Nota de Padilha

O ministro Eliseu Padilha divulgou nas redes sociais, uma nota em que se defende do bloqueio de bens determinado pela Justiça do Mato Grosso. Leia:
"Surpreenderam-me dois fatos que aconteceram hoje.
Primeiro, a existência de duas ações civis públicas, no estado do Mato Grosso, em Vila Bela da Santíssima Trindade, tratando de desmatamentos, e correlacionando meu nome.
Segundo, tomar conhecimento destas, saber que buscavam um bloqueio de mais de R$ 100 milhões em contas correntes minha e de outras pessoas.
O Senhor Juiz, surpreendentemente, deferiu, liminarmente, sem me ouvir, o bloqueio de meus bens, que estão declarados em meu imposto de renda. Tudo que eu tenho está disponível ao conhecimento de qualquer cidadão.
Diferentemente do que está sendo noticiado, não foi bloqueada dita importância em minha conta corrente bancária, até porque o saldo dela era de R$ 2.067,12, que foi bloqueado.
O Senhor Juiz deferiu uma medida extrema, no primeiro ato processual sem ouvir as partes. Tal despacho não é uma sentença é uma liminar no início do processo, no qual creio que no final a decisão será pela improcedência de ambas as ações.
Vamos contestar as ações, produzir as nossas provas e cremos que ambas serão julgadas improcedentes, pois confiamos na capacidade do Poder Judiciário em fazer a verdadeira justiça.

Não cometi nenhum crime ambiental. Não extrai uma só árvore na propriedade em questão. Isto tudo restará provado quando da decisão final. "

J.R. Guzzo - Falta combinar

Os meios de comunicação, no Brasil e numa porção de países do Primeiro Mundo, muito civilizados, prósperos e democráticos, estão com uma doença que pelo jeito não tem cura. Publicam notícias, comentários e “conteúdo” segundo uma tábua de mandamentos que não deixa nenhuma dúvida sobre o que está certo e o que está errado, o que é bom e o que é ruim, o que é permitido e o que deveria ser proibido – só que não combinam com o público se ele próprio, o público, está de acordo com isso tudo. Os comunicadores estão cada vez mais convencidos de que a sua maneira de ver o mundo é a melhor, não apenas para o mundo, mas para leitores, espectadores e ouvintes; não parecem ter nenhuma dúvida a respeito.
O resultado é que estão sendo cada vez menos representativos do público que imaginam representar. Dão informações que esse público não está interessado em receber e opiniões que não está disposto a compartilhar. Ensinam coisas que ele não quer aprender. Falam de valores que não são os seus – ou não necessariamente os seus. Torcem por causas que não são obrigatoriamente as suas. Elogiam uma série de comportamentos, condenam outros tantos, e em ambos os casos deixam uma advertência clara: é assim que nós, órgãos de comunicação, esperamos que vocês, público, se comportem. Só existem duas maneiras de avaliar as coisas neste mundo. Uma é a maneira errada. A outra é a nossa. Qual é a surpresa, então, em que a mídia esteja com tantos problemas?
Não é preciso, para ver o tamanho do problema, recorrer a casos extremos como a eleição de Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos. Depois de atacar a sua candidatura como o pior momento da humanidade desde a vinda da peste negra, a imprensa americana e a internacional têm certeza, agora, de que sua vitória nos levará de volta à Idade da Pedra. Deveria estar mais do que óbvio, se fosse assim mesmo, que só um débil mental votaria nesse homem. Mas é claro que não foi isso que aconteceu, como é claro que ninguém está em pânico só porque a imprensa diz que todo mundo deveria estar em pânico.
No Brasil de hoje, então, o descolamento entre meios de comunicação e público parece caminhar para o modo mais extremo. O que dizer quando nas últimas eleições para prefeito os vencedores nas duas maiores cidades do Brasil foram justo os dois candidatos mais detestados pela mídia? Estão operando lado a lado, aí, duas linguagens opostas – a dos jornalistas e a de dezenas de milhões de cidadãos comuns.
Os exemplos se aplicam a um mundo de coisas. Os comunicadores, em sua maioria, são a favor da ocupação de escolas por grupos de organizações de estudantes, ou a veem com compreensão quase ilimitada; fazem um voto de confiança sem restrições no idealismo dos jovens e sua vontade de reformar o nosso ensino. São a favor da ocupação dos espaços públicos por marginais de todo tipo – acham que seu direito é maior que o direito do restante da população de utilizar em paz o mesmo espaço. São a favor de praticamente todo tipo de invasão (que chamam de “ocupação”), de lugar público ou privado; são contra a liberação desses locais pela polícia, mesmo com ordem judicial, e sua devolução aos legítimos donos; estão convencidos de que a polícia, sem exceção, age “com brutalidade”.
Há um critério rigoroso na escolha das palavras. A imprensa fala sempre em “manifestantes”, “militantes”, “estudantes”, “desabrigados” e até em “camponeses” – nunca, em nenhum caso, são “invasores”. Não fala mais “favela”, palavra hoje condenada como preconceituosa, elitizante e fascista; tem de ser “comunidade”. A imprensa brasileira continua falando do golpe militar de 1964 como se fosse algo que aconteceu ontem, e alerta para os “perigos” de se voltar, a qualquer momento, à mesma situação; esquece que só tinham chegado à maioridade, em 1964, pessoas que têm hoje pelo menos 70 anos de idade.
Nossa mídia dá a entender, cada vez mais, que ter um automóvel é uma falha moral – e que o importante, hoje, não é a propriedade, e sim o uso do veículo. Jamais lhe ocorre que para milhões de brasileiros o carro é um instrumento de liberdade, e sua propriedade um sonho individual importante. Ao contrário da imprensa, a população não acha que o problema do Brasil é ter gente de mais na cadeia; acha que é ter gente de menos. Não acha que o principal problema da segurança pública seja a polícia – acha que são os bandidos. Não acha que a fé evangélica seja uma ameaça.
Dá para escrever um “Manual de Redação” inteirinho com essas regras. Só que não são as regras do público.

Dora Kramer: O abuso das autoridades

Dora Kramer: O abuso das autoridades
Abuso de autoridade pronto e acabado ocorreu no Congresso. Ou não é um abuso inverter o espírito das propostas de combate à corrupção?
Por: Augusto Nunes  04/12/2016 às 19:01
Publicado no Estadão
Diante da inversão de valores perpetrada pela Câmara na retaliação da proposta das medidas de combate à corrupção e da tentativa do réu que preside o Senado de votá-la de afogadilho na Casa revisora, é de se perguntar qual é a parte do repúdio social a manobras espúrias que Suas Excelências ainda não entenderam.
Hoje estão marcados protestos cuja motivação mais forte reside nas recentes atitudes do Congresso. A pauta é dispersa, embora o recado da sociedade seja claro: “Não me enganem, porque definitiva e claramente eu não gosto”. Retrato disso foi o contraste entre a animosidade latente contra o juiz Sérgio Moro na Mesa Diretora e a calorosa recepção dada a ele por parte de funcionários do Senado quando do debate, no plenário, sobre a Lei de Abuso de Autoridade.
Na rua, ocorre do mesmo modo. Só que lá o juiz (para além da figura de Moro) é tratado também com apreço e os políticos com menosprezo. O paradoxo é estes dependem de votos para seguir na carreira, mas são aqueles (magistrados, promotores, procuradores e policiais) os que falam o idioma da legalidade, valor finalmente em alta na sociedade brasileira.
Em baixa na opinião do público o Congresso está faz tempo. O dado novo é a manifestação coletiva da condenação aos atos cometidos no ambiente legislativo, justamente o que abriga representantes da população, cujo dever de ofício deveria ser o de zelar pelos interesses dos brasileiros, senhores de seus mandatos.
A Câmara e o Senado vêm de um processo legal e legítimo de impeachment presidencial, mas em nenhuma das duas Casas prepondera a compreensão de que a convergência com a posição da maioria expressa nos protestos contra os governos do PT e confirmada pelas pesquisas de opinião não dá ao Parlamento um salvo-conduto para atuar ao seu bel-prazer sem ser importunado.
Ao contrário: o conjunto de razões pelas quais deputados e senadores afastaram do poder o grupo liderado de direito por Dilma Rousseff e de fato por Luiz Inácio da Silva, os obriga a seguir o padrão de exigência aplicado para sustentar o afastamento. O grupo que assumiu o governo, aí incluídos os congressistas aliados, não pode dar-se ao desfrute de adotar o lema “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. O mesmo aplica-se ao PT que agora de volta à oposição atua como se nada tivesse a ver com o poço fundo em que jogou o País.
Suas Excelências abusaram e se lambuzaram. Aqueles recentemente apeados do poder, no assalto ao Estado. Seus substitutos, na agressão à paciência e à capacidade de discernimento dos cidadãos. À exceção de um e outro exagero – imediatamente apontados ou corrigidos – os responsáveis pelas investigações e condenações em curso até agora se mantiveram nos padrões da lei, conforme atesta o aval dos tribunais superiores à quase totalidade das ações.
Abuso de autoridade pronto e acabado ocorreu no Congresso e, em vários momentos, no Executivo. Ou não é um abuso inverter o espírito das propostas de combate à corrupção para aprovar medidas em defesa de corruptos e de ataque aos encarregados de investigá-los? Ou não se configura um abuso da investidura do cargo o réu que preside o Senado comandar manobra para aprovar a lambança tal como saiu da Câmara de maneira açodada a fim de dar o fato como consumado?
Congressistas falaram de corda em casa de enforcado, acabaram por enrolar os respectivos pescoços ao atiçar a população e alimentar a motivação aos protestos marcados para hoje e tornarem-se alvo principal das manifestações. A depender da amplitude e densidade da grita geral, nossas autoridades legislativas terão dado tiros que saíram pela culatra para se alojar no coração do Parlamento