Dagoberto Lima Godoy é advogado e engenheiro, ex-presidente da Fiergs e ex-representante do Brasil na OIT.
A Operação Poço de Lobato, desencadeada contra o Grupo Fit/Refit, é mais do que uma ação fiscal de grande porte. Ela virou, em poucas horas, um capítulo da disputa política entre Brasília e Washington sobre quem, afinal, está sendo rigoroso — ou leniente — com o crime organizado.
Em suas declarações, o ministro Fernando Haddad explicitou um ponto politicamente explosivo: o crime organizado brasileiro estaria usando empresas constituídas no estado de Delaware, nos Estados Unidos, tratado na prática como paraíso fiscal, para viabilizar esquemas de lavagem de dinheiro e evasão.
Ou seja: no momento em que o Brasil mostra os dentes contra um grande sonegador doméstico, aponta também o dedo para as fragilidades do sistema jurídico-financeiro americano.
Do outro lado da mesa, o governo Trump vem esticando o conceito de terrorismo. Na prática, “terrorismo” deixa de ser uma categoria relativamente bem delimitada e vira instrumento político elástico, capaz de justificar sanções financeiras pesadas e, no limite, ações militares.
Em 2025, emissários americanos vieram a Brasília pressionar para que o Brasil também classificasse PCC e Comando Vermelho como organizações terroristas. O governo brasileiro recusou, sustentando que a legislação nacional reserva o conceito de terrorismo para ações com finalidade político-ideológica contra o Estado. Enquanto isso, no Congresso e em alguns governos estaduais, surgiram iniciativas em sentido oposto, muitas vezes em sintonia com a agenda de Washington.
Temos, portanto, dois projetos em choque:
De um lado, Trump: expandir o rótulo de terrorismo para cartéis, gangues e facções, construindo base jurídica para uma “guerra total” contra o crime organizado na América Latina.
Do outro, o governo Lula: insistir na distinção entre crime organizado e terrorismo, preservando a autonomia de enquadrar suas próprias facções segundo o direito interno.
É aqui que a operação contra o Grupo Fit ganha dimensão geopolítica. A forma como o caso foi comunicado coloca a operação dentro da disputa com os EUA.
Não estou dizendo que a investigação tenha sido “inventada” para responder às tarifas; o que me parece claro é que, uma vez deflagrada, ela passou a ser capitalizada politicamente como prova de firmeza interna e, ao mesmo tempo, como crítica às fragilidades externas.
No fundo, estamos assistindo menos a uma “guerra ao crime” e mais a uma guerra de narrativas. Trump precisa de inimigos externos suficientemente assustadores para justificar tarifas punitivas e expansão do aparato antiterror. O governo Lula, por sua vez, precisa provar que não é cúmplice do crime organizado — e encontrou, em Poço de Lobato, um caso exemplar para mostrar serviço e, de quebra, apontar falhas do governo americano.
Tudo muito oportuno, no momento em que estão em curso negociações em torno do tarifaço aplicado por Trump contra o Brasil.
Ha muita conversa mole... dizem que o tal grupo sonegou 26 bilhões R$.... e outros que dizem ser de 300 milhões por mes.....então faz quase 90 meses qoe vem sonegando sem que nehum fiscal da secretaria da fazenda fique sabendo....ai tem coisa.....
ResponderExcluirO artigo do Dr. Dagoberto Godoy, ex-presidente da FIERGS, serve de "bengala de cego" aos seus concidadãos com dificuldades de orientação e mobilidade.
ResponderExcluirÉ uma raríssima manifestação de quem teve ativa participação no meio empresarial.Falo da sua lucidez e a coragem que faltam a muitos outros do setor empresarial.
Foi precisa a sua análise. Concordo quando diz:" o governo Lula precisa provar que não é cúmplice do crime organizado":Os indícios de sua tolerância e socialidade com os chefes do crime organizado estão estampados pela imprensa, como se fora um "garoto propaganda: da sua marca em seus bonés, símbolos da organização.
Por outro lado, em entrevista o ministro Addad mostra-se bom entendedor em matéria de "paraíso fiscal" para lavagem de dinheiro e evasão.