Bolsonaro aposta que outros farão a articulação política
por ele. Talvez não esteja tão errado assim
A dificuldade política do governo não está na falta de
diálogo ou habilidade. Se fosse só isso, e se o presidente reservasse para cada
parlamentar da potencial base uns 30 minutos, e se gastasse umas quatro horas
diárias na coisa, em menos de dois meses o problema estaria resolvido e a
reforma da previdência seria votada no primeiro semestre.
Restaria a questão da habilidade, mas Jair Bolsonaro sabe
ser boa praça quando precisa. O ponto é outro: os parlamentares, deputados
principalmente, não querem ajudar o governo a dar certo e depois serem
atropelados em suas bases na eleição de 2022 por bolsonaristas armados do
discurso da nova política e vitaminados pelos cargos federais.
Pois, no mentalmente entorpecido Brasil, deputados que
pressionam por poder são rotulados fisiológicos, enquanto as divisões do
bolsonarismo avançam como legiões romanas sobre os cargos federais. E os
conflitos internos entre os subgrupos deles são tratados respeitosamente pela
opinião pública como disputa entre ideológicos e pragmáticos.
Aí a palavra “fisiológico” não aparece. E ainda dizem que
o governo tem problemas de comunicação. Nessa operação de promover a ocupação
maciça da máquina enquanto os outros são acusados de fisiologismo o governo é
um sucesso absoluto de comunicação. Mas não existe almoço grátis e o Parlamento
está inquieto. Também pudera!
Os (e as) parlamentares sabem que cada novato no primeiro
e segundo escalão no Executivo é potencial candidato em 2022. Ainda mais se
tiver autoridade sobre dinheiro para prefeituras, que aliás têm eleição ano que
vem. Se Bolsonaro chega bem na reta final, estarão dadas as condições para o
bolsonarismo esmagar os atuais aliados na urna.
Em algum grau essa disputa é insolúvel, pois o
bolsonarismo também tem boas razões para tentar diminuir a força eleitoral dos
aliados. Depender muito de aliados na política não é bom. E Bolsonaro é produto
de uma demanda bonapartista, ou cesarista, não seria prudente ele
repentinamente vestir a roupa de conciliador e agregador.
Então não tem solução? Melhor ir com calma. O presidente
sabe: em condições razoavelmente normais de temperatura e pressão o Congresso
aprova alguma reforma da previdência. E isso vai injetar algum otimismo no
mercado e velocidade na política. Já se fala na reforma tributária. Mas, e o
risco de desidratar a previdenciária?
Bem, até agora “um trilhão de economia em dez anos” é
postulado, ou dogma, não questionado. Ninguém diz exatamente quanto será
economizado com cada medida. Sabe-se apenas a cota de sacrifício dos militares:
1% do total. O resto é mistério. E não é impossível o número final estar
subestimado, já prevendo a lipoaspiração.
Ou seja, o Planalto espera que o Congresso, especialmente
os presidentes das duas Casas, entregue a mercadoria para o ansioso mercado, em
nome do superior interesse nacional, enquanto as tropas bolsonaristas se ocupam
de tomar o Estado para a partir dele consolidar seu poder. E é exatamente isso
que o eleitor fiel de Bolsonaro espera dele.
Se vai dar certo? Os fatos dirão, mas a probabilidade é
razoável. Apesar dos resmungos localizados, o centro da agenda governamental, a
política econômica, mantém apoio maciço nos grupos sociais hegemônicos e na
opinião pública. E a Lava Jato continua à caça da velha política. E o
Judiciário está sob ataque. E as Forças Armadas estão coesas.
Claro que vai depender da execução. Mas não é tão difícil
assim. O governo precisará errar muito para não entregar nada. E se entregar
quase qualquer coisa isso será avaliado como avanço. O risco maior? A política
econômica não dar o resultado esperado no médio e longo prazos. Um “Efeito
Macri”. Mas isso, se é perfeitamente possível, ainda não está no radar.
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Alon Feuerwerker (+55 61 9 8161-9394)
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