18 de abril de 2016 - 18:09
Só em 2015, banco vendeu por R$ 493 milhões créditos de
R$ 13 bilhões considerados de difícil recuperação; para analistas, repasse
acaba distorcendo os índices de inadimplência
Depois de ser usada pelo governo como locomotiva de
crédito para impulsionar a economia nos últimos anos, a Caixa Econômica Federal
recorreu à venda recorde de R$ 23 bilhões em “créditos podres” – débitos
considerados de difícil recuperação – desde 2014 para limpar o balanço da
instituição.
No ano passado, o banco estatal vendeu R$ 13,1 bilhões a
empresas especializadas na recuperação de dívidas, quase o triplo da soma das
operações do mesmo tipo feitas pelos três principais concorrentes – Banco do
Brasil vendeu R$ 3 bilhões, Itaú Unibanco, R$ 2,2 bilhões, e Bradesco não
efetuou esse tipo de negócio. Pelas transações feitas no ano passado, a Caixa
recebeu apenas R$ 439,3 milhões.
O Estado apurou que neste ano, em fevereiro, o banco
colocou à venda mais R$ 1,5 bilhão da carteira de empréstimos inadimplentes de
micro e pequenas empresas. Em 2014, a Caixa já tinha desovado R$ 8,3 bilhões em
créditos em atraso que estava carregando no balanço, ou mesmo já baixados para
prejuízo. Por essa venda, recebeu R$ 1,6 bilhão.
Depois de ser protagonista na expansão de crédito no
Brasil nos últimos anos, com crescimento da carteira até superior a 40% ao ano,
a Caixa passa por brusca desaceleração na concessão de empréstimos e
financiamentos. Fechou 2015 com aumento de 11,9%, ritmo bem menor do que os
22,4% de 2014 e os 36,8% de 2013.
Com a recessão prolongada, a inadimplência aumentou, o
que obrigou o banco a fazer provisões maiores para cobrir eventuais calotes. A
exigência diminuiu o lucro do banco, que não contará com novas injeções do
governo e depende de lucros retidos para reforçar o capital.
“A Caixa entrou numa série de linhas que nunca tinha
entrado antes, foi muito agressiva na oferta de crédito, viu a inadimplência
subir e não tem a expertise na recuperação de inadimplentes”, afirma Guilherme
Ferreira, da Jive, empresa de recuperação de dívidas.
O banco, seguindo recomendação do governo, seu
controlador, entrou nas operações de crédito a empresas. Também foi obrigado a
tocar o Minha Casa Melhor, linha de financiamento de até R$ 5 mil para compra
de móveis e eletrodomésticos para os beneficiários do Minha Casa Minha Vida. A
inadimplência do programa, rejeitado pela equipe técnica do banco, é de 35,2%,
enquanto a taxa de calotes de linhas similares oferecidas pela rede bancária é
de 10%.
Distorção. O banco de investimento JP Morgan disse, na
análise do balanço da Caixa de 2015, que a venda de carteiras “podres”
distorceu o índice de inadimplência do banco. O índice fechou o ano passado em
3,55%, acima dos 3,26% registrados em setembro. Pelos cálculos do JP Morgan, se
não fosse a venda de carteiras, o indicador teria sido de 3,89%.
Para especialistas do setor, a Caixa errou na forma como
tornou pública a operação, sem dar detalhes do impacto da venda de créditos que
ainda carregava no balanço do banco na taxa de inadimplência.
Do volume vendido no ano passado, 20% foram comprados
pela Ativos, que pertence ao Banco do Brasil. Das vendas de 2014, 87% foram
comprados pela Emgea, empresa pública criada pelo governo para absorver
prejuízos dos bancos oficiais com devedores.
Em nota, o banco afirmou que a cessão de carteiras “não
performadas ou de baixa possibilidade de recuperação” é uma boa prática de
gestão bancária utilizada por bancos no Brasil e no mundo. “Possibilita a renovação
dos ativos e a liberação de recursos para aplicação em novas operações”, disse.
A Caixa afirmou negociar com todas as empresas
especialistas em recuperação antes de fechar a venda. “A contribuição dessas
cessões para o resultado do banco é pequena e seu principal objetivo é renovar
os ativos e ganhar eficiência operacional, mantendo o foco da administração e o
uso do capital em operações de maior rentabilidade.”
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