz dos Juízes pode ter sido também a última

A maior vitória do ministro que se promoveu a Juiz dos Juízes pode ter sido também a última

Uma imensidão de brasileiros descobriu na semana passada que o Tribunal Superior Eleitoral é presidido por um ministro da defesa de réus soterrados pela avalanche de provas do crime. Quem acompanha a trajetória de Gilmar Mendes sabe disso pelo menos desde 2008, quando esse mato-grossense de Diamantino assumiu a presidência do Supremo Tribunal Federal — e passou a mostrar que o professor de Direito Constitucional era a fachada que camuflava um doutor em absolvição de culpados.

Em 27 de agosto de 2009, por exemplo, Gilmar conseguiu arquivar “por falta de provas” a denúncia que identificava Antonio Palocci como o mentor da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, que testemunhara as frequentes aparições do ainda ministro da Fazenda na suspeitíssima “República de Ribeirão Preto”. Para inventar o estupro encomendado sem mandante, valeu-se do duplo papel de presidente da corte e relator do caso.

O relator negou-se a enxergar a catarata de evidências. O presidente foi o primeiro a votar pelo sepultamento da bandalheira. A mentira venceu por 5 a 4 porque Gilmar, como reafirma o vídeo abaixo, não viu nada de mais. Talvez aceitasse a denúncia se Palocci fosse pessoalmente à agência da CEF, obrigasse o gerente a mostrar-lhe a conta e convocasse uma entrevista coletiva para confessar o que fizera. Como não agiu assim, sobrou para o caseiro.

Por ter contado a verdade, Francenildo perdeu o emprego, o sossego, a mulher e a chance de conseguir trabalho fixo em Brasília. O culpado ficou dois meses deprimido com a perda do emprego, elegeu-se deputado federal, coordenou a campanha de Dilma Rousseff, virou chefe da Casa Civil, teve de cair fora do primeiro escalão por ter enriquecido como facilitador de negociatas disfarçado de “consultor”, voltou ao palco para ajudar a candidata à reeleição e acabou no pântano drenado pela Lava Jato.

Preso em Curitiba desde 26 de setembro de 2016, Palocci tentou recentemente escapar pela trilha que começa na Segunda Turma do STF. O malogro da tentativa de ser resgatado da cela pela trinca formada por Gilmar, Lewandowski e Toffoli convenceu o ex-ministro a buscar um acordo com o Ministério Público Federal. No momento, o Italiano da Odebrecht ensaia a delação premiada que assombra as madrugadas de Lula. Promete fazer revelações que comprometem banqueiros e empresários. Tomara que não se esqueça do Poder Judiciário.

Em dezembro de 2009, enquanto Palocci saboreava o regresso à Câmara dos Deputados, Gilmar valeu-se de um habeas corpus para devolver à liberdade o médico Roger Abdelmassih, engaiolado desde agosto pela autoria de pelo menos 56 crimes sexuais contra 37 pacientes e condenado a 278 anos de prisão. Convencido de que o popstar da inseminação artificial já não ameaçava ninguém por ter sido proibido de exercer a profissão, decidiu que quatro meses de confinamento estavam de bom tamanho.

Em 2011, a polícia comunicou à Justiça que Abdelmassih havia regularizado o passaporte e pediu autorização ao STF para prendê-lo antes que fugisse. De novo, Gilmar garantiu-lhe o direito de ir e vir, que usou em 2011 para ir embora do Brasil e não voltar. Foi recapturado três anos mais tarde, quando saboreava a vida mansa no Paraguai. Hoje é um dos hóspedes do presídio de Tremembé.

Nos anos seguintes, a agenda sempre sobrecarregada de Gilmar Mendes não deixou de abrir espaço para atendimentos de emergência a amigos do Estado natal, sobretudo aos que reconhecem e festejam a influência do ministro. Em 10 de maio de 2013, ao receber a medalha da Ordem do Mérito de Mato Grosso, o homenageado incluiu nesse grupo de elite o governador Silval Barbosa: “Somos amigos há muito anos, sempre tivemos conversas proveitosas”, diz Gilmar no vídeo abaixo. Uma dessas conversas proveitosas ocorreria um ano mais tarde, quando a residência de Silval foi alvo de um mandado de busca e apreensão executado pela Polícia Federal.

Ao vasculharem a casa do político investigado no Supremo Tribunal Federal por corrupção, os agentes da PF encontraram uma pistola com registro vencido. Depois de pagar a fiança fixada em R$ 100 mil, Silval teve prontamente atendido o pedido de socorro a Gilmar, como atesta o áudio abaixo.

— Governador, que confusão é essa!!!??? — ouve-se a voz de Gilmar Mendes num tom que desenha um buquê de pontos de exclamação e interrogação.

— Barbaridade, ministro, isso é uma loucura! — ouve-se a voz de Silval Barbosa num tom de quem faz o possível para simular espanto.

— Que coisa! Tô sabendo isso agora! — Gilmar continua perplexo.

— É… é uma decisão aí do Toffoli — começa o cortejo de palavras desconexas, frases truncadas e explicações incoerentes, interrompido a cada meia dúzia de sílabas por vírgulas bêbadas e reticências que denunciam a ausência de álibis. Entre um e outro hum-hum rosnado por Gilmar, o governador menciona Blairo Maggi, uma delação premiada e denúncias envolvendo a campanha eleitoral de 2010 que nem sabe direito quais são. Precisa conferir o processo. — É uma loucura, viu? — recita com voz chorosa.

— Que loucura!, que loucura! — concorda Gilmar, antes de avisar que o socorro está a caminho. — Eu vou ver. Vou agora para o TSE conversar com o Toffoli.

O governador repete o falatório incongruente. O ministro do STF reitera a promessa de ajuda:

— Eu vou lá e, se for o caso, depois a gente conversa — combina Gilmar, que se despede com “um abraço de solidariedade”.

Silval pôde dormir em sossego enquanto desfrutou do foro privilegiado.
Terminado o mandato, ficou exposto a instâncias do Judiciário fora do alcance do nada santo protetor de corruptos. Em 17 de setembro de 2015, depois de ficar foragido por dois dias para escapar da prisão preventiva decretada pela juíza Selma Arruda, Silval entregou-se à Justiça. Passados quase dois anos, continua engaiolado. Mas não parece figurar na agenda de preocupações do especialista na absolvição de culpados.

Gilmar, que vive prometendo marcar encontros com “as prisões alongadas ocorridas em Curitiba”, não deu as caras na cadeia que há quase dois anos aloja Silval. Feroz inimigo de delações premiadas, decerto não gostou de saber que o ex-governador negocia um acordo com a Justiça que o obrigará a contar tudo o que sabe. A amizade entre essas duas celebridades mato-grossenses pode estar perto do fim.

Como reiterou a entrevista publicada pela Folha nesta segunda-feira, Gilmar vê no espelho uma figura onipotente, onisciente e onipresente.
Mas mesmo quem pode muito não pode tudo. Já não pode, por exemplo, livrar Aécio Neves da enrascada em que se meteu com a divulgação da conversa telefônica em que tentou conseguir R$ 2 milhões de Joesley Batista — e mostrou ao país que um ex-candidato à Presidência da República também sabe falar um subdialeto de encabular o mais desbocado brigão de cortiço.

Até então, o senador mineiro figurou na lista VIP dos clientes do ministro. Aos integrantes desse grupo é permitido até pedir que um ministro do Supremo interfira em votações no Senado, como atesta a gravação abaixo reproduzida, que registra o diálogo entre entre Gilmar e Aécio ocorrido em 26 de abril deste ano. Ou pode, como fez Michel Temer, pedir ao presidente do TSE que o absolva por excesso de provas.

Foi a maior vitória do Juiz dos Juízes. Talvez tenha sido a última.

O COITADINHO TATUADO

          A mídia nacional concedeu amplos espaços para lamentar o “pobre coitado” que teve a sua testa tatuada com os dizeres: Eu sou ladrão e vacilão. Tudo porque o referido “anjinho” roubou e agrediu a um deficiente físico que, honestamente, tentava ganhar seu sustento vendendo guloseimas nas ruas.
         A mesma mídia (hipócrita e politicamente correta) ainda teve o desplante de divulgar uma entrevista com a mãe do “pobre coitado”, dizendo: meu filho não é um animal. O que por si só explica o fato.
         Pois eu afirmo – ao mesmo tempo em que a minha paciência com esta vitimização ridícula e descabida, acabou! – que, independente da idade do marginal, ele é sim um animal.
         Porque só um animal – mesmo adolescente, afinal o Champinha também o era – pode ser capaz de um ato tão revoltante como o de assaltar e agredir um deficiente físico (um jovem perneta), seja para roubar sua bicicleta, seja para roubar qualquer outra coisa.
         E, neste país onde a inversão dos valores virou moda, ainda querem crucificar o vagabundo assaltante. Tanto que prenderam quem o tatuou, tratando do “pobre coitado” como se vítima fosse.
         Ora, devagar com o andor que o santo é de barro!
         Não estou aqui defendendo a justiça “olho por olho, dente por dente”. O que eu quero (e, com certeza muita gente) é justiça e decência! E ponto final. Simples assim.
         Todos nós aprendemos (ou deveríamos ter aprendido) o que é certo e o que é errado. E roubar é errado. Quem ensina isto não sou eu, é o Código Penal e a boa moral. Que não é inata a quem tenha dinheiro, ou seja  nascido em berço esplêndido. Chovem exemplos disso, em qualquer canto do país e do mundo.
         Mas, também não silenciarei por causa de meia dúzia de defensores dos direitos dos manos, mais preocupados em defender os vagabundos, que chamam de “vítimas da sociedade”, do que preocupados com o justo, o correto. E o deficiente físico assaltado não seria muito mais “vítima da sociedade” do que o vagabundo que o assaltou?
         Ah, querem justiça para os tatuadores? Tudo bem, eu também sou contra a LEI DE TALIÃO, mas o “pobre coitado” igualmente terá que responder pelo seu crime. E sem um advogado porta de cadeia para inventar teses mirabolantes em sua defesa.
         Há agravantes de peso contra o “pobre coitado” assaltante.
         A principal reside na deficiência física do assaltado! O jovem é perneta, meu Deus do céu!
         Se os deficientes tem uma série de privilégios legais, quem os viola – como o “pobre coitado” violou – deve responder severamente pelo ato praticado. E não ser protegido por alguns que se consideram o “passo certo do batalhão”.
         As estapafúrdias alegações ouvidas são no sentido de que o “pobre coitado” não sabia que estava cometendo um crime hediondo? Ou do excesso da reação dos tatuadores. Tal excesso que é causado pela impunidade absurda que os criminosos ganham no Brasil.
         Então vou sentar na porta da minha casa e esperar – desde agora, 12 de junho – pela chegada do Papai Noel, com sua carruagem voadora conduzida por belas renas.
         E, o máximo da vergonha foi a criação de uma “vaquinha” visando arrecadar fundos para pagar uma cirurgia corretiva na testa do “pobre coitado”, vagabundo e ladrão.
         Mas, não se viu (e nem se soube de) nenhuma “vaquinha” para ajudar ao deficiente físico que vende balas de forma honesta num sinal para se sustentar, e não rouba ninguém.
         Aliás, falando nisso, será que aqueles que colaboraram nesta “vaquinha” ridícula para ajudar o “pobre coitado”, alguma vez se dispuseram a estender a mão na direção de quem realmente necessite (pessoas sem ter o que comer; desempregados com filhos pequenos; vítimas das enchentes; etc...)?
         CHEGA DE TANTA HIPOCRISIA!
         Está mais do que na hora da decência voltar ao Brasil.
         Quem sabe esta não é uma ótima oportunidade?


         Marcelo Aiquel – advogado (12/06/2017)