Exclusivo, Cláudia Woellner Pereira - Os entulhos da política brasileira

Cláudia Woellner Pereira é tradutora e redatora.

Três meninos brincam alegremente nos entulhos. O homem carrega vitorioso o violão de doze cordas que não soará mais na igreja. Duas mulheres levam um sofá estropiado num carrinho de mão. Outro sujeito levanta uma porta do monturo e diz que vai fazer uma mesa. As águas, ironicamente, arrancaram de uns e lançaram alguma possibilidade aos pés de outros. Sabe lá Deus se foi o otimismo ou a alienação o autor desses movimentos.

Não são só os otimistas, ou alienados, que circulam. Caminhões e escavadeiras. Carros de TV e Rádios farejam algum “furo”, como se o todo já não fosse uma enorme “bomba”. Rostos abatidos, olhares perdidos. A pergunta que ninguém transforma em grito, mas que é muito mais forte que o fôlego remanescente, está cravada em cada esquina. A normalidade vai encontrar o seu curso?

Cenário de guerra onde não houve sequer um estopim. Houve, sim. Nas urnas, quando os brasileiros transformaram o seu voto em moeda de troca. Nos gabinetes de vereadores, prefeitos, deputados, senadores, governadores, assessores, presidente, quando os seus ofícios descambam para o gozo de favores e campo de corrupção.  

Vamos responsabilizar as mudanças climáticas quando existem fatos antecedentes de ocorrência semelhante no mesmo espaço geográfico? Não é o que propõe o pensamento científico pós-moderno, o de usar o corpo de conhecimento produzido para benefício da humanidade? Não somos capazes de mapear as áreas de risco e, de forma inteligente, gerar políticas públicas de prevenção e proteção?

Quando estive em ruas de Canoas/RS com um grupo de voluntários para amenizar um pouco a dor daqueles que perderam tudo, o alvo da minha raiva não foi Deus, questionando onde Ele estava quando tudo isso aconteceu. Não foi o mundo capitalista que supostamente desequilibrou o clima. O alvo da minha indignação voltou-se para aqueles que têm a responsabilidade de desenvolver e executar planos diretores, de administrar o planejamento urbano e rural, de conhecer as áreas de risco de seus municípios e aplicar medidas de proteção.

Os meninos têm que seguir brincando alegremente. O violão precisa e deve ser tocado. O sofá tem que ser lugar de aconchego e tempo de família. Nunca, nunca em meio a entulhos gerados pelo descaso e a omissão.



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