O autor é advogado no RS.
A implantação de pedágios em nossas rodovias é resultado de uma má compreensão de necessidades públicas. Assume o tipo de imposto com outra roupagem a ser pago por quem utiliza a via rodoviária. Contudo, é de uma repercussão difusa e extensiva a tudo o mais que o cidadão precisa para viver.
Isto é, para um país que depende do seu crescimento econômico para existir. A infraestrutura rodoviária é tão essencial quanto à saúde e a educação do seu povo. Equivale às veias humanas.
Os recursos para isto devem estar no orçamento geral o País e dos Estados, em lugar do leque de graúdas e pulverizadas emendas parlamentares, doações a outros países “amigos da onça” e em gastos supérfluos crescentes e inúteis. Muitos deles, revoltantes.
Só depois disso - e de forma complementar - dependendo do vulto das obras e serviços, seria o caso da exploração através de: a) pedágio público, b) parceria público-privada ou, c) de delegação à iniciativa privada mediante concessão.
Acontece, que as empresas do ramo da construção rodoviária querem transformar a infraestrutura das nossas vias rodoviárias - eixos de desenvolvimento econômico e da mobilidade individual - como sua reserva de mercado. Isto é, negócio.
Até é compreensível, desde que a conta não seja paga, exclusivamente, por quem já suporta um turbilhão de impostos, transformando-se o pedágio em mais um pesado tributo com outro nome de batismo.
Este tema possui três vertentes. Cabe a nós encontrarmos as de águas limpas e de menor custo à bolsa dos cidadãos. São elas, a do pedágio público (comunitário), a da parceria público-privada-PPP e a delegada por concessão às empresas particulares.
Nesta última modalidade , todos os impostos das concessionárias, custos operacionais, seguro, verba de publicidades e o ISS municipal, que conquista o apoio de prefeitos pelas praças de pedágios em seus municípios, são repassados aos usuários das vias. Encarecem os custos e provocam incontidos reajustes das tarifas durante o tempo de duração do contrato.
Como o objetivo das concessionárias é o lucro, soma-se a isto a TIR, Taxa Interna de Retorno que trata de assegurar a rentabilidade dos investimentos das concessionárias. Nada disso incide na exploração direta do poder público. A totalidade da arrecadação do pedágio público é invertida no programa de obras e serviços das vias rodoviárias em ritmo compatível com a conjuntura econômico-financeira do país e dos seus habitantes. Compomos um condomínio em que uns não devem ser extorquidos por um síndico temporário e despreparado.
A velocidade ou ritmo das obras pode não ser a mesma, mas será sem riscos de indenizações quando os usuários não puderem mais pagar e as concessionárias ameaçarem cair fora das suas obrigações.
Falo dos produtores rurais, das indústrias, comércio e serviços que repassarão ou absorverão este custo adicional, maior do que o efeito do corrosivo IOF, (Imposto sobre Operações Financeiras) motivo igual às crises nas relações dos três Poderes que ora estamos assistindo.
O Pedágio público é sensível a conjuntura econômica do país. O concedido não quer saber de fatores exógenos desfavoráveis agindo sobre a sua operação. Não deixará de exigir o reajuste da tarifa ou a dilação do prazo contratual em troca da contenção dos aumentos tarifários. Foi o que fizeram no PECR/RS de 2007. Recorreram ao Judiciário. Os prazos são cogitados em 30 anos. Quantos governadores terão que resolver omissões, falhas e erros cometidos por seus antecessores. Os contratos não aguentarão tantas barrigadas.
O nosso Estado conheceu bem este assunto. Tivemos um Programa de Concessão Rodoviária com um final melancólico e de infindáveis demandas judiciais. Em 2007, acumularam-se denúncias perturbadoras aos gaúchos. Resultaram em uma CPI dos Pedágios.
A comissão foi presidida pelo dep. Gilmar Sossella.
Disso o que importa são as conclusões no Relatório Final da CPI dos Pedágios a ser lido, antes de nova tentativa. O que ficou registrado para não acontecer mais foi amplamente abordado. Espera-se que alguém relembre os fatos do malogro daquela malfadada experiência, de interesses inconfessáveis a céu aberto.
O “olho grande” e a intransigência das concessionárias, a pretexto da manutenção do equilíbrio econômico e financeiro do contrato, provocaram reajustes desproporcionais ao valor do pedágio, de um serviço mal fiscalizado e de duvidoso favorecimento às empresas concessionárias.
Elas formaram um clube fechado com enorme influência nos órgãos do governo.
As atas deste Conselho Rodoviário, provaram estes e outros fatos. Os diretores do DAER tinham à disposição veículos cedidos pelas concessionárias. Familiares de dirigentes do DAER foram empregados pelas concessionárias e empreiteiras contratadas do DAER.
O sentimento colhido na CPI foi de que os usuários não se opunham a pagar tarifa de pedágio.
Mas, mostraram a preferência pelos chamados “pedágios comunitários”, exercidos diretamente pelos órgãos da administração pública esvaziados, quase adormecidos. Houve críticas ao DAER que se escapou de uma CPI na época.
Os pedágios comunitários (públicos como o de Portão) chegaram a conviver por muito tempo com os polos das concessões apadrinhadas por partidos políticos desprovidos de “emendas partidárias ou parlamentares.”
Eles, os partidos e políticos avulsos aparecerão novamente, adulados pela imprensa desejosa de polpudas verbas publicitárias. Essa parceria já começou. A mídia está encarregada em apontar todo o tipo de defeitos das atuais rodovias a serem pedagiadas e a propalar como solução a cobrança do pedágio por empresas privadas.
Em linguagem clara e objetiva. Este assunto trata de uma contratação de prestador de serviço público. A Administração Pública contrata uma o mais empresas privadas ou consórcio com a finalidade de conservar, ampliar, construir trechos rodoviários e administrá-las, por tempo determinado, com direito de cobrar a tarifa diretamente do usuário.
Por se tratar de projeto de médio e grande porte que exige investimentos consideráveis, a pretensão do Estado em pedagiar algumas de suas rodovias, deve incluir em seus estudos contratação de Parceria Público-Privada PPP.
É a formula mais adequada à divisão das responsabilidades das partes contratantes em matéria de riscos. Refiro-me à flexibilização de alterações futuras do contrato de forma a conduzir sem traumas, a sua sustentabilidade financeira ao longo do prazo do contrato.
É muito comum o abandono de obras e serviços em concessões públicas. É fundamental prever aos inadimplementos penalidades, indenizações e a reversão de todos os bens ao Poder Concedente.
Situações que cabem à Assembleia Legislativa se ater no exame do programa que deverá apreciar. E, ficar atenta à localização das praças de arrecadação, para impedir que os moradores do mesmo munícipio sejam divididos pela praça de pedágio e tenham que pagar em seus deslocamentos rotineiros e interiores, nas suas atividades de trabalhadores, estudantes e de quem precisar ir ao hospital.
É, indispensável prever a criação de associações civis com direito de realizarem a fiscalização externa dos serviços concedidos, por se tratar do interesse público ressalvado pelo art.37 da Constituição Federal (eficiência) diante de uma provável inadequação ou deficiente prestação do serviço delegado.
Talvez, isto que escrevi possa interessar a alguém esperançoso por novos rumos da Administração Pública. Mais debates e visibilidades.
Caxias do Sul, 2.07.2025