Inimigo do povo

Inimigo do povo

O afastamento do jornalista William Waack, acusado de ‘racismo’ pela Rede Globo, é um clássico em matéria de hipocrisia e oportunismo

J. R. Guzzo, Veja, 9 nov 2017

A maior parte dos meios de comunicação do Brasil, com a Rede Globo disparada na frente, está se transformando num serviço de polícia do pensamento livre. É repressão pura e simples. Ou você pensa, fala e age de acordo com a atual planilha de ideias em vigor na mídia ou, se não for assim, você está fora. Os chefes da repressão não podem mandar as pessoas para a cadeia, como o DOPS fazia antigamente com os subversivos, mas podem lhes tirar o emprego. É isso, precisamente, que o comando da Globo acaba de fazer com o jornalista William Waack, estrela dos noticiários da noite, afastado das suas funções por suspeita de racismo. Por suspeita , apenas – já que a própria emissora não garante que ele tenha mesmo feito as ofensas racistas de que é acusado, numa conversa particular ocorrida um ano atrás nos Estados Unidos. Mas, da mesma forma como se agia no Comitê de Salvação Pública da velha França, que mandava o sujeito para a guilhotina quando achava que ele era um inimigo do povo, uma acusação anônima vale tanto quanto a melhor das provas.

William não foi demitido do seu cargo por ser racista, pois ele não é racista. Em seus 21 anos de trabalho na Globo nunca disse uma palavra que pudesse ser ofensiva a qualquer raça. Também nunca escreveu nada parecido em nenhum dos veículos de imprensa em que trabalha há mais de 40 anos. Nunca fez um comentário racista em suas numerosas palestras. O público, em suma, jamais foi influenciado por absolutamente nada do que ele disse ou escreveu durante toda a sua carreira profissional. O que William pensa ou não pensa, na sua vida pessoal, não é da conta dos seus empregadores, ou dos colegas, ou dos artistas que assinam manifestos. O princípio é esse. Não há outro. Ponto final.

William Waack foi demitido por duas razões. A primeira é por ser competente – entre ele, de um lado, e seus chefes e colegas, de outro, há simplesmente um abismo. Isso, no bioma que prevalece hoje na Globo e na mídia em geral, é infração gravíssima. A segunda razão é que William nunca ficou de quatro diante da esquerda brasileira em geral e do PT em particular – é um cidadão que exerce o direito de pensar por conta própria e não obedece à atitude de manada que está na alma do pensamento “politicamente correto”, se é que se pode chamar a isso de “pensamento”. Somadas, essas duas razões formam um oceano de raiva, ressentimento e neurastenia.


A punição a William Waack tem tudo para se tornar um clássico em matéria de hipocrisia, oportunismo e conduta histérica. A Rede Globo,como se sabe, renunciou à sua história tempos atrás, apresentando – sem que ninguém lhe tivesse solicitado nada – um pedido público de desculpas por ter apoiado “a ditadura militar”. Esse manifesto, naturalmente, foi feito com o máximo de segurança. Só saiu vários anos depois da “ditadura militar” ter acabado e, sobretudo, depois da morte do seu fundador, que não estava mais presente para dizer se concordava ou não em pedir desculpas pelo que fez. A emissora, agora, acredita estar na vanguarda das lutas populares – não falta gente para garantir isso aos seus donos, dia e noite. William Waack, com certeza, só estava atrapalhando.

ugusto Nunes - O chefão quer unir os larápios do PT e os gatunos do PMDB

O chefão quer unir os larápios do PT e os gatunos do PMDB

Lula perdoa os 'golpistas' para pacificar os dois bandos que agiram juntos no maior esquema corrupto da história

“Estou perdoando os golpistas que fizeram essa desgraça com o país”, disse Lula a seus discípulos no sermão da missa negra celebrada em Belo Horizonte. Em seguida, o torturador da verdade jurou que se inspira em Juscelino Kubitschek, que anistiou militares envolvidos em duas rebeliões contra o governo constitucional.

O exemplo histórico escancara o mentiroso compulsivo e o ignorante sem remédio que convivem na cabeça do palanque ambulante. JK perdoou os amotinados para conter a inquietação dos quartéis e consolidar a democracia. Lula se fantasia de generoso para reunificar a grande quadrilha que concebeu e chefiou.

Até a chegada da Lava Jato, os larápios do PT e os gatunos do PMDB roubaram juntos. Em perfeita harmonia, esvaziaram cofres ministeriais, embolsaram verbas federais bilionárias e, com o PP como coadjuvante, transformaram a Petrobras no alvo do maior esquema corrupto da história.

Os delinquentes separados pelo impeachment de Dilma Rousseff têm tudo para refazer o casamento dos fora-da-lei. Geddel Vieira Lima, por exemplo, foi ministro de Lula, diretor da Caixa Econômica de Dilma e ministro de Temer. Elizeu Padilha e Moreira Franco atuaram no governo do poste fabricado por Lula com a mesma desenvoltura que exibem no governo do vice que o chefão escolheu.


Todos estão ligados por anotações comuns nos prontuários. E todos sabem que nasceram uns para os outros.

Riscos na manobra para alterar a Lei da Ficha Limpa, editorial de O Globo

A questão central está na mensagem que a Câmara transmite à sociedade com mais essa tentativa de “estancar a sangria”, como se diz no Congresso

É preciso reconhecer a persistência de um grupo de parlamentares federais empenhados em “estancar a sangria”, via aprovação de alguma forma de anistia a eles mesmos e aos aliados — investigados, réus ou sentenciados por crimes contra a administração pública.

Já nem é possível contabilizar, de forma precisa, as sucessivas manobras para induzir o Congresso a sancionar um perdão geral aos envolvidos nas maracutaias reveladas pela Operação Lava-Jato.

Agora, pretende-se reverter um entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) em benefício de, ao menos, duas centenas de políticos passíveis de enquadramento na Lei da Ficha Limpa.

Com um projeto de lei complementar apresentado pelo deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), deputados de 19 partidos resolveram “disciplinar” o alcance da lei que torna inelegível condenados por abuso de poder econômico ou político.

A Lei da Ficha Limpa foi sancionada em junho de 2010 e começou a valer nas eleições seguintes, de 2012. No mês passado, o Supremo decidiu que os políticos condenados antes de a lei entrar em vigor também podem ser atingidos por essa inelegibilidade de oito anos. Antes, o político condenado ficava inelegível por três anos. A decisão foi tomada por maioria apertada no STF, de 6 a 5.

É natural o debate sobre decisões judiciais e, no caso, esgrime-se com o razoável argumento de que, filosoficamente, uma lei não pode ter efeitos retroativos, exceto para benefícios.

“A lei brasileira, do ponto de vista de muitos, nunca retroagiu para prejudicar”, argumentou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, “não se está alterando [a Lei da Ficha Limpa], está se tratando do caso específico para a lei não retroagir” insistiu.

O problema, porém, não está nas eventuais zonas cinzentas da legislação criada para barrar políticos infratores na disputa eleitoral, até porque o Supremo já decidiu sobre o aspecto específico em discussão.

Alterar a Lei da Ficha Limpa é apenas mais uma iniciativa na coletânea dos últimos 12 meses com o mesmo objetivo — retirar alguns do alcance da lei em vigor.

Nesse curto período, em diversas ocasiões e até de forma velada e anônima, muitos parlamentares insistiram na aprovação de anistia, sob os mais diversos formatos.

A questão central está na mensagem que a Câmara transmite à sociedade com mais essa tentativa de “estancar a sangria”, como se diz no Congresso.


Arrisca-se a criar o precedente de que leis são passíveis de mudança sempre que o Supremo apresentar, em apertada maioria, uma interpretação contrária aos interesses e privilégios de qualquer fração da elite política.