O sistema feudal e o STF/TSE

 O sistema feudal e o STF/TSE

Marcus Vinicius Gravina

Cidadão brasileiro – OAB-RS 4.949


Vejam o que não mudou do século V - idade média - ao XXI.  Segundo alguns historiadores o feudalismo foi um sistema econômico, político e social provindo do meio rural, da propriedade de terras. A nobreza era a classe dirigente.

Hoje foi substituída, como num corpo só, pela classe política, altos e dourados integrantes do funcionalismo público, dirigentes de empresas estatais e os protegidos pela ala dominante do Poder Judiciário.  Esta é a nobreza do nosso tempo. 

Os demais cidadãos, nós do povo, com a fantasia de acreditar que somos a fonte única do poder, voltamos à época em que éramos vassalos, chacareiros de vastas propriedades de terras e pagadores de impostos, que assistiam as carruagens passarem e supostamente protegidos pela nobreza, dona de tudo, ora instalada na Praça dos três Poderes em Brasília. 

Ao invés de terras - porque o MST está se ocupando disso na marra - o presidente da República está doando aos seus súditos partidários, ou distribuindo via Senado, mandatos intocáveis a ministros dos tribunais superiores, com carinhosos tapinhas em seus rostos, em troca de fidelidade absoluta às suas convicções políticas e administrativas, num aparente pacto cooperativo. 

Como nenhum castelo se mantem inexpugnável sem uma força militar, o presidente optou pelos homens togados de preto, uma vez que os fardados, verde oliva deixaram de ser confiáveis perante à Nação. 

Devem existir inúmeros projetos de lei no Congresso propondo outra forma de indicação de ministros ao STF, com alguma participação da sociedade.  O Congresso através dos Senadores poderia concentrar, diretamente  esta tarefa se não tivesse tantos parlamentares aguardando por julgamentos dos seus atos de corrupção, de dentro e fora da Lava Jato.  É preciso movê-los rumo à votação no plenário do Congresso Nacional.

Reparem os dejetos repugnantes da repercussão vingativa de quem festejou a cassação do mandato do deputado Deltan Dallagnol.  Havia motivo até para algum ministro se dar por impedido de votar, por falta de isenção, em razão de manifestações públicas de ataques à Lava Jato e a seus procuradores e juízes.

O deputado cassado terá direito a recurso ao STF, cujos membros são os mesmos que, simultaneamente, ocupam  duas cadeiras de julgador daquele processo.  Ministros do STF estão no STE como tutores dos demais integrantes, daquele anexo da Suprema Corte, para não o qualificar aquele Órgão, como quarto de despejo ou de depósito de urnas eleitorais eletrônicas suspeitas.   

Quando o seu recurso chegar ao STF, encontrará para julgá-lo quem já destilou sua bílis contra um dos principais protagonista da Lava Jato. Isto, depois da animosidade indisfarçável e  declarada ao procurador, hoje deputado cassado, que representou o Ministério Público na Lava-Jato. Não se deu por impedido e não se ouviu nenhum balido dos demais participantes da votação a este respeito.     

O que se esperar de quem irá julgar, novamente, agora de sua casa, transformada em um bunker, atrás de um biombo protetor do sistema virtual de voto, mais do que um réu, um desafeto da odiosa Lava Jato. Isto vale para outros dois ministros que promoveram a imediata interrupção das investigações que começavam a tocar os seus pés com o lodo provindo de um de tantos córregos vertentes de atos repreensivos ou igualmente condenáveis.  

A interferência agressiva ou inconstitucional de atos do judiciário sobre os poderes Executivo e Legislativo, de domínio público, apontados por juristas inconformados, estão desviando alguns ministros do STF das suas funções precípuas de julgar os processos. Muitos deles  se encontram retidos há muito tempo. Logo haverá um atacadão de prescrições de ações ou processos, com direito à restituição de valores vultosos,  resultado de  julgamentos condenatórios das instâncias inferiores.  

Quanto ao TSE, será que é indispensável a sua dispendiosa existência, diante da discórdia nacional resultante da condução conflituosa das últimas eleições?  Afinal, num regime democrático nenhum eleitor tem o direito de desconfiar do que teria o TSE feito com o seu voto, ou com as somas de votos de todas as urnas eletrônicas?  Quem fiscaliza o TSE? 

Os cidadãos, autorizados pelos direitos constitucionais, falaram e foram presos. Tiveram suas contas bancárias bloqueadas e as suas redes sociais suspensas.  Além disso, todos nós estamos sendo coagidos a entregar nossas armas caseiras a um poder tirano, por medo da reação contrária as injustiças praticadas.   Para que serve o Congresso Nacional? 

O Exército Brasileiro quis saber, iniciou a investigação, que logo foi interrompida pela negativa do fornecimento dos códigos fontes das urnas suspeitas, por este mesmo Tribunal Superior Eleitoral. 

A tribuna do povo está na rua.  Precisamos voltar às ruas do Brasil, de forma ordeira, para dizer que não somos vassalos.  

Caxias do Sul, 20.05.2023   


Comentário de You Tube

O TSE pode até não sair derrotado neste episódio da 




Além da violação do devido processo legal, a decisão do TSE sobre Deltan Dallagnol significou uma evidente usurpação de prerrogativas do Congresso Nacional. Se a Câmara não trancar o passo do TSE, estará ela mesma violando a Constituição e se abastardando, abrindo caminho para a ampliação do atual estado de exceção em curso.

São duplas razões para que a Câmara dos Deputados repila a cassação do deputado do Paraná, pelo menos do ponto de vista jurídico, sem considerar o rancor político da decisão ilegal, conforme alertou antes mesmo do julgamento a própria Procuradoria Geral Eleitoral (CLIQUE AQUI para ler a íntegra do arrazoado):

1) O devido processo legal foi violado porque o TSE ou qualquer instância do Judiciário, não pode ir além do que diz a letra fria da lei e conforme os princípios gerais do Direito, o sentido das decisões podem até ser flexibilizados, mas de modo restritivo.

2) Ao ampliar o estipulado de modo incontroverso o que diz a lei, o TSE usurpou prerrogativas do Congresso, porque a Constituição Federal deixa claro que só ele pode legislar.

Opinião do editor - O TSE violou a lei e usurpou prerrogativas do Congresso

 Além da violação do devido processo legal, a decisão do TSE sobre Deltan Dallagnol significou uma evidente usurpação de prerrogativas do Congresso Nacional. Se a Câmara não trancar o passo do TSE, estará ela mesma violando a Constituição e se abastardando, abrindo caminho para a ampliação do atual estado de exceção em curso.

São duplas razões para que a Câmara dos Deputados repila a cassação do deputado do Paraná, pelo menos do ponto de vista jurídico, sem considerar o rancor político da decisão ilegal, conforme alertou antes mesmo do julgamento a própria Procuradoria Geral Eleitoral (CLIQUE AQUI para ler a íntegra do arrazoado):

1) O devido processo legal foi violado porque o TSE ou qualquer instância do Judiciário, não pode ir além do que diz a letra fria da lei e conforme os princípios gerais do Direito, o sentido das decisões podem até ser flexibilizados, mas de modo restritivo.

E foi o que fez o TSE pelas mãos do ministro Benedito Gonçalves, aquele do "Missão dada, missão cumpridas", cochichado no ouvido de A. de Moraes quando da diplomação de Lula da Silva. Ele simplesmente buscou um procedimento que no CNMP é chamado Procedimento Administrativo Disciplinar, que quando em curso realmente é causa de inelebilidade para alguém do MP candidato, mas em vez de usar isto restritivamente, resolveu legislar, ampliando a causa impeditiva para algo como "mera intenção de instaurar um PAD", supondo, além disto, que ele seria desfavorável a Dallagnol.

2) Ao ampliar o estipulado de modo incontroverso o que diz a lei, o TSE usurpou prerrogativas do Congresso, porque a Constituição Federal deixa claro que só ele pode legislar.

E é pelas razões que acabei de expor.

Desta vez, no entanto, o tom da reação de políticos, parlamentares, juristas, advogados e jornalistas foi muito mais duro ao reagir a mais este laivo autoritário das Cortes Superiores. Eu quero particularmente saudar a reação da OAB do RS, que embora não se refira a este caso de Dellanhol, ao falar sobre os destemperos de A. de Moraes em relação ao controle e a censura dos conteúdos das redes sociais, faz ilegal ativismo judicial.

Em artigo no jornal Zero Hora de hoje, ensina Lamachia:

- As decisões (ele critica a posição ilegal de Alexandre de Moraes no caso do PL 2630) colocam o STF como árbitro do debate público no Brasil, o que não é correto em um estado de direito por não ser previsto constitucionalmente.

Não pensem que não há esperança.

Não desanimem.

Ainda existem homens de bem deste lado do Equador.

Procuiradoria-Geral Eleitoral avisou ao TSE que cassação de Dallagnol seria totalmente ilegal

 MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

PROCURADORIA-GERAL ELEITORAL


Nº ……../2022 - PGGB/PGE


RO-El Nº 0601407-70.2022.6.16.0000 – Curitiba/PR

Relator(a) : Ministro Benedito Gonçalves

Recorrente(s) : Federação Brasil da Esperança e PMN

Advogado(a/s) : Fernando José dos Santos e outros

Recorridos : Deltan Martinazzo Dallagnol e PODEMOS

Advogados : Matheus Almeida Rios Carmo e outros



Eleições 2022. Deputado Federal. Recurso ordinário. Inelegibilidade.

A decisão judicial que suspende os efeitos de rejeição das contas afasta a incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90.

Para que o impedimento do art. 1º, I, q, da LC n. 64/90 opere, a exoneração do membro do Ministério Público deve ocorrer na pendência de processo administrativo disciplinar, hipótese distinta da pendência de expedientes outros de investigação, de natureza diversa, como a reclamação disciplinar, a sindicância e o pedido de providências. Leitura restritiva de hipóteses de inelegibilidade. Precedentes.

Parecer pelo desprovimento dos recursos ordinários.

O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná julgou improcedentes as impugnações ao registro de candidatura de Deltan Martinazzo Dallagnol a Deputado Federal pelo PODEMOS, nas eleições de 2022, ante a não incidência das causas de inelegibilidade previstas no art. 1º, I, g e q, da LC n. 64/90. Assentou que a Justiça Federal suspendeu a decisão de rejeição das contas apontada e que o candidato não respondia a processo administrativo disciplinar por ocasião do seu pedido de exoneração do cargo de Procurador da República.

A Federação Brasil da Esperança interpõe recurso ordinário, alegando que o candidato se encontrava sujeito, por ocasião de seu pedido de exoneração, a dois processos administrativos disciplinares (n. 1.00898/2018-99 – Pet. 8614/STF e 1.00982/2019-48 – Pet. 9068/STF) e era objeto de “numerosas investigações disciplinares”, como reclamações disciplinares, pedido de providências e sindicância.  Sustenta que a alínea q deve ser interpretada tal como a alínea k, com o que seria suficiente para a incidência da inelegibilidade a exoneração na pendência de qualquer procedimento, “mesmo que ocorra antes da instauração efetiva de procedimento administrativo disciplinar”. Afirma, citando dispositivos do regimento interno do CNMP, que pedido de providências, reclamação disciplinar e sindicância são procedimentos equiparados ao PAD. Argumenta que os PADs n. 1.00898/2018-99 e n. 1.00982/2019-48, embora “tenha havido encerramento no âmbito administrativo, (…) ainda estão pendentes”, uma vez que o candidato propôs ações no STF pondo em discussão o mérito das infrações imputadas. Insiste em que é possível aplicar a cláusula de inelegibilidade da alínea q em casos de feitos disciplinares distintos do PAD que ostentem gravidade e verificado que a exoneração atende a  propósito de burla às consequências jurídicas das investigações administrativas. Discorre sobre as condutas em cada uma das investigações, classificando-as como “gravíssimos feitos disciplinares”. Quanto à inelegibilidade da alínea g, noticia que a decisão judicial que suspendeu a rejeição de contas foi objeto de “agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo pela União Federal, em 24 de outubro de 2022, o qual aguarda do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (autos n. 50448962520224040000)”. Acrescenta que as irregularidades referidas pelo TCU são insanáveis e configuram atos dolosos de improbidade.

O PMN também interpõe recurso ordinário, dizendo que há no CNMP “52 (cinquenta e dois) feitos administrativos, todos eles destinados à apuração de faltas disciplinares” praticadas pelo recorrido. Alega que a exoneração se deu muito antes do momento exigido pela legislação eleitoral, o que demonstraria o intento de não possuir contra si processos em trâmite avançado de apuração de infrações administrativas e de fugir, assim, à pena de demissão. Argumenta que a estratégia foi suficiente para levar diversas reclamações disciplinares ao arquivamento por perda de objeto. Sustenta que a existência de reclamações disciplinares e de pedidos de providências contra o recorrido ao tempo do pedido de exoneração também inviabiliza o registro de sua candidatura. Afirma equivocado o entendimento do TRE de que reclamações disciplinares diferem substancialmente do processo administrativo disciplinar, já que, “por definição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), as Reclamações Disciplinares se consubstanciam em um “procedimento investigativo de notícia de falta disciplinar atribuída a membros ...”. Argumenta que a finalidade da alínea q do art. 1º, I, da LC n. 64/90 “inibir que aqueles que tenham descumprido deveres funcionais/praticado condutas vedadas, saiam ilesos das consequências decorrentes dos seus atos”.

- II -

A inelegibilidade estabelecida na alínea g  tem por finalidade preservar a probidade administrativa, obstando o registro da candidatura de quem foi responsabilizado por má gestão de recursos públicos. A sua incidência exige, segundo a disposição legal e a orientação firmada no Tribunal Superior Eleitoral, a concomitância dos seguintes elementos:

a) rejeição de contas relativas ao exercício de cargo ou função pública;

b) decisão irrecorrível proferida por órgão competente;

c) detecção de irregularidade insanável;

d) configuração de ato doloso de improbidade administrativa, e

e) decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário .

Na espécie, o recorrido viu contra si decisão de rejeição de contas proferida pelo Tribunal de Contas da União (Processo de Tomada de Contas Especial n. 006.470/2022-0) Nesse processo, foram arroladas irregularidades relacionadas com pagamentos de diárias. O recorrido obteve, contudo, provimento cautelar de suspensão dos efeitos do julgamento da Corte de Contas junto à 6ª Vara Federal de Curitiba (Proc. n. 5053024-83.2022.4.04.7000). 

A decisão do Poder Judiciário suspendendo os efeitos da rejeição de contas impede a caracterização da inelegibilidade em apreço. A jurisprudência do TSE é firme a esse respeito:

1. A rejeição de contas calcada em decisão irrecorrível, emanada do órgão competente, no exercício de cargo ou função pública, com nota de insanabilidade e por irregularidade que, em tese, constitui ato doloso de improbidade administrativa, desde que imputado débito, e não apenas sancionada com multa, atrai a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, salvo se suspensa ou anulada por pronunciamento judicial. (RO-El - Recurso Ordinário Eleitoral nº 060076575 - FLORIANÓPOLIS – SC, Acórdão de 22/11/2022, Relator(a) Min. Carlos Horbach, PSESS de 22/11/2022)

(…) 2. A decisão de desaprovação das contas de governo de Frank Gomes Freitas – proferida em 10.11.2015 pela Câmara Municipal de Itaiçaba/CE – teve seus efeitos suspensos em razão da tutela liminar obtida em 9.8.2016. Assim, a questão referente à incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da Lei Complementar 64/90 foi examinada no processo de registro de candidatura dos recorrentes, mas não foi reconhecida justamente em razão da vigência da referida liminar.

3. Como a revogação da liminar que suspendia os efeitos da desaprovação de contas ocorreu somente em 18.12.2020 (dois dias após a diplomação dos recorrentes – ocorrida em 16.12.2020), a inelegibilidade superveniente dela resultante não pode ser considerada no julgamento do presente recurso contra a expedição de diploma, haja vista que, nos momentos culminantes do processo eleitoral, não existia o suporte fático da alegada inelegibilidade, de modo que tanto a manifestação soberana do eleitor (data da eleição) quanto o ato administrativo que atesta a regularidade de todo o processo eleitoral em relação a certo candidato e o legitima à assunção do cargo (diplomação) foram informados pela inexistência de óbices à candidatura.

(REspEl - Recurso Especial Eleitoral nº 060039367 - ITAIÇABA – CE, Acórdão de 17/02/2022, Relator(a) Min. Sérgio Banhos, DJE de 24/02/2022)

A existência, no TRF-4, do agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo (autos n. 50448962520224040000) interposto pela União Federal em 24 de outubro de 2022, não é suficiente para neutralizar o efeito da suspensão judicial dos efeitos da condenação pelo Tribunal de Contas. Não se exige, como visto no precedente acima, que a decisão judicial se tenha tornado definitiva para que o 

efeitos do julgamento da Corte de Contas junto à 6ª Vara Federal de Curitiba (Proc. n. 5053024-83.2022.4.04.7000). 

A decisão do Poder Judiciário suspendendo os efeitos da rejeição de contas impede a caracterização da inelegibilidade em apreço. A jurisprudência do TSE é firme a esse respeito:

1. A rejeição de contas calcada em decisão irrecorrível, emanada do órgão competente, no exercício de cargo ou função pública, com nota de insanabilidade e por irregularidade que, em tese, constitui ato doloso de improbidade administrativa, desde que imputado débito, e não apenas sancionada com multa, atrai a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, salvo se suspensa ou anulada por pronunciamento judicial. (RO-El - Recurso Ordinário Eleitoral nº 060076575 - FLORIANÓPOLIS – SC, Acórdão de 22/11/2022, Relator(a) Min. Carlos Horbach, PSESS de 22/11/2022)

(…) 2. A decisão de desaprovação das contas de governo de Frank Gomes Freitas – proferida em 10.11.2015 pela Câmara Municipal de Itaiçaba/CE – teve seus efeitos suspensos em razão da tutela liminar obtida em 9.8.2016. Assim, a questão referente à incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da Lei Complementar 64/90 foi examinada no processo de registro de candidatura dos recorrentes, mas não foi reconhecida justamente em razão da vigência da referida liminar.

3. Como a revogação da liminar que suspendia os efeitos da desaprovação de contas ocorreu somente em 18.12.2020 (dois dias após a diplomação dos recorrentes – ocorrida em 16.12.2020), a inelegibilidade superveniente dela resultante não pode ser considerada no julgamento do presente recurso contra a expedição de diploma, haja vista que, nos momentos culminantes do processo eleitoral, não existia o suporte fático da alegada inelegibilidade, de modo que tanto a manifestação soberana do eleitor (data da eleição) quanto o ato administrativo que atesta a regularidade de todo o processo eleitoral em relação a certo candidato e o legitima à assunção do cargo (diplomação) foram informados pela inexistência de óbices à candidatura.

(REspEl - Recurso Especial Eleitoral nº 060039367 - ITAIÇABA – CE, Acórdão de 17/02/2022, Relator(a) Min. Sérgio Banhos, DJE de 24/02/2022)

A existência, no TRF-4, do agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo (autos n. 50448962520224040000) interposto pela União Federal em 24 de outubro de 2022, não é suficiente para neutralizar o efeito da suspensão judicial dos efeitos da condenação pelo Tribunal de Contas. Não se exige, como visto no precedente acima, que a decisão judicial se tenha tornado definitiva para que o 

registro de candidatura se isente dos efeitos da deliberação da Corte de Contas. Além disso, os autos não dão notícia de deferimento da suspensão de liminar ocorrido antes da diplomação. Assim, estando vigente a tutela provisória que suspendeu a rejeição das contas, a inelegibilidade em causa não recai sobre o recorrido.

A causa de inelegibilidade da alínea q do art. 1º, I, da LC 64/90, de seu turno, recai sobre “os magistrados e os membros do Ministério Público que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos”. 

Como anotou o acórdão regional, o processo administrativo disciplinar - PAD é instrumento destinado a apurar a responsabilidade do membro do Ministério Público por desvio de conduta, na perspectiva da aplicação da respectiva sanção administrativa. Com ele não se confundem os procedimentos de investigação dos fatos, como a sindicância, a reclamação disciplinar e o pedido de providências, que não são aptos, por si, a gerar imposição de sanção administrativa. Esses procedimentos podem levar, antes, à instauração do processo administrativo disciplinar – este sim previsto na norma de inelegibilidade. Aqueles instrumentos são distintos do PAD na natureza e nos fins. Ocupam-se de reunir elementos de convicção para averiguar se há justa causa para a instauração do processo disciplinar. Daí o acórdão recorrido haver assinalado que:

Como se pode notar, são claras as diferenças entre o processo administrativo disciplinar e a reclamação disciplinar, a sindicância e o pedido de providências.

O primeiro tem como objetivo apurar a responsabilidade do membro do Ministério Público, com observância do devido processo legal e garantia do contraditório e da ampla defesa, podendo acarretar aplicação de sanção disciplinar, enquanto os demais expedientes são meramente investigativos.

Não há, na reclamação disciplinar, na sindicância e no pedido de providências, a possibilidade de aplicação de penalidade e a garantia do contraditório e da ampla defesa. 

Esses procedimentos preliminares podem resultar, ou não, na instauração de processo administrativo disciplinar.


Acrescentou o Tribunal Regional Eleitoral que “a certidão apresentada pelo Conselho Nacional do Ministério Público (ID 43163974) demonstra que não havia processo administrativo disciplinar instaurado ou em tramitação em 2/11/2021, quando apresentado o pedido de exoneração pelo candidato impugnado”, salientando que “o candidato impugnado respondeu a dois processos administrativos disciplinares: o PAD n. 1.00898/2018-99, que teve como consequência a aplicação de penalidade de advertência, com trânsito em julgado em 12/12/2019; e o PAD n. 1.00982/2019-48, que teve como consequência a aplicação de penalidade de censura, com trânsito em julgado em 18/9/2020”, encerrados, portanto, muito antes do pedido de exoneração.

É fato certo, assim, que, no momento do registro, não havia processo administrativo disciplinar pesando sobre o candidato.  O art. 1º, I, q, da LC n. 64/90, dessa forma, não lhe era pertinente.

Essa conclusão mais se reforça pela linha de interpretação que o Tribunal Superior Eleitoral adota, em se tratando de extração de sentido de enunciados de impedimento a candidatura. O Tribunal prefere, nesses casos, a interpretação mais restrita da regra, em prol do direito fundamental de ser votado, rejeitando leituras que escapem do sentido próprio, imediato, dos enunciados normativos. A propósito, a decisão em que se disse que “os dispositivos que tratam das hipóteses de inelegibilidade, por traduzirem restrição ao exercício dos direitos políticos, não comportam interpretação extensiva, não cabendo ao intérprete suprir eventual deficiência da norma [...], devendo prevalecer a legalidade estrita ".

Essa inteligência não é avulsa no repertório de julgados do TSE; vem sendo citada e seguida em outros precedentes . Em especial, muito recentemente, o Tribunal pôde apreciar essas mesmas arguições contra a leitura que o TRE do Paraná realizou da causa de inelegibilidade do art. 1º, I, q, da LC 64/90. Na oportunidade, caso do ex-magistrado Moro, o TSE assentou que expedientes distintos do processo administrativo disciplinar não preenchem o pressuposto da causa de inelegibilidade em exame, justamente dada a compreensão restritiva que dispositivos dessa sorte deve receber e à vista da distinção ontológica entre o PAD e outros procedimentos típicos de órgãos como o CNJ e o CNMP. Ficou estabelecido que apenas o processo administrativo disciplinar stricto sensu se amolda à causa de inelegibilidade da alínea q:

(…) 3. INELEGIBILIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. ALÍNEA Q. MAGISTRADO. EXONERAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR STRICTO SENSU. MENS LEGIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. JURISPRUDÊNCIA ITERATIVA. 4.CONCLUSÃO. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DE CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, Q, DA LC Nº 64/90. ACÓRDÃO REGIONAL. ACERTO. RECURSOS ESPECIAL E ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. SEGUNDO RECURSO ORDINÁRIO. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIMENTO.

(…)

11. Não há falar na incidência da causa de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990. Articula–se tal tese por força do pedido de exoneração da magistratura federal formulado pelo recorrido, ainda na pendência de pretensos expedientes disciplinares instaurados no CNJ.

12. Os preditos expedientes correram sob a forma de Pedido de Providências e de Reclamação Disciplinar. É forçosa, portanto, a conclusão pela ausência de instauração de Processo Administrativo Disciplinar, elementar reclamada pela legislação eleitoral para a configuração do impedimento temporário. Isso porque não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado.

13. É iterativa a jurisprudência deste Tribunal Superior no sentido de que normas delineadas na Lei de Inelegibilidade (LC nº 64/1990), por serem de ordem restritiva, também devem ser interpretadas restritivamente, sob pena de se incorrer em indevida analogia, desnaturando o comando legal. Precedentes.

(...)

16. Uma vez satisfeitas as condições de elegibilidade de (I) domicílio eleitoral e de (II) filiação partidária, bem como não havendo falar na incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, a manutenção do aresto regional é medida que se impõe.


17. Recursos especial e ordinário a que se negam provimento. Não conhecimento do segundo recurso ordinário. 
Nessas circunstâncias ainda, é irrelevante cogitar da motivação do requerimento de exoneração antes do término dos procedimentos distintos do processo administrativo disciplinar.
O parecer é pelo desprovimento dos recursos ordinários.
Brasília, H八2023Ho八ia3520 de maio de 2023.


Paulo Gustavo Gonet Branco