Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(a) da Vara da
Fazenda Pública Porto Alegre/RS
MATEUS AFFONSO
BANDEIRA, brasileiro, administrador e consultor de empresas, ex-presidente do
Banco do Estado do Rio Grande do Sul S/A, diretor de relações com investidores,
além de vice-presidente do Conselho de Administração, com domicílio à Rua Barão
de Ubá, 401/Apto 1102, Bairro Bela Vista, CEP 90450-090, Porto Alegre/RS, vem,
perante Vossa Excelência, oferecer
AÇÃO POPULAR COM PEDIDO LIMINAR
em face do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, do seu governador
e chefe do Poder Executivo, EDUARDO FIGUEIREDO CAVALHEIRO LEITE, domiciliado em
Praça Mal. Deodoro, s/n, Centro Histórico, Porto Alegre/RS, 90010-905, e do
BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SA, sociedade de economia mista sediada à
Rua Capitão Montanha, nº 177, Centro, Porto Alegre/RS, CEP 90010-040, nos
termos do art. 1º da Lei nº 4.717/65 e art. 5º, LXXIII, da CF/88, diante dos
fundamentos e razões que passa a expor:
1. SÍNTESE
2
Conforme fato
relevante divulgado ao mercado financeiro no dia 12 de junho de 2019 (em
anexo), o BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SA informou o interesse do
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, atual "controlador" e possuidor da
porção majoritária de suas ações, na realização de oferta pública envolvendo
ações excedentes de controle. Com efeito, restou descrito pela instituição
financeira que ―a oferta abrangerá ações ordinárias até o limite da manutenção
do controle acionário.”.
Nesse sentido, em
nota divulgada à imprensa no mesmo dia, a Secretaria da Fazenda do Rio Grande
do Sul informou o seguinte:
“Tendo em vista a autorização do Conselho Diretor do
Programa de Reforma do Estado (CODPRE), do último mês de maio, o governo do
Estado esclarece que contratou o Banrisul para a coordenação de propostas de
eventual colocação do excedente acionário do banco mediante oferta pública de
ações.”
Destarte,
operações semelhantes já foram realizadas no ano de 2018 e em abril de 2019 e
se mostraram lesivas ao patrimônio público quando levado em consideração o
valor de venda das ações nas operações. Exatamente o que se encontra em vias de
acontecer no caso em tela, considerando-se as questões que demonstram
imprudência e negligência na venda precoce dessas ações, em que será
demonstrada:
1. A oferta destas ações já previamente fixadas ABAIXO
dos valores econômicos potenciais do BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL SA;
2. A lesão que será gerada ao erário público com a dilapidação deste valioso
patrimônio a um preço irrisório e considerável; 3. A limitação sucessiva ao
crescimento da instituição financeira; 4. A impossibilidade futura do Rio
Grande do Sul aderir ao RRF - Regime de Recuperação Fiscal, por falta de ativos
no plano de ajuste fiscal.
3
Tais fatos, de
imensa gravidade e de alto interesse público, demandam, desde já, tendo em
vista a verossimilhança dos eventos de negligência, a obtenção de uma medida
liminar que vise a suspensão imediata da oferta de ações até que o ESTADO DO
RIO GRANDE DO SUL faça a adesão ao RRF, pelas razões trazidas a seguir.
1.1. HISTÓRICO DE DANOS RECENTES AO PATRIMÔNIO PÚBLICO DO
BANRISUL
O valor econômico
de uma empresa corresponde à sua geração futura de caixa descontada a valor
presente. Através dos dados das operações passadas é possível verificar que em
nenhum momento o valor e nem o potencial econômico do Banrisul foi considerado
na precificação das vendas de ações do banco, o que acabou por gerar imensos
prejuízos, como certamente está em vias de ocorrer no caso em tela.
Na primeira
operação, em 10 de abril de 2018, foram vendidas 26 milhões de ações
preferenciais a R$ 18,65 por ação. Na segunda operação, em 27 de abril de 2018,
foram vendidas 2,9 milhões de ações ordinárias a R$ 17,65 por ação. Nestas duas
operações foram arrecadados, ao final, R$ 536,1 milhões.
Desde a ocorrência
dessas duas operações em 2018, o Banrisul já distribuiu R$ 2,4085 por ação em
proventos aos seus acionistas. Considerando as 28,9 milhões de ações que foram
vendidas, no período de apenas 14 meses, o Estado do Rio Grande do Sul deixou
de receber R$ 69,60 milhões em proventos. Destaque-se: o ativo está atualmente
cotado na bolsa de valores a R$ 25,08, valorização considerável após as
operações.
4
Dessa forma,
considerando os proventos distribuídos que o Estado deixou de receber e a
valorização da ação em bolsa, apenas nessa operação o Estado do Rio Grande do
Sul deixou de arrecadar R$ 258,3 milhões. Logo, para arrecadar R$ 536,1
milhões, o Estado abriu mão de R$ 258,3 em um pouco mais de um ano.
1.3. UM NOVO RISCO DE LESÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO
COMETENDO O MESMO EQUÍVOCO
Aquela perda
gerada pelas operações de vendas das ações do Banrisul em 2018 se ocasionou em
função da falta de uma avaliação de valor econômico na precificação das ações
para a venda. Uma avaliação econômica do banco que considerasse o seu potencial
de resultados futuros e distribuição de dividendos, certamente levaria em conta
uma precificação adequada.
Contudo, o Estado
não está realizando ou não está executando devidamente uma avaliação econômica
nas operações, literalmente vendendo as ações do Banrisul a qualquer preço que
o mercado deseje pagar ou fazendo estimativa grosseira para a sua próxima
operação. Senão vejamos.
Em entrevista ao
jornal Estadão no dia 16 de junho de 2019 (em anexo), o Sr. Governador EDUARDO
FIGUEIREDO CAVALHEIRO LEITE afirmou que a participação do Estado em uma venda
do Banrisul poderia valer R$ 10 bilhões. No entanto, o Estado pretende arrecadar
até R$ 2,4 bilhões com a venda de metade de sua participação no banco, conforme
amplamente noticiado na imprensa.
5
Nesse sentido,
parece muito temerário que o Sr. Governador aceite vender metade da
participação do Estado no Banrisul por uma fração do valor que ele próprio
admite valer. Essas operações indicam verdadeira falta de transparência na
venda das ações, o que evidencia uma tentativa de levantamento de verbas em
curto prazo, ante a necessidade de aprovação do Governo em detrimento da
opinião pública.
De qualquer modo,
as partes Rés estão abrindo mão de um ativo relevante para a sociedade gaúcha,
com capacidade de geração de resultados futuros, por um preço abaixo do seu
valor econômico e sem a devida avaliação apenas para sobreviver por um curto
período de tempo.
Ressalta-se que o
próprio Sr. Governador considerou a medida de venda parcial de ações equivocada
durante a campanha eleitoral ao afirmar ao seu oponente no segundo turno das
eleições: ―o senhor queimou o futuro do Rio Grande do Sul quando vendeu parte
do banco e usou o dinheiro no custeio da máquina‖.
1.4. DISCREPÂNCIA EM RELAÇÃO À OFERTA DE AÇÕES DE OUTROS
BANCOS PÚBLICOS
O histórico de
venda de ativos de bancos no Brasil, sejam privados ou públicos, mostra
claramente a desconexão em relação aos valores que o ESTADO DO RIO GRANDE DO
SUL obteve e pretende obter com as operações de venda de ações do Banrisul,
quando feita sem a realização de uma devida avaliação do valor da empresa. A
tabela que será apresentada a seguir, através de um histórico de operações,
mostra como os gestores do Estado têm ofertado patrimônio público sem levar em
conta uma quantificação profissionalizada do preço do ativo.
6
Destarte, mesmo
considerando a venda parcial de ações do Banrisul realizada pelo Estado em 2007
(ou seja, sem privatização do banco) o preço de venda das ações foi equivalente
a 2,2x o valor patrimonial da empresa. Já nas operações realizadas em 2018 o preço
de venda foi equivalente a 1,05x o valor patrimonial, proporção muito abaixo da
oferta anterior e, conforme se verá, muito abaixo da média do preço de venda
das ações de bancos nas operações realizadas no país (excluindo a venda feita
pelo Rio Grande do Sul em 2018) que é de 2,48x do valor patrimonial:
Dessa forma,
seguindo a renúncia de valores substanciais e a lesão ao patrimônio público
ocorridas em 2018, com a dilapidação negligente em relação ao valor econômico
do Banrisul, fica bastante claro que a presente operação também toma como
parâmetro os mesmos moldes.
1.5. ANALISTAS INDEPENDENTES COMPROVAM: AS AÇÕES DO
BANRISUL VALEM MUITO MAIS DO QUE A PRETENSÃO DE OFERTA DO ESTADO
A Bloomberg L.P. é
uma empresa de tecnologia e dados para o mercado financeiro além de uma agência
de notícias operacional em todo o
7
mundo com sede em Nova York. É hoje uma empresa referência
em termos de dados financeiros nessa seara, e o mesmo pode-se dizer acerca da
tarefa de quantificação de ativos negociáveis em bolsas de valores, o que faz
com que sua opinião jamais seja passível de desconsideração.
Nesse sentido,
seguindo-se o argumento de que o Estado demonstra a intenção de vender ações do
Banrisul a um preço irrisório e sem considerar uma avaliação mais apurada do
valor econômico da empresa, o valor justo médio para as ações do Banrisul,
estipulado por cinco casas de análise independentes e compilado pela Bloomberg
(em anexo), está em R$ 32,22 por ação.
Com efeito, apesar
de ser avaliação simplista e que não atende aos requisitos criteriosos para
venda de bem público, o preço médio das ações de tipo PNB do Banrisul nos últimos
90 dias foi de R$ 23,40. Nos últimos seis meses, o preço médio dessas ações foi
de R$ 23,50. De qualquer modo, esses preços médios apresentam um grande
desconto em relação ao seu valor econômico potencial, ainda que seja mantida a
hipótese de controle público.
Ressalte-se: as
ações utilizadas para o preço médio projetado pelos analistas independentes
compilados pela Bloomberg e para a média da cotação são do tipo PNB
(preferenciais), enquanto as ações que o Estado pretende vender são do tipo ON
(ordinárias). No entanto, é importante que fique claro que o valor econômico de
uma empresa independe da classe de ação analisada. A diferença de preço em
bolsa entre classes de ações ocorre em função de fatores específicos, como
algum direito adicional ou maior liquidez que alguma classe de ação possa ter
em relação à outra. A avaliação em
tela, feita por casas de análise independentes e compiladas pela Bloomberg,
evidencia o baixo preço potencial da operação
8
planejada, caso seja realizada sem avaliação, como as
operações anteriores, tendo em vista que o valor justo médio estipulado por
essas cinco casas de análise é de R$ 32,22.
Destaca-se a
necessidade de uma avaliação independente do valor justo da empresa. A nota
divulgada pela Secretaria da Fazenda do Estado afirma que o Governo “contratou
o Banrisul para a coordenação de propostas de eventual colocação do excedente
acionário do Banco” e que “estão sendo feitas análises coordenadas pelo
Banrisul de uma eventual operação”. Ressalta-se a indiscutível a relação de
dependência entre o Banrisul e o seu controlador, Estado do Rio Grande do Sul,
o que fere a independência necessária para tal operação.
1.6. CEEE, SULGÁS E CRM TERÃO PRECIFICAÇÃO ADEQUADA PARA
PRIVATIZAÇÃO
Conforme afirmado
pelo próprio Sr. Governador EDUARDO FIGUEIREDO CAVALHEIRO LEITE, o montante da
participação do Estado no Banrisul valeria R$ 10 bilhões. Por outro lado, a
expectativa de arrecadação com a operação anunciada é de até R$ 2,4 bilhões. Em
suma, o Estado estaria abrindo mão de cerca de R$ 2,6 bilhões nessa operação,
um valor muito próximo, ou até mesmo superior, ao que se espera arrecadar com a
privatização de CEEE, Sulgás e CRM.
Conforme
amplamente divulgado na imprensa, o governo espera arrecadar cerca de R$ 3
bilhões com a venda dessas três empresas. Esse fato mostra a relevância da
operação envolvendo o Banrisul e como parece temerário efetivar uma venda sem a
devida avaliação.
Para realizar a
venda de CEEE, Sulgás e CRM, o governo contratou o BNDES para efetuar a
modelagem e a precificação adequada
9
dessas empresas. Ao contrário do que ocorre com as ações
do Banrisul, através do que foi divulgado pelo governo, a formação do modelo de
venda destas empresas deve levar 500 dias, indicando o quão diligente é preciso
ser na avaliação de uma venda de uma empresa pública.
1.7. LIMITAÇÃO NO CRESCIMENTO FUTURO DA EMPRESA, BEM COMO
LIMITAÇÃO À CAPACIDADE DE DIRIMIR RISCOS INERENTES A UMA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
O fato de o Estado
passar a ter ações apenas no limite do controle acionário confere grande risco
ao futuro do banco. Isso porque, sua capacidade de expansão via emissão de
novas ações ficará impossibilitada, pois, em uma nova emissão de ações, o
Estado seria diluído e perderia o controle do Banrisul, o que não é permitido
pela Constituição Estadual.
Essa diluição do
Estado ocorreria pela sua incapacidade de aportar recursos em montante
proporcional a sua participação no Banrisul, em um eventual aumento de capital.
Essa incapacidade ocorreria em função da grave crise financeira que o estado
enfrenta. De acordo com o diagnóstico do próprio Governo (notícia em anexo), a
insuficiência orçamentária pode alcançar R$ 43 bilhões apenas no decorrer dos
quatro anos do atual mandato.
Um bom exemplo, de
como é importante manter uma medida reserva para fins de emissões futuras, é o
da emissão de 66,7 milhões ações realizada pelo Banrisul em 2007. Naquela
operação, o objetivo foi certeiro, tanto é que viabilizou o crescimento do
banco nos períodos seguintes com base no capital levantado na operação.
É comum no setor
financeiro a realização de aumento de capital para financiar a expansão da
empresa. Em momentos de crescimento
10
mais forte da carteira de crédito o Índice de Basiléia da
instituição pode ficar comprometido, limitando seu crescimento. Uma solução
para esta questão é um aumento de capital da instituição. O Índice de Basiléia
é a relação entre o patrimônio de referência do banco e valor dos ativos
ponderado pelo risco. Quanto maior o índice, maior a sobra de capital próprio
ou patrimônio para a realização de operações de crédito de maior risco.
A crise econômica
que a economia brasileira vem enfrentando já há alguns anos provocou uma
desaceleração no crescimento do crédito no sistema financeiro nacional. Com o
menor crescimento do crédito, os bancos hoje tem uma posição confortável no seu
Índice de Basiléia. No entanto, uma retomada mais forte do crédito nos próximos
anos pode levar a necessidade de aumento da capital para suportar esse
crescimento, de forma que a instituição possa defender seu mercado em um
ambiente de aceleração do crédito e aumento da competição. Como exemplo do exposto acima, além do
próprio Banrisul, que realizou o aumento de capital já citado em 2007, é
possível elencar também o aumento de capital do Banco do Brasil em 2010, do
Banco Panamericano em 2014 e 2018 e o já anunciado aumento de capital do Banco
Inter, que será realizado em 2019, entre outros.
Os exemplos deixam
claro como os bancos emitem novas ações para financiar seu crescimento.
Exatamente o oposto do que está ocorrendo com o Banrisul, onde o Governo do
Estado quer vender ações apenas para financiar a si mesmo no curto prazo,
limitando o potencial de crescimento futuro do banco.
Não obstante, o
Banco Central do Brasil exige que instituições financeiras possuam controle
definido. A hipótese de o Estado ficar no limite do controle acionário também
elevaria o risco da instituição e do sistema
11
financeiro, pois uma eventual necessidade de aumento de
capital para cobertura de perdas inerentes à atividade de instituição
financeira não poderia ocorrer sem que o Estado perdesse o controle do banco, o
que, reitera-se, não é permitido pela Constituição Estadual. A Lei Federal
9.447/97, no seu artigo 5º, faculta ao Banco Central do Brasil, em casos
previstos, a determinação de medidas como a capitalização da sociedade.
Destarte, a manutenção de ações apenas em quantidade mínima para deter o
controle do banco tolheria o rol de ações do Banco Central do Brasil em casos
já previstos em lei.
1.8. IMPOSSIBILIDADE DE O ESTADO ADERIR AO REGIME DE
RECUPERAÇÃO FISCAL
O Regime de
Recuperação Fiscal (RRF), aprovado pela Lei Complementar 159/2017, foi criado
para fornecer aos Estados com grave desequilíbrio financeiro os instrumentos
para o ajuste de suas contas. Dessa forma, ele complementa e fortalece a Lei de
Responsabilidade Fiscal, que não trazia até então previsão para o tratamento
dessas situações.
Nesse sentido, o
desequilíbrio financeiro é considerado grave quando a Receita Corrente Líquida
anual do Estado for menor do que a dívida consolidada ao final do último
exercício, nos termos da Lei Complementar 101/00. Além disso, é necessário que
o somatório das despesas com pessoal, juros e amortizações seja igual ou maior
do que 70% da Receita Corrente Líquida e o valor total de obrigações sejam
superiores às disponibilidades de caixa. Só poderá aderir ao RRF o Estado que
cumprir esses três requisitos de entrada cumulativamente.
Nesse sentido, é
pública e notória a importância do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL aderir ao Regime
de Recuperação Fiscal (RRF) para que haja o mínimo funcionamento da máquina
pública e de suas funções
12
primordiais para a sociedade. Com efeito, é consenso
tanto para o atual governador, Sr. Eduardo Leite, como do ex-governador, Sr.
José Ivo Sartori, que a adesão ao RRF é a única saída para uma solução para as
finanças do Estado.
Nesse sentido, em
2017, o Estado obteve uma decisão liminar do STF suspendendo o pagamento da
dívida com a União enquanto negocia sua adesão ao RRF. No processo em questão
(ACO 2755), está apensada no arquivo 49 a Nota Técnica Conjunta nº
29/COREM-COAFICOPEM/SURIN/STN/MF-DF.
A referida nota
técnica (em anexo) afirma que o Estado não preenche os requisitos da Lei
Complementar 159/17 exatamente por não ter autorização para a privatização de
empresas de setores financeiros e saneamento, conforme previsto pela legislação
(fls. 8 do anexo).
A nota ainda
afirma que “embora financeiramente atrativas, o Governo do RS, foi categórico
em relação à não inclusão de Banrisul e Corsan nas medidas de saneamento fiscal
do Estado” (fls. 14) e ainda conclui dizendo que “o RS possui meios a sua
disposição para fazer um ajuste fiscal mais drástico, como por exemplo,
privatizar suas estatais, haja vista o valor dos seus ativos frente ao déficit
que ele mesmo afirma ter (...) É importante ressaltar que ter um Banco, ativo
de maior valor do Estado, é um instrumento poderoso de política pública.
Entretanto, frente a necessidade de continuidade administrativa o sentido do
instrumento se perde.” (fls. 15). (grifou-se)
Adicionalmente, em
28 de novembro de 2018 a então Secretária-executiva do Ministério da Fazenda,
Ana Paula Vescovi, foi questionada em entrevista (em anexo):
13
O governador
eleito Eduardo Leite já disse que Banrisul não entraria em negociação. O quanto
isso pode impedir que o Estado entre no plano?
Impedimento total. (grifou-se)
A
Sra. Ana Paula Vescovi ainda complementa:
―O tesouro fez uma fase inicial, que foi sumular todos os
cenários. Essa fase é demorada — temos que colocar todas as medidas na mesa,
fazer o calculo do impacto e a viabilidade jurídica. Mas na hora que os
cenários ficaram prontos, isso ficou bem claro. Tem dois impedimentos hoje para
o Estado aderir: o demonstrativo das contas segundo as regras e, segundo,
colocar no plano de privatizações os ativos capazes de levar o Estado ao
equilíbrio na saída do regime, e isso envolve sim o Banrisul.‖ (grifou-se)
Importante
ressaltar que, até abril de 2018, a Sra. Ana Paula Vescovi foi Secretária do
Tesouro Nacional e responsável pela negociação com o Rio Grande do Sul para
adesão ao RRF. Embora atual configuração do Governo Federal tenha se alterado e
a Sra. Ana Paula Vescovi não faça mais parte da administração, o Sr. Mansueto
de Almeida, atual Secretário do Tesouro Nacional, assumiu o cargo em abril de
2018. Destarte, o atual Secretário do Tesouro Nacional também participou das
negociações para adesão ao RRF em 2018.
14
Considerando o
exposto e a demonstração da importância do Banrisul para a adesão ao RRF,
impõe-se cautela em uma operação que venderia metade da participação do Estado
no banco sem avaliação prévia e a preços deprimidos. Isso porque, um ativo hoje
muito valioso ter sua parcela de ações vendida por um preço irrisório poderia,
inclusive, impedir a entrada do Estado no RRF.
Portanto, por mais
que o Sr. Governador declare publicamente que vai aderir ao RRF sem incluir o
Banrisul entre os ativos para privatização, não é possível ter certeza disso
até que um acordo com a União esteja efetivamente assinado.
Dessa forma, com o
objetivo de evitar mais um prejuízo irreparável ao Estado, isto é, a
impossibilidade de adesão ao RRF por falta de ativos no plano de ajuste fiscal,
seria prudente aguardar a efetiva adesão do Estado ao RRF antes de qualquer
operação de venda de ações.
2. PRELIMINAR CABIMENTO DE AÇÃO POPULAR PREVENTIVA
A doutrina pátria
tem considerado que a ilegalidade ou o ensejo de ilegalidade de conduta do
administrador público enseja a propositura do remédio constitucional denominado
ação popular. Nesse sentido, ainda que a Lei nº 4.717/65 preveja a legitimidade
do cidadão comum para pleitear a nulidade em face de atos lesivos, a
jurisprudência atual tem como pacífica o fato de que podem ser indagados,
preventivamente, atos que ainda não ocorreram e que estejam comprovadamente em
vias de ocorrer.
O fato descrito da
oferta de ações do Banrisul não somente já se encontra sendo planejado, como
vem sendo anunciado pelo Sr. Governador
15
com certa frequência. Assim, a constatação do ato coator
pode ser facilmente descrito pelas notas afirmadas pelo Banrisul e pelas
entrevistas concedidas pelo próprio Governador do Estado.
Com efeito, o
Tribunal de Justiça/RS tem sido pacífico em relação a utilizar-se do feito da
ação popular para fins preventivos:
AÇÃO POPULAR. MUDANÇA DE SEDE DE AUTARQUIA MEDIANTE
DECRETO. 1) PETIÇÃO INICIAL APTA AO DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO, PORQUANTO A
AÇÃO POPULAR TAMBÉM SE PRESTA À TUTELA PREVENTIVA, HIPÓTESE EM QUE O DANO SERÁ
FUTURO, BASTANDO SUA CONFIGURAÇÃO EM TESE. 2) INCONSTITUCIONALIDADE E
ILEGALIDADE DO ATO DEMONSTRADAS. 3) LESÃO À MORALIDADE DEMONSTRADA. VOTO
VENCIDO.(Apelação Cível, Nº 592049365, Primeira Câmara Cível, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Milton dos Santos Martins, Julgado em: 02-03-1993)
(grifou-se)
O mesmo tem sido
decidido pelo TRF3:
AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR PREVENTIVA.
POSSIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. PERDA DE OBJETO E AUSÊNCIA
DE REQUISITO DA MEDIDA POPULAR. PRELIMINARES NÃO CONFIGURADAS. DANO AMBIENTAL
POTENCIAL. POSSIBILIDADE. ILEGALIDADE DAS LICENÇAS DE INSTALAÇÃO. AUSÊNCIA DE
EIA-RIMA. - No caso sob análise, trata-se de ação popular preventiva, que está
prevista nos artigos 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal e 1º da Lei nº
4.717/65 e não é vedada no sistema processual. Assim, não há que se falar em
impossibilidade jurídica do pedido, de modo que deve ser afastada a preliminar
em debate. - A demanda cautelar proposta para evitar a construção de uma via
pública de dupla rodagem em local de preservação permanente, bem como em
qualquer terreno da universidade, se revela adequada e útil à obtenção do
provimento pretendido, porquanto a obra efetivamente ingressou na área de
propriedade da instituição de ensino, razão pela qual remanesce o interesse
16
na análise da legalidade do ato. Dessa forma, a
preliminar de perda do objeto também deve ser rechaçada sob tal aspecto. - A
ação popular constitui um remédio constitucional colocado à disposição de
qualquer cidadão para defesa dos interesses da coletividade e se destina à
anulação de ato lesivo, concreto ou potencialmente, ao patrimônio público, à
moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e
cultural, consoante previsão nos artigos 5º, inciso LXXIII, da Constituição
Federal e 1º da Lei nº 4.717/65. - Para tanto, o ordenamento jurídico prevê
alguns requisitos legais, sem os quais a demanda não se viabiliza, são eles:
condição de eleitor, ilegalidade ou ilegitimidade do ato e lesividade. - In
casu, a ação foi proposta por eleitores. No tocante à presença do binômio
ilegalidade-lesividade do ato impugnado há divergência na doutrina e na
jurisprudência acerca de sua necessidade. Adotada a corrente segundo a qual
basta um desses requisitos para a propositura e procedência do processo popular,
na medida em que a ilegalidade da conduta do administrador público enseja a
violação à moralidade administrativa, a qual pode ser considerada um elemento
apto a ensejar a propositura do remédio constitucional. Dessa forma, o
instituto popular pode ser manejado para proteção dos bens juridicamente
tutelados, ainda que inexistente o dano material ao patrimônio público.
Precedentes da Corte Superior. – (...) Destarte, patente a ilegalidade do ato
impugnado (licenças de instalação), é de rigor a manutenção da sentença
recorrida. - Apelação e remessa oficial desprovidas. (ApelRemNec
0006992-29.2002.4.03.6000, DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, TRF3 - QUARTA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/09/2013.)
Logo, requer o
processamento do feito, ante qualquer levantamento imotivado quanto à ausência
de interesse processual ou impossibilidade jurídica do pedido.
3. MÉRITO REQUISITOS DE ALIENAÇÃO E DESESTATIZAÇÃO
VIOLADOS E RESPONSABILIDADE ENVOLVIDA
17
A Lei nº 8.666 de
21 de junho de 1993 prevê em seu Art. 17 que:
Art. 17. A
alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de
interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e
obedecerá às seguintes normas: II - quando móveis, dependerá de avaliação
prévia e de licitação, dispensada esta nos seguintes casos: c) venda de ações,
que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica;
(grifou-se)
Ou seja, muito
superior a qualquer ato político, a avaliação prévia do bem a ser alienado, no
caso as ações do Banrisul, é uma exigência primária imposta pela referida lei.
Não obstante, trata-se de uma atitude prudente e uma chamada à legalidade,
diante das possibilidades de perda de valores públicos e do notório potencial
de crescimento que o banco possui.
Não obstante, a
Lei Estadual nº 10.607/95, que instituiu o Programa de Reforma do Estado,
afirma em seu art. 2º, Parágrafo Único:
Art. 2.º Com vistas
à consecução dos
objetivos elencados no
artigo 1º, poderão
ser tomadas medidas de
desestatização de empreendimentos que
caracterizem a intervenção
do Estado na atividade econômica. Parágrafo Único. Considera-se
desestatização, para efeitos desta Lei, a alienação, pelo Estado, de direitos
que lhe assegurem, diretamente ou através de controladas, preponderância nas
deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da
sociedade, bem assim a alienação das participações minoritárias diretas e
indiretas do Estado, no capital social de quaisquer outras sociedades.
18
Assim, a alienação
de participações minoritárias, como é o caso da operação trazida pela exordial,
é facilmente caracterizada como desestatização pela Lei Estadual nº 10.607/95,
devendo, portanto, obedecer ao seu regramento e requisitos para consecução do
ato.
Com efeito, o art.
4º da referida lei determina o seguinte:
Art. 4.º Os
processos de desestatização observarão, além das normas fixadas no artigo
anterior, os seguintes preceitos: I - serão precedidos de editais publicados,
na íntegra, na Imprensa Oficial e de avisos, no mínimo, em dois órgãos de
grande circulação, expondo as condições do processo e da situação econômica e
financeira da sociedade incluída no Programa de Reforma do Estado; II - a
alienação de ações a pessoas jurídicas domiciliadas e residentes no exterior,
bem como as pessoas jurídicas controladas por aquelas, deverá observar os
mesmos limites, termos e condições estabelecidos pela legislação em vigor.
Não obstante, o
art. 5º ainda determina, acerca da publicidade das condições para processamento
da desestatização:
Art. 5.º Para a
publicidade das condições em que se processará a desestatização, assim
como da
situação econômica, financeira
e operacional de
cada sociedade incluída
no Programa de Reforma do Estado
-PRE constarão dos Editais, pelo menos, os elementos seguintes: I -
justificativa da desestatização, indicando o percentual do capital social da
sociedade a ser alienado; II - data do ato que determinou a constituição da
sociedade estadual; III - passivo exigível das sociedades, indicando a quem
caberá sua responsabilidade, após a desestatização; IV - situação
econômico-financeira da sociedade, especificando lucros ou prejuízos,
endividamento interno e externo, pagamento de dividendos ou recebimento de recursos
providos pelo Governo Estadual nos últimos exercícios;
19
V - informações sobre a existência ou não de controle de
preços sobre produtos ou serviços da sociedade a desestatizar e qual a variação
dos mesmos nos últimos exercícios e respectiva comparação com os índices de
inflação, quando for o caso; VI - sumário dos estudos de avaliação da
sociedade; VII - critério de fixação do preço total de alienação da sociedade e
o valor de cada ação, com base em laudo de avaliação.
Ocorre que em
nenhuma das vendas de ações já realizadas as normas citadas foram atendidas,
fato que inclusive foi noticiado pela imprensa. Em notícia veiculada do dia 08
de abril de 2019 (em anexo), o Jornal do Comércio informou:
―A Lei 10.607, de 1995, que instituiu o Programa de
Reforma do Estado (PRE), prevê que os processos de alienações ‗serão precedidos
de editais publicados, na íntegra, na Imprensa Oficial e de avisos, no mínimo,
em dois órgãos de grande circulação‘. (...) Também em 2018, quando o Estado
vendeu quase 29 milhões de ações - 26 milhões de preferenciais e 2,9 milhões de
ações ordinárias (com direito a voto) em duas ofertas obtendo R$ 537,4 milhões
-, não houve divulgação anterior da decisão do conselho diretor. Na primeira
operação, em 10 de abril, houve divulgação um dia antes da oferta. Na segunda
oferta, em 27 de abril, o estado só se manifestou após a venda.‖
Dessa forma, fica
claro que o Governo do Estado não cumpriu os artigos 4º e 5º da Lei Estadual,
privando a sociedade de informações essenciais sobre as operações realizadas e
se colocando ao arrepio do cumprimento dos requisitos legais para promoção do
ato.
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Importa destacar o
item VII do art. 5º da Lei Estadual 10.607/95, que determina a publicidade do
critério de fixação do preço total de alienação da sociedade e o valor de cada
ação, com base em laudo de avaliação. Assim, tanto a Lei Federal nº 8666/93 quanto
a legislação estadual exigem uma avaliação prévia do bem a ser vendido. Já a
legislação estadual determina ainda a publicação prévia de edital contendo o
critério de fixação do preço de alienação com base em laudo de avaliação.
Nesse sentido, o
caso de negligência e de imprudência com a coisa pública beira a própria
violação da responsabilidade com o cargo em relação aos envolvidos com a
operação, devendo ser devidamente ponderado por este Juízo a necessidade de
suspender a venda dessas ações, até que seja firmado o RRF, e, finalmente, se
proceda à avaliação devida dos ativos por empresa e profissionais capacitados
para isso.
Logo, requer a
procedência do feito para que
4. PEDIDO LIMINAR
Estando, assim,
demonstrado à saciedade o fumus boni iuris, acerca da necessidade de se
proceder a uma avaliação que apure o preço justo das ações, torna-se imperiosa
a concessão da medida liminar para que seja suspensa a venda, ao menos até que
o Estado firme a entrada no RRF OU se proceda a avaliação devida dos seus
ativos através de contratação de instituição independente.
O perigo da demora
está igualmente presente e se reveste na necessidade de grave prejuízo ao
Estado e, finalmente, na ausência de requisitos econômicos para aderir ao RRF.
Deixar a situação correr sem essas garantias (de valorização do ativo e de
entrada no RRF), poderá
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apenas alargar e agravar a situação de sangria nas contas
públicas, à qual passa o Estado.
Patentes, portanto, o fumus boni juris e o periculum in mora,
autorizadores da concessão da medida, impõe-se a suspensão da venda das ações,
até que se garanta a entrada do RRF, ou que seja promovida a devida avaliação e
apuração dos seus valores econômicos.
5. REQUERIMENTOS
Isso posto,
requer:
a) A concessão de medida liminar, para que seja suspenso
o processo de venda das ações, até que o Estado firme a entrada no RRF ou se
proceda avaliação devida dos seus ativos, através de avaliação prévia e
independente do preço das ações considerando seu valor econômico para que seja
determinado valor justo das ações; b) A
confirmação da medida liminar com a procedência final do feito, para que o
governo proceda avaliação prévia e independente do preço das ações considerando
seu valor econômico para que seja determinado valor justo das ações, com a
produção de laudo de avaliação para determinar o preço correto das ações que
excedem ao controle, através de contratação de instituição independente para
proceder a avaliação do valor econômico das ações. c) A citação das partes
envolvidas, do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, do seu governador e chefe do Poder
Executivo, EDUARDO FIGUEIREDO CAVALHEIRO LEITE, e do BANCO DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL SA, na figura de seus administradores, para que, querendo,
contestem o feito; d) O chamamento do Ministério Público ao feito, como fiscal
da lei;
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e) O oficiamento dos membros do CODPRE - Conselho Diretor
do Programa de Reforma do Estado, para prestarem informações: o Secretário
Chefe da Casa Civil; o Secretário de Estado de Planejamento, Orçamento e
Gestão; o Procurador-Geral do Estado; o Secretário de Estado de Governança e
Gestão Estratégica; o Secretário de Estado da Fazenda; o Secretário de Estado
do Meio Ambiente e Infraestrutura; e o Secretário de Estado de Desenvolvimento
Econômico e Turismo. f) O oficiamento do Banco Central do Brasil ao feito, para
prestar informações próprias da fiscalização das instituições financeiras. g)
Seja determinado, também em medida liminar, ou em período de produção de
provas, ao Banrisul, para que o banco apresente extrato das vendas de ações
feitas nos governos Leite, Sartori e também Yeda, para fins de relacionar estes
dados com o valor patrimonial, de forma a confirmar a informação apresentada na
exordial; g)h) A produção de toda a prova admitida em direito. h)i) A
condenação dos Réus ao pagamento de honorários advocatícios a serem
estipulados, nos termos do art. 12, da Lei nº 4.717/65, combinado com o art. 85
do CPC.
Pede
deferimento. Dá-se à causa o valor de R$
3.000.000.000,00
Porto Alegre, 12
de julho de 2019.
Bruno Dornelles
OAB/RS nº 87.015
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