Este artigo é do "Observatório para um Brasil Soberano"
Enquanto parte do país tenta entender as verdadeiras razões por trás da tarifa de 50 por cento imposta pelos Estados Unidos ao Brasil, um silêncio calculado se instala no centro financeiro do país. Não se trata de desconhecimento, tampouco de neutralidade. Trata-se de estratégia. A elite financeira nacional, em especial os setores mais influentes do mercado, optou por não tratar da crise institucional como variável relevante. E essa escolha diz muito.
O conteúdo da carta enviada pelo governo Trump foi explícito ao vincular a adoção das tarifas ao ambiente institucional brasileiro. A reação do empresariado, porém, tem sido fingir que se trata apenas de um problema comercial ou diplomático, como se bastasse contratar lobbies em Washington para contornar as sanções. Essa leitura ignora o essencial: o nó não está nos Estados Unidos, está aqui dentro.
A seletividade é reveladora. Quando se trata de questões fiscais, reformas tributárias ou regulação bancária, o mercado reage de imediato. Mas diante da quebra de garantias constitucionais, da criminalização seletiva da oposição ou da erosão do devido processo legal, a resposta é o silêncio. Esse vácuo não é ausência de posicionamento, é posicionamento calculado. Porque enquanto a crise atinge a estrutura democrática, ela não ameaça diretamente os fluxos financeiros que interessam aos grandes players.
O que se observa é a construção de uma falsa normalidade. Um cenário onde sanções internacionais são tratadas como ruídos temporários e a instabilidade institucional é administrada como se fosse uma variável de baixa prioridade. A ideia de que o Brasil ainda é um destino confiável para investimento se sustenta, em parte, por essa negação ativa da realidade. Mas é uma ilusão que cobrará seu preço, e ele já começou a aparecer nas métricas de risco, no comportamento cambial e no desempenho da B3.
Em mercados globais, reputação institucional conta tanto quanto fundamentos econômicos. A partir do momento em que o Brasil é percebido como um país que não oferece segurança jurídica ou previsibilidade regulatória, o capital internacional começa a reavaliar sua exposição. Não se trata de ideologia, mas de cálculo de risco. E ignorar essa variável não a elimina.
Países que atravessam longos ciclos de instabilidade institucional tendem a ver sua elite econômica capturada por um tipo específico de conformismo regulado: a ideia de que é possível manter margens, rendimentos e estabilidade contratual mesmo sem estabilidade constitucional. Mas não há blindagem que resista a esse tipo de erosão no longo prazo.
O episódio da anistia é simbólico. A proposta de restaurar direitos políticos e reequilibrar o sistema de pesos e contrapesos encontra enorme resistência. Já temas como fusões, privatizações e liberação regulatória avançam com relativa fluidez. A leitura que se impõe é simples: alguns assuntos só ganham tração se traduzidos em linguagem de mercado. Talvez por isso, enquanto se rejeita a palavra “anistia”, não se ousa criticar “BTG”. A omissão não é moral, é pragmática. Mas esse pragmatismo é perigoso. Ao normalizar o anormal, o mercado se torna cúmplice de uma instabilidade que, mais cedo ou mais tarde, afeta a todos. Inclusive aqueles que hoje acreditam estar blindados por planilhas, relatórios e retornos trimestrais
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