Artigo, Rodrigo Constantino, Zero Hora - Greenpiche


Chesterton dizia que não há problema em não acreditar em Deus; o problema é que quem deixa de acreditar em Deus começa a acreditar em qualquer outra bobagem. Sempre penso nisso quando vejo essas "religiões seculares" que tomaram conta do mundo pós-moderno. O socialismo como ideologia; o ambientalismo como seita fanática; a turma dos direitos dos animais dando mais importância para um ovo de tartaruga do que para um feto humano; etc.

Quando o sujeito adere a uma dessas "religiões" de forma cega, isso lhe fornece uma sensação de superioridade moral. Basta ele usar sacola não-reciclável para ir ao mercado, ser vegano ou condenar o canudinho plástico que já se sente a alma mais pura e bondosa que já pisou na Terra. E passa a olhar para os demais com certo desprezo, como um ungido iluminado olharia para um bárbaro.

Nesse monopólio das virtudes, sem precisar gastar muita caloria, os meios passam a não importar tanto. Se é a sobrevivência da democracia em jogo, então parece um pequeno preço combater com violência esses "fascistas", certo? E eis que os membros da Antifa, com esse nobre propósito, são os primeiros a adotar métodos fascistas e, mascarados, agridem ou intimidam senhorinhas conservadoras nas ruas.

Se a meta é nada menos do que salvar o planeta, vale a mesma lógica. O que são alguns projetos stalinistas de controle total da economia e de nossas vidas em troca da continuidade de Gaia? E que tal jogar óleo em frente ao Palácio do Planalto para "protestar" contra o governo de direita? Os fins justificam quaisquer meios. Só que o alvo é sempre seletivo: quase nunca é de esquerda!

Ou alguém acha mesmo que a cena patética promovida pelo Greenpeace teria ocorrido se o presidente fosse Lula? A politização dessas crenças é evidente. E se não quer acreditar em mim, ao menos acredite em Patrick Moore, um dos fundadores do Greenpeace: "o movimento ecologista tornou-se a mais intensa corrente a impedir o desenvolvimento nos países subdesenvolvidos".

O que une essas seitas todas é o ódio comum que sentem pelo capitalismo liberal e o progresso. Além de um toque de misantropia com niilismo, claro.

Artigo, Alon Feuerwerker, FSB - Por que de repente a coisa desanda, como agora no Chile


A explicação difundida sobre as ditas jornadas de junho de 2013 no Brasil era a profunda insatisfação com os serviços públicos. Havia inclusive uma tese de a vida ter melhorado dentro de casa mas continuado ruim fora. Obviamente uma explicação errada. Ou pelo menos gravemente parcial. Pois os serviços públicos continuam do jeitinho que eram e nunca mais se viu nada remotamente parecido com 2013. Teve as mobilizações pelo impeachment, mas já era outra coisa.

Há um esforço intelectual disseminado para encontrar um fio condutor que ligue as rebeliões populares ao redor do planeta, e naturalmente cada um puxa a brasa para sua sardinha particular. Uns culpam o que chamam de neoliberalismo ali, outros a falta de liberdade acolá, outros o déficit de soberania nacional mais adiante. É provável que todas essas explicações estejam algo certas. E também por isso elas têm pouca utilidade para localizar o tal fio condutor.

A erupção de rebeliões populares, como agora no Chile, exige duas premissas: as pessoas comuns não estarem mais dispostas a aceitar as condições materiais e espirituais em que vivem e o sistema não mais deter força suficiente para obrigar as pessoas a continuar aceitando tais condições. E o segundo fator está associado diretamente à queda nas taxas de coesão entre os grupos que detêm o monopólio weberiano da "violência legítima”.

A ubiquidade da transmissão de informações e da conectividade, algo traduzido na expressão genérica “redes sociais”, afetou diretamente a possibilidade de aplicar essa violência. Ela persiste firme em situações, como na Síria, onde o poder consegue bloquear a informação. No Chile não dá. Sebastián Piñera chamar as Forças Armadas teve pouco efeito prático porque a tropa não pode atirar nos manifestantes para matar. O remédio pinochetista está vencido.

Qual seria então o tal fio condutor? Uma boa hipótese é o sentimento de a injustiça ter ultrapassado o limite do aceitável. Verdade que a régua para medir esse “aceitável" é bastante subjetiva, mas paciência. A subjetividade explica por que a rebelião popular pode perfeitamente acontecer, e acontece, mesmo quando as condições materiais objetivas não estão piorando, ou até quando estão melhorando. Um paradoxo que neutraliza as explicações mecanicistas e economicistas.

Esse viés subjetivo explica também a certa imprevisibilidade de acontecimentos como do Chile. Não existe um método quantitativo 100% confiável para medir quando os de baixo não mais estarão dispostos a viver como antes e os de cima não mais poderão obrigá-los a isso. Daí que duas atitudes sejam essenciais no exercício do poder: 1) ficar esperto e 2) não dar sopa pro azar. O primeiro depende de empatia. Já para o segundo contribui bastante a paranoia.

Um dia alguém disse que apenas os paranóicos sobreviverão. Mesmo se for verdade, não é suficiente constatar. É preciso dar consequência à paranoia. Por isso governos investem tanto em sistemas de informação, espionagem e repressão, mas também difundem platitudes do tipo “governarei para todos”, “precisamos unir o país”, “basta de polarização”. São platitudes, mas ajudam a atenuar o sentimento de estar excluído do jogo, e portanto de ser alvo de injustiça.

Outro detalhe: os mesmos atores colocarem o gênio de volta na garrafa pode exigir um nível da tal “violência legítima” acima do disponível em determinada correlação de forças. Também por isso governos caem. Aliás, as chamadas transições pacíficas costumam resultar não tanto de um caráter pacífico inerente aos atores, mas de correlações de força esmagadoras e que levam à situação ideal de vencer sem precisar guerrear. Só que nem sempre é possível.

Para o poder, bom mesmo é não deixar o gênio escapar.