A característica central dos processos e investigações
nesta era contemporânea de comunicação em tempo real é causar desgastes
políticos imediatos e irreversíveis em seus alvos. Não por outra razão,
inclusive no Direito Comparado, muitos preferem acordos em detrimento ao devido
processo legal, na medida em que o enfrentamento de um duro e longo embate nos
tribunais já é uma derrota de proporções gigantescas, em termos de imagem.
Causa espanto que diversos criminalistas, muitos com
larga experiência no trato com a mídia e os tribunais, rejeitem a possibilidade
de uma autonomia privada das partes em acordos criminais, mesmo sabendo das
agruras inerentes às investigações e aos processos. Um dos argumentos seria a
suposta injustiça do modelo norte-americano, o que costumam invocar sem
qualquer base estatística. Quem garante que há injustiças nos acordos
celebrados naquele país? Como aferir se há ou não uma arbitrariedade num
acordo?
O chamado "Direito Penal dos pobres", que
atinge majoritariamente os negros, os excluídos e os imigrantes nos Estados
Unidos, é decorrência de outros fatores associados à desigualdade.
Por certo, a criminalidade violenta nunca foi ligada
diretamente aos empresários, tampouco à elite do "colarinho-branco".
Não são estes que praticam latrocínios, roubos, furtos, e mesmo homicídios em
larga escala. Todavia, o sistema norte-americano é emblemático ao atingir o
andar de cima também e sobre isso ninguém fala. O combate à corrupção, à
sonegação fiscal, e aos ilícitos do colarinho-branco é duro não apenas nos EUA,
como também na Europa.
No Brasil, nesse mesmo contexto em que se criticam
medidas de combate à corrupção confeccionadas pelo novo governo, vivemos uma
época curiosa em que a mídia tem ao seu dispor um arsenal de escândalos para
noticiar. Pode-se agora abrir a caixa preta do BNDES, uma oportunidade única.
Há uma série interminável de problemas para decifrar a
partir de delações que estão vindo à tona. O governo eleito já demonstrou
disposição em enviar projetos anticorrupção consistentes ao Congresso e
precisará de articulação política para aprová-los.
Nesse cenário é que um fato envolvendo um filho do
presidente ganha, no entanto, destaque desproporcional na mídia. A distribuição
dos espaços dedicados aos eventos é objeto de escolhas discricionárias dos
veículos, e deve ser tomada em consideração como parâmetro para as estratégias
de cada um.
Ninguém está imune a críticas, e muito menos isento
de ser alvo de uma fiscalização. É de se registrar, todavia, que o senador
em questão não é membro do governo eleito, e tampouco candidato a presidir casa
legislativa alguma. Em comparação com outros personagens, o senador tem
recebido um tratamento intensivo dos meios de comunicação.
Flávio Bolsonaro sofre linchamento público na mídia como
se fosse postulante a cargo de alta relevância no governo. A meu ver, é vítima
de um erro do STF que, de modo vacilante, vem titubeando sobre a importante
garantia da prerrogativa de foro para os detentores de cargos públicos. Ou
seja, atualmente, permite-se que um senador, ou um ministro, sejam mesmo
investigados em primeira instância, ou instância diversa de seu foro natural.
Foi o que o STF chancelou ao decidir pelo esvaziamento
dessa prerrogativa, como se fora um privilégio, e não uma garantia inerente ao
cargo. Um erro jurídico e político que talvez o plenário devesse corrigir. Pela
orientação vigente, será mesmo possível que ministros, deputados federais e
senadores sejam investigados e até processados por autoridades de primeira
instância.
Fábio Medina Osório é advogado e ex-ministro da
Advocacia-Geral da União
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