Artigo, Marcus Vinicius Gravina - Nem Bolsonaro, nem Lula

Marcus Vinicius Gravina é advogado no RS.


É isso mesmo. Nem Bolsonaro e nem Lula estão obrigados a devolverem os relógios recebidos dos governantes da Arábia Saudita e da França. Não há lei que os obriguem.   


Em meu artigo: “A maldição do Rolex’, publicado no Blog do Políbio Braga, de 15 de agosto, escrevi dizendo estar curioso para saber em que lei se baseara o inquérito aberto contra Bolsonaro, sobre o Rolex e qual a penalidade cabível.  


Pois, agora estou convencido de que a Lei 8.394/91 e o tardio decreto regulamentar 4.344/2002 são inaplicáveis. 


A Lei 8.394/91, combinada com o §1º do Art.216, é uma lei especial que resume em sua ementa seu limitado escopo, ou seja para o que veio: “dispõe sobre a preservação e proteção dos acervos documentais privados dos presidentes da República.”  


Assim todo o seu texto, de apenas 20 artigos, se manteve sem sair “fora das quatro linhas”. Embora pudesse, em nenhum momento a lei incluiu os bens materiais, como relógios, joias, espadas cravejadas e armas. 


Em todos os dispositivos da lei, só se fala em “acervos documentais privados de Presidentes da República.  Entendem-se como documentos privados dos presidentes, exclusivamente, o acervo de interesse histórico.  


O único objetivo da lei é preservar a memória presidencial como um todo num conjunto integrado, compreendendo os acervos arquivísticos, bibliográficos e museológicos.  Nada menciona sobre joias ou relógios. 


Mas, também é verdade, que ao final do mandato presidencial os documentos tratados pela Secretaria de Documentação Histórica serão entregues aos ex-presidentes. Os documentos que constituem o acervo privado presidencial serão entregues, para fins de herança, doação ou venda. Em caso de venda a União terá a preferência de compra. Isso em caso de acervo documental.  Preste-se, atenção: acervos documentais. 


Insisto em afirmar. O inquérito sobre relógios e joias não possui amparo legal.  


A Portaria não passa de uma “gambiarra” legislativa do TCU. Ela foi apresentada como se tivesse força de lei, de forma inovadora. 


O professor J. Cretella Junior ao se referir ao mundo do direito leciona que a lei vem em primeiro lugar na frente de qualquer ordem do Estado em comunicação com os cidadãos. Sendo a Constituição Federal a mais alta delas.  


Abaixo da lei cabe espaço a um regulamento, normalmente, o Decreto, desde que não ofenda o texto legal regulamentado. No caso deste comentário o decreto não acrescentou como bens do acervo material, relógios e joias.  Não teve a pretensão de alterar a lei.  


O TCU, no entanto, resolveu encurtar o caminho do Poder Legislativo, e com a audácia aprendida do STF, resolveu legislar mediante Portaria.   


“É sabido que portaria não inova, não cria, não extingue, não modifica, por si qualquer impositivo da Ordem Jurídica em vigor. A Portaria interpreta o texto legal com fins executivos e não tem vida autônoma. Está impedida de criar direitos novos ou obrigações novas, não estabelecidas no texto básico”. 


Sem lei não há como penalizar os ex-presidentes que receberam e continuam com seus presentes, em relógios e joias. Convocar nova CPMI para investigá-los é aceitar mais um jogo sujo e desprezível. 


O que eles podem e devem fazer é promoverem ações judiciais contra os que os têm caluniados e difamados, sobre os presentes recebidos, a começar por empresas concessionárias do serviço público Nacional de difusão, redes de jornais e TVs. 


Caxias do Sul, 27.08.2023 


 


Nenhum comentário:

Postar um comentário