O título original do editorial de hoje é "O caso Lula"
O ex-presidente Lula durante entrevista à Folha, na sede
da PF em Curitiba, em abril deste ano - Marlene Bergamo/Folhapress
Poucos assuntos têm se mostrado tão divisivos na
sociedade brasileira quanto a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
(PT). Embora existam vozes a defender equilíbrio diante do caso, são mais
volumosos os gritos dos que, à esquerda e à direita, cerram fileiras com o
radicalismo e mal escutam argumentos racionais.
O Direito, no entanto, não convive bem com polarizações
simplistas. A aplicação da lei a uma situação concreta se dá a partir de interpretações
sobre os fatos conhecidos e sobre as normas pertinentes.
Para espanto da lógica maniqueísta, desfechos opostos de
um julgamento podem ser ambos corretos, desde que tenham sido observadas as
regras jurídicas e respeitados os princípios legais.
Tome-se por essa perspectiva, e não sob a luz de paixões
irrefletidas, a decisão do Supremo Tribunal Federal de rejeitar nesta terça
(25), por 3 votos a 2, a proposta de soltura de Lula até que se examinasse o
questionamento da imparcialidade do ex-juiz Sergio Moro.
O caso se tornou mais complexo depois que o site The
Intercept Brasil divulgou o que seriam diálogos travados entre Moro e
procuradores da força-tarefa da Lava Jato.
As mensagens enviadas por fonte anônima ao Intercept,
depois analisadas também por esta Folha, de fato sugerem proximidade excessiva
entre juiz e acusador. Não poucos especialistas enxergaram ali sinais de que o
hoje ministro da Justiça chegou a aconselhar os procuradores, o que o tornaria
suspeito para julgar o processo.
Tal situação poderia justificar a aplicação de um
conhecido brocardo: “in dubio pro reo” (na dúvida, a favor do réu).
Contra esses levantam-se argumentos igualmente
respeitáveis. Em uma operação de longo prazo, essa proximidade seria natural.
Além disso, as conversas até aqui divulgadas não mostraram, de modo
inquestionável, condutas ilícitas de Moro ou dos procuradores.
Considere-se ainda que o ex-presidente foi condenado por
corrupção em três instâncias judiciais, que na essência só divergiram no
tamanho das penas aplicadas.
Por fim, e não menos importante, ainda não se atestou a
autenticidade das mensagens, que de resto talvez tenham sido obtidas de forma
criminosa. Da ilegalidade dessa prova decorreria sua inutilidade do ponto de
vista jurídico.
Sopesando esses aspectos, a Segunda Turma do STF optou
por manter Lula preso pela ausência de prova mais contundente a seu favor. Mas
não seria descabido o outro caminho possível, o de deixar o ex-presidente em
liberdade até que a imparcialidade de sua condenação seja inquestionável.
O caso bombástico continua em aberto e sujeito a novos
fatos. Que a Justiça se mantenha dentro das balizas formais ao examiná-lo.
Como se dizia - bem antigamente - aqui em Minas: tá “arrodiando” a roça de milho.
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