Os Tribunais de Contas pairam alheios sobre as
dificuldades que afligem os demais órgãos públicos no País
Segundo dados do Banco Central e do Tesouro Nacional, a
maioria dos Estados passa por preocupante situação de desequilíbrio fiscal.
Sete dos entes federativos – Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rio Grande do
Norte, Minas Gerais, Roraima, Mato Grosso e Goiás – decretaram estado de
calamidade financeira. À frieza dos números oficiais junte-se a precariedade da
prestação de serviços públicos à população, em especial aos mais pobres, os
primeiros a sentirem os efeitos da crise, e está pintado o quadro adverso que
desafia a responsabilidade fiscal.
Na contramão da penúria, os Tribunais de Contas, que têm
por dever constitucional realizar a fiscalização contábil, financeira,
operacional, patrimonial e orçamentária da União, dos Estados e municípios,
pairam alheios sobre as dificuldades que afligem os demais órgãos públicos. São
ilhas de prosperidade em meio à crise fiscal que paralisa o País.
Violando a Constituição e uma decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF), as Cortes de Contas estaduais mantêm pagamentos e benefícios aos
conselheiros, auditores e procuradores dos órgãos – os chamados “penduricalhos”
–, o que faz com que os salários desses servidores ultrapassem o teto
constitucional de R$ 39,2 mil, correspondente ao salário dos ministros do STF.
São comuns os casos em que esses servidores ganham mais do que o presidente da
República, ministros dos Tribunais Superiores, deputados ou senadores.
Mas independentemente de ganhar mais ou menos do que
outro servidor, ainda que por si só seja um disparate um conselheiro de
Tribunal de Contas estadual ganhar mais do que alguém com responsabilidade
muito maior, como é o caso de um ministro do STF, a situação é inadmissível
porque se trata de um fragoroso desrespeito à Constituição.
Um levantamento feito pelo Estado encontrou exemplos de
“penduricalhos” criados por Tribunais de Contas que levam os salários dos
servidores desses órgãos para muito além do teto salarial do funcionalismo
público definido pela Lei Maior. No Tribunal de Contas de Mato Grosso, por
exemplo, um dos Estados que decretaram calamidade financeira, o desrespeito com
o contribuinte chega a ponto de se pagar um “vale livro” de R$ 71 mil por ano aos
conselheiros.
Os Tribunais de Contas do Distrito Federal e de Goiás,
outro Estado em calamidade financeira, incorporaram aos salários benefícios que
tinham natureza temporária, prática observada também em outros Tribunais de
Contas.
Até junho do ano passado, o Tribunal de Contas de Alagoas
ainda mantinha em vigor uma norma que proibia repasses de benefícios que
ultrapassassem o teto constitucional. Mas a norma foi derrubada e o texto
constitucional virou letra morta. Hoje, todos os conselheiros daquele tribunal
recebem acima do teto, de acordo com levantamento do Estado. O único que recebe
seus proventos até o limite definido pela Constituição é o conselheiro Cícero
Amélio da Silva, mas por um detalhe nada republicano: está afastado por ter
sido condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por falsidade ideológica
e prevaricação. Ou seja, fora do Tribunal de Contas de Alagoas, ele não tem,
por óbvio, como incorporar ao salário os “penduricalhos” que são normalmente
pagos aos conselheiros em atividade.
Os Tribunais de Contas dos Estados argumentam que as
gratificações se referem ao exercício de atividades “extras” e, portanto,
seriam legais. No entanto, as atividades “extras” são, na maioria dos casos,
correlatas à atividade principal de conselheiro dos Tribunais de Contas, como
as funções de corregedor ou ouvidor. A Lei Maior só permite aos conselheiros
acumular o cargo de professor para efeitos de remuneração adicional.
Os Tribunais de Contas dos Estados refletem o
patrimonialismo que remonta às nossas origens coloniais. Não raro, a composição
das Cortes é um desfile de sobrenomes conhecidos, indicados com base em
relações políticas e familiares. Apropriam-se deste naco do Estado e, em seus
domínios, vale a vontade de quem detém o poder.
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