Artigo, Roberto Padovani - Fim do ciclo de ajustes

O Brasil deverá encerrar neste ano o longo ciclo de ajustes e reformas iniciado em 2016.


Depois de anos marcados por avanços em reformas e redução gradual do déficit público, tudo 

sugere que 2023 seja o início de um período de fraca agenda reformista e piora das contas 

públicas.

No que se refere às reformas, os anos de 2016 a 2021 foram atípicos no Congresso. A revisão 

ampla de regras não é o padrão legislativo, caracterizado por avanços marginais. A agenda de 

reformas foi explicada pela crise econômica e política de 2016, que fez a sociedade exigir 

respostas do Estado. Neste momento, no entanto, a superação das últimas recessões reduz a 

pressão por mudanças e faz com que a atividade parlamentar volte ao padrão. Em particular, 

parece pouco provável que versões amplas das reformas tributária e administrativa sejam

aprovadas.

No caso das contas públicas, é curioso que a despeito de todos os ruídos, o retrato de 2022 foi 

positivo e os indicadores do governo central, como despesa, receita, dívida bruta e resultados 

primário e nominal consolidaram a melhoria observada a partir de 2017.

De fato, apesar de todas as manobras para se contornar a regra do teto e ampliar o gasto em 

cerca de R$ 190 bilhões em um ano eleitoral, a tendência de queda da despesa do governo 

central como proporção do PIB foi preservada. De um nível próximo a 20% do PIB em 2016, os 

últimos dois anos mostraram valores ao redor de 18%. Desde 2017 há controle de salários e 

investimentos públicos, com a revisão da estrutura do Estado por meio da reforma da 

previdência, programas de concessão, privatização e devolução de recursos das estatais.

O comportamento das receitas também contribui para o bom desempenho fiscal. Além do 

crescimento econômico acima do esperado, os preços de energia subiram significativamente 

mais que o IPCA em boa parte do ano. Com isso, as receitas líquidas avançaram quase R$ 280 

bilhões e, como proporção do PIB, alcançaram patamares acima da média histórica.

Com despesas relativamente controladas e receitas em alta, o País confirmou a tendência de 

melhoria gradual do resultado primário do governo central e, depois de oito anos, voltou a 

apresentar um superávit de R$ 54 bilhões, equivalente a 0,5% do PIB. Este desempenho 

permitiu que a dívida bruta, após o salto para 87% do PIB em 2020, recuasse para o patamar 

de 74%, número bem melhor que o esperado pelos analistas.

Esta tendência recente das contas públicas, no entanto, deverá ser revertida a partir de agora. 

Com o esgotamento político da estratégia de ajuste fiscal, a demanda da sociedade por 

maiores gastos após a pandemia e a vitória nas eleições de uma visão que valoriza a presença 

do Estado na economia e na sociedade, a tendência dos próximos anos deverá ser de aumento 

de gastos. Para este ano, a expansão já anunciada deverá recolocar a despesa como proporção 

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PÚBLICO

do PIB no patamar de 19,5% do PIB. Este ambiente deverá influenciar o debate sobre regras 

fiscais e impactar o cenário para as contas públicas a partir de agora.

Da mesma forma, a desaceleração global, o aperto nas condições locais de crédito e a queda 

da inflação, principalmente nos preços de energia, devem fazer com que a receita como 

proporção do PIB reverta à média. Como resultado de mais despesas e menos receitas, o País 

deve voltar a apresentar um déficit primário do governo central da ordem de 1,0% do PIB, com 

a dívida bruta voltando para o patamar de 79% do PIB.

Mais importante, as incertezas em relação às regras fiscais e à agenda econômica dificultam a 

construção de cenários de estabilidade fiscal. A única certeza é que o desafio à frente é 

elevado. Enquanto a mediana das projeções coletadas pelo Banco Central indica a volta do 

superávit primário apenas a partir de 2028, a estabilização da dívida bruta ocorreria em 2031 e 

no elevado patamar de 92% do PIB.

O problema é que este quadro é muito sensível ao ambiente econômico. Sem um quadro de 

forte expansão global e com uma agenda econômica que leve a um equilíbrio 

macroeconômico marcado por menor crescimento, inflação mais alta e juros reais mais 

elevados, será difícil gerar superávits primários capazes de estabilizar a dívida pública.

Por último, vale lembrar que este cenário de perda de fôlego das reformas e de piora das 

contas públicas não deverá produzir impactos relevantes no curto prazo. A economia ainda 

está sendo favorecida pelas reformas trabalhista e da previdência, pela autonomia do Banco 

Central e por novos marcos regulatórios.

Isso não significa que não haja problemas. O fim do ciclo de ajustes tende a fazer com que a 

economia gradualmente volte a ficar vulnerável a choques e crie um círculo vicioso entre 

instabilidade e crescimento

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