Artigo, Fernando Schuller, Folha - A era da irrelevância


Um dos subprodutos mais curiosos da democracia digital é o gosto generalizado pela tagarelice e pelos assuntos irrelevantes, que parece ter tomado conta, como uma erva daninha, do debate público.

Assuntos irrelevantes são essas coisas que geram bate-boca e algum calor, em regra na internet, por 24 ou 36 horas, e depois simplesmente desaparecem, sem deixar rastro.

Foi o caso do debate sobre a cor da roupinha das crianças, a partir de um vídeo da ministra-pastora dos Direitos Humanos. Li muita gente argumentando, em tom aparentemente sério, que aquilo tudo era bastante grave, escondia um atroz preconceito e fatalmente levaria a mais violência contra populações trans e LGBT.

Durante a campanha, lembro do debate próximo à histeria sobre uma suposta proliferação de grupos nazifascistas que andariam pela ruas do país atacando mulheres e homossexuais. Gente muito boa sugeriu que havíamos voltado aos anos 30, na Alemanha, com base no episódio da moça que teria sido marcada com uma suástica, no Sul do Brasil.

Depois se descobriu que era tudo falso, mas ninguém pareceu preocupado ou se desculpou. Partimos alegremente para a próxima besteira.

Na transição, por um ou dois dias, discutimos o hábito do novo presidente cumprimentar todo mundo fazendo continência. Primeiro foi com um assessor americano, depois foi a um jogador do Palmeiras. Depois disso o assunto perdeu a graça.

Antes da posse, discutimos intensamente se o presidente iria desfilar em carro aberto ou fechado, entre a Catedral e o Congresso Nacional. Depois discutimos o que fazia o primeiro-filho sentado na traseira do Rolls-Royce, e logo depois (com direito à manchete no The Washington Post) o significado da “saudação militar” feita pela primeira-dama, Michelle Bolsonaro (que no fim era apenas um movimento com a mão, no discurso em Libras).

Na última semana, dedicamos intensos dois ou três dias fazendo graça com a viagem dos novatos deputados do PSL à China e seu bate-boca com Olavo de Carvalho.

E ainda ontem, muita gente graduada discutia, com ares de grande coisa, a gravíssima atitude do presidente almoçar em um bandejão de supermercado, no centro de Davos, e o fato de ele ter usado um teleprompter em seu pronunciamento.

A lista é saborosa e poderia ir longe. Irrelevâncias e não acontecimentos se tornaram uma espécie de pão nosso de cada dia, no debate atual.

É evidente que não há como definir bem estas coisas. A aprovação de um rombo na Lei de Responsabilidade Fiscal, pelo Congresso, é mais ou menos importante do que o último desmentido presidencial? O que vale mais, discutir a independência do Banco Central ou a troca de farpas da ministra da Agricultura com Gisele Bündchen?

Desconfio que, no fundo, temos uma boa noção sobre isto. Se o debate público valesse alguma coisa, levaríamos as coisas mais a sério. O sujeito que é acionista da empresa não gasta seu tempo, na reunião do conselho, tagarelando sobre o barraco da festa de final do ano.

Não o faz por uma razão simples: sua opinião pesa e ele não irá perder seu tempo com besteira. Na democracia, é o contrário: a opinião do cidadão vale muito pouco. Seu incentivo para levar alguma coisa realmente a sério é quase nenhum.

Isto sempre foi assim, nas democracias, mas o fato é que a emergência das mídias digitais deu uma outra dimensão ao fenômeno.

Uma razão para isto diz respeito ao custo da informação. Há 30 anos, emitir uma opinião dava muito mais trabalho. Implicava em escrever um artigo, dar uma entrevista na rádio ou imprimir alguma coisa por conta própria e depois distribuir na fila do cinema ou do posto de saúde.

Me lembro de tudo isto, nos anos 80.

A democracia digital explodiu essas coisas. O debate público se tornou vítima do instantâneo. Há informação demais, discussões demais, sem permitir que o tempo se encarregue de depurar os acontecimentos e separar o que importa daquilo que não passa de lixo em forma de palavras e imagens.

Há duas notícias preocupantes aí: a primeira é que isto não faz bem à democracia. A qualidade do debate público, por óbvio, afeta a escolha pública. Quanto mais toxina ideológica espalhamos por aí, mais perdemos tempo e capacidade de gerar consensos e fazer as coisas que importam andar pra frente.

A segunda notícia é que se trata de um estado de coisas que veio para ficar. O modus operandi das mídias sociais contaminou a todos, a liderança política, os intelectuais e (ao menos boa parte) da mídia profissional.

E mais: fez com que o eleitor, agora transformado em um ativista digital, passasse a se comportar como um pequeno político, usando da retórica e reproduzindo, um a um, todos os vícios que ele vê nos políticos contra os quais esbraveja.

Estamos diante de um problema sem saída. Todo mundo conhece o vaticínio de Umberto Eco, segundo o qual a internet fez com que o idiota da aldeia fosse promovido a portador da verdade.

O que imagino nem Umberto Eco esperasse era o efeito inverso: que também a elite usualmente tida como portadora da verdade passasse a se comportar, no dia a dia, como o idiota da aldeia.

Artigo, Renato Sant'Ana - Crítica ou guerra?

Na relação imprensa versus políticos, é imprescindível que governos
sejam criticados e que governantes saibam responder às críticas com boas
ações. Mas não se pode confundir "crítica" com "guerra ideológica". Nem
exigir passividade a quem é atacado com truculência.

O que grande parte da mídia vem fazendo nos primeiros dias do novo
governo beira a infâmia, revelando um notado propósito de produzir
crises e atingir a pessoa do presidente da República. A título de
exemplo, faça-se a análise de um caso apenas.

Antes, porém, convém explicitar duas premissas. Uma é que o governo
Bolsonaro tem, sim, pontos a serem criticados e, embora qualquer
avaliação definitiva em tão curto tempo seja indevida, não é razoável
pretender blindá-lo. Outra é que cidadãos com clara noção de democracia
não fazem apologia de governo algum, mas contribuem sempre que possível,
inclusive com críticas, para que o governo realize o melhor, tenham ou
não votado nele.

Posto isso, é abjeta a forma com que Igor Gielow, colunista da Folha de
S. Paulo, se empenha em deslegitimar o governo Bolsonaro. Recorrendo à
tática do "sem dizer, dizendo", ele é só mais um a fazer um terceiro
turno de 2018. Pretenderá deseleger o presidente?

Em 23/01/19, sua coluna começa pela desonestidade do título : "Marielle
surge no caso Queiroz para assombrar começo do governo Bolsonaro". Ora,
uma afirmação categórica, usada como título, tende a fixar uma "verdade"
para o leitor médio, que não se caracteriza pelo salutar cepticismo nem
pelo hábito de pesquisar. É na cabeça desse leitor que Gielow se empenha
em meter uma suposta ligação entre Bolsonaro e o "caso Marielle".

E vai em frente: "É portanto irônico que a maior dor de cabeça dessa
alvorada de governo (...) esteja se aproximando lentamente de um outro
cadáver famoso [o de Marielle]". Ah, mas ele depois até admite "total
desconexão entre o papel dos protagonistas e o enredo", isto é, entre
quem matou Marielle e o entorno do presidente. Mas a ressalva vem só
depois de instilar alta dose de veneno!

Ele cuida de teatralizar certa isenção, aludindo a que o espectro de
Celso Daniel (morte até hoje não esclarecida) esteve presente durante o
governo do PT (os 13 anos "com fracassos e sucessos", faz ele questão de
salientar). E logo diz (sem dizer) que o envolvimento do PT no
assassinato de Daniel é "teoria conspiratória". Será que ele, sobre esse
caso, não leu o minucioso relato de José Nêumanne Pinto nem a análise do
experiente policial Romeu Tuma Junior?

"Do ponto de vista de imagem", prossegue Gielow, "a coisa fica
particularmente complicada porque Marielle virou um símbolo, dentro e
fora do Brasil, de vítima de um país truculento e autoritário que não dá
certo, que não protege suas minorias."

Gielow explora um panorama que a mídia, em vez de alimentar, deveria
questionar e transformar, no qual a maior distinção de uma pessoa não é
ter alta eficiência, não é a retidão de caráter, mas, isto sim, a
qualidade de vítima. O esquerdismo investe nesse quadro, fomentando o
vitimismo, dividindo a sociedade e atribuindo um estatuto e um discurso[

A Marielle Franco que a mídia badala é um símbolo criado para esse fim ideológico e destoa da pessoa real. Marielle não é heroína. Mártir não é.
Ela é só mais uma, entre milhares de vítimas. Merece compaixão e, sim, respeito. Só isso. Tudo mais é mistificação. Ao contrário do que a mídia insinua (sem dizer, dizendo), ela não serve de exemplo a ninguém.
A Marielle Franco da mídia é ficção ideológica!

Ela é um ícone, um módulo imagético criado para substituir a explicitação de conceitos, driblar o discernimento dos simples e propagar preconceitos. Ao usar seu nome, Igor Gielow apresenta o ícone que, no computador mental dos desavisados, carrega o aplicativo da indignação e ativa sentimentos de injustiça, o que ele pretende colar na imagem do novo governo. Isso é crítica ou guerra ideológica?





Inspeção não encontrou falhas em Brumadinho, diz empresa alemã Tuv Sud


Esta reportagem é da Reuters, assinada pelos jornalistas Ernest Scheyder em Houston e Christoph Steitz em Frankfurt.

Vale a pena ler tudo:

Uma barragem da Vale que entrou em colapso na sexta-feira, matando pelo menos 34 pessoas e deixando centenas desaparecidas, não mostrou falhas estruturais quando foi inspecionada em setembro passado, disse neste sábado a empresa alemã que realizou a inspeção.

O número de mortes na barragens de rejeitos que se rompeu na sexta-feira, na mina de minério de ferro Córrego do Feijão, em Brumadinho, região metropolitana de Belo Horizonte (MG), deverá aumentar devido ao alto número de desaparecidos, no pior desastre de mineração do país desde 2015.

A TUV SUD, com sede na Alemanha, informou neste sábado que inspecionou a barragem de rejeitos em setembro e concluiu que ela estava operando bem.

“Com base em nosso estado atual de conhecimento, nenhum dano foi encontrado”, disse um porta-voz da companhia. “Apoiaremos totalmente a investigação e disponibilizaremos todos os documentos exigidos pelas autoridades investigadoras.”

A empresa não deu mais detalhes.

A TUV SUD faz parte da família de empresas TUV, que realiza uma série de inspeções industriais, incluindo dutos, barragens de rejeitos e até implantes mamários. No entanto, cada entidade TUV tem uma estrutura de propriedade complexa.

Em 2010, a TUV SUD foi suspensa por um comitê de mudança climática da Organização das Nações Unidas por não seguir os procedimentos e por dar “uma opinião de validação positiva a alguns projetos, mesmo que tivesse preocupações”.

A causa da ruptura da barragem de Córrego do Feijão não é conhecida. O diretor-presidente da Vale, Fabio Schvartsman, disse que a barragem estava sendo descomissionada e que uma leitura de monitores mostrou que estava tudo normal em 10 de janeiro.

Rejeitos são os detritos líquidos ou sólidos que sobram do processo de mineração. Ouro, cobre, minério de ferro e outros minerais são separados dos elementos da rocha base após serem removidos da terra.

Essa mistura pegajosa de rejeitos remanescentes é muitas vezes tóxica e é armazenada em reservatórios próximos mantidos por barragens que são elevadas quanto mais tempo a mina opera. Mas essas barragens de rejeitos, algumas das quais estão entre as maiores estruturas do mundo, são suscetíveis à erosão.

A Agência Nacional de Mineração do Brasil já ordenou que a Vale suspenda as operações no local de Córrego do Feijão. A Justiça de MG bloqueou 5 bilhões de reais da Vale a pedido do Ministério Público estadual e outro 1 bilhão de reais a pedido do Estado.

Íntegra da representação de Adão Paiani contra o chefe do MPE do RJ


Excelentíssima Senhora Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público, Doutora RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE. Processo 1.000.61/2019-76 Relator: Dr. Luis Fernando Bandeira de Mello Filho



   ADÃO JOSÉ CORREA PAIANI, brasileiro, casado,
advogado, regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Rio Grande do Sul, sob o nº 62.656, com endereço profissional à Alameda das Acácias, Quadra 107, Lote 20, Casa 04, Águas Claras, em Brasília/DF, CEP 71.927-540, onde recebe intimações e notificações; vêm à presença de Vossa Excelência, com base no que dispõe o artigo 130-A, § 2º, inciso III, e § 3º, inciso I, da Constituição da República; bem como o artigo 138, e seguintes, do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público, apresentar a presente

REPRESENTAÇÃO COM REQUERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA

face a JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, Procurador-Geral de
Justiça do Estado do Rio de Janeiro, com endereço funcional à Av. Marechal Câmara, n° 370 - Centro - Rio de Janeiro, RJ - CEP 20020080 - Telefone: (21) 2550-9050; pelos fatos e fundamentos que passa a expor.


I – DOS FATOS: 

   Na data de 18 de Janeiro do corrente ano, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, foi fotografado em encontro com o jornalista OCTÁVIO GUEDES da GloboNews, emissora da Rede Globo de Televisão, no restaurante Lorenzo Bistrô, localizado no Bairro Jardim Botânico, próximo aos estúdios da citada empresa de comunicação; conforme se verifica no registro fotográfico que segue:
 As fotografias retro reproduzidas, de inquestionável clareza, mostram o chefe do Ministério Público do Rio de Janeiro, acompanhado de outro servidor do Grupo de Investigação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, responsável pelas investigações no âmbito da ALERJ, cuja identidade ainda carece de apuração, em inegável “reunião de trabalho” com o citado jornalista, na antevéspera do vazamento de informações do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) sobre a movimentação financeira do deputado estadual, e Senador da República Eleito, Flávio Bolsonaro; e de declarações do próprio Procurador-Geral de que o referido parlamentar estaria sendo investigado pelo MP-RJ, juntamente com outros 26 deputados estaduais; mas com inegável ênfase no seu nome, aparentemente pelo fato de tratar-se do filho do Presidente da República. 

  O referido encontro, e seus objetivos, não foram negados por nenhum dos envolvidos, e nem poderiam. O jornalista OCTÁVIO GUEDES, da GloboNews, inclusive, afirmou em declaração veiculada pela emissora na qual trabalha que estava “atrás de informações”,
“ouviu vários especialistas, aproveitando pra ouvir também o Gussem”; e  “não revelou nada que está sob sigilo, mas até poderia”, o que faz presumir, evidentemente, que recebeu informações abrigadas sob sigilo de parte do seu interlocutor, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM. As declarações do jornalista OCTÁVIO GUEDES podem ser verificadas no link que, por oportuno, indicamos: http://www.caneta.org/noticias/gaguejando-jornalista-da-globonewsconfirma-encontro-com-chefe-do-mp-rj-em-restaurante/      A conduta do Representado, reunindo-se de forma exclusiva e fora das dependências do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ao qual preside, para tratar de assuntos referentes a uma investigação que deveria ser sigilosa, e que está sendo levada a cabo por aquele órgão ministerial, a qual está sob sua responsabilidade e de seus subordinados, enseja o questionamento de estarmos diante de um grave

desvio ético, quando não da prática, em tese, de crimes de natureza funcional, sem prejuízo de outros, na esfera penal, a serem igualmente apurados, incompatíveis com a conduta exigível de servidor público investido de funções de tamanha envergadura.

  Tal conduta deve ensejar pronta, célere, responsável e segura apuração deste Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), uma vez que depõe contra a lisura e isenção necessárias ao parquet para apurar eventuais ilícitos que tenham sido praticados no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro; sendo este, precisamente, o objetivo da presente Representação.      É imperioso salientar que, muito embora as referidas investigações sobre irregularidades que teriam sido praticadas, em tese, por parlamentares da ALERJ alcancem quase trinta deputados estaduais, as declarações sobre detalhes da apuração, e o vazamento ilegal e seletivo de informações sigilosas tem-se focado única e exclusivamente no nome de um único parlamentar daquela Casa Legislativa, coincidentemente filho do Presidente da República, contra o qual a emissora à qual pertence o jornalista OCTÁVIO GUEDES - comensal à mesa do restaurante Lorenzo Bistrô, juntamente com o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM – move, indiscutivelmente, feroz campanha de desconstrução de imagem. 

  Assim, a conduta reprovável, ilegal e imoral do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM merece, de parte deste CNMP a apuração devida e, uma vez comprovadas as ilegalidades que por hora se presumem, justificadamente, tenham ocorrido, a responsabilização cabível do representado.
II – DA LEGITIMIDADE E CABIMENTO DA PRESENTE REPRESENTAÇÃO: 
    Encontra-se estabelecido pelo parágrafo 2º, do artigo 130-A, da Constituição da República, que “compete ao Conselho Nacional do
Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do
Ministério Público, e do cumprimento de todos os deveres funcionais dos seus membros” cabendo-lhe zelar pela observância do art. 37 da Constituição da República e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados; sendo legítimo a qualquer cidadão representar, por escrito ou pessoalmente, no referido órgão.     Tal controle das atividades funcionais move-se pela imperiosidade das mesmas serem desenvolvidas, pela extrema relevância da atividade ministerial e pela segurança jurídica da sociedade e dos seus cidadãos, dentro dos limites estabelecidos tanto pela Carta Constitucional quanto pelo ordenamento infraconstitucional, sob pena de nos depararmos com faltas disciplinares, e extrapolação dos deveres funcionais, dos órgãos ministeriais.      No caso em tela, pelas circunstâncias em que o fato ocorreu, é absolutamente legítimo supor-se que o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM agiu em prejuízo da ética funcional, quando não cometendo graves delitos de natureza funcional e mesmo, em tese, na esfera penal, que devem ser apurados com o necessário rigor e isenção por este CNMP, em observância às suas atribuições constitucionais e legais, e em respeito à própria sociedade; uma vez que a conduta praticada expõe, depõe e compromete a própria  dignidade do Ministério Público e de seus membros.

  Assim, visando uma apuração rigorosa do lamentável episódio, onde a mais alta autoridade do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, é flagrado em conduta, em tese, ilegal, mas seguramente imoral, em uma circunstância na qual deveria, indiscutivelmente, cumprir com seu papel de custus legis e não submeter-se à condição de informante privilegiado de um veículo de comunicação; cabível o acolhimento da presente Representação que, nos termos regimentais do CNMP, a qual deve ser distribuída a um Relator para, a critério deste, tramitar na forma apresentada, ou receber nova classificação.     III – DAS VIOLAÇÕES ÉTICAS E FUNCIONAIS PRATICADAS, EM TESE, PELO REPRESENTADO:     A conduta antiética, imoral e ilegal do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, na condição de Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ao encontrar-se com jornalista da já citada empresa de comunicação com a finalidade de passar-lhe com exclusividade informações sigilosas de uma investigação, não apenas depõe contra os mais basilares princípios da administração pública, mas igualmente, e com igual gravidade, a isenção necessária e exigível de qualquer órgão da instituição que preside, a própria segurança jurídica da sociedade e dos cidadãos, e os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito.

   A conduta vexatória do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM carrega em si uma inequívoca e indevida antecipação de juízo de valor, e a personalização de uma investigação na figura de apenas um dos supostos “investigados”, tendo como motivação interesses de ordem política e ideológica, bem como a utilização de um feito como plataforma de promoção pessoal, e ainda em benefício dos interesses de um grupo de comunicação em clara e notória ação de vendetta  contra a

pessoa do Presidente da República, mediante a exposição pública de seu filho em um caso ainda sob investigação.     Ao aceitar, ou mesmo propor, reunir-se com um jornalista de um grupo de comunicação que demonstra de maneira inequívoca ter interesse em direcionar, e influenciar, os resultados de uma investigação em curso, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM ofereceu a primazia de suas conclusões antecipadas à Rede Globo de Televisão, veículo de imprensa notoriamente engajado na persecução pessoal e política do Presidente da República, de seus familiares e demais integrantes de seu campo político, e que tem se utilizado de todos os expedientes possíveis para criar uma atmosfera negativa e de instabilidade política fabricada em relação a um governo legitimamente eleito por mais de 57 milhões de brasileiros, e recém empossado.  

  A atuação do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, compartilhando informações sigilosas com exclusividade para um único veículo de informação, tem por objetivo, nitidamente, agradar os donos e responsáveis pela empresa de comunicação, em troca de espaço de promoção pessoal concedido, bem como dar vazão aos seus próprios interesses políticos e ideológicos. Tal conduta desprezível depõe contra as garantias constitucionais das quais o representado, membro da instituição à qual foi confiada, pela Carta Magna, a defesa da ordem jurídica e do regime democrático, comprometeu-se a defender e preservar.     Ao antecipar informações sigilosas de uma investigação em andamento, em prejuízo de apenas um dos investigados, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, sob qualquer ângulo que seja analisada sua pérfida conduta, compromete o prestígio e a dignidade do Ministério Público, bem como a honradez de seus membros; os deveres legais que lhe são impostos, em especial, o de manter conduta ilibada e

compatível com o exercício do cargo, de zelar pela dignidade de suas funções, de tratar com urbanidade os jurisdicionados, e de observar a formalidades legais observar as formalidades legais no desempenho de sua atuação funcional. 

  Em uma conduta absolutamente mesquinha e desleal, o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM desvenda para um grupo específico de comunicação – não por acaso o mais poderoso do país – detalhes sigilosos de um procedimento inconcluso, fazendo com que uma hipotética denúncia, que teria que ser submetida ainda ao crivo do Poder Judiciário, tenha um primeiro “julgamento” pela “opinião publicada” de um noticiário parcial e faccioso, disseminado a partir da Rede Globo de Televisão e de seus veículos de comunicação; contaminando, em prejuízo da própria persecução penal que venha a ser buscada e de todo um procedimento legal, distanciando-se de fatos objetivos e de uma análise estritamente jurídica que deveria ser realizada.      A conduta do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, nesse contexto, o artigo 43, incisos I, II, VI e IX, da Lei Federal n.º 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público) a qual transcrevemos:   
“Art. 43. São deveres dos membros do Ministério
Público, além de outros previstos em lei: I - manter
ilibada conduta pública e particular; I I - zelar pelo
prestígio da Justiça, por suas prerrogativas e pela
dignidade de suas funções; (...) VI - desempenhar, com
zelo e presteza, as suas funções; (...) IX - tratar com
urbanidade as partes, testemunhas, funcionários e
auxiliares da Justiça.”


  Tal violação, que seguramente se comprovará no âmbito do procedimento que se requer, depõe contra a Instituição presidida pelo representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM como um todo, causando grave desprestígio social e intelectual ao Ministério Público.       Antecipar juízo de valor, expor efeitos de eventual ação penal ou civil, indicar responsáveis por malfeitos no início das investigações, divulgar diligências que sequer foram realizadas, ou seus resultados sem uma análise criteriosa, violando sigilo processual ou de diligências, em razão do cargo, como observado na conduta do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, evidentemente torna-se fatal para a credibilidade da Instituição Ministério Público; e deve ser coibida com todo o rigorismo que a lei prevê para situações análogas     Embora os membros do Ministério Público não estejam proibidos de manterem relacionamento com a imprensa, o que é vedado a Promotores e Procuradores de Justiça é o agir midiático, com vista a mera promoção pessoal, afastando sua conduta dos princípios da legalidade, moralidade e, em especial, do interesse público, o que, sob uma análise realística, evidentemente ocorreu no caso em tela, pela ação do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, em evidente desvio de conduta funcional. 

  Igualmente grave é a primazia dada pelo representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM a um determinado grupo de comunicação, o que somente potencializa o dano causado pela sua conduta, evidenciando a sua falta de isenção necessária para o desempenho das funções ministeriais, tendo o mesmo dever de declarar-se suspeito para atuar no procedimento em tela.

  A conduta do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM não deixa dúvidas de que foram – e certamente continuam sendo


cometidas as infrações disciplinares acima referidas, e que o mesmo deve ser apenado na forma da lei. 

  O vazamento seletivo de informações em detrimento de apenas um dois investigados no âmbito da ALERJ não encontra, de parte do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, qualquer ação de contenção, contrariando frontalmente o disposto pela Lei n.º 8.625/1993 – Lei Orgânica do Ministério Público, que prevê:   
“Art. 43. São deveres dos membros do Ministério
Público, além de outros previstos em lei: (...) VIII -
adotar, nos limites de suas atribuições, as
providências cabíveis em face da irregularidade de
que tenha conhecimento ou que ocorra nos serviços a seu cargo.” 
    Torna-se assim evidente que o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM tem desrespeitado regras e aos deveres funcionais a que está submetido, demonstrando descaso com a condução do feito em tela, dando prioridade ao andamento deste, a qualquer custo, e abrindo as portas para a utilização da mídia como instrumento de coerção.    IV - DA NECESSIDADE DE TUTELA LIMINAR:       Os fatos narrados não deixam dúvidas a respeito das ilegalidades e da infração aos deveres funcionais praticados pelo representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM; e que sua ação violou e continua violando a privacidade, presunção de inocência e dignidade da pessoa humana, particularmente do Senador eleito Flávio Bolsonaro, havendo fortes indícios de que seus procedimentos possas implicar em novas ilegalidades e violações, situações aptas a evidenciar o periculum in mora, tornando necessária e impostergável a adoção de providência cautelar em caráter liminar por parte deste CNMP, qual seja o
afastamento do representado de todo e qualquer ato envolvendo a investigação em curso.     O Regimento Interno do CNMP contempla no art. 43, VIII, a possibilidade do Relator conceder medida liminar pleiteada:   
“Art. 43. Compete ao Relator: (...) VIII – conceder
medida liminar ou cautelar, presentes relevantes
fundamentos jurídicos e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação”.
     Assim, em sede de medida cautelar, liminarmente, propõese a suspensão, pelo da prática de qualquer ato do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM no âmbito da investigação em curso e que tenha como alvo, em qualquer condição, o Senador eleito Flávio Bolsonaro.

V – DOS REQUERIMENTOS:       Diante de todo o exposto, é possível concluir que o representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM transgrediu os deveres funcionais e as regras previstos na Lei Federal n.º 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), pelo que se requer: 

  a) nos termos do artigo 130 – A, § 2º, inciso III e §3º, inciso I da Constituição Federal, seja recebida e autuada a presente REPRESENTAÇÃO COM REQUERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA, com a distribuição a um dos insignes Conselheiros deste CNMP;      b) seja concedida medida liminar, suspendendo-se a prática de qualquer ato pelo representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, no âmbito da investigação referente a irregularidades eventualmente praticadas no âmbito da ALERJ


  c) que, após prestadas as informações pelo representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, seja a presente processada, nos termos do artigo 138 e seguintes do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público, para sua instauração, ou subsidiariamente, caso não seja este o entendimento, para que seja instaurado o feito sob a classificação processual cabível, nos termos do art. 138 do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público;      d) após regular processamento, seja confirmada a liminar acima requerida, sem prejuízo da aplicação, em desfavor do representado JOSÉ EDUARDO CIOTOLA GUSSEM, uma das penas disciplinares previstas no artigo 130-A, § 2º, inciso III, da Constituição Federal e na Lei Complementar 75/93.      Finalmente, requer sejam as publicações e intimações atinentes a essa Representação realizadas exclusivamente em nome do subscritor da presente, sob pena de nulidade. 

  Protesta pela apresentação de provas acaso necessárias.

   Termos em que requer e aguarda deferimento.

     
Brasília/DF, 25 de janeiro de 2019.


ADÃO JOSÉ CORREA PAIANI OAB/RS 62.656