Quem disse que ter noções de Direito é exclusividade de bacharéis? Oh, não! Há
conceitos e valores que todo e qualquer cidadão responsável deveria cultivar. E
não precisa incorrer no "juspedantismo", aquela língua estranha dos
operadores do Direito. Vejamos em casos concretos
São dois. No primeiro, uma senhora, que morava perto da linha do trem, chamou
um marceneiro para prestar um serviço. "Quando o trem passa", disse
ela ao artífice, "o meu roupeiro faz um barulho muito estranho, chega a
dar medo."
Depois de examinar o móvel, ele propôs: "Vou entrar no roupeiro e, quando
o trem passar, verei por dentro o que ocorre." E assim fez.
Aos poucos minutos, antes do trem, chegou o marido da senhora, que, por acaso,
foi logo abrindo o roupeiro.
"Ah, meu amigo", disse o marceneiro, "se eu lhe disser que estou
aqui esperando o trem, o senhor não vai acreditar!" E se lamentou:
"Como poderei eu provar a verdade?"
Pois é. Às vezes, o que parece só parece, mas não é. Eis por que a Constituição
Federal é pressurosa ao garantir aos litigantes e aos acusados em geral "o
contraditório e ampla defesa": liberdade para apresentar provas e um
terceiro imparcial para julgar.
No
segundo caso, o marido foi advertido de que a patroa todo dia recebia uma
visita de calças, chapéu e bigode. E decidiu dar uma incerta, voltando para
casa em hora inesperada - indo direto ao roupeiro.
Ali, entre vestidos e blusas da mulher, ele encontrou uma figura de calças,
chapéu e bigode. Mas os suspeitos logo passaram a negar tudo!
Acontece que, além do flagrante, houve o testemunho das vizinhas e vários
vídeos gravados no celular, com entradas e saídas do gabiru. E a empregada
(cúmplice da patroa) bateu com a língua nos dentes, tipo assim, delação
premiada...
Agora, se o sujeito de calças, chapéu e bigode falasse que ali estava a esperar
o trem, faria sentido? Bem, não é de duvidar que os partidários dos envolvidos
adotassem essa versão.
Pois é. Embora aqueles dois não tenham sido apanhados em "atos
reprováveis", nesse caso as suspeitas foram confirmadas e poderão ser
alegadas se houver litígio entre as partes. O fundamento jurídico é este:
"várias circunstâncias formam um indício, e vários indícios formam uma
prova", é a Teoria das Provas.
Lembram o caso do goleiro Bruno? O cadáver de Eliza Samudio nunca apareceu. E
não existem imagens do crime. Mesmo assim, houve elementos consistentes para a
condenação dos criminosos.
Haveremos de evocar esse fundamento, quando, por exemplo, artistas teleguiados
usarem a condição de celebridade para propagar que determinado líder político
foi condenado sem provas, só porque o fulano jamais passou recibo das vantagens
indevidas que recebeu de nossos gentis empreiteiros...
- Renato Sant'Ana é psicólogo e advogado.
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