Artigo, Eduardo Karpat, Brazil Journal - Na nova era espacial, Alcântara pode mudar o jogo


Brasil e Estados Unidos assinaram semana passada um “Acordo de Salvaguardas Tecnológicas”, o primeiro passo em direção a uma colaboração par ao uso comercial da base de Alcântara.
Os dois países haviam assinado um acordo semelhante em 200, durante os governos FHC e Clinton, mas ele acabou sendo derrubado pela oposição no Congresso. Muita coisa mudou nos quase 20 anos entre os dois acordos, tanto na economia espacial como na política brasileira, que fazem com que este acordo seja muito mais promissor do que o primeiro.
Do lado espacial, os satélites estão cada vez menores e o custo de lançamento não para de cair (caíram quase dez vezes nos últimos dez anos, medido em $/Kg). Hoje um satélite do tamanho de uma caixa de sapatos pode custar menos de um milhão de dólares incluindo o lançamento.
Com os avanços tecnológicos e barateamento do acesso ao espaço, há um boom de startups sendo criadas para oferecer serviços que derivam de satélites.
Alguns exemplos desses serviços são o rastreamento de veículos e embarcações, observação de áreas de interesse (como fazendas, pipelines, países adversários), previsão do tempo, comunicação de pessoas e equipamentos (IoT) em áreas rurais ou remotas, e até comunicação entre os próprios satélites. Nos EUA, até estudantes de ginásio já enviaram satélites-cubo (cubesats) ao espaço a um custo total de US$ 90 MIL.
Com a corrida atual, consultorias especializadas estimam que o número de satélites operando pode pular de 1.900 hoje para 10 mil em 2030.
No ano passado, o setor puxou cerca de US$ 260 bilhões de receita na sua cadeia, crescendo 7% ao ano nos últimos cinco anos. A demanda para lançamento não falta. O grande gargalo é a oferta de lançamentos em si.
Apesar dos custos para lançar um foguete terem caído de centenas de milhões para dezenas – graças a fatores como reusabilidade e maior competição – os lançamentos ainda são esparsos e focados em atender os grandes satélites. Isso desencadeou uma nova onda de inovação para atender á classe emergente dos pequenos satélites.
De um lado, entraram na moda os “rideshares”, quando os pequenos satélites “pegam carona” com os grandes. De outro, se iniciou uma corrida entre as novas empresas de foguetes, muitas delas dedicadas ao mercado dos pequenos. A Vector Launch, empresa investida pela Lapa Capital é uma delas.
A oposição de Alcântara a apenas dois graus ao sul do Equador usa a rotação da Terra em seu favor, economizando combustível em até 30% e barateando em muito o custo do lançamento. O caso mais próximo é o da estação de Kouru, na Guiana Francesa, que fica em distância semelhante ao Equador (cinco graus). Considera-se que Kouru – sob jurisdição francesa e europeia – trouxe uma grande vantagem competitiva á empresa francesa Ariane, que lança seus foguetes de lá desde 1979 e concorre com as americanas ULA e SpaceX.
Por isso os Estados Unidos, cuja predominância na economia espacial é difícil de ignorar, nunca perderam o interesse, e voltaram á mesa de negociação a convite do governo Temer. Nos últimos dois anos, várias empresas de foguetes como SpaceX, Vector e ULA visitaram Alcântara. O CEO da Vector, Jim Cnatrell, um veterano do mercado espacial e um dos fundadores da SpaceX, disse que está animado com a abertura da base e interessado em lançar a partir de lá, citando a economia de combustível.
O governo brasileiro estima que pode faturar pelo menos R$ 150 milhões em taxas de lançamento ao ano, o que pode ajudar a desenterrar o programa espacial brasileiro. A ideia é assinar o mesmo acordo de salvaguardas com outros países.
O texto do novo acordo foi melhorado para evitar ambiguidades e dirimir receios sobre uma eventual perda de soberania nacional, o principal argumento usado pela oposição no Congresso brasileiro há quase 20 anos.
Além de se dizer “open for business” e de manter um alinhamento ideológico como o governo Trump, o governo Bolsonaro tem Marcos Pontes, o primeiro e único astronauta brasileiro, como Ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Ele integrou a comissão foi a Washington e assinou o documento.
Agora só falta o Congresso entender... e aprovar.

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