Três grupos disputam política externa de Bolsonaro


A diplomacia do novo governo expressará conflitos desses núcleos

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, e o futuro ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Araújo

Valter Campanato/Agência Brasil

15.nov.2018 às 2h00

Jair Bolsonaro prometeu chacoalhar a diplomacia brasileira mais do que qualquer antecessor do ciclo democrático. Ninguém sabe quão intensa será a sacudida, mas vem mudança por aí.

Também já está claro que há três grupos diferentes atuando com força na política externa da transição e com capacidade de influenciar as decisões do presidente depois da posse.

Num desses grupos está Eduardo Bolsonaro com a assessoria internacional do PSL. Trata-se da vertente mais ambiciosa do novo governo: a esperança é promover uma ruptura com a política externa do passado, consolidando a imagem do presidente como liderança internacional de destaque. Para isso, esse grupo buscará espaço para Bolsonaro no movimento transnacional antiglobalista encabeçado por Donald Trump. A escolha do chanceler Ernesto Araújo ilustra a força dessa vertente. 

O segundo grupo inclui os militares vinculados ao vice-presidente e ao ministro do gabinete de Segurança Institucional. Os generais Mourão e Heleno terão peso próprio nos rumos da política externa. É uma visão da diplomacia que bebe da geopolítica e, seguindo termos próprios, não se confunde com as preferências do primeiro grupo. Aqui, o foco está em questões de segurança, fronteiras, indústria de defesa e o papel internacional das Forças Armadas, além de um diálogo cada vez mais intenso com os investidores estrangeiros sedentos por acesso às privatizações que se aproximam.

Por fim, está a equipe econômica comandada por Paulo Guedes. Para esse grupo, a área externa é central na batalha para desmantelar o Estado desenvolvimentista que alimenta grupos rentistas em detrimento da maioria desorganizada dos cidadãos. O objetivo dessa turma é utilizar as Relações Exteriores para limitar a capacidade que esses grupos hoje têm de capturar a política externa em benefício próprio. Por esse motivo, esse pessoal tentará realocar a política de comércio exterior no novo Ministério da Economia.

Esses três grupos concordam em muita coisa, inclusive na necessidade de mudar a condução da política externa brasileira. No entanto, eles possuem interesses e visões de mundo diferentes. A diplomacia do novo governo expressará tais conflitos e será objeto de disputas.

Esse processo não ocorrerá num ambiente formalizado que permita ao presidente cotejar argumentos alternativos à luz de evidências e de embates explícitos. A regra do jogo é a informalidade. 

Além disso, o papel de cada grupo não é fixo, mas variável no tempo e por área temática. Dependerá da entrega de vitórias e de imagem positiva para o presidente. Dependerá, acima de tudo, da capacidade que cada um deles terá de impor custos ao chefe, limitando seu espaço de manobra.

Matias Spektor

Professor de relações internacionais na FGV

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