Assembleia Nacional Constituinte, 1988. Em votação,
direitos do funcionalismo público. Nas galerias, representantes de algumas
corporações, exigindo privilégios. Na Mesa, impaciente com as manifestações e a
pressão sobre os parlamentares, o doutor Ulysses. Interrompida a sessão, por
conta do impasse, ele perguntava a quem se aproximava: “Vocês já viram as
galerias ocupadas pelo sindicato dos desempregados?”
Passados 31 anos, o país se modernizou, é melhor em quase
todos os aspectos mas as galerias e todos os locais onde se exerce a pressão
politica seguem carentes de representação dos realmente necessitados
–desempregados, analfabetos, os injustiçados pela realidade brasileira–
enquanto o monopólio das corporações sobre galerias e corredores do Congresso
parece maior que nunca.
Foi o que se viu, mais uma vez, na votação da reforma da
Previdência, essa semana, na Câmara dos Deputados.
Pegue-se, como exemplo, os policiais. Desde sempre,
discute-se no Brasil o chamado regime das aposentadorias especiais –profissionais
que diante da insalubridade, risco ou condições inerentes ao trabalho que
exercem sofreriam, de forma comprovada, desgaste superior ao de outras
profissões e, por isso, mereceriam atenção diferenciada na contagem de tempo de
serviço e regras para aposentadoria. Caso clássico de policiais em atividade
permanente nas ruas.
Até aí, tudo certo. Mas, como sempre no Brasil, o
discurso sobre justiça rapidamente se transforma em biombo para proteger
privilégios. E o argumento do perigo e do risco é usurpado, por exemplo, por
membros da polícia legislativa –profissionais que passarão a vida pelos tapetes
e gabinetes dos parlamentos. Uma generalização, essa sim injusta, torna-os
iguais a quem estiver em alguma fronteira perigosa do país combatendo traficantes.
Ou burocratas da ABIN, analistas de informações, que viverão anos lendo jornais
e navegando pelas redes sociais, mas recebendo benefícios especiais.
A firmeza e competência de alguns parlamentares, Rodrigo
Maia à frente, permitiram que a reforma da Previdência avançasse, apesar de
concessões muitas vezes injustificáveis ainda que necessárias para sua
aprovação. Mas deixaram, mais uma vez, a comprovação do peso e do prejuízo que
a presença excessiva das corporações vem trazendo ao país, principalmente
quando o presidente da Republica renuncia à defesa do interesse geral para
comportar-se como presidente de sindicato de uma única categoria.
Este prejuízo decorre, primeiro, do fato do quase
monopólio delas na hora da pressão. Em um cenário verdadeiramente democrático,
o legitimo direito de alguma corporação querer mais e mais benefícios sofreria
a oposição dos representantes dos demais setores, majoritários, estes sim
necessitados –o sindicato dos desempregados a que se referia Ulysses Guimarães.
Mas, estes, estão ausentes ou no máximo pouco representados no debate político
e na disputa pela divisão de recursos e políticas públicas.
Em segundo lugar, o atual sistema eleitoral garante às
corporações, com exclusividade, a condição de terem “os seus parlamentares”.
Uma corporação poderosa é tríplice garantia para um candidato que a ela se
vincular –uma base concreta para atuar, uma rede eficiente de contatos e apoios
e, ainda, recursos materiais e financeiros. Os desempregados, para comparar,
não têm sede, nem rede e muito menos recursos…
O efeito das corporações estende-se ainda aos partidos,
desmoralizando discursos. A esquerda, sem constrangimento, troca a defesa
histórica de justiça e igualdade pela adesão incondicional, com honrosas
exceções, a interesses de poucos. Ainda essa semana, na discussão sobre alguns
destaques apresentados à reforma da Previdência, assistimos líderes que
conseguiam ao mesmo tempo criticar a proposta por “prejudicar a maioria dos
brasileiros” enquanto anunciavam apoio a emendas que apenas beneficiam a poucos
e, por isso, retiram obrigatoriamente recursos da maioria…
À direita, o efeito desmoralizador do peso das
corporações, também se faz sentir. Partidos e líderes que simultaneamente se
anunciam reformistas defendem a redução do tamanho do Estado e a “nova
política” mas se submetem com entusiasmo ao que há de mais velho no país: a
tomada de fatias crescentes do setor público por interesses corporativistas, a
forma mais perversa de privatização.
Enquanto não vier o voto distrital, porém, o apoio de uma
corporação seguirá sendo o caminho mais rápido e eficiente para enfrentar uma
campanha eleitoral para cargos legislativos. E, na dimensão desproporcional que
assumiu entre nós, um elemento que deturpa o debate e fragiliza a possibilidade
de justiça e equidade.
A matéria está correta. Existe a polícia que corre risco e a polícia de gabinete, precisa haver diferenciação. Na PF por exemplo: Todos os cargos concorrem para missões em todo o Brasil, sempre correndo risco. Em caso de invalidez, a serviço, o policial ainda tem amparo, recebe 100%. Mas se o policial vier a ficar doente por outras causas, e invalido, sua remuneração será progressivamente menor, ficando, na hora que mais precisa, desamparado. O mesmo vale a pensão caso o policial na ativa ou aposentado venha a falecer. A família ficará com seu orçamento muito comprometido. Não se leva em conta o tempo que o servidor ficou afastado trabalhando longe da família, dedicando-se ao trabalho, ficando meses longe, com jornadas de 12 a 15 horas ininterruptas, sem fins-de-semana e feriados, não se conta o stress e desgaste físico e emocional que vai corroendo a saúde do policial por ter que lidar com o pior da sociedade. Sim, só é polícia quem quer sabendo que vai passar por essas dificuldades, mas quando entra, é por regras estabelecidas. Só aumentam as atribuições e perigos, ao passo que não há o reconhecimento disso, e pior, mudam-se as regras no meio do jogo. O policial contribui desde o primeiro dia na profissão pelo teto do que recebe, e por toda vida, mesmo aposentado. outra, não recebem plano de saúde. Realmente o que estão fazendo é injustiça com a carreira.
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