Tucanos e petistas finalmente (e publicamente) juntos

Guilherme Baumhardt

    


Senhoras e senhores, estamos assistindo ao ocaso do Teatro das Tesouras, ao fim de uma falsa dualidade que durante décadas ludibriou o eleitorado brasileiro. E o começo do fim tem data, hora e local. No meio da tarde desta segunda-feira, dia 24 de outubro, no Rio Grande do Sul, o Partido dos Trabalhadores, em uma nota oficial, selou o destino que todos já imaginavam: “...decidimos recomendar o voto crítico em Eduardo Leite no domingo próximo (30/10), esperando com este gesto que todos(as) aqueles(as) comprometidos(as) com a Democracia, se unam para derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo neste segundo turno. Fazemos um chamamento, neste sentido, aos apoiadores da candidatura de Eduardo Leite. Entendemos que todos os democratas devem ter como compromisso primeiro a defesa da Democracia e o combate às candidaturas que representam o atraso bolsonarista”.


É isso. PT e PSDB estão juntos, finalmente, no mesmo barco. Ainda meio envergonhados, ainda meio sem jeito – a expressão “voto crítico” demonstra bem isso. Compreende-se. É assim em todo início de relacionamento. É como aquele casal de jovens namorados. O menino ainda não sabe se pode segurar a mão da menina, se pode convidá-la para jantar fora ou ir ao cinema. Claro, olhando pelas lentes dos nossos avós. Hoje as coisas são mais rápidas. Mas tucanos e petistas namoram à moda antiga – foram mais de três décadas de flerte! O que interessa é que, no final das contas, o casamento é apenas uma questão de tempo.


Este é mais um produto, mais um dos resultados do parto de uma direita no Brasil, que durante anos teve vergonha de mostrar a cara, de mostrar que existia, culpa de um fantasma chamado ditadura militar – que por aqui foi de direita, mas nada teve de liberal na economia, diferentemente do que ocorreu no Chile. A direita de hoje é legítima, é democrática, vence e perde disputas no voto, mostra seus resultados, comete erros e acertos. Mas fundamentalmente não tem vergonha de dizer o óbvio: sim, sou de direita, e daí?


Há um movimento muito maior por trás disso. E tem a ver com o amadurecimento político brasileiro. Como em todo parto, há dor, muita dor. Ou, no caso dos homens, só nos resta a comparação quando enfrentamos um cálculo renal, a famosa “pedra nos rins”. Nos Estados Unidos há direita e esquerda. Na Europa, também. No Reino Unido, trabalhistas e conservadores disputam o poder. Só não há concorrência em regimes hegemônicos e ditatoriais – os da atualidade, frise-se, são todos de esquerda, como Cuba, China, Coreia do Norte, Venezuela. O Brasil tem agora uma dualidade, que é saudável, porque dá as caras, deixa evidentes suas diferenças. Não há zona cinzenta.


Em um momento bola de cristal, arrisco alguns cenários. Independentemente do resultado da disputa pelo governo do Rio Grande do Sul, não se surpreendam se Eduardo Leite trocar de partido em um futuro próximo. Diante do derretimento do PSDB (elegeu apenas 13 deputados federais), o ninho tucano não tem mais forças para as pretensões dele, de um dia disputar a Presidência da República. Seria o PT o destino? Não sei dizer, não tenho hoje a resposta. A turma da estrela sempre foi muito refratária a quem vinha de outras siglas, mas isso pode mudar.


A partir de agora, quando você enxergar Leite, pense em Tarso Genro. Quando você enxergar Olívio, veja Eduardo Leite. Quando lembrar de Lula, recorde-se de Fernando Henrique Cardoso. Tenho um amigo cuja máxima é a seguinte: “A diferença entre ambos é que o PSDB é o PT que aprendeu a usar os talheres em um jantar de gala”. Brincadeiras de lado e com raras exceções, eles sempre estiveram juntos. Apenas disfarçavam isso muito bem.

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