O “bon vivant” do agreste
Carlos José Marques, diretor editorial, Istoé
Foi o amigo dileto, Emílio Odebrecht, que o ajuda desde
os idos de 70 com presentes, agrados e muita propina, quem assim o classificou:
“Lula é um bon vivant, não tem nada de esquerda, gosta de coisa boa!”. Mimos
como uma conta aberta em seu nome no valor de R$ 40 milhões, com saques à
disposição em dinheiro vivo na hora desejada, reformas de sítio, palestras
regiamente pagas em troca de vantagens, apartamento, jatinhos, terreno,
qualquer coisa. Era só o “chefe” mandar. Ou pedir. Ajuda meu filho, meu irmão,
meu compadre, meu partido. Valia a pena. No universo idílico que ronda Lula
tudo é fruto de uma benevolência extrema. Do toma-lá-da-cá. Dos favores. Nos
idos dos anos 80, o memorável “Senhor Diretas” Ulysses Guimarães já
diagnosticava com uma precisão cirúrgica: “o mau de Lula é que ele parece
gostar de viver de obséquios”. Os fatos teimaram em demonstrar. Estavam certos
Ulysses e o patriarca do grupo que agora faz a “delação do fim do mundo”. O
petista sempre deu sinais nesse sentido. Quando da primeira vitória nas
eleições presidenciais, lá foi ele comemorar com uma garrafa de vinho
Romanée-Conti, ao custo de US$ 5 mil (paga por outro amigo, naturalmente). Lula
jactava-se pelos ventos da sorte e pelas boas relações com os amigos. Não há
como negar: ele também é um fiel e generoso amigo. Ao menos dos ricos amigos,
numa convivência tão estreita como promíscua. Fez mais por eles que recebeu.
Não há dúvida. Foi capaz de prejudicar estatais e o povo que recolhe impostos
em prol dos negócios da empresa do amigo Emílio. Seguiu sempre a surrada máxima
“para os amigos, tudo!”. Com o patrimônio alheio – de cada um de nós,
brasileiros. Você bancou a farra. Mas isso é detalhe. Não seria da conta de
ninguém, é verdade, se o deplorável hábito de pedir tudo a todos ocorresse
estritamente na platitude das relações desinteressadas. Infelizmente não foi
bem assim. O que ele fez chama-se corrupção. Em benefício próprio e dos seus.
Com a quebra inexorável das finanças de um País. Está evidenciado. Lula
instaurou a corrupção como política de Estado. Em suas gestões, e na da
sucessora Dilma , os desvios ganharam conotação de praga endêmica,
institucionalizada e alastraram-se para cada departamento, autarquia ou
organismo federal. Às favas com os escrúpulos. Lula hoje diz que as acusações
são mentira. Só ele fala a verdade. Seria a história mais fabulosa do mundo um
conluio tão bem arquitetado de delatores, que contam em requintes de detalhes
as tramoias do grande líder, com o intuito exclusivo de condená-lo. Quem não se
condói de tamanha injustiça? Lula agora reclama das noites insones, temerário
de ser preso a qualquer momento. Os companheiros ideológicos desembarcam. O
marxista Noam Chomsky, admirador de primeira hora, reclamou do partido e do seu
criador que “simplesmente não pode manter as mãos fora da caixa
registradora…que está roubando o tempo todo”. A alternativa do retirante
nordestino que virou presidente – e acredita estar sendo penalizado por essa
condição – é reagir no grito. Insistir na nauseabunda mentira. Seus convictos
aliados – detentores de uma fé incondicional, que enxergam o homem quase como
uma divindade, a despeito de seus reincidentes pecados – convocam a militância
para armar um verdadeiro circo de protestos em frente à sede da Polícia
Federal, em Curitiba, onde no próximo dia 3 acontece o que já vem sendo chamado
como o “embate do século” entre o paladino da justiça, Sergio Moro, e o cacique
objeto da cega veneração. Os mais extremados abarrotam as redes sociais com
ameaças de “guerra civil”, num tom belicoso que extrapola para o crime, sem
receio de reprimendas. A lei, ora a lei, não vale para o grande comandante.
Quando você nasce como a alma mais honesta que existe, qualquer um precisa
respeitar. Ele está acima dos demais. Não podem pairar dúvidas sobre seus atos.
É preciso louvar a santidade. Ela não mente, não erra, não comete faltas.
Onipotente, onisciente, acima do bem e do mal, não pode ser alcançada pelas
infâmias da raia miúda, nem condenada pela justiça dos mortais. De forma
alguma. Por esse modo muito peculiar de visão dos fatos, Lula não pediu nada a
ninguém. Lula não levou propina. Não armou quadrilha de desvios. Muito menos
costurou esquemas que lesaram o Tesouro. Aquele sítio, com notas frias, ora
bolas, era do amigo. O tríplex, de outro amigo. O apê onde mora, também. Se de
2006 para cá uma empresa quis dar mais de R$ 10 bilhões, como confessou, em
propinas para Lula e sua turma do poder, o problema é dela. Se ganhou como
contrapartida grandes obras públicas, foi sorte. O Estádio do Corinthians,
sonho de mais de R$ 1 bilhão de Lula, era merecido. Maldosos, os brasileiros!
Há de se perguntar aos áulicos seguidores do petista se por acaso tiveram tempo
e o cuidado de ouvir os depoimentos dos delatores, gravados em áudio e vídeo e
mostrados a quem quisesse ver? Atentaram para o volume de informações, para a
avalanche de evidências e provas já colhidas? É esse o País que desejam para si
e para os seus, sob o julgo de um esquema de bandalheira sem fim? A ladroagem
ilimitada e a arrogância populista não podem virar exemplo. Destruiu
recentemente a Venezuela nas mãos do caudilho Hugo Chaves. Não podem se repetir
pela ambição desmedida do “bon vivant” Lula.
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