Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL
DA 4ª REGIÃO
EMBARGOS
INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 5008766-51.2014.4.04.7102/RS
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL
LEANDRO PAULSEN
EMBARGANTE: RUBEM HÖHER
EMBARGANTE: LUIZ CARLOS DE PELLEGRINI
EMBARGANTE: FERNANDO FERNANDES
EMBARGANTE: ROSANA CRISTINA FERST
EMBARGANTE: CARLOS DAHLEM DA ROSA
EMBARGANTE: PAULO JORGE SARKIS
EMBARGANTE: JOSE ANTONIO FERNANDES
EMBARGANTE: HELVIO DEBUS OLIVEIRA
SOUZA
EMBARGANTE: SILVESTRE SELHORST
EMBARGANTE: DARIO TREVISAN DE ALMEIDA
EMBARGANTE: LUIZ PAULO ROSEK GERMANO
EMBARGANTE: FLAVIO ROBERTO LUIZ VAZ
NETTO
EMBARGANTE: ROSMARI GREFF AVILA DA
SILVEIRA
EMBARGANTE: FERDINANDO FRANCISCO
FERNANDES
EMBARGANTE: ALFREDO PINTO TELLES
EMBARGANTE: EDUARDO WEGNER VARGAS
EMBARGANTE: PATRICIA JONARA BADO DOS
SANTOS
EMBARGANTE: DENISE NACHTIGALL LUZ
EMBARGANTE: MARCO AURELIO DA ROSA
TREVIZANI
EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
VOTO
Sumário: 1. Caso dos autos.
1.1. A primeira fase do esquema criminoso. 1.2. A segunda fase do esquema
criminoso. 1.3. Núcleos estatais e privados. 1.4. Sentença. 1.5.
Apelações. 2. Dos crimes sobre os quais há divergência. 2.1.
Peculato-desvio: art. 312 do CP. 2.2. Corrupção passiva: art. 317 do CP. 2.3.
Corrupção ativa: art. 333 do CP. 2.4. Dispensa indevida de licitação e
beneficiar-se de dispensa indevida de licitação: arts. 89, caput e parágrafo
único, da Lei nº 8.666/93. 3. Da tipicidade das condutas, da
especialidade e da consunção. 4. Embargos infringentes contra o
voto médio do Des. Márcio, para que prevaleça o voto do Des. Sebastião.
4.1. José Antônio Fernandes, Ferdinando Francisco Fernandes e Fernando
Fernandes. 4.2. Alfredo Pinto Telles. 4.3. Carlos Dahlem da Rosa. 5.
Embargos infringentes contra o voto médio do Des. Sebastião, para que prevaleça
o voto do Des. Márcio. 5.1. Rosmari Gerff Ávila da Silveira. 5.2.
Rosana Cristina Ferst. 5.3. Denise Nachtigall Luz. 5.4. Dario Trevisan de
Almeida. 5.5. Silvestre Selhorst. 5.6. Luiz Carlos de Pellegrini. 5.7. Flávio
Roberto Luiz Vaz Netto. 6. Embargos infringentes contra o voto médio da
Des. Cláudia, para que prevaleça o voto do Des. Márcio. 6.1. Patrícia
Jonara Bado dos Santos. 6.2. Hélvio Debus Oliveira Souza. 6.3. Luiz Paulo Rosek
Germano. 6.4. Paulo Jorge Sarkis. 6.5. Eduardo Wegner Vargas. 6.6. Marco
Aurélio da Rosa Trevizani. 7. Conclusão. 7.1. Ferdinando
Francisco Fernandes. 7.2. Fernando Fernandes. 7.3. José Antônio Fernandes. 7.4.
Alfredo Pinto Telles. 7.5. Carlos Dahlem da Rosa. 7.6. Rosmari Greff Ávila da
Silveira. 7.7. Rosana Cristina Ferst. 7.8. Denise Nachtigall Luz. 7.9. Dario
Trevisan de Almeida. 7.10. Silvestre Selhorst. 7.11. Luiz Carlos de Pellegrini.
7.12. Flávio Roberto Luiz Vaz Netto. 7.13. Patrícia Jonara Bado dos Santos.
7.14. Helvio Debus Oliveira Souza. 7.15. Luiz Paulo Rosek Germano. 7.16. Paulo
Jorge Sarkis. 7.17. Eduardo Wegner Vargas. 7.18. Marco Aurélio Trevizani. 7.19.
Resultado final. 8. Dispositivo.
O Senhor
Desembargador Leandro Paulsen: 1. Caso dos autos:
Trata-se de embargos infringentes e de nulidade opostos por ROSMARI GREFF ÁVILA
DA SILVEIRA, ALFREDO PINTO TELLES, ROSANA CRISTINA FERST, CARLOS DAHLEM DA
ROSA, PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS, DENISE NACHTIGALL LUZ, DARIO TREVISAN DE
ALMEIDA, HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA SOUZA, LUIZ PAULO ROSEK GERMANO, SILVESTRE
SELHORST, PAULO JORGE SARKIS, JOSÉ ANTONIO FERNANDES, FERDINANDO FRANCISCO
FERNANDES, FERNANDO FERNANDES, LUIZ CAROS DE PELEGRINI, EDUARDO WEGNER VARGAS,
FLÁVIO ROBERTO LUIZ VAZ NETTO e MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI, em face de
acórdão da 7ª Turma, que deu parcial provimento às suas apelações interpostas
contra sentença que julgou parcialmente procedentes as imputações derivadas da
denominada OPERAÇÃO RODIN. Essa operação teve por objeto a apuração de esquema
de desvio de recursos públicos, na ordem de R$ 44.000.000,00 (quarenta e
quatro milhões de reais), a partir de dispensas ilegais de licitação na
contratação, pelo DETRAN/RS, de fundações de apoio (FATEC e FUNDAE), ligadas à
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), para a realização de exames teórico
e prático de direção veicular, com vista à emissão da Carteira Nacional de
Habilitação (CNH), no período de 2003 a 2007, com a subcontratação de empresas
privadas, distribuição de propinas e apropriação do produto dos
crimes.
Narra o Ministério
Público Federal que a empreitada criminosa teria se desdobrado em pelo menos
duas fases.
1.1. A primeira
fase do esquema criminoso teria se iniciado quando, em meados de 2003,
a Família FERNANDES, capitaneada por José Antônio Fernandes, uniu-se a Lair
Fest (empresário lobista), a Paulo Jorge Sarkis (então reitor da UFSM) e a
Dario Trevisan de Almeida (Presidente da COPERVS, professor universitário). Até
o ano de 2003, o DETRAN/RS mantinha contrato com a Fundação Getúlio Vargas
(FGV) para prestação de serviços de "exames práticos e teóricos de direção
veicular". Após realizada a avença, Sarkis e Dario teriam praticado atos administrativos
necessários a que a UFSM pudesse dar suporte e participar da contratação da
FATEC pelo DETRAN para a realização dos citados exames. Posteriormente, os
integrantes da Família Fernandes, juntamente com Lair Fest e Paulo Jorge
Sarkis, prometeram vantagem indevida a Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio
Gomes Júnior (então diretores do DETRAN/RS) para obterem êxito na contratação,
pelo DETRAN/RS, da UFSM (por meio da FATEC), para execução das atividades de
aplicação de Exames Práticos de Direção Veicular (EPDV) e Exames Teóricos de
Direção Veicular (EDTV). Desse modo, em julho de 2003, o DETRAN/RS contratou a
Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência – FATEC, por meio de dispensa de
licitação - justificada falsamente na emergencialidade da situação -, a qual utilizou-se
de recursos físicos, tecnológicos e humanos da UFSM, restando viabilizada a
atuação de Dario Trevisan de Almeida e Rosmari Greff Ávila da Silveira, ambos
integrantes do quadro funcional da UFSM.
Esgotado o prazo
para a contratação emergencial, de 180 (cento e oitenta) dias, foi firmado novo
contrato entre o DETRAN e a FATEC, também com dispensa de licitação, desta vez
amparada no art. 24, XIII da Lei 8.666, que a possibilita quando em favor de
instituição brasileira incumbida regimental e estatutariamente da pesquisa, do
ensino, ou do desenvolvimento institucional. Ato contínuo, a FATEC subcontratou
quatro empresas, denominadas SISTEMISTAS, às quais coube o recebimento do
percentual de 40% dos valores brutos obtidos do DETRAN/RS como contraprestação
pelas atividades e serviços contratados. Assim, foram contratadas as empresas
PENSANT CONSULTORES LTDA., NEWMARK TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO, LOGÍSTICA E
MARKETING LTDA, RIO DEL SUR – AUDITORIA E CONSULTORIA LTDA e a sociedade de
advogados CARLOS ROSA ADVOGADOS S/A.
A despeito da
contratação das sistemistas para execução do contrato, sua efetiva operação
teria sido atribuída à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), instituição
com estrutura para suportar adequadamente o objeto do contrato. Para isso, a
FATEC teria contratado a UFSM para, por intermédio de um projeto institucional,
vinculado à Reitoria, fornecer o suporte necessário à realização de atividades
que o DETRAN havia exigido na contratação.
Assim, as empresas
sistemistas teriam uma expressiva participação nos recursos vinculados à
contratação em questão (entre 2003 e 2006 receberam, em conjunto, R$ 31
milhões), enquanto a UFSM teria tido gastos, entre 1/2005 e 12/2008, da ordem
de R$ 953.664,00 para desenvolver o projeto (valor extremamente menor que os
percebidos pelas quatro sistemistas). Tais empresas somente teriam sido
contratadas pela FATEC para alimentar um esquema de pagamentos aos lobistas
(família Fernandes e Lair Ferst) e, ainda, de propinas (pela via do escritório
de advocacia com vínculos com o então presidente do DETRAN, Carlos Ubiratan, e
ainda por triangulação de valores que passavam por empresa sistemista).
A PENSANT teria
obtido 10% do valor do contrato da autarquia federal com a fundação, sendo por
essa subcontratada para exercer atividades de supervisão e gerência do
contrato. Esse percentual teria se destinado ao pagamento de José Fernandes e
seus familiares (Ferdinando Francisco Fernandes, Denise Nachtigall Luz,
Fernando Fernandes, Francene Fabrícia Fernandes e Lenir Beatriz da Luz
Fernandes), aos sócios do grupo, bem como a vantagens indevidas a integrantes
do quadro funcional da UFSM. A participação da RIO DEL SUR AUDITORIA E
CONSULTORIA correspondeu a 10%, sendo que o destino dos valores pagos à empresa
teria sido, precipuamente, à remuneração indevida do acusado Lair Fest e de
seus familiares (Alfredo Pinto Telles, Elci Teresinha Ferst, Rosana Cristina
Ferst e Cenira Maria Ferst Ferreira), Por sua vez, à sistemista NEWMARK
TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO, também controlada por Lair Ferst, coube o percentual
de 14% do valor do contrato, tendo parte dos recursos sido usado para o
pagamento de propina aos dirigentes do DETRAN/RS, Carlos Ubiratan dos Santos e
Hermínio Gomes Júnior, que, posteriormente, criaram uma empresa de fachada cada
um, ambas contratadas pela Newmark para suposta prestação de serviços. Carlos
Ubiratan, juntamente com a sua esposa Patrícia Jonara Bado dos Santos, com a
participação de Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, criou a empresa
NILZA TEREZINHA PROCESSAMENTO DE DADOS ME, posteriormente denominada, NT
PEREIRA, que foi administrada por Patrícia, valendo-se de Nilza Terezinha
Pereira (amiga da família). Hermínio, por sua vez, constituiu, também com a
participação de Lair Ferst e Marco Aurélio, a empresa PEDRO LUÍS SARAIVA DE
AZEVEDO ME, posteriormente denominada PLS AZEVEDO, de titularidade formal do
seu cunhado Pedro Luís Saraiva de Azevedo.
Ao longo dos três
anos de contratação da FATEC pelo DETRAN, outras empresas, vinculadas às mesmas
pessoas, teriam sido inseridas no esquema, supostamente por força de novas
exigências de vantagens indevidas formuladas por José Antônio Fernandes junto à
FATEC e ao coordenador do projeto DETRAN na UFSM, Dario Trevisan de Almeida. O
percentual originariamente destinado aos subcontratados, na ordem de 40%,
assim, teria sido gradualmente ampliado, com o que a parcela destinada à
efetiva operacionalização do contrato restou reduzida, dificultando a efetiva
prestação dos serviços.
Em meados de 2005,
teriam ocorrido divergências no grupo, em face da suposta inoperância das
empresas vinculadas à Lair Ferst na prestação dos serviços, pelo que a Família
Fernandes deu início à represálias contra o citado réu, que não foi excluído do
esquema apenas em razão de "cláusulas contratuais restritivas e de
sua amizade com Carlos Ubiratan dos Santos" (que o protegeriam e
teria interesse na formatação original, na condição de beneficiário dos
recursos desviados), originando, assim, a segunda fase do esquema.
1.2. A segunda
fase da empreitada criminosa ocorreu a partir do início do ano de
2007, com a saída de Carlos Ubiratan dos Santos da condição de
Diretor-Presidente do DETRAN e a assunção de Flávio Vaz Netto no posto máximo
da autarquia, por indicação de José Otávio Germano à governadora Yeda Crusius.
Relata o Parquet que
a Família Fernandes estava preparando a Fundação Educacional e Cultural para o
Desenvolvimento da Educação e Cultura - FUNDAE, juntamente com Paulo Jorge
Sarkis, para ser a intermediária dos contratos públicos. Com a assunção da
Direção do DETRAN/RS por Flávio Vaz Netto, José Antônio Fernandes e seus
familiares (especialmente Ferdinando Francisco Fernandes, Fernando Fernandes e
Denise Nachtigall Luz), bem como Luiz Paulo Rosek Germano e Carlos Dahlem da
Rosa teriam mantido contato com ele no intuito de indicar a necessidade de
excluir do contrato as empresas vinculadas a Lari Ferst: Rio Del Sur e a
Newmark Tecnologia da Informação, Logística e Marketin Ltda. Não havendo
possibilidade de rescisão do contrato entre tais empresas e a FATEC, a opção
teria sido a de romper o contrato originário, firmado entre o DETRAN e a FATEC.
A FATEC argumentou, perante o DETRAN, ter havido aumento no custo para
prestação dos serviços, postulando então aumento da remuneração, a qual foi
indeferida por "falta de fundamentação". Ato contínuo, o contrato foi
encerrado e, já no dia seguinte foi contratada a outra Fundação de Apoio à
Universidade Federal de Santa Maria, qual seja a FUNDAE, que supostamente
poderia prestar o serviço por preço menor, por se tratar de entidade
filantrópica. Para obter tal intento, inicialmente teriam sido corrompidos os
servidores públicos Dario Trevisan de Almeida e Luis Carlos de Pelegrini
(integrantes do quadro funcional da UFSM). Foi composto novo quadro de SISTEMISTAS:
PENSANT CONSULTORES LTDA., IGPL, NACHTIGALL LUZ ADVOGADOS ASSOCIADOS, GETPLAN,
S3 CONTABILIDADE CONSULTORIA E ASSESSORIA e DOCTUS CONSULTORES, esta integrada
por Rubem Höher.
Em 2007, a FATEC
contratou os serviços de HÖHER E CIOCCARI ADVOGADOS S/S e da PAKT EXCELÊNCIA EM
PROJETOS S/S. Esta teria, por efetivo administrador, responsável gerencial e
sócio o réu Dario Trevisan de Almeida (servidor público federal – UFSM).
1.3. O esquema
teria se valido de um forte planejamento jurídico e contábil para conferir
legalidade às operações, bem da entabulação de contatos políticos e veiculação
de imagem positiva na imprensa (v.g. com programas assistenciais,
contatos com entidades eclesiásticas, etc). Teria havido preocupação com
eventuais investigações, de modo que as conversações seriam em código. Tudo
denotaria alto nível de organização, destinado a conferir aparência de
legalidade ao esquema, estruturado em diversos núcleos estatais e
privados, quais sejam:
1) Núcleo Família Fernandes
(Pensant), supostamente encabeçado por José Antônio Fernandes, que
teria controlado o esquema, encetando as negociações iniciais (juntamente com
dirigentes da UFSM e, muitas vezes, falando em nome da instituição), ultimado a
partilha dos recursos obtidos por meios espúrios para formação da propina a
agentes públicos e políticos e para desvio do dinheiro público em benefício do
enriquecimento ilícito. Teria aproximando a UFSM dos dirigentes
do DETRAN e beneficiado-se do esquema mediante empresas como
a PENSANT (subcontratadas);
2) Núcleo Lair Ferst,
supostamente encabeçado por Lair Antônio Ferst que, dada sua inserção e
trânsito junto ao poder público, teria atuado no lobby em favor da UFSM
e FATEC perante os dirigentes do DETRAN/RS, a fim de obter o
contrato. Ter-se-ia beneficiado por meio de empresas constituídas por seus
familiares (subcontratadas), bem como efetivado pagamento de propina aos
dirigentes do DETRAN/RS, Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio Gomes Jr., por
intermédio de repasses a empresas titularizadas por "laranjas";
3) Núcleo Carlos Rosa,
supostamente integrado por Carlos Dahlem da Rosa e Luiz Paulo Rosek Germano,
que seriam responsáveis por suposta consultoria jurídica no âmbito do contrato
DETRAN/FATEC, sendo que pelo escritório de advocacia respectivo receberiam remuneração
superfaturada, destinada a distribuir propina aos dirigentes
do DETRAN e a José Otávio Germano, além de gerar o próprio
enriquecimento ilícito. José Otávio Germano e Carlos Rosa teriam participado de
"toda a negociata prévia à assinatura desses contratos", sendo que ao
seu lado, no oferecimento de vantagem indevida a Flávio Vaz Netto, estaria Luiz
Paulo, irmão de José Otávio Germano e amigo de Flávio Vaz Netto, controlando,
ao lado deste, a distribuição do dinheiro da propina, por intermédio do "laranja"
Carlos Rosa;
4) Núcleo UFSM, que seria
integrado por Paulo Jorge Sarkis, Dario Trevisan de Almeida e Rosmari Greff
Ávila da Silveira, servidores públicos federais da instituição. Paulo Jorge
Sarkis, então reitor da UFSM, teria agido em conjunto com a FATEC,
notadamente autorizando a utilização da estrutura física da universidade pela
fundação, além de designar os servidores Dario e Rosmari para execução do
Projeto Trabalhando pela Vida;
5) Núcleo Pakt, integrado
por Luciana Balconi Carneiro e os demais sócios da empresa de mesmo nome, que
inicialmente eram empregados da FATEC, subordinados a Dario, tendo sido
por este instigados a constituir a empresa para justificar custos e, ainda,
viabilizar o pagamento de propina e enriquecimento sem causa dos envolvidos;
6) Núcleo Detran,
estabelecido no âmbito da autarquia estadual. Na primeira fase, teria como
integrantes Carlos Ubiratan dos Santos, Patrícia Jonara Bado dos Santos, Nilza
Terezinha Pereira, Hermínio Gomes Júnior, Pedro Luis Saraiva Azevedo, Alexandre
Dornelles Barrios e Gilson Araújo de Araújo. Carlos Ubiratan teria atuado no
sentido de dispensar indevidamente a licitação nas duas primeiras oportunidades
(junho e dezembro de 2003), como diretor-presidente do Detran, para contratar
a FATEC e, juntamente com sua esposa, Patrícia Jonara, e com a
participação de Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, teriam criado a
empresa de fachada NT Pereira (com auxílio de sua titular, Nilza Terezinha
Pereira), destinada a distribuir propina ao casal. Hermínio Gomes Júnior, então
diretor administrativo-financeiro do DETRAN, teria atuado na execução dos
contratos, autorizando o pagamento das faturas emitidas
pela FATEC antes mesmo de seu prazo final, tendo recebido como
contrapartida vantagens financeiras por intermédio da empresa de fachada PLS
Azevedo (constituída com auxílio de seu cunhado, Pedro Luís Saraiva Azevedo),
com a participação de Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani. Alexandre
Barrios seria responsável pela emissão de pareceres, no DETRAN, nos termos
solicitados pelos dirigentes. Gilson Araújo de Araújo teria posição
estratégica, de modo que, após corrompido pelos integrantes da família
Fernandes, teria passado a agir conjuntamente com os mesmos, tendo as funções
de ser elo de ligação daquela família com as diretorias do DETRAN/RS e,a
inda, por ter vínculo com a Associação Nacional dos DETRANS, auxilia-la na
apresentação do esquema a outros DETRANS. Na segunda fase, passaria a
integrar o núcleo o demandado José Otávio Germano, que teria atuado na
coordenação de Flávio Roberto Luiz Vaz Netto (o novo diretor-presidente
do DETRAN) e Antônio Dornéu Cardoso Maciel, no sentido do rompimento do
contrato com a FATEC e contratação da FUNDAE;
7) Núcleo Fundacional,
que teria como componentes Luiz Carlos de Pelegrini, Rubem Höher,
Silvestre Selhorst e Helvio Debus Oliveira Souza. (Relatório da Sentença
na Ação de Improbidade Administrativa nº 50096972520124047102)
A pretensão
punitiva estatal prosseguiu contra 32 (trinta e dois) dos originalmente 44
(quarenta e quatro) acusados na seguinte forma:
Fato 1
|
art.
288 do CP
|
Quadrilha
ou bando
|
Fatos 2
a 4
|
art.
89, caput, da Lei 8.666/93
|
Dispensa
indevida de licitação
|
Fatos 5
a 7
|
art.
89, parágrafo único, da Lei 8.666/93 + art. 29 do Código Penal
|
Beneficiar-se
da dispensa indevida de licitação em concurso de pessoas
|
Fatos 8
e 9
|
art.
312, caput, do Código Penal
|
Peculato-desvio
|
Fato 10
|
art.
316 do Código Penal
|
Concussão
|
Fatos
11 a 15
|
art.
333 do Código Penal
|
Corrupção
ativa
|
Fato 16
|
art.
158, §1º, do Código Penal
|
Extorsão
|
Fatos
17 a 21
|
art.
317, §1º, do Código Penal
|
Corrupção
passiva
|
Fatos
22 a 29
|
art.
299 do Código Penal
|
Falsidade
ideológica
|
Fato 30
|
art.
305, caput, do Código Penal
|
Supressão
de documentos
|
1. 'NÚCLEO FAMÍLIA FERNANDES': JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES, pelos Fatos
1, 5 a 9, 11 a 15; FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES, pelos Fatos 1,5 a 9, 11 a
15; FERNANDO FERNANDES, pelos Fatos 1, 5 a 9 e 11 a 15; DENISE NACHTIGALL LUZ,
pelos Fatos 1 e 7 a 9; LENIR BEATRIZ DA L. FERNANDES, pelos Fatos 1 e 5 a 9;
EDUARDO WEGNER VARGAS, pelos Fatos 1 e 9;
2. 'NÚCLEO LAIR FERST': LAIR ANTÔNIO FERST, pelos Fatos 1,
5, 6, 9, 11, 12, 16, 22 a 26; ALFREDO PINTO TELLES, pelos Fatos 1, 5, 6, 8, 22,
23, 25; ROSANA CRISTINA FERST, pelos Fatos 1, 5, 6, 8, 24 e 25; ELCI TEREZINHA
FERST, pelos Fatos 1, 5, 8, 22, 24 e 25; CENIRA MARIA FERST FERREIRA, pelos
Fatos 24 e 25; MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI, pelos Fatos 1, 8, 25 a 27;
EDUARDO REDLICH JOÃO, pelos Fatos 1, 8 e 25; FRANCISCO JOSÉ DE OLIVEIRA FRAGA
(na condição de colaborador eventual), pelo Fato 16;
3. 'NÚCLEO DETRAN/RS': 3.1 - PRIMEIRA FASE (FATEC):
CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS, pelos Fatos 1 a 3, 8, 18, 25 e 26; HERMÍNIO GOMES
JÚNIOR, pelos Fatos 1 a 3, 8, 18, 25 e 27; PATRÍCIA JONARA DOS SANTOS, pelos
Fatos 1, 6, 8, 25 e 26; NILZA TEREZINHA PEREIRA, pelos Fatos 1, 6, 8, 25 e 26;
PEDRO LUIZ SARAIVA AZEVEDO, pelos Fatos 1, 6, 8, 23, 25 e 27; ALEXANDRE
DORNELLES BARRIOS, pelos Fatos 1 a 3 e 26; GILSON ARAÚJO DE ARAÚJO, pelos Fatos
1, 21 e 29; 3.2 - SEGUNDA FASE (FUNDAE): FLÁVIO ROBERTO LUIZ VAZ
NETTO, pelos Fatos 1, 4, 9, 10 e 20;
4. 'NÚCLEO CARLOS ROSA': CARLOS DAHLEM ROSA, pelos Fatos 1,
5 a 9, 12 e 14; LUIZ PAULO ROSEK GERMANO, pelos Fatos, 1, 7, 9 e 14;
5. 'NÚCLEO UFSM': PAULO JORGE SARKIS, pelos Fatos 1,
5 a 9, 12 e 17; DARIO TREVISAN DE ALMEIDA, pelos Fatos 1, 5 a 9, 14, 17, 19 e
28; ROSMARI GREFF AVILA DA SILVEIRA, pelos Fatos 1, 8, 9 e 30;
6. 'NÚCLEO FUNDACIONAL': LUIZ CARLOS DE PELLEGRINI, pelos
Fatos 1, 7 a 9 e 19; RUBEM HOHER, pelos Fatos 1, 8, 9, 13 e 20; SILVESTRE
SELHORST, pelos Fatos 1, 5 a 9, 13 e 20; HELVIO DEBUS OLIVEIRA SOUZA, pelos
Fatos 1 e 9;
7. 'NÚCLEO PAKT': LUCIANA BALCONI CARNEIRO, pelos
Fatos 1, 9 e 28. (transcrição do Relatório do julgamento das apelações
criminais, ev. 145)
1.4. Após regular
instrução processual, sobreveio sentença que implicou a
parcial procedência da exordial acusatória para absolver:
ALFREDO PINTO TELLES, pela prática do Fato 23,
na forma do art. 386, III, do CPP; DARIO TREVISAN DE ALMEIDA, pela
prática dos Fatos 05, 06 e 14, na forma do art. 386, V, do
CPP, e pela prática dos Fatos 17 e 19, na forma do art. 386,
VII, do CPP; ELCI TERESINHA FERST, pela prática dos Fatos
01, 05 e 08, na forma do art. 386, V, do CPP; FERDINANDO
FRANCISCO FERNANDES, pela prática dos Fatos 11, 13, 15 e 29,
na forma do art. 386, VII, do CPP; FERNANDO FERNANDES, pela prática
dos Fatos 11, 13, 15 e 29, na forma do art. 386, VII, do
CPP; FLÁVIO ROBERTO LUIZ VAZ NETTO, pela prática do Fato
10, na forma do art. 386, II, do CPP; FRANCISCO JOSÉ DE OLIVEIRA
FRAGA, pela prática do Fato 16 (única imputação), na
forma do art. 386, II, do CPP; GILSON ARAÚJO DE ARAÚJO, pela
prática do Fato 01 na forma do art. 386, V, do CPP e
pela prática dos Fatos 21 e 29, ambos na forma do art. 386,
VII, do CPP; HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA SOUZA, pela prática do Fato
07, na forma do art. 386, V, do CPP; JOSÉ ANTÔNIO
FERNANDES, pela prática dos Fatos 11, 13, 15 e 29, na
forma do art. 386, VII, do CPP; LAIR ANTÔNIO FERST, pela
prática do Fato 09, na forma do art. 386, V, do CPP; pela
prática dos Fatos 11 e 27, na forma do art. 386, VII,
do CPP; pela prática do Fato 16, na forma do art. 386,
II, do CP e pela prática do Fato 23, na forma do art. 386,
III, do CPP; LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES, pela prática dos Fatos
01, 05, 06, 07, 08 e 09 (todas as imputações), na forma do art. 386, V,
do CPP; LUCIANA BALCONI CARNEIRO, pela prática do Fato
01, na forma do art. 386, V, do CPP; LUIZ CARLOS DE
PELLEGRINI, pela prática dos Fatos 07 e 08, ambos na
forma do art. 386, V, do CPP, e pela prática do Fato 19, na
forma do art. 386, VII, do CPP; LUIZ PAULO ROSEK GERMANO, pela
prática dos Fatos 07 e 14, ambos na forma do art. 386, V, do
CPP; NILZA TEREZINHA PEREIRA, do pela prática Fato 06,
na forma do art. 386, V, do CPP, e pela prática do Fato 23, na
forma do art. 386, III, do CPP; PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS,
pela prática do Fato 06, na forma do art. 386, V, do
CPP; PAULO JORGE SARKIS, pela prática dos Fatos
05, 06, 07, 09, 12 e 17, todos na forma do art. 386, V, do CPP; PEDRO
LUIS SARAIVA AZEVEDO, pela prática dos Fatos 01 e 06,
ambos na forma do art. 386, V, do CPP, e pela prática Fato 23,
na forma do art. 386, III, do CPP; ROSANA CRISTINA FERST, pela
prática do Fato 05, na forma do art. 386, V, do CPP; ROSMARI
GREFF ÁVILA DA SILVEIRA, pela prática do Fato 01, na
forma do art. 386, V, do CPP, e pela prática do Fato 30, na
forma do art. 386, II, do CPP; RUBEN HOHER, pela prática
dos Fatos 05 e 06, na forma do art. 386, V, CPP, e pela
prática do Fato 13, na forma do art. 386, VII, do CPP; SILVESTRE
SELHORST, pela prática do Fato 13, na forma do art. 386,
VII, do CPP;
E para condenar:
1) ALEXANDRE DORNELLES
BARRIOS, à pena privativa de liberdade de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses, a
ser cumprida em regime inicial fechado, além de 270 dias-multa, no valor
unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 1 ano e 6 meses de
reclusão); dispensa indevida de licitação (Fato 2 = 3 anos e 8 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa; Fato 3 = 3 anos e 8 meses de detenção, acrescidos
de 130 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 26 = 8 meses de reclusão,
acrescidos de 10 dias-multa);
2) ALFREDO PINTO TELLES,
à pena privativa de liberdade de 17 (dezessete) anos e 05 (cinco) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 500 dias-multa, no valor unitário
de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela
prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 03 meses de
reclusão); beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 5 = 03 anos e
03 meses de detenção, acrescidos de 55 dias-multa; Fato 6 = 03 anos e 03 meses
de detenção, acrescidos de 55 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 04 anos e
05 meses de reclusão, acrescidos de 97 dias-multa); e falsidade ideológica
(Fato 22 = 02 anos e 04 meses de reclusão, acrescidos de 122 dias-multa; Fato
25 = 02 anos e 11 meses de reclusão, acrescidos de 171 dias-multa);
3) CARLOS DAHLEM DA ROSA à
pena privativa de liberdade de 36 (trinta e seis) anos e 11 (onze) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 1.012 dias-multa, no valor unitário
de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos delitos de
quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 09 meses de reclusão); beneficiar-se da
dispensa indevida de licitação (Fato 5 = 03 anos e 08 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa; Fato 6 = 03 anos e 08 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa; Fato 7 = 03 anos e 08 meses de detenção, acrescidos
de 130 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 08 anos e 07 meses de reclusão,
acrescidos de 247 dias-multa; Fato 9 = 07 anos e 09 meses de reclusão,
acrescidos de 217 dias-multa); e corrupção ativa (Fato 12 = 03 anos e 11 meses
de reclusão, acrescidos de 79 dias-multa; Fato 14 = 03 anos e 11 meses de
reclusão, acrescidos de 79 dias-multa);
4) CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS à
pena privativa de liberdade de 32 (trinta e dois) anos e 10 (dez) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 1426 dias-multa, no valor unitário
de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); dispensa
indevida de licitação (Fato 2 = 04 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de
310 dias-multa; Fato 3 = 04 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de 310
dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 06 anos de reclusão, acrescidos de 298
dias-multa); corrupção passiva (Fato 18 = 05 anos e 02 meses de reclusão,
acrescidos de 124 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 03 anos e 09
meses de reclusão, acrescidos de 241 dias-multa; Fato 26 = 02 anos e 07 meses
de reclusão, acrescidos de 143 dias-multa);
5) CENIRA MARIA FERST
FERREIRA à pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos, a ser
cumprida em regime inicial semiaberto, além de 272 dias-multa, no valor
unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
pela prática dos delitos de falsidade ideológica (Fato 24 = 02 anos e 01 mês de
reclusão, acrescidos de 101 dias-multa; Fato 25 = 02 anos e 11 meses de
reclusão, acrescidos de 171 dias-multa);
6) DARIO TREVISAN DE ALMEIDA à
pena privativa de liberdade de 26 (vinte e seis) anos e 08 (oito) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 760 dias-multa, no valor unitário
de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); beneficiar-se
da dispensa indevida de licitação (Fato 7 = 03 anos e 05 meses de detenção,
acrescidos de 85 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 10 anos de reclusão,
acrescidos de 298 dias-multa; Fato 9 = 09 anos de reclusão, acrescidos de 262
dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 28 = 02 anos e 03 meses de reclusão,
acrescidos de 115 dias-multa);
7) DENISE NACHTIGALL LUZ à
pena privativa de liberdade de 22 (vinte e dois) anos e 07 (sete) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 606 dias-multa, no valor unitário
de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela
prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos e 03 meses de
reclusão); beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 7 = 03 anos e
08 meses de detenção, acrescidos de 130 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 =
08 anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 253 dias-multa; Fato 9 = 07 anos
e 11 meses de reclusão, acrescidos de 223 dias-multa);
8) EDUARDO REDLICH JOÃO à
pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 05 (cinco) meses, a ser
cumprida em regime inicial semiaberto, além de 179 dias-multa, no valor
unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
pela prática dos delitos de peculato-desvio (Fato 8 = 02 anos e 11 meses de
reclusão, acrescidos de 43 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 02
anos e 06 meses de reclusão, acrescidos de 136 dias-multa);
9) EDUARDO WEGNER VARGAS à
pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 01 (um) mês, a ser cumprida em
regime inicial semiaberto, além de 76 dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro
décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos delitos
de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 03 meses de reclusão); e
peculato-desvio (Fato 9 = 03 anos e 10 meses de reclusão, acrescidos de 76
dias-multa);
10) ELCI TERESINHA
FERST à pena privativa de liberdade de 05 (cinco) anos e 05 (cinco)
meses, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, além de 233 dias-multa, no
valor unitário de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
pela prática dos delitos de falsidade ideológica (Fato 22 = 01 ano e 03 meses
de reclusão, acrescidos de 31 dias-multa; Fato 24 = 01 ano e 03 meses de
reclusão, acrescidos de 31 dias-multa; Fato 25 = 02 anos e 11 meses de
reclusão, acrescidos de 171 dias-multa);
11) FERDINANDO FRANCISCO
FERNANDES à pena privativa de liberdade de 38 (trinta e oito) anos e
07 (sete) meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 1.054
dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos e 03
meses de reclusão); beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 5 =
03 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de 130 dias-multa; Fato 6 = 03 anos
e 08 meses de detenção, acrescidos de 130 dias-multa; Fato 7 = 03 anos e 08
meses de detenção, acrescidos de 130 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 08
anos e 07 meses de reclusão, acrescidos de 247 dias-multa; Fato 9 = 07 anos e
09 meses de reclusão, acrescidos de 217 dias-multa); corrupção ativa (Fato 12 =
04 anos e 06 meses de reclusão, acrescidos de 100 dias-multa; Fato 14 = 04 anos
e 06 meses de reclusão, acrescidos de 100 dias-multa);
12) FERNANDO FERNANDES à
pena privativa de liberdade de 31 (trinta e um) anos e 03 (três) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 664 dias-multa, no valor unitário
de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 09 meses de reclusão);
beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 5 = 03 anos e 04 meses de
detenção, acrescidos de 70 dias-multa; Fato 6 = 03 anos e 04 meses de detenção,
acrescidos de 70 dias-multa; Fato 7 = 03 anos e 04 meses de detenção,
acrescidos de 70 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 06 anos e 06 meses de
reclusão, acrescidos de 172 dias-multa; Fato 9 = 05 anos e 10 meses de
reclusão, acrescidos de 148 dias-multa); corrupção ativa (Fato 12 = 03 anos e
03 meses de reclusão, acrescidos de 55 dias-multa; Fato 14 = 03 anos e 11 meses
de reclusão, acrescidos de 79 dias-multa);
13) FLÁVIO ROBERTO LUIZ VAZ
NETTO à pena privativa de liberdade de 20 (vinte) anos e 10 (dez)
meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 696 dias-multa, no
valor unitário de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); dispensa
indevida de licitação (Fato 4 = 04 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de
310 dias-multa); peculato-desvio (Fato 9 = 09 anos de reclusão, acrescidos de 262
dias-multa); corrupção passiva (Fato 20 = 05 anos e 02 meses de reclusão,
acrescidos de 124 dias-multa);
14) HELVIO DEBUS OLIVEIRA
SOUZA à pena privativa de liberdade de 07 (sete) anos e 07 (sete)
meses, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, além de 148 dias-multa, no
valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 09
meses de reclusão); peculato-desvio (Fato 9 = 05 anos e 10 meses de reclusão,
acrescidos de 148 dias-multa);
15) HERMÍNIO GOMES JÚNIOR à
pena privativa de liberdade de 32 (trinta e dois) anos e 02 (dois) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 1.370 dias-multa, no valor unitário
de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); dispensa
indevida de licitação (Fato 2 = 04 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de
310 dias-multa; Fato 3 = 04 anos e 08 meses de detenção, acrescidos de 310
dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 10 anos de reclusão, acrescidos de 298
dias-multa); corrupção passiva (Fato 18 = 05 anos e 02 meses de reclusão,
acrescidos de 124 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 03 anos e 04
meses de reclusão, acrescidos de 206 dias-multa; Fato 27 = 02 anos e 04 meses
de reclusão, acrescidos de 122 dias-multa);
16) JOSÉ ANTONIO FERNANDES à
pena privativa de liberdade de 38 (trinta e oito) anos e 07 (sete) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 1.054 dias-multa, no valor unitário
de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos delitos de
quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos e 03 meses de reclusão); beneficiar-se da
dispensa indevida de licitação (Fato 5 = 03 anos e 08 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa; Fato 6 = 03 anos e 08 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa; Fato 7 = 03 anos e 08 meses de detenção,
acrescidos de 130 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 08 anos e 07 meses de
reclusão, acrescidos de 247 dias-multa; Fato 9 = 07 anos e 09 meses de
reclusão, acrescidos de 217 dias-multa); corrupção ativa (Fato 12 = 04 anos e
06 meses de reclusão, acrescidos de 100 dias-multa; Fato 14 = 04 anos e 06
meses de reclusão, acrescidos de 100 dias-multa);
17) LAIR ANTONIO FERST à
pena privativa de liberdade de 25 anos (vinte e cinco) e 02 (dois) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 686 dias-multa, no valor unitário
de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos delitos de
quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 08 meses de reclusão); beneficiar-se da
dispensa indevida de licitação (Fato 5 = 02 anos e 06 meses de detenção,
acrescidos de 10 dias-multa; Fato 6 = 02 anos e 06 meses de detenção,
acrescidos de 10 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 = 06 anos e 04 meses de
reclusão, acrescidos de 166 dias-multa); corrupção ativa (Fato 12 = 03 anos e
05 meses de reclusão, acrescidos de 61 dias-multa); e falsidade ideológica
(Fato 22 = 02 anos e 02 meses de reclusão, acrescidos de 108 dias-multa; Fato
24 = 02 anos e 01 mês de reclusão, acrescidos de 101 dias-multa; Fato 25 = 02
anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 157 dias-multa; Fato 26 = 01 ano e
09 meses de reclusão, acrescidos de 73 dias-multa);
18) LUCIANA BALCONI CARNEIRO à
pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos, a ser cumprida em regime inicial
aberto, além de 94 dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do
salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática do delito de falsidade
ideológica (Fato 28 = 02 anos de reclusão, acrescidos de 94 dias-multa);
19) LUIZ CARLOS DE PELLEGRINI à
pena privativa de liberdade de 08 (oito) anos e 09 (nove) meses, a ser cumprida
em regime inicial fechado, além de 181 dias-multa, no valor unitário de 2/10
(dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos
delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); e peculato-desvio
(Fato 9 = 06 anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 181 dias-multa);
20) LUIZ PAULO ROSEK GERMANO à
pena privativa de liberdade de 08 (oito) anos e 09 (nove) meses, a ser cumprida
em regime inicial fechado, além de 181 dias-multa, no valor unitário de 4/10
(quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática dos
delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de reclusão); e peculato-desvio
(Fato 9 = 06 anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 181 dias-multa);
21) MARCO AURÉLIO DA ROSA
TREVIZANI à pena privativa de liberdade de 14 (quatorze) anos e 04
(quatro) meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 582
dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente
à data dos fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01
ano e 06 meses de reclusão); peculato-desvio (Fato 8 = 04 anos e 05 meses de
reclusão, acrescidos de 97 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 03
anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 241 dias-multa; Fato 26 = 02 anos e
04 meses de reclusão, acrescidos de 122 dias-multa; Fato 27 = 02 anos e 04
meses de reclusão, acrescidos de 122 dias-multa);
22) NILZA TEREZINHA
PEREIRA à pena privativa de liberdade de 10 (dez) anos e 07 (sete)
meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 362 dias-multa, no
valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 03
meses de reclusão); peculato-desvio (Fato 8 = 04 anos e 05 meses de reclusão,
acrescidos de 97 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 02 anos e 11 meses
de reclusão, acrescidos de 171 dias-multa; Fato 26 = 02 anos de reclusão,
acrescidos de 94 dias-multa);
23) PATRÍCIA JONARA BADO DOS
SANTOS à pena privativa de liberdade de 15 (quinze) anos e 02 (dois)
meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 536 dias-multa, no
valor unitário de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos de
reclusão); peculato-desvio (Fato 8 = 07 anos e 06 meses de reclusão, acrescidos
de 208 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 03 anos e 04 meses de
reclusão, acrescidos de 206 dias-multa; Fato 26 = 02 anos e 04 meses de
reclusão, acrescidos de 122 dias-multa);
24) PAULO JORGE SARKIS à
pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos, a ser cumprida em regime inicial
fechado, além de 298 dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo
vigente à data dos fatos, pela prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato
1 = 02 anos de reclusão); e peculato-desvio (Fato 8 = 10 anos de reclusão,
acrescidos de 298 dias-multa);
25) PEDRO LUIS SARAIVA
AZEVEDO à pena privativa de liberdade de 09 (nove) anos e 04 (quatro)
meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 362 dias-multa, no
valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de peculato-desvio (Fato 8 = 04 anos e 05 meses
de reclusão, acrescidos de 97 dias-multa); e falsidade ideológica (Fato 25 = 02
anos e 11 meses de reclusão, acrescidos de 171 dias-multa; Fato 27 = 02 anos de
reclusão, acrescidos de 94 dias-multa);
26) ROSANA CRISTINA FERST à
pena privativa de liberdade de 16 (dezesseis) anos e 08 (oito) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 586 dias-multa, no valor unitário
de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela
prática dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 01 ano e 06 meses de
reclusão); beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 6 = 03 anos e
03 meses de detenção, acrescidos de 55 dias-multa); peculato-desvio (Fato 8 =
05 anos e 05 meses de reclusão, acrescidos de 133 dias-multa); e falsidade
ideológica (Fato 24 = 02 anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 157
dias-multa; Fato 25 = 03 anos e 09 meses de reclusão, acrescidos de 241 dias-multa);
27) ROSMARI GREFF ÁVILA DA
SILVEIRA à pena privativa de liberdade de 10 (dez) anos e 03 (três)
meses, a ser cumprida em regime inicial fechado, além de 245 dias-multa, no
valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática dos delitos de peculato-desvio (Fato 8 = 05 anos e 05 meses
de reclusão, acrescidos de 133 dias-multa; Fato 9 = 04 anos e 10 meses de
reclusão, acrescidos de 112 dias-multa);
28) RUBEM HÖHER à
pena privativa de liberdade de 26 (vinte e seis) anos e 05 (cinco) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 775 dias-multa, no valor unitário
de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de beneficiar-se da dispensa indevida de licitação (Fato 7 = 03
anos e 09 meses de detenção, acrescidos de 145 dias-multa); peculato-desvio
(Fato 8 = 09 anos e 07 meses de reclusão, acrescidos de 283 dias-multa; Fato 9
= 08 anos e 07 meses de reclusão, acrescidos de 247 dias-multa); e corrupção
passiva (Fato 20 = 04 anos e 06 meses de reclusão, acrescidos de 100
dias-multa);
29) SILVESTRE SELHORST à
pena privativa de liberdade de 25 (vinte e cinco) anos e 02 (dois) meses, a ser
cumprida em regime inicial fechado, além de 630 dias-multa, no valor unitário
de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática
dos delitos de quadrilha ou bando (Fato 1 = 02 anos e 06 meses de reclusão);
peculato-desvio (Fato 8 = 09 anos e 07 meses de reclusão, acrescidos de 283
dias-multa; Fato 9 = 08 anos e 07 meses de reclusão, acrescidos de 247
dias-multa); e corrupção passiva (Fato 20 = 04 anos e 06 meses de reclusão,
acrescidos de 100 dias-multa).
Nenhum dos réus
teve a pena privativa de liberdade substituída por penas restritivas de
direitos. Foi decretada extinta a punibilidade de RUBEM HÖHER em razão da
ocorrência da prescrição da pretensão punitiva considerada a pena em abstrato
em relação ao crime de quadrilha ou bando (Fato 1).
1.5.
Irresignados, o Ministério Público Federal e os réus interpuseram apelações.
O acórdão foi
proferido, em observância ao critério do voto médio, nos seguintes termos:
Vistos e relatados estes autos em que
são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 7a. Turma do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, POR UNANIMIDADE: A) conhecer do apelo de GILSON ARAUJO DE
ARAUJO e negar-lhe provimento e dar parcial provimento aos apelos de CENIRA
MARIA FERST, ELCI TERESINHA FERST, apenas para reduzir o apenamento imposto,
nos termos do voto da relatora. B) DE OFÍCIO, declarar a prescrição da
pretensão punitiva, relativamente aos delitos de quadrilha e de falsidade
ideológica, em relação a todos os réus que estão sendo condenados por sua
prática; e declarar a prescrição da pretensão punitiva e extinção total de
punibilidade em favor de CENIRA MARIA FERST FERREIRA, ELCI TERESINHA FERST,
LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES, LUCIANA BALCONI E RUBEN HOHER. C) DE OFÍCIO,
revogar a ordem de cassação de aposentadoria em favor de FLÁVIO ROBERTO LUIZ
VAZ NETO e PAULO JORGE SARKIS como efeito obrigatório da sentença penal
condenatória D) DE OFÍCIO, revogar a ordem de segredo de justiça anteriormente
exarada nestes autos, tornando-os públicos, restando protegidos eventuais dados
que não guardem correlação íntima com os fatos delituosos em apreço, com a ressalva
de entendimento pessoal do revisor, no sentido de que, desde seu início, o
julgamento das apelações deveria ter sido aberto ao público. POR
MAIORIA: E) DAR PARCIAL PROVIMENTO ao apelo do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, para
condenar LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES, pela prática dos crimes de quadrilha
(Fato 01) e peculato-desvio (Fatos 08 e 09); PAULO JORGE SARKIS, pela prática
dos crimes de peculato-desvio (Fato 09) e corrupção ativa (Fato 12); ROSMARI
GREFF ÁVILA DA SILVEIRA, pela prática do crime de quadrilha (Fato 01); LUIZ
CARLOS DE PELLEGRINI, pela prática do crime de beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (Fato 07); e reduzir por metade (1/2) a pena de LAIR
ANTONIO FERST, em razão da colaboração premiada, vencidos parcialmente o Des.
Federal Márcio Antônio Rocha no ponto em que mantém a absolvição dos réus pelo
delito de peculato-desvio, e a Relatora no ponto em que condenou a ré
LUCIANA BALCONI CARNEIRO pela prática do crime de quadrilha (Fato 01) e fez
incidir a causa de aumento do art. 84, § 2º, da Lei n. 8.666/93 em desfavor de
ALEXANDRE DORNELLES BARRIOS (Fatos 02 e 03). POR VOTO MÉDIO DO
REVISOR: F) DAR PARCIAL PROVIMENTO aos apelos de DARIO
TREVISAN DE ALMEIDA, DENISE NACHTIGALL LUZ, FLÁVIO ROBERTO LUIZ VAZ NETTO, LUIZ
CARLOS DE PELLEGRINI, PAULO JORGE SARKIS, ROSANA CRISTINA FERST, ROSMARI GREFF
ÁVILA DA SILVEIRA, SILVESTRE SELHORST e RUBEM HOHER. POR VOTO MÉDIO DO DES.
FEDERAL MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA: G) DAR PARCIAL PROVIMENTO aos apelos de ALFREDO
PINTO TELLES, CARLOS DAHLEM DA ROSA, CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS, FERDINANDO
FRANCISCO FERNANDES, FERNANDO FERNANDES, HERMÍNIO GOMES JÚNIOR, JOSÉ ANTÔNIO
FERNANDES e LAIR ANTONIO FERST e, de ofício, declarar a prescrição da pretensão
punitiva em relação a este último réu. POR VOTO MÉDIO DA RELATORA:
H) DAR PARCIAL PROVIMENTO aos apelos de EDUARDO REDLICH
JOÃO, EDUARDO WEGNER VARGAS, HELVIO DEBUS OLIVEIRA SOUZA, LUIZ PAULO
ROSEK GERMANO, MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI, NILZA TEREZINHA PEREIRA,
PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS e PEDRO LUIS SARAIVA AZEVEDO, e, de ofício,
declarar a prescrição da pretensão punitiva em relação ao réu EDUARDO REDLICH
JOÃO. POR MAIORIA, VENCIDA A RELATORA: I) DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação de
ALEXANDRE DORNELLES BARRIOS, para absolvê-lo da prática dos delitos de que
tratam o artigo 89, caput, da Lei n. 8.666/93 (Fatos 2 e 3) e o artigo 288 do
Código Penal (Fato 1), nos termos do voto do revisor e, POR UNANIMIDADE,
reduzir o apenamento imposto em relação ao crime de que trata o artigo 299 do
código penal (Fato 26). POR MAIORIA, VENCIDA A RELATORA: J) DAR PARCIAL
PROVIMENTO ao apelo de LUCIANA BALCONI CARNEIRO, apenas para reduzir o
apenamento imposto, nos termos do voto do revisor. POR UNANIMIDADE: L) DE
OFÍCIO, estabelecer que o início da execução provisória da pena observará o
entendimento adotado pela 4.ª Seção deste Tribunal, no julgamento dos embargos
infringentes e de nulidade n. 5008572-31.2012.404.7002; MANTIDA A RELATORIA,
nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
As penas restaram
assim fixadas, ao final:
Voto do
Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha (Vogal):
Réu/Embargante
|
Fato -
condenação
|
Pena
imposta pelo voto médio
|
Ferdinando
Fernandes
|
Fatos
5, 6 e 7 - Beneficiar-se de dispensa indevida de licitação.
Fato 14 - Corrupção ativa |
13 anos
de detenção
|
Fernando
Fernandes
|
Fatos
5, 6 e 7 - Beneficiar-se de dispensa indevida de licitação.
Fato 14 - Corrupção ativa |
12 anos
de detenção
|
José
Antonio Fernandes
|
Fatos
5, 6 e 7 - Beneficiar-se de dispensa indevida de licitação.
Fato 14 - Corrupção ativa |
13 anos
de detenção
|
Alfredo
Pinto Teles
|
Fatos 5
e 6 - Beneficiar-se de dispensa indevida de licitação
|
6 anos
e 6 meses de detenção
|
Carlos
Dahlem Rosa
|
Fatos 5
e 6 - Beneficiar-se de dispensa indevida de licitação
|
9 anos
e 9 meses de detenção
|
Voto do
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz (Revisor):
Réu/Embargante
|
Fato -
condenação
|
Pena
imposta pelo voto médio
|
Rosmari
Greff Ávila da Silveira
|
Fatos 8
e 9 - Peculato-desvio
|
5 anos
e 5 meses de reclusão
|
Rosana
Cristina Ferst
|
Fato 8
- Peculato-desvio
|
5 anos
e 5 meses de reclusão
|
Denise
Nachtigall Luz
|
Fatos 8
e 9 - Peculatos-desvio
|
6 anos,
5 meses e 15 dias de reclusão
|
Dario
Trevisan de Almeida
|
Fatos 8
e 9 - Peculatos-desvio
|
8 anos,
7 meses e 10 dias de reclusão
|
Silvestre
Selhorst
|
Fatos 8
e 9 - Peculato-desvio
|
5 anos
e 5 meses de reclusão
|
Luiz
Carlos de Pelegrini
|
Fato 9
-Peculato-desvio
|
5 anos,
9 meses e 22 dias de reclusão
|
Flávio
Roberto Luiz Vaz Netto
|
Fato 9-
Peculato-desvio
|
8 anos,
7 meses e 10 dias de reclusão
|
Voto da
Desembargadora Federal Cláudia Cristofani (Relatora):
Réu/Embargante
|
Fato -
condenação
|
Pena
imposta pelo voto médio
|
Patrícia
Jonara dos Santos
|
Fato 8
- Peculato-desvio
|
3 anos
e 9 meses de reclusão
|
Hélvio
Debus Oliveira Souza
|
Fato 9
- Peculato-desvio
|
2 anos,
9 meses e 22 dias de reclusão
|
Luiz
Paulo Rosek Germano
|
Fato 9
- Peculato-desvio
|
2 anos,
9 meses e 22 dias de reclusão
|
Paulo
Jorge Sarkis
|
Fato 8
- Peculato-desvio
|
5 anos
de reclusão
|
Eduardo
Wegner Vargas
|
Fato 9
- Peculato-desvio
|
2 anos,
9 meses e 22 dias de reclusão
|
Marco
Aurélio da Rosa Trevizani
|
Fato 8
- Peculato-desvio
|
3 anos
e 9 meses de reclusão
|
As divergências são
objeto dos recursos ora trazidos a julgamento com vista a que prevaleça sempre
o voto mais favorável a cada réu.
2. Dos
crimes em questão. Há diversos crimes imputados aos réus e que foram
objeto de análise, não tendo havido unanimidade entre os Desembargadores quanto
ao enquadramento das condutas dos réus. É importante, portanto, que sejam
feitas algumas considerações para aclarar o alcance de cada tipo penal, de modo
que sejam assentados os pressupostos para a solução do caso.
2.1. Peculato-desvio: art.
312, CP. O crime de peculato tutela o patrimônio público, sim, mas não
apenas isso (TRF4, ACR 5006071-20.2011.404.7009, Sétima Turma, Relator
FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 27/01/2016; TRF4, ACR
5000151-47.2011.404.7015, Oitava Turma, Relator para Acórdão LEANDRO PAULSEN,
juntado aos autos em 07/01/2016). PRADO refere também a “correta gestão
administrativa”, a “lisura no exercício da função administrativa” (PRADO, Luiz
Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2015, p. 1046). Já se decidiu também: “1. Considerando que a ratio
legis ou objetividade jurídica do Título XI da Parte Especial do
Código Penal (Crimes contra a Administração Pública) é o correto ou normal
funcionamento da Administração Pública na consecução de seus fins, que o crime
de peculato é pluriofensivo, tendo por objeto jurídico específico tanto o
patrimônio público como o dever de fidelidade do funcionário para com a
Administração”(TRF4, ACR 0024846-94.2008.404.7100, OITAVA TURMA, Relator JOÃO
PEDRO GEBRAN NETO, D.E. 17/09/2015).
Efetivamente, resguarda
a propriedade, a posse, a guarda de quaisquer bens e valores públicos que
tenham o Poder Público como titular ou que, sendo de terceiros, estejam a sua
administração, sendo certo que cabe aos servidores zelar pela sua adequada
guarda e aplicação ou destinação.
Vejamos o tipo
penal:
TÍTULO XI
DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
CAPÍTULO I
DOS CRIMES PRATICADOS
POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
DOS CRIMES PRATICADOS
POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
Peculato
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário
público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular,
de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou
alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos,
e multa.
§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o
funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o
subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio,
valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.
Peculato culposo
§ 2º - Se o funcionário concorre
culposamente para o crime de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um
ano.
§ 3º - No caso do parágrafo anterior,
a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a
punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
Peculato mediante erro de outrem
Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro
ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:
Pena - reclusão, de um a quatro anos,
e multa.
De pronto, note-se
que se trata de crime próprio, ou seja, que exige determinada qualidade do
sujeito ativo, qual seja, que seja funcionário público. Atualmente, a
expressão funcionário público caiu em desuso, tendo sido
substituído por servidor público. Mas importa ter em conta o que também vale
para os demais crimes: o alargamento de tal conceito pelo art. 327 do CP.
Segundo tal dispositivo, considera-se funcionário público por equiparação
qualquer pessoa que, mesmo transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo,
emprego ou função pública, mesmo em entidade paraestatal, ou que trabalhe para
pessoa jurídica que preste serviço mediante, contrato ou convênio, para a
execução de atividade típica da Administração. Desse modo, alcança qualquer
pessoa, ainda que de direito privado, que esteja aplicando recursos públicos.
Já decidimos que o “fator preponderante para enquadramento do agente na
condição de ‘funcionário público por equiparação’ reside no manejo de verbas
oriundas do erário, ainda que, sob uma perspectiva estritamente
funcional-administrativa, não reste configurado vínculo de subordinação
disciplinar direto entre o indivíduo e o Estado”.
Se a equiparação
ocorre até mesmo relativamente a agentes de pessoas privadas, com mais razão
para entidades sem fins lucrativos como as Organizações da Sociedade Civil de
Interesse Público (OSCIPs), reguladas pela Lei 9.790/99, que, por força do seu
art. 3º, dedicam-se a atividades que também são típicas do Estado, como a
assistência social, a promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio
histórico e artístico, a promoção gratuita da educação ou da saúde, a defesa,
preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento
sustentável, o combate à pobreza, dentre outras. Ademais, tais entidades, nos
termos do seu art. 4º, estão sujeitas à “observância dos princípios da
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da
eficiência”, sendo certo, ainda, que tem de prestar contas relativamente aos
Termos de Parceria firmados. O art. 13 da referida Lei ainda estabelece:
“havendo indícios fundados de malversação de bens ou recursos de origem
pública, os responsáveis pela fiscalização representarão ao Ministério Público,
à Advocacia-Geral da União, para que requeiram ao juízo competente a decretação
da indisponibilidade dos bens da entidade e o seqüestro dos bens dos seus
dirigentes, bem como de agente público ou terceiro, que possam ter enriquecido
ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público”. Na ACR
5009807-73.2011.4.04.7000/PR, em meados de 2016, a 8ª Turma do TRF4 condenou,
por peculato, dirigentes de OSCIPs e titulares de assessorias e de consultorias
por elas contratadas para o desvio de dinheiro público.
Acrescente-se,
ainda, que, se o agente ocupar cargo em comissão ou função de direção ou
assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de
economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público, a
pena será aumentada da terça parte, conforme o § 3º do art. 327 do CP. Assim,
por exemplo, quando é agente o gerente de agência de correios, que exerce cargo
de confiança em empresa pública (TRF4, ACR 5002627-58.2011.404.7015, SÉTIMA TURMA,
Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 18/06/2015). Já decidiu o
STF que essa causa de aumento de pena também se aplica “aos agentes detentores
de mandato eletivo que exercem, cumulativamente, as funções política e
administrativa", como no caso do Presidente de Câmara Legislativa (STF,
RHC 110.513, rel. min. JOAQUIM BARBOSA, julgamento em 29-5-2012, Segunda
Turma).
Ademais, como
qualquer crime, admite co-autoria, sendo que os co-autores podem ser outras
pessoas, não servidores, sequer por equiparação, desde que conheçam a
circunstância do servidor ou equiparado, e que participem da conduta delitiva.
Veja-se precedente do TRF4, sob a relatoria do Des. VICTOR LAUS, nesse sentido:
“1. Sendo a condição de funcionário público elementar do tipo do artigo 312 do
Código Penal, esta, a teor do artigo 30 do mesmo Diploma Legal, se comunica ao
co-autor (particular), desde que este último esteja ciente este da condição
funcional do autor” (TRF4, ACR 5014083-12.2014.404.7108, Oitava Turma, Relator
VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, juntado aos autos em 11/12/2015) No INQ 3.113,
decidiu o STF, conduzido pelo Min. ROBERTO BARROSO: “O fato de a acusada não
ser funcionária pública não impede que seja denunciada pela prática de
peculato, se, consciente dos atos praticados pelos supostos autores do crime, é
beneficiada pela apropriação ou pelo desvio. Na hipótese de que se trata, a
denunciada, antes mesmo do episódio retratado no vídeo aportado aos autos
(recebimento de valores em espécie), conscientemente, aderiu às ações dos
demais agentes, contribuindo, portanto, para a produção do resultado lesivo, de
modo a configurar a sua condição de partícipe no delito funcional praticado
pelo funcionário público”(STF, Inq 3.113, rel. min. ROBERTO BARROSO, Primeira
Turma, dez/2014).
Seguindo na análise
do tipo legal, é possível distinguir diversas condutas caracterizadoras de
peculato.
Em primeiro lugar,
diferem conforme o funcionário tenha ou não a posse do
numerário ou do bem. Para sermos precisos, a posse é da pessoa jurídica, sendo
que o servidor, propriamente, pode ter a detenção na medida em que, através
dele, o estado é que age.
Quando o servidor
(ou equiparado) tem acesso direto ao dinheiro, valor ou bem, incide o caput.
Apropria-se tomando, simplesmente, o bem para si ou o desvia mediante aplicação
diversa da devida. Apropriar-se é, efetivamente, assenhorear-se. Desviar
significa dar destino diverso do que deveria ter, aplicar em outro fim, podendo
ser, nesse tipo que estamos analisando, em proveito próprio ou alheio. No caput,
portanto, temos as figuras do peculato-apropriação e do peculato-desvio.
Ocorrem as
modalidades do caput, por exemplo, quando empregados da Caixa
Econômica Federal, que exercem a função de caixa, apropriam-se de dinheiro,
retirando-o em espécie, ou o desviam, transferindo-o para si próprios ou para
outrem em detrimento dos titulares das contas. Já se decidiu: “1. Pratica o
crime de peculato (art. 312, caput) o caixa de uma agência da Caixa
Econômica Federal que desvia valores, em proveito próprio, de que tem a posse
em razão do cargo exercido” (TRF4, ACR 5052951-54.2012.404.7100, Oitava Turma,
Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos autos em 04/07/2016). Entendeu, o STF, que
pratica peculato o deputado que nomeia assessores fantasmas e se apropria da
totalidade ou de parte das respectivas remunerações (STF, Inq. 2005, rel.
Min. JOAQUIM BARBOSA, Plenário, dez/2010). Assim, também, em caso de nomeação
de assessores fantasmas no âmbito do Poder Executivo (STF, Inq. 2.449,
rel. Min. AYRES BRITTO, Plenário, dez/2010). Também entendeu que pratica
peculato o servidor que obtém ressarcimento por despesas não realizadas (STF,
Inq. 2.486, rel. Min. AYRES BRITTO, Plenário, out/2009).
A consumação é
analisada por PRADO: “... a consumação se perfaz, na hipótese de apropriação,
no momento em que o funcionário inverte a titularidade da posse, passando a
comportar-se em relação à coisa com animus domini. No caso de
desvio, a consumação se concretiza quando ao agente, traindo a confiança que
lhe fora depositada, dá à coisa destinação diversa daquela determinada pela
Administração Pública, visando beneficiar a si próprio ou a terceiro, não
havendo necessidade, porém, de que o agente obtenha o proveito visado, bastando
para a consumação que ocorra o desvio. A tentativa é admissível” (PRADO, Luiz
Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2015, p. 1046/1047).
Já entendeu, o STF,
sob a relatoria do Min. MARCO AURÉLIO, que “O simples fato de cidadão assinar
convênio como testemunha não sinaliza participação em desvio de verbas
públicas, ocorrido na execução de obra. (...) No peculato-desvio, exige-se que
o servidor público se aproprie de dinheiro do qual tenha posse direta ou
indireta, ainda que mediante mera disponibilidade jurídica. O fato de não
constar da denúncia o modo relativo ao núcleo do tipo, não sendo para tanto
suficiente o grau de parentesco com sócios da cessionária, impossibilita o
recebimento da peça”(STF, Inq 2.966, rel. min. MARCO AURÉLIO, Plenário,
mai/2014).
Quando o servidor
(ou equiparado) não detém o valor ou o bem, mas a sua função facilita o acesso
ao mesmo, incide a figura do § 1º. Na medida em que terá de subtrair o
dinheiro, valor ou bem, realizará o que, em outras situações, se consideraria
um furto. Daí porque a figura do § 1º é denominada de peculato-furto. Para a
figura desse parágrafo, basta que a subtração tenha se dado mediante a
facilidade que proporcionou, a um dos agentes, a qualidade de funcionário. A
figura do parágrafo primeiro, assim, amplia a tipificação. Nesse caso, não é
necessária a posse do dinheiro, valor ou bem. Basta que, valendo-se da
facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário, o agente subtraia ou
concorra para que isso ocorra. Note-se, efetivamente, que, embora sendo um crime
próprio, poderá ocorrer co-autoria, de modo que o servidor (ou equiparado)
poderá facilitar a ação de um comparsa não servidor. É correto dizermos,
portanto, que o servidor subtrai ou concorre para que outro subtraia.
O peculato-furto
ocorre, por exemplo, quando vigilante a serviço da Polícia Federal subtrai arma
de fogo da Delegacia (TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5007038-57.2014.4.04.7204/SC).
Do mesmo modo, praticam o delito na modalidade do parágrafo primeiro “vigilante
e particular que, mediante comunhão de esforços e unidade de desígnios,
subtraem bens tais como estepes, rádios e outros de veículos apreendidos pela
Receita Federal, aproveitando-se da facilidade de acesso ao local decorrente da
função de vigilante desempenhada por um dos réus, comunicando-se a elementar
funcionário público ao extraneus” (TRF4, ACR
5007928-54.2013.404.7002, OITAVA TURMA, Relator LEANDRO PAULSEN, juntado aos
autos em 14/03/2016).
A subtração poderá
dar-se, ainda, mediante fraude. Julgamos um caso que envolvia o desvio de recursos
de depósitos judiciais vinculados a ações trabalhistas. Dois servidores de uma
Vara do Trabalho, juntamente com um advogado, induziram em erro a magistrada e
dela obtiveram a assinatura para liberação dos valores e, em vez de darem a
eles o destino adequado, qual seja, a disponibilização aos seus titulares, os
desviaram em proveito próprio. Noutro caso, houve o acusado, “valendo-se de
facilidades proporcionadas pela sua condição de funcionário público no
exercício do cargo de Analista de Consórcios junto ao Banco Central do Brasil
(conhecimento da identificação de pessoas desistentes de consórcios, aos quais
era devida, ao final deste, a devolução dos valores pagos), subtrai, em
proveito próprio, valores de que não tinha a posse, fazendo-se passar, perante
as empresas administradoras dos consórcios, como consorciado desistente, com
apresentação de falsa identificação, solicitando a devolução dos valores pagos,
os quais eram depositados em contas abertas pelo acusado com a falsa
identificação do consorciado e posteriormente sacados ou transferidos a contas
suas ou de terceiro” (TRF4, ACR 0024846-94.2008.404.7100, OITAVA TURMA, Relator
JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, D.E. 17/09/2015).
Na AP 470, o STF
condenou por peculato o Diretor de Marketing do Banco do Brasil em co-autoria
com sócios de agência de publicidade pela apropriação indevida de valores
pertencentes ao Banco do Brasil, denominados “bônus de volume”, devolvidos por
empresas contratadas pelo Banco, a título de desconto à entidade pública
contratante. Entendeu-se que os recursos, “nos termos das normas regimentais,
estavam sob a posse e fiscalização do mencionado Diretor” (STF, AP 470, Rel.
Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, dez/2012).
Na mesma ação, o
STF entendeu que foram co-autores de peculato corruptores que, firmando
contratos de publicidade, subcontratavam quase integralmente o seu objeto,
incluíam despesas a eles não atinentes e recebiam recursos públicos em volume
incompatível com os ínfimos serviços prestados, desviando, assim, o dinheiro público
“com participação ativa do Presidente da Câmara dos Deputados, que detinha a
posse dos recursos em razão do cargo que exercia”(STF, AP 470, Rel. Min.
JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, dez/2012).
2.2. Corrupção
passiva: art. 317 do CP. O funcionamento da Administração Pública
deve pautar-se pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência. Para tanto, impende que toda pessoa que exerce cargo,
emprego ou função pública, seja em caráter efetivo, ou mesmo transitoriamente e
ainda que sem remuneração, observe esses princípios na prática dos seus atos.
Isso tanto no âmbito da administração direta (ente político) como da
administração indireta (suas autarquias, funções, empresas públicas e
sociedades de economia mista) e também das empresas contratadas ou conveniadas
para a execução de atividade típica da Administração Pública.
Que os servidores
públicos e agentes políticos atuem de modo íntegro, com espírito público,
inspirados por esses princípios e com vista ao bem comum é o que se espera. E
há uma grande preocupação com isso, porquanto, quando outros interesses se
sobrepõem, não apenas o servidor se corrompe, no sentido de se deteriorar
moralmente, de se perverter, mas, com ele, também a Administração se deteriora
e se perverte.
Em 2000, no âmbito
da Organização das Nações Unidas (ONU), foi adotada a Convenção contra o Crime
Organizado Transnacional. Internalizada em nosso ordenamento jurídico pelo
Decreto 5.015/2004, seu art. 8º ocupa-se da importância da criminalização da corrupção.
Nosso ordenamento
jurídico já o fazia, inclusive através de mais de um tipo penal, dentre os
quais os que estão sob as rubricas de concussão, excesso de exação e
facilitação ao contrabando e ao descaminho. E há o tipo específico do crime de
corrupção passiva, assim redigido:
TÍTULO XI
DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
CAPÍTULO I
DOS CRIMES PRATICADOS POR FUNCIONÁRIO
PÚBLICO
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
Corrupção passiva
Art. 317 - Solicitar ou receber, para
si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes
de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal
vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12
(doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
§ 1º - A pena é aumentada de um
terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou
deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever
funcional.
§ 2º - Se o funcionário pratica,
deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional,
cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um
ano, ou multa.
Acerca da palavra
corrupção, PRADO ensina:
“a origem desse vocábulo encontra-se
ligada à idéia de degradação, deterioração, menosprezo, seja natural, seja
valorativo... Na função pública, “corrupto” é o agente eu faz uso de sua função
para atender finalidade distinta da do interesse público, movido pelo objetivo
de alcançar vantagem pessoal. Também aqui, portanto, o funcionário corrupto
‘degrada’ ou ‘deteriora’ a autoridade de que foi investido, em proveito
próprio”. (PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 1073).
O tipo surge sob a
denominação de corrupção passiva. BALTAZAR esclarece: “a corrupção do
funcionário é chamada de passiva em atenção ao sentido da vantagem, podendo
estar configurada em conduta ativa do funcionário, que faz a solicitação”
(BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 10ª ed. São Paulo: Saraiva,
2015). Também PRADO faz esse destaque: “... embora a corrupção seja denominada
‘passiva’ pelo legislador, ela abrange, também, uma conduta ativa por parte do funcionário
corrompido – qual seja, a de solicitar a vantagem indevida” (PRADO, Luiz Regis.
Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2015, p. 1074).
A corrupção passiva
envolve, normalmente, pelo menos a perspectiva de uma vantagem indevida.
Mas, na forma privilegiada do § 2º, a situação pode ser outra, de simplesmente
ceder a um pedido ou a uma pressão por parte de outrem, mesmo sem solicitação,
promessa, recebimento ou qualquer perspectiva de vantagem direta.
A vantagem pode ser
uma quantia em dinheiro, um bem, uma promoção, um apoio político, um cargo para
um parente. Pode, portanto, ter qualquer natureza e ser em favor próprio ou de
outrem. Certa feita, deparamo-nos com uma ação penal em que o servidor havia solicitado
um emprego para seu sobrinho.
Algumas práticas,
embora impróprias, não chegam a configurar corrupção passiva por sua
insignificância, como o recebimento, em repartição, de brindes e doces no
Natal, por exemplo, sem qualquer relação com a prática direta de qualquer ato
de ofício.
Trata-se de crime
formal, de modo que a sua consumação independente de a vantagem se efetivar.
PRADO diz que se consuma “com a solicitação da vantagem indevida, com o seu
recebimento ou com a aceitação da promessa, não sendo imprescindível que o
agente venha a praticar o ato funcional”. Assim, “Não é admissível a tentativa”
(PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, p. 1074).
Vejam-se, a
propósito, os verbos configuradores do tipo de corrupção
passiva: solicitar, receber, aceitar promessa.
A solicitação, por
si só, já configura o crime. Do mesmo modo, a aceitação de promessa.
Consuma-se, portanto, nesses casos, independentemente do recebimento efetivo da
vantagem. Não é necessário o recebimento da vantagem, tampouco qualquer
prejuízo para a Administração.
De outro lado,
conforme o STF, “O recebimento de propina constitui o marco consumativo do
delito de corrupção passiva, na forma objetiva ‘receber’, sendo indiferente que
seja praticada com elemento de dissimulação” (STF, AP 470-EI-sextos, rel. p/ o
ac. min. Roberto Barroso, Plenário, mar/2014).
Vale notar, ainda
que, na modalidade “solicitar”, a corrupção passiva pode ocorrer sem que haja a
prática do crime de corrupção ativa pelo particular envolvido. Efetivamente,
pode o particular negar-se a prestar a vantagem indevida e, ainda assim, já
terá se consumado, no momento da sua solicitação pelo servidor, o crime de
corrupção passiva. E, mesmo que o particular preste a vantagem, ainda assim
pode não ocorrer a corrupção ativa, conforme destaque feito por NUCCI:
“A pessoa que fornece a vantagem
indevida, pode estar preparando o funcionário para que, um dia dele
necessitando, solicite algo, mas nada pretenda no momento da entrega do mimo.
Ou, ainda, pode presentear o funcionário, após ter este realizado um ato de
ofício. Cuida-se de corrupção passiva do mesmo modo, pois fere a moralidade
administrativa, sem que se possa sustentar (por ausência de elementos típicos) a
ocorrência da corrupção ativa” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal
Comentado. 13ª ed. RT, 2013, p.1182).
Ainda:
“o particular que dá a vantagem
indevida, em lugar de responder como partícipe do delito de corrupção passiva,
comete o crime de corrupção ativa. Porém, pode o fornecedor do presente ao
funcionário ser punido como partícipe do delito de corrupção passiva, caso o
mimo seja fornecido após a prática do ato funcional ou sem que haja a promessa
de realização de ato de ofício, pois não há caracterização do crime de
corrupção ativa”
E note-se que isso independe de o ato
de ofício ser legal ou ilegal. Acatar solicitação de vantagem indevida feita
por servidor público, ainda que para o fim de que pratique ato de ofício
regular, de qualquer modo implica crime. (NUCCI, Guilherme de Souza. Código
Penal Comentado. 13ª ed. RT, 2013, p.1185).
Aliás, NUCCI chama
a atenção para a classificação da corrupção em própria e imprópria:
“corrupção própria a solicitação,
recebimento ou aceitação de promessa de vantagem indevida para a prática de ato
ilícito, contrário aos deveres funcionais... corrupção imprópria, quando a
prática se refere a ato lícito, inerente aos deveres impostos pelo cargo ou
função” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13ª ed. RT, 2013,
p. 1182).
Para a configuração
da conduta, importa ter em conta que a solicitação não precisa ser verbal,
expressa, assertiva. Veja-se o que diz BALTAZAR: “A solicitação pode ocorrer de
forma explícita ou implícita, seja a sugestão feita de forma verbal ou mesmo
mediante comportamento astucioso do agente, que deixa transparecer a proposta
de vantagem” (BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 10ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2015, p.298).
Caso, em vez de
solicitação, ocorra a exigência de vantagem, já não estaremos em face do crime
de corrupção passiva, mas no de concussão, disciplinado pelo art. 316 do CP.
A corrupção
passiva, nas modalidades receber e aceitar, estará ligada ao crime de corrupção
ativa, do art. 333 do CP, que envolve a oferta ou promessa de vantagem
indevida, por particular a funcionário público, para determiná-lo a praticar,
omitir ou retardar ato de ofício. Diz PRADO: “Receber denota a idéia de obter a
vantagem oferecida, havendo aqui uma conduta passiva do funcionário, em
contrapartida à ação de oferecer praticada pelo corruptor (art. 333, CP)”
(PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, p. 1074). Aceitar promessa, por sua vez, é
“consentir em receber dádiva futura” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal
Comentado. 13ª ed. RT, 2013, p. 1182).
A solicitação, o
recebimento ou a aceitação de vantagem indevida tem de ser em razão da função
pública. Tem em conta, portanto, que a função pública enseja que o agente
pratique atos de ofício, ou deixe de fazê-lo, no interesse daquele a quem
solicita ou de quem recebe a vantagem indevida ou que lhe promete concedê-la.
Na AP 470, do
Mensalão, o STF entendeu configurada a prática do crime de corrupção passiva,
dentre outros, pelo Diretor de Marketing do Banco do Brasil, por deputados
federais e, também pelo então Presidente da Câmara dos Deputados, assim
decidindo quanto a este último:
“CORRUPÇÃO PASSIVA. CORRUPÇÃO
ATIVA... 1. Restou comprovado o pagamento de vantagem indevida ao então
Presidente da Câmara dos Deputados, por parte dos sócios da agência de
publicidade que, poucos dias depois, viria a ser contratada pelo órgão público
presidido pelo agente público corrompido. Vinculação entre o pagamento da
vantagem e os atos de ofício de competência do ex-Presidente da Câmara, cuja
prática os réus sócios da agência de publicidade pretenderam influenciar.
Condenação do réu JOÃO PAULO CUNHA, pela prática do delito descrito no artigo
317 do Código Penal (corrupção passiva), e dos réus MARCOS VALÉRIO, CRISTIANO
PAZ e RAMON HOLLERBACH, pela prática do crime tipificado no artigo 333 do
Código Penal (corrupção ativa)” (STF, AP 470, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA,
Tribunal Pleno, dez/2012).
Entre o servidor e
o particular de quem se solicita a vantagem ou de quem é recebida a vantagem ou
aceita a promessa, por vezes há uma terceira pessoa interposta. Isso, aliás, é
bastante comum, na medida em que esse terceiro acaba por fazer a ligação entre
o corrupto e o corruptor. Esse terceiro será coautor do crime de corrupção
passiva ou ativa, conforme esteja atuando em conluio com o servidor corrupto ou
com o particular corruptor. Veja-se o que diz BALTAZAR:
“Admite-se a coautoria ou
participação de particular, como, por exemplo, quando a cobrança é feita por
pessoa interposta, que não pertence aos quadros do serviço público, na chamada
corrupção indireta, prática comumente adotada para dificultar a
responsabilização penal do funcionário... Em tais hipóteses, o particular
poderá até mesmo responder como coautor, comunicando-se a qualidade de
funcionário público, que é elementar do delito, por aplicação doa RT. 30 do CP,
desde que essa circunstância tenha entrado em sua esfera de conhecimento”
(BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 10ª ed. São Paulo: Saraiva,
2015, p. 296).
O crime de
corrupção passiva tem uma modalidade qualificada e outra privilegiada.
A modalidade
qualificada, que implica aumento da pena de um terço, se dá quando, “em
conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar
qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional”.
Na forma
privilegiada, o funcionário pode atuar com a “intenção de agradar outrem”
(PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 10ª edição. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2015, p. 1074). Ou, ainda que contrariado e
constrangido, simplesmente ceder à pressão. Nessa modalidade, como a pena é de
três meses a um ano, ou multa, a competência é dos Juizados Especiais
Criminais.
Ademais, os crimes
próprios de servidores públicos têm como causa de aumento de pena (1/3) a
posição do agente de ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou
assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista,
empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. Nesse sentido,
dispõe o art. 327, 2º, do CP.
Tratando-se de
servidor com atribuições para o lançamento ou cobrança de tributos e a isso se
relacionando os fatos, teremos o crime de concussão e corrupção passiva fiscal,
descrito no art. 3º, II, da Lei 8.137/90: “Art. 3° Constitui crime funcional
contra a ordem tributária, além dos previstos no Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal (Título XI,
Capítulo I): II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou
indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas
em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para
deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los
parcialmente. Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.” Pelo
princípio da especialidade, portanto, não terá aplicação o art. 317 do CP.
2.3. Corrupção
ativa: art. 333 do CP. Por vezes, a violação da moralidade e da
impessoalidade da administração tem início na atuação de particulares que
oferecem ou prometem vantagens a servidores públicos. Daí a criminalização da
chamada corrupção ativa:
TÍTULO XI
DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
CAPÍTULO II
DOS CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR
CONTRA A ADMINISTRAÇÃO EM GERAL
Corrupção ativa
Art. 333 - Oferecer ou prometer
vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir
ou retardar ato de ofício:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12
(doze) anos, e multa. (Redação
dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)
Parágrafo único - A pena é aumentada
de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou
omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.
Cleber Masson
ensina que o crime de corrupção ativa é simples, formal, instantâneo, tem por
objeto jurídico tutelar a Administração Pública, buscando impedir a atuação
ilícita de particulares na atividade administrativa, que não pode se converter
em palco para as negociações espúrias relativas aos atos de funcionários
públicos. O objeto material é a vantagem indevida. Os núcleos do tipo são oferecer e prometer. Oferecer é
propor ou apresentar ao funcionário público a vantagem indevida, colocando-a à
sua disposição. Prometer equivale a obrigar-se a entregar
futuramente a vantagem indevida, exigindo em contrapartida uma ação
correspondente de funcionário público. Trata-se de tipo misto alternativo,
crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, havendo um só crime quando o
particular, relativamente ao mesmo ato de ofício, promete vantagem indevida,
promete vantagem indevida e depois a oferece a funcionário público. As condutas
têm em mira o comportamento do funcionário público. Buscam determiná-lo a
praticar, omitir ou retardar ato de ofício. Como o legislador referiu-se a 'ato
de ofício', não há corrupção ativa, mas crime impossível (art. 17 do CP), no oferecimento
ou promessa de vantagem indevida a funcionário público que não tenha poderes
legítimos para a prática do ato visado. O sujeito ativo pode ser qualquer
pessoa (crime comum ou geral), inclusive o funcionário público, desde que
realize conduta sem aproveitar-se das facilidades inerentes à sua condição
funcional. O sujeito passivo é o Estado e, mediatamente, a pessoa física ou
jurídica lesada pela conduta criminosa. A falta de identificação do funcionário
público corrompido não descaracteriza o crime, se houver provas da oferta e
promessa da vantagem indevida, notadamente pelo fato de constituir-se em crime
formal, dispensando a aceitação do funcionário público para sua caracterização.
O elemento subjetivo é o dolo, acrescido de um especial fim de agir,
consistente em determinar o funcionário público a praticar, omitir ou retardar
ato de ofício. O delito consuma-se com a oferta ou promessa de vantagem
indevida ao funcionário público, independentemente da sua aceitação.
Trata-se de crime
formal. O efetivo recebimento da propina pelos funcionários públicos não é
exigido para condenação, porquanto a mera oferta de vantagem indevida, ainda
que sua natureza não seja econômica, já tipifica o ilícito penal. Decidiu o STF
que o crime de corrupção ativa consuma-se “quando o oferecimento ou a promessa
de vantagem indevida chega ao conhecimento do funcionário, independentemente da
aquiescência” e “ainda que a oferta seja recusada pelo funcionário". (STF,
HC 105.478, voto do rel. min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, mar/2011) Não
se exige, também, que o ato de ofício tenha efetivamente sido praticado,
omitido ou retardado pelo servidor. Aliás, esse resultado, quando ocorrido,
implicará o aumento da pena em um terço, nos termos do parágrafo único do art.
333.
2.4. Dispensa
indevida de licitação e beneficiar-se de dispensa indevida de
licitação: art. 89, caput e parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. A
Constituição Federal, em seu art. 37, traz um rol de princípios a serem
observados pela administração pública direta e indireta e, determina, ainda, no
seu inciso XXI, a realização de licitação, como regra, para a contratação de
obras, serviços, compras e alienações, devendo ser observada a “igualdade de
condições a todos os concorrentes”, permitidas apenas “exigências de qualificação
técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”
(CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos
Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte: XXI - ressalvados os casos especificados na
legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante
processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas
as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá
as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações”). Prevê ainda, em seus artigos 173 e 175, que mesmo
as empresas públicas e as sociedades de economia mista estejam submetidas à
exigência de licitação, bem como que a concessão ou permissão de serviços
públicos se dará “sempre através de licitação”.
A matéria é
disciplinada pela Lei 8.666/93, que estabelece normas gerais sobre licitações e
contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de
publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, vinculando os órgãos da
administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações
públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais
entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito
Federal e Municípios. MARCIO PESTANA chama atenção, de outro lado, para o fato
de que há leis específicas estabelecendo normas especiais para determinados
setores, como é o caso da Lei 9.472/97, que disciplina a concessão, permissão
ou autorização para exploração de serviços de telecomunicações e de uso de
radiofreqüência, a lei 10.191/01, que dispõe sobre a aquisição de produtos para
a implementação de ações de saúde no âmbito do Ministério da Saúde, a Lei
9.478, que disciplina as atividades de exploração, desenvolvimento e produção
de petróleo e de gás natural mediante concessão, a Lei 11.284/06, que dispõe
sobre concessão florestal, a Lei 12.232/10, que regula a contratação de séricos
de publicidade por intermédio de agências de propaganda, e a Lei 12.462/11, que
instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas quanto às licitações e
contratos atinentes à Copa das Confederações de 2013, à Copa do Mundo de 2014 e
aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016 (PESTANA, Marcio. Licitações
Públicas no Brasil: exame integrado das Leis 8.666/93 e 10.820/02. São Paulo:
Atlas, 2013, p. 13 e seguintes).
O artigo 2º da Lei
8.666/93 dispõe que as contratações com terceiros serão “necessariamente
precedidas de licitação”, ressalvadas as hipóteses que a própria lei
estabelece, quando é autorizada a contratação direta. Dentre as modalidades de
licitação, encontram-se a concorrência, a tomada de preços, o convite, o
concurso e o leilão, nos termos do art. 22 da Lei 8.666/93. Há, ainda, o
pregão, disciplinado pela Lei 10.520/02.
A licitação é um
procedimento administrativo que a Administração deve realizar previamente às
contratações, com vista à identificação de possível contratante que lhe ofereça
a melhor proposta. MARCIO PESTANA esclarece: “Os critérios identificadores do
que reputa ser a melhor posposta deverão ser claramente alojados no instrumento
convocatório...” E conclui: “A melhor posposta, uma vez identificada e,
posteriormente, contratada, contribui para que a Administração Pública melhor
possa zelar pela coisa pública, realizando a contratação que julgue melhor
atender às suas necessidades e, consequentemente, de toda a coletividade”
(PESTANA, Marcio. Licitações Públicas no Brasil: exame integrado das Leis
8.666/93 e 10.820/02. São Paulo: Atlas, 2013, p. 34).
A Lei 8.666/93
destaca, em seu art. 3º, a finalidade da licitação, in verbis:
Art. 3o A
licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da
isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a
promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em
estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da
impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade
administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento
objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei 12.349/10)
Como se vê, a
licitação procura preservar a isonomia e a impessoalidade e visa à eficiência,
assim considerada a contratação mediante seleção da proposta mais vantajosa.
Conforme MARÇAL JUSTEN FILHO, a Constituição “acolheu a presunção de que prévia
licitação produz a melhor contratação – entendida como aquela que assegura a
maior vantagem possível à Administração Pública, com observância do princípio
da isonomia”. Mas esse autor destaca que “a própria Constituição se encarregou
de limitar tal presunção, facultando contratação direta nos casos previstos por
lei” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos
Administrativos. 15ª edição. São Paulo: Dialética, 2012, p. 328). Efetivamente,
o art. 37, inciso XXI, ressalvou a possibilidade de a Lei estabelecer casos
para os quais não seja necessária licitação. De qualquer modo, a licitação é a regra.
Apenas em casos excepcionais, previstos em lei, será lícito realizar
contratações sem prévia licitação.
Na própria Lei
8.666/93 (Lei de Licitações), cuidou-se de criminalizar determinadas condutas
de modo a assegurar a realização dos procedimentos licitatórios e sua lisura. E
ainda destaca que a perda do cargo é efeito da condenação: “Art. 83. Os crimes
definidos nesta Lei, ainda que simplesmente tentados, sujeitam os seus autores,
quando servidores públicos, além das sanções penais, à perda do cargo, emprego,
função ou mandato eletivo.” A Seção III cuida dos Crimes e das Penas. Dispõem a
respeito os artigos 89 a 99.
Dentre as condutas
criminalizadas, estão, por exemplo, o patrocínio de interesse privado perante a
Administração dando causa à instauração de licitação ou à celebração de
contrato que venha a ser invalidado pelo Judiciário (art. 91), admitir,
possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive
contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados
com o Poder Público, sem autorização ou, ainda, pagar fatura com preterição da
ordem cronológica de sua exigibilidade (art. 92). Assim, também, impedir,
perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório
(art. 93), devassar o sigilo de proposta apresentada em procedimento
licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo (art. 94),
fraudar licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou
contrato dela decorrente, e.g., elevando arbitrariamente os preços (art. 96),
dentre outras condutas.
Centraremos atenção
nos tipos que parecem ser aqueles mais recorrentes nas ações penais perante a
Justiça Federal: dispensa ou inexigibilidade ilegais de licitação (art. 89 da
Lei 8.666/93); e frustração do caráter competitivo de licitação (art. 90 da Lei
8.666/93).
Dispõe o art. 89 da
Lei de Licitações:
Art. 89. Dispensar ou inexigir
licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as
formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5
(cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena
incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar
contrato com o Poder Público.
O dispositivo
remete à dispensa ou inexigência de licitação, ou seja, à contratação direta
sem a realização prévia de licitação (“Há situações em que a Administração
recebe da lei o comando para a contratação direta; há outras em que a Administração
recebe da lei autorização para deixar de licitar, se assim entender conveniente
ao interesse do serviço; hipóteses há em que a Administração defronta-se com
inviabilidade fática para licitar, anuindo a lei em que é inexigível fazê-lo; e
há um caso em que à Administração é defeso licitar, por expressa vedação da
lei. Estes quatro grupos de situações constituem exceções ao dever geral
constitucional de licitar. No primeiro grupo estão as hipóteses do art. 17,
incisos I e II; no segundo, as do art. 24, no terceiro, as do art. 25, entre
outras que com elas se venham a identificar no dia-a-dia da Administração; no
último, a do at. 7º, § 5º.” (PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à Lei
das Licitações e Contratações da Administração Pública. Rio de Janeiro:
Renovar, 2009, p. 290).
As hipóteses de
inexigibilidade de licitação estão arroladas no art. 25 da Lei 8.666/93,
alcançando, por exemplo, a aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que
só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial
exclusivo e a contratação de serviços técnicos com profissionais ou empresas de
notória especialização. MARÇAL JUSTEN FILHO esclarece que as hipóteses de
dispensa de licitação dizem respeito a situações “em que a licitação formal seria
impossível ou frustraria a realização adequada das funções estatais”. Nesses
casos, o “procedimento licitatório normal conduziria ao sacrifício dos fins
buscados pelo Estado e não asseguraria a contratação mais vantajosa”, razão
pela qual é excepcionado (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações
e Contratos Administrativos. 15ª edição. São Paulo: Dialética, 2012, p. 329).
Destaca que se caracterizam por um desequilíbrio do custo/benefício, seja de
caráter econômico (quando o custo econômico da licitação for superior ao
benefício dela extraível), temporal (quando a demora na realização da licitação
puder acarretar a ineficácia da contratação), de ausência de potencial
benefício ou em face da função extraeconômica da contratação (quando a contratação
não for norteada pelo critério da vantagem econômica, porque o Estado busca
realizar outros fins) (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e
Contratos Administrativos. 15ª edição. São Paulo: Dialética, 2012, p. 334). As
hipóteses de dispensa de licitação constam, em geral, do art. 24 e, algumas
relacionadas a alienação de bens e direitos, do art. 17 do mesmo diploma.
Pode-se exemplificar a dispensa referindo as contratações de pequeno valor, em
casos de emergência ou de calamidade e quando licitação anterior tiver restado
frustrada por ausência de interessados e não puder ser repetida sem prejuízo à
Administração.
Importa considerar
que as hipóteses de inexigibilidade e de dispensa de licitação, por vezes,
contemplam algum grau de discricionariedade, não sendo simples a sua análise.
Daí porque MARCIO PESTANA adverte: “havendo motivação logicamente pertinente e
cuidadosamente circunstanciada, em conjunto com coerente fundamentação jurídica
para justificar a não realização da licitação, assim como, ainda, obediência
SOS procedimentos aplicáveis, não nos parece apropriado sequer cogitar-se de
aplicação, em concreto, da sanção criminal prescrita no art. 89 da Lei
8.666/91” (PESTANA, Marcio. Licitações Públicas no Brasil: exame integrado das
Leis 8.666/93 e 10.820/02. São Paulo: Atlas, 2013, p. 892).
O STF decidiu que o
ilícito penal depende da caracterização do ilícito administrativo. Assim,
considerou não haver crime em caso no qual restou demonstrada a notória
especialização dos profissionais contratados, o que implicava inexigibilidade
de licitação. Vejamos:
“AÇÃO PENAL PÚBLICA. CONTRATAÇÃO
EMERGENCIAL DE ADVOGADOS FACE AO CAOS ADMINISTRATIVO HERDADO DA ADMINISTRAÇÃO
MUNICIPAL SUCEDIDA. LICITAÇÃO. ART. 37, XXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DISPENSA
DE LICITAÇÃO NÃO CONFIGURADA. INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO CARACTERIZADA PELA
NOTÓRIA ESPECIALIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS CONTRATADOS, COMPROVADA NOS AUTOS,
ALIADA À CONFIANÇA DA ADMINISTRAÇÃO POR ELES DESFRUTADA. PREVISÃO LEGAL. A
hipótese dos autos não é de dispensa de licitação, eis que não caracterizado o
requisito da emergência. Caracterização de situação na qual há inviabilidade de
competição e, logo, inexigibilidade de licitação. 2. "Serviços técnicos
profissionais especializados" são serviços que a Administração deve
contratar sem licitação, escolhendo o contratado de acordo, em última
instância, com o grau de confiança que ela própria, Administração, deposite na
especialização desse contratado. Nesses casos, o requisito da confiança da
Administração em quem deseje contratar é subjetivo. Daí que a realização de
procedimento licitatório para a contratação de tais serviços - procedimento
regido, entre outros, pelo princípio do julgamento objetivo - é incompatível
com a atribuição de exercício de subjetividade que o direito positivo confere à
Administração para a escolha do "trabalho essencial e indiscutivelmente
mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato" (cf. o § 1º do
art. 25 da Lei 8.666/93). O que a norma extraída do texto legal exige é a notória
especialização, associada ao elemento subjetivo confiança. Há, no caso
concreto, requisitos suficientes para o seu enquadramento em situação na qual
não incide o dever de licitar, ou seja, de inexigibilidade de licitação: os
profissionais contratados possuem notória especialização, comprovada nos autos,
além de desfrutarem da confiança da Administração. Ação Penal que se julga
improcedente.” (STF, Tribunal Pleno, AP 348, Rel. Min. EROS GRAU, dez/06)
O que se pode
concluir, com destaque, é que o legislador reafirma que a regra é a realização
de licitação e que isso deve ser respeitado, sendo que a contratação direta só
é cabível quando o procedimento licitatório não seja exigível ou esteja
expressamente dispensado por lei. A infração a tal premissa constitucionalmente
tem relevância penal. MARCIO PESTANA sintetiza: “Repulsa ao direito, sobretudo
no que atina ao aspecto da moralidade, a dispensa ou inexigibilidade de certame
licitatório, quando necessária e cabível a sua realização” (PESTANA, Marcio. Licitações
Públicas no Brasil: exame integrado das Leis 8.666/93 e 10.820/02. São Paulo:
Atlas, 2013, p. 891).
A licitação evita a
celebração de contratos movidos por interesses pessoais dos agentes públicos e
econômicos em detrimento dos cofres públicos. Através da licitação,
seleciona-se, com respeito à isonomia e à impessoalidade, a proposta mais
vantajosa para a Administração, de modo que não haja malversação de recursos. O
afastamento da licitação para a realização de contratação direta, em face do
seu potencial lesivo aos princípios que regem a administração e ao interesse
público, é descrito como crime no art. 89 da Lei 8.666/93.
O dispositivo
refere, de um lado, dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei e, de outro, deixar de observar as formalidades pertinentes à
dispensa ou à inexigibilidade. Isso porque mesmo quando for o caso de
inexigibilidade ou de dispensa, devem ser justificadas. MARÇAL JUSTEN FILHO
destaca que, de qualquer modo, é necessário “apurar e comprovar o preenchimento
dos requisitos para contratação direta (dispensa ou inexigibilidade). Por
outro, busca-se selecionar a melhor proposta possível, com observância (na
medida do possível) do princípio da isonomia. Se a Administração pode escolher
o particular, isso não significa autorizar escolhas meramente subjetivas.
Deverá evidenciar que, nas circunstâncias, a contratação foi a melhor possível.
Logo, deverão existir dados concretos acerca das condições de mercado, da
capacitação do particular escolhido etc.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à
Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15ª edição. São Paulo:
Dialética, 2012, p. 330).
MARÇAL JUSTEN FILHO
desta que “A punição penal incide não apenas quando o agente ignorar as
hipóteses previstas para a contratação direta, mas também quando, de modo
fraudulento, simular a presença de tais requisitos.” (JUSTEN FILHO, Marçal.
Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15ª edição. São
Paulo: Dialética, 2012, p. 1034). Assim, também, MARCIO PESTANA: “...
também aquele que não obedecer aos procedimentos previstos em lei para as
contratações diretas... estará sujeito a sofrer a aplicação da aludida sanção
penal, conforme extrai-se da parte in fine do aludido
preceptivo legal.” (PESTANA, Marcio. Licitações Públicas no Brasil: exame
integrado das Leis 8.666/93 e 10.820/02. São Paulo: Atlas, 2013, p. 892).
A dispensa ou
inexigibilidade ilegais podem ocorrer de diversas maneiras e não apenas
mediante a prática de crimes de falso. O STF, por isso, afasta a consunção.
Vejamos: “não há relação de necessariedade entre o crime de falso e o crime no
art. 89 da Lei 8.666/1993. É dizer, não é indispensável para o tipo do art. 89
da Lei 8.666/1993 que se utilize de documento ideologicamente falso, o uso de documento
não perfaz elemento normativo do tipo descrito na Lei das Licitações, razão
pela qual não há consumação entre os delitos.” (STF, RHC 118.030, rel. min.
LUIZ FUX, julgamento em 19-8-2014, Primeira Turma).
O dispositivo
refere a conduta, sem exigir qualquer resultado material. Desse modo, pode-se
concluir que se trata de crime formal. Mas há bastante controvérsia sobre esse
ponto.
A conclusão, no
sentido de tratar-se de crime formal, justifica-se pela redação do dispositivo,
que não coloca como elemento do tipo qualquer resultado material. Ademais,
tratando-se de crime pluriofensivo, o desrespeito à impessoalidade e à
igualdade, por si só, configuram ofensa a bem jurídico tutelado pela norma,
independentemente da configuração de prejuízo econômico.
Veja-se recente
julgado do STF sobre o ponto:
“4. O crime do art. 89 da Lei
8.666/90 é formal, consumando-se tão somente com a dispensa ou inexigibilidade
de licitação fora das hipóteses legais. Não se exige, para sua configuração,
prova de prejuízo financeiro ao erário, uma vez que o bem jurídico tutelado não
se resume ao patrimônio público, mas coincide com os fins buscados pela
Constituição da República, ao exigir em seu art. 37, XXI, ‘licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes’. Tutela-se,
igualmente, a moralidade administrativa, a probidade, a impessoalidade e a
isonomia.” (STF, AP 971, rel. Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, jun/2016).
O TRF4 também já
reconheceu que “não se trata de crime material, pois não exige a demonstração
de efetivo prejuízo aos cofres públicos, como, por exemplo, que os valores
tenham sido superfaturados ou que o objeto não tenha sido cumprido”. E
ressaltou: “O dispositivo não diz: causar prejuízo ou dano em razão da dispensa
ou inexigibilidade de licitação. Também não exige qualquer dolo específico,
qualquer fim especial para o agir”. Ponderou, ainda, que “a moralidade, a
impessoalidade e a eficiência administrativas decorrentes da pura e simples
exigência e realização das licitações constituem, por si mesmas, bens dignos de
tutela.” (TRF4, Quarta Seção, AI 0019925-72.2006.4.04.7000/PR, rel. Des. Fed.
MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, jun/2016).
Mas também há
doutrina e precedentes em sentido diverso. MARCIO PESTANA entende que “seria um
absoluto sem sentido apenar-se o agente, quando a contratação trouxera
benefícios à Administração” (PESTANA, Marcio. Licitações Públicas no Brasil:
exame integrado das Leis 8.666/93 e 10.820/02. São Paulo: Atlas, 2013, p. 892).
E MARÇAL JUSTEN FILHO também se posiciona pela imprescindibilidade do resultado
material de dano aos cofres públicos:
“Não se aperfeiçoa o crime do art. 89
sem dano aos cofres públicos. Ou seja, o crime consiste não apenas na indevida
contratação indireta, mas na produção de um resultado final danoso. Se a
contratação direta, ainda que indevidamente adotada, gerou um contrato
vantajoso para a Administração, não existirá crime. Não se pune a mera conduta,
ainda que reprovável, de deixar de adotar a licitação. O que se pune é a
instrumentalização da contratação di8reta para gerar lesão patrimonial à
Administração.”JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e
Contratos Administrativos. 15ª edição. São Paulo: Dialética, 2012, p. 1034.
De qualquer modo,
mesmo tratando-se de crime formal, não se deve olvidar que o dolo é exigido.
Efetivamente, não se deve confundir a natureza do crime com a exigência ou não
de dolo. O tipo do art. 89 da Lei 8.666/93 é doloso, como são todos os tipos
penais, ressalvada disposição legal expressa em sentido diverso. Conforme já
destacou o STF, não se pode confundir o administrador inapto do administrador
ímprobo:
“5. Para a configuração da tipicidade
subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, o Supremo Tribunal
Federal exige o especial fim de agir, consistente na intenção específica de
lesar o erário. Assim, distinguem-se as meras irregularidades administrativas
do ato criminoso e deliberado de dispensar licitação quando à toda evidência
era ela obrigatória. Destarte, não se confunde o administrador inapto com o administrador
ímprobo. Sendo flagrante a ilegalidade da dispensa, mostra-se configurada a
intenção específica de lesar o erário, mormente quando outros elementos
probatórios apontam nessa direção.” (STF, AP 971, rel. Min. EDSON FACHIN,
Primeira Turma, jun/2016).
A 7ª Turma do TRF4,
aliás, já afirmara: “Diante da necessidade de distinguir o administrador
ímprobo do administrador inepto, a existência de dolo específico de lesar o
erário se mostra imprescindível para caracterizar o crime de dispensa irregular
de licitação” (TRF4, ACR 5000477-98.2011.404.7211, Sétima Turma, Relator p/
Acórdão RICARDO RACHID DE OLIVEIRA, juntado aos autos em jan/2015).
Assim, exige-se a
ação deliberada de dispensar ou inexigir, ou de deixar de observar as
formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade quando o agente sabe
que deveria agir de modo diverso e, ainda assim, decide agir em desconformidade
com a lei, ou, ao menos, faz pouco caso da exigência de licitação, incorrendo
em dolo eventual. O STF rejeitou denúncia quanto a inexigibilidade que fora
considerada regular pelo Tribunal de Contas, entendendo que, não tendo sido
trazidos maiores elementos pelo Ministério Público, não havia justa causa para
a ação (STF, HC 107.263, rel. min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, jun/2011). Também
rejeitou denúncia relativamente a conduta de quem agira embasado em parecer da
Procuradoria Jurídica no sentido da inexigibilidade da licitação, sendo certo
que destacou, na hipótese, que se tratava de situação em que as contratações costumam
ser intuitu personae (STF, Inq 2.482, rel. p/ o ac. min. LUIZ
FUX, Plenário, set/2011). Em outro caso, porém, destacou que “Embora seja
importante elemento de convicção, o fato de a ilegal dispensa de licitação ter
sido embasada em parecer jurídico que afirmava a licitude do proceder, não é,
por si só, suficiente a descaracterizar o dolo, mormente quando os elementos
probatórios indicam, com segurança, que o apelado tinha plena ciência da
ilicitude da dispensa” (STF, AP 971, rel. Min. EDSON FACHIN, Primeira
Turma, jun/2016).
Na hipótese de
cuidarmos de simples negligência ou imperícia, não estaremos frente a uma
conduta dolosa, mas, isso sim, de um agir meramente culposo, não caracterizador
do tipo penal. No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, aliás, há precedente
frisando: “Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmada
a partir do julgamento da APn n. 480/MG, a consumação do crime do art. 89 da
Lei n. 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a intenção
de causar dano ao Erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres
públicos” (STJ, REsp 1185582/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA
TURMA, julgado em 21/11/2013).
A figura do
parágrafo único do art. 89, por sua vez, tem o efeito de explicitar que o
particular que concorre para o crime, beneficiando através de contratação
mediante dispensa ou inexigibilidade ilegais, também comete o crime: “Na mesma
pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da
ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar
contrato com o Poder Público”. Não houvesse tal dispositivo, de qualquer modo
se reconheceria a co-autoria nesses casos, forte no art. 29 do CP.
Trata-se de caso de
co-autoria, de modo que jamais teremos a figura do parágrafo único sem que
algum servidor tenha incorrido no crime do “caput”. Correta, portanto, a
afirmação feita por MARÇAL JUSTEN FILHO: “Não é juridicamente possível
reconhecer a existência do crime do parágrafo único sem a consumação do crime
previsto no caput do art. 89.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei
de Licitações e Contratos Administrativos. 15ª edição. São Paulo:
Dialética, 2012, p. 1040).
3. Da
tipicidade das condutas, da especialidade e da consunção. Para a análise de
cada recurso de embargos infringentes, é necessário definir a subsunção das
condutas aos tipos penais já referidos, sendo relevante, para tanto,
considerar-se a especialidade. Concluindo-se que não se configura o tipo de
determinado crime, não há sequer de ser analisada a respectiva consunção, se
absorve ou é absorvido; caso configurado o tipo, aí sim sua relação com os
demais crimes será pertinente, importando verificar se é adequada a
conclusão dos Desembargadores quanto à aplicação do instituto da consunção e
em que sentido.
Assim,
estabelecerei premissas sobre a especialidade e sobre a consunção em
matéria penal.
Há conflito
aparente de normas penais quando estamos diante de duas ou mais normas
incriminadoras que, supostamente, regulam o mesmo fato. Trata-se de um conflito
meramente aparente, porquanto a ciência jurídica oferece critérios para
identificarmos a qual norma subsume-se aquela determinada conduta: princípios
da especialidade, da alternatividade, da subsidiariedade e da consunção.
Dentre tais instrumentos,
o princípio da consunção é aplicável diante de concurso de crimes em que o
crime-meio tem o seu potencial lesivo restrito à realização do crime-fim. Nessa
hipótese, o delito intermediário resulta absorvido por esse último. Os fatos,
consoante lição de ROGÉRIO GRECO, não se acham em relação de espécie e gênero,
mas de menos a mais, de parte a todo, de meio a fim. (GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal – Parte Geral. 10. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008) Assim, a
consumação absorve a tentativa e esta absorve o incriminado ato preparatório; o
crime de lesão absorve o correspondente crime de perigo; o homicídio absorve a
lesão corporal; o furto em casa habitada absorve a violação de domicílio, etc..
De outro lado, a
especialidade preconiza que a norma especial afasta a aplicação da norma geral.
É a regra expressa pelo brocardo lex specialis derrogat generali. Em
determinados tipos penais incriminadores, há elementos que os tornam especiais
em relação a outros, fazendo com que, se houver uma comparação entre eles, a
regra contida no tipo especial, se amolde adequadamente ao caso concreto,
afastando, desta forma, a aplicação da norma geral.
Em tal perspectiva,
o que definirá a utilização de tal instrumento hermenêutico em detrimento dos
demais é a possibilidade de identificarmos esta relação de meio e fim já no
âmbito normativo (plano abstrato) – hipótese em que trabalharemos com a
subsidiariedade, alternatividade ou especialidade –, ou, alternativamente, se
tal relação entre as condutas é imposta diretamente pelos fatos sob exame
(plano concreto) – hipótese em que a consunção será chamada a
atuar. Traçando comparativo entre a subsidiariedade e a consunção,
FERNANDO CAPEZ esclarece o que ora afirmo:
“É muito tênue a linha diferenciadora
que separa a consunção da subsidiariedade. Na verdade, a distinção está apenas
no enfoque dado na incidência do princípio. Na subsidiariedade, em função do
fato concreto praticado, comparam-se as normas para se saber qual é a
aplicável. Na consunção, sem recorrer às normas, comparam-se os fatos,
verificando-se que o mais grave absorve todos os demais. O fato principal
absorve o acessório, sobreando apenas a norma que o regula. A comparação,
portanto, é estabelecida entre fatos e não normas, de maneira que o mais perfeito,
o mais completo, o “todo”, prevalece sobre a parte.” (CAPEZ, FERNANDO. Curso de
Direito Penal. Vol1. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 187)
GUILHERME DE SOUZA
NUCCI fornece interpretação similar ao princípio em estudo:
“Na consunção, o fato está contido em
outro de maior amplitude, permitindo uma única tipificação (o homicídio absorve
o porte ilegal de arma porque a vítima perdeu a vida em razão dos tiros
disparados pelo revólver do agente, o que demonstra estar o fato – portar
ilegalmente uma arma – ínsito em outro de maior alcance – tirar a vida ferindo
a integridade física de alguém). Ocorre que é possível matar alguém sem dar
tiros, isto é, sem portar ilegalmente uma arma. Assim, a consunção envolve
fatos que absorvem fatos, enquanto a subsidiariedade abrange tipos que, de
algum modo, contêm outros.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito
Penal: Parte Geral. 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.
p.150)
Também vale
retomarmos o ensinamento de FERNANDO DE ALMEIDA PEDROSO, in Direito
Penal. Vol. 1. Método, 2008, p. 678:
“Na consunção (lex consumens derogat
legi consumptae) ocorre uma continência de tipos. Alguns tipos são absorvidos e
consumidos por outro, denominado consuntivo, dentro de uma linha evolutiva ou
de fusão que os condensa numa relação de continente a conteúdo. O tipo
consuntivo, que atrai os demais para o seu campo de força, prevalece e
predomina a final como uma unidade, pois desintegra e dilui os outros em seu
contexto. O tipo consuntivo pode exercer sua força atrativa sobre fatos típicos
anteriores (efeito ex tunc), tornando-os ante factum impuníveis,
ou absorver fatos ulteriores (efeito ex nunc), fazendo-os post
factum impuníveis”.
No caso dos autos,
a relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, concluiu
pela prática de todos os delitos de forma autônoma. O então revisor,
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, entendeu que tudo deveria ser
compreendido sob a perspectiva de um grande crime de peculato-desvio, restando
absorvidos os crimes-meio praticados para a viabilização e
operacionaliza do desvio, quais sejam, os crimes de corrupção ativa,
corrupção passiva, dispensa indevida de licitação e beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação. O Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, por sua
vez, à época vogal, manifestou entendimento de que foram praticados crimes de
corrupção e licitatórios e que tais crimes, por guardarem autonomia e
ofenderem bens jurídicos distintos, não podem ser reduzidos ao crime de
peculato-desvio. Conforme a conduta de cada réu, ora absolveu do
peculato por não considerar tipificado tal crime, ora o considerou
absorvido pelos demais, na medida em que o desvio constituiu mera consequência,
verdadeiro exaurimento dos crimes anteriores.
Diante da ausência
de consenso entre os votos proferidos pelos três Desembargadores Federais, foi
adotado o critério do voto médio, mediante o qual prevalece, dentre todas
as possibilidades aventadas pelos Julgadores, aquela que observa o 'meio-termo'
entre elas, previsto no art. 195 do RITRF4:
Art. 195. A decisão da Turma será
tomada pelo voto da maioria dos seus membros ou pelo voto médio, exceto nas
hipóteses previstas no artigo 942 do CPC. (Redação dada pelo Assento Regimental
nº 11, de 23/05/2016)
O voto médio foi
identificado pelo critério quantitativo e não qualitativo.
Impende destacar
que todos os Desembargadores Federais entenderam pela condenação dos réus,
apenas divergindo quanto à tipificação das condutas.
Passo, na
sequência, a examinar a divergência apontada pelos embargantes e a decisão que
deve prevalecer em cada caso.
4. Inicialmente,
aprecio os recursos manejados pelos embargantes para os quais prevaleceu
o voto proferido pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha e
que pedem a prevalência do voto Desembargador Federal Sebastião Ogê
Muniz, o revisor.
4.1. JOSÉ
ANTONIO FERNANDES, FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES e FERNANDO FERNANDES objetivam
a prevalência do voto mais favorável proferido pelo Revisor, que, por entender
que os delitos de corrupção ativa e locupletamento em dispensa ilegal de
licitação restaram absorvidos pelo crime de peculato-desvio, os condenou às
penas de 7 (sete) anos, 6 (seis) meses e 11 (onze) dias de reclusão, em regime
semiaberto (José Antônio e Ferdinando) e 5 (cinco) anos e 5 (cinco) meses de
reclusão, em regime semiaberto (Fernando), respectivamente, pelo cometimento
deste delito. Alternativamente, caso mantido o voto-médio proferido pelo
Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, pedem a aplicação da regra do crime
continuado, vertida no voto do Revisor, relativamente aos crimes de
locupletamento em indevida dispensa de licitação.
O voto-médio do
Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, o qual prevaleceu, implicou a
decretação da prescrição da pretensão punitiva quando ao crime de quadrilha (art.
288 do CP) e a condenação dos ora embargantes pela prática dos delitos de
beneficiar-se de dispensa indevida de licitação (Fatos 5, 6 e 7) e corrupção
ativa (fato 14) às penas privativas de liberdade de 12 (doze) anos, no regime
inicial semiaberto, e 210 (duzentos e dez) dias-multa, no valor unitário de
8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente na data dos fatos (Fernando) e de
13 (treze) anos de pena privativa de liberdade, no regime inicial semiaberto, e
440 (quatrocentos e quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário
mínimo vigente na data dos fatos (Ferdinando e José Fernandes), sob os
seguintes fundamentos (ev. 280):
(...) Crimes de corrupção
ativa e passiva e de licitações. Não consunção.
A Exma. Relatora afasta as teses
defensivas que buscam considerar os crimes de corrupção absorvidos pelo
peculato, mantendo, em geral, as condenações proferidas na sentença, com
exceção do réu Carlos Dahlem da Rosa, que absolve do delito de corrupção ativa
(fatos 12 e 14) e dos réus Silvestre Selhorst e Rubem Höher, que absolve do
delito de corrupção passiva (fato 20).
O Exmo. Revisor, no ponto, entende
que os crimes de corrupção devem ser absorvidos pelos crimes de peculato, sob o
fundamento de que as vantagens indevidas oferecidas e prometidas aos servidores
públicos correspondiam a uma parcela do dinheiro público que por eles viria a
ser desviado, em proveito próprio e em proveito de terceiros, concluindo que as
vantagens indevidas se confundem com o produto do peculato-desvio.
Neste ponto, com a vênia do Exmo.
Revisor, acompanho a Exma. Relatora nos pontos em que mantém
as condenações pelos crimes de corrupção ativa e passiva, destacando que a
oferta de vantagem indevida é um conceito amplo, abarcando não apenas o
oferecimento de dinheiro em espécie, mas outras formas de locupletamento
ilícito, como, no caso, a realização de contratos decorrentes dos serviços
públicos cuja licitação foi indevidamente dispensada, bem como subcontratações,
e pagamentos de valores a esses títulos, ou, ainda, outros favores prometidos
ou recebidos, cuja oferta, pelo particular, ou a aceitação, pelo agente
público, sejam irregulares.
A corrupção, no caso, apresenta
tipicidade autônoma, violando sistema de proteção fundada em cláusulas
constitucional (art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988) e legal (Lei
8.666/96) expressas, impondo dever inafastável de todo administrador público
efetuar a contratação de serviços mediante licitação. O afastamento irregular
do processo licitatório, afastando o regime de proteção legal da Administração,
causa lesão jurídica complexa, sendo evidente a pluriofensividade do crime em
questão. Primeiro, o crime ofende o dever lisura dos servidores públicos no
exercício de suas funções, que para tanto deve operar segundo os princípios
constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade,
eficiência. Inferem-se diretamente de tais princípios a proibição de praticar
atos sem que o interesse público seja a meta essencial, a proibição de praticar
atos com parcialidade, buscando o favorecimento de terceiros; a proibição de
praticar atos sem finalidade pública e sem que exista boa-fé. Segundo, o crime
ofende o dever de, através de licitação, promover a concorrência entre os
diversos interessados, ferramenta essencial para a obtenção da melhor oferta em
prol dos interesses envolvidos. Terceiro, ausente o devido processo
licitatório, e esboroada a sua publicidade inerente, afasta-se por completo a
possibilidade do cidadão acompanhar e controlar o ato administrativo,
enfraquecendo o Estado e a participação da Sociedade no controle da
Administração.
A existência desse farto e robusto
conjunto de interesses a serem defendidos recomenda, com propriedade, que se
sancione com a punição criminal, todo aquele que, buscando interesses escusos, promova
a contratação de serviços públicos sem o processo legal de licitação.
Por outro lado, se para efetuar a
dispensa ilegal de licitação, o servidor público ainda se beneficia
pessoalmente, em ato de corrupção ativa ou passiva, acaba por violar outro interesse
juridicamente tutelado, ligado à necessária probidade no desempenho de qualquer
cargo ou função pública.
Configurados os crimes de corrupção e
licitatórios. Daí porque não são miscíveis em um único tipo penal, sob a
invocação de princípio consuntivo, ações criminosas que violam interesses
jurídicos tão amplos quanto específicos, voltados de um lado, à proteção da
lisura nos processos de aquisição de bens e serviços, de outro lado, ao
asseguramento da probidade pública. Isso impõe que, efetuada a dispensa ilegal
de licitação, mediante ato de corrupção, ficam configurados crimes sob dois
aspectos, no licitatório os crimes de dispensa irregular de licitação e de
beneficiar-se da dispensa irregular; e no da probidade do servidor público, os
atos de corrupção passiva e ativa.
Afastamento do crime de
peculato-desvio. Seguindo o mesmo raciocínio anterior, fica claro que se o
funcionário é corrompido ou se corrompe, e com isso afasta o processo
licitatório em benefício de terceiro, todo o dano causado à Administração já
ocorreu, sendo de menor importância, para fins penais, os destinos que se dá à
receitas advindas de um contrato assim fraudado. Há no meu entender, inversão
de valores pretender-se que tudo fosse resumido ao crime de peculato, cuja
objetividade jurídica é essencialmente de proteção da propriedade, olvidando-se
que foram cometidas ações criminosas violadoras de interesses inafastáveis, e
anteriores, ou seja, a ofensa à imposição licitatória e ao execramento jurídico
da corrupção passiva e ativa.
Suficientemente defendido o interesse
coletivo com a incidência de tais tipos penais, ou em outras palavras, a esse
ponto já esboroada a ordem jurídica de modo irreparável, não há espaço para a
punição pelo peculato-desvio, pois, a uma, desviar o produto ilicitamente
obtido seria mero exaurimento dos crimes anteriores, a duas, pela absoluta
ausência, no caso, dos elementos constitutivos do tipo penal. Com efeito, o
crime de peculato, sob a modalidade de desvio, por ser próprio do servidor
público, depende de que o próprio funcionário tenha a habilidade de promover o
desvio de valores. (Peculato - Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de
dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem
a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio).
No caso em referência, conforme bem
exposto pelo voto da Exma Relatora, verbis: 'A ilegalidade das contratações se
verifica pelo vício de origem, já exposto, tratando-se de avenças nulas.
Relembrando, os contratos FATEC/DETRAN (34/2003 e 70/2003) e FUNDAE/DETRAN
(09/2007) são viciados pela indevida dispensa de licitação, dos delitos penais
subjacentes, o que contamina as contratações posteriores. Não fosse isso
suficiente, as subcontratações para a 'prestação' dos serviços não foi
expressamente autorizada pelo contratante (DETRAN), de modo que todas as
sistemistas operaram ilegalmente pela violação ao disposto no art. 72 da Lei n.
8.666/93.'
Frente a esse quadro, o amealhamento
de vantagens advindas de contratos ilícitos, ressalvadas as falsidades e tipos
penais outros, obtidos por meio de corrupção, configuram além dos tipos da
corrupção passiva e ativa qualificados, apenas o crime de beneficiar-se de
dispensa indevida de licitação, razão por quê, com a devida vênia, e lamentando
por abrir divergência quanto aos votos anteriores da Relatoria e da Revisão,
voto por absolver todos os réus dos crimes de peculato-desvio. (grifei)
Os embargantes
pretendem a prevalência do voto proferido pelo Revisor, Desembargador Federal
Sebastião Ogê Muniz, assim exarado:
(...) Pois bem.
O parecer do Ministério Público
Federal, subscrito pelo Dr. Ipojucan Corvello Borba, Procurador Regional da
República (evento 125), é no seguinte sentido:
Os peculatos-desvios englobam também
os eventos de corrupção ativa e passiva, eis que a forma de remuneração dos
agentes públicos corrompidos se dava mediante divisão das receitas das chamadas
sistemistas.
Acompanho, quanto ao tema, o
entendimento adotado no referido parecer.
(...) Em suma, o delito de peculato-desvio
consiste em desviar, em proveito próprio ou alheio, dinheiro, valor ou qualquer
outro bem móvel, público ou particular, de que o agente tem a posse em razão do
cargo.
O delito de corrupção ativa abrange
as condutas alternativas de: a) oferecer vantagem indevida a funcionário
público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício; b)
prometer vantagem indevida a funcionário público, para o mesmo fim.
O delito de corrupção passiva abrange
as condutas alternativas de solicitar vantagem indevida em razão do cargo que o
funcionário público ocupa, em receber essa vantagem indevida, ou em aceitá-la.
No presente caso, a vantagem indevida
objeto da corrupção ativa consistiu na oferta e promessa de pagamento, a
funcionários do DETRAN/RS, de uma parcela das prestações mensais dos contratos
de prestação de serviços que viriam a ser celebrados entre aquela autarquia e a
FATEC (primeiro e segundo contratos), e entre aquela autarquia e a FUNDAE
(último contrato). Os atos de ofício consistiram na deflagração das medidas
destinadas à contratação da FATEC (dois primeiros contratos) e da FUNDAE
(último contrato), com dispensa de licitação.
Em outras palavras, as vantagens
indevidas oferecidas e prometidas aos servidores públicos correspondiam a uma parcela
do dinheiro público que por eles viria a ser desviado, em proveito próprio e em
proveito de terceiros.
Por conseguinte, as vantagens
indevidas aceitas e recebidas pelos servidores públicos também correspondiam a
uma parcela dos recursos que constituíram alvo do peculato-desvio.
Verifica-se, portanto, que as
condutas correspondentes à corrupção ativa e passiva constituíram meio para a
prática do delito-fim, que era o delito de peculato-desvio.
A própria vantagem indevida destinada
aos agentes públicos consistia, no presente caso, na parte do produto do
peculato-desvio que foi desviada em proveito deles próprios.
Em outras palavras, os agentes do
delito de corrupção ativa outra coisa não fizeram senão oferecer e prometer,
aos agentes públicos que promoveram os delitos de peculato-desvio, uma parte do
valor dos recursos provenientes dos contratos celebrados entre o DETRAN/RS e a
FATEC, e entre o DETRAN/RS e a FUNDAE. E os agentes do delito de corrupção
passiva outra coisa não fizeram senão aceitar a oferta e promessa de tais
vantagens, bem como recebê-las.
No presente caso, portanto, a
vantagem indevida se confunde com o próprio produto do peculato-desvio.
Assim sendo, impõe-se que se
reconheça a absorção dos delitos de corrupção ativa e passiva pelo delito de
peculato-desvio, que é o crime-fim.
Em suma, sigo o entendimento no
sentido de que os delitos de corrupção ativa e passiva restaram absorvidos pelo
delito de peculato-desvio.
(...) Todavia, adotado o entendimento
no sentido de que a dispensa indevida de licitação (artigo 89, caput, da Lei
n.º 8.666/93), no caso, restou absorvida pelo delito de peculato-desvio, do
qual ela foi meio, com muito mais razão se justifica a adoção do mesmo
entendimento, com relação a quem se beneficia dessa dispensa indevida (artigo
89, parágrafo único, da Lei n.º 8.666/93).
Aliás, o parecer ministerial de que
trata o evento 125, subscrito pelo Dr. Ipojucan Curvello Borba, também é no
sentido de que ocorreu essa absorção.
Adoto, portanto, o entendimento no
sentido de que, no presente caso, o delito capitulado no artigo 89, parágrafo
único, da Lei n.º 8.666/93, restou absorvido pelo delito de peculato-desvio
(Código Penal, artigo 312, caput), em relação aos réus condenados pelos fatos
5, 6 e 7 da denúncia, acima referidos.
(...) Dosimetria.
Peculato-desvio. Refazimento.
Refaço, pois, a dosimetria da pena
atinente ao delito de peculato-desvio (fatos 8 e 9), nos termos que se seguem:
(...)- FERDINANDO FRANCISCO
FERNANDES
- Peculato-desvio (artigo
312 do Código Penal - fatos 8 e 9)
- Soma das penas não
prescritas: 07 (sete) anos, 06 (seis) meses e 11 (onze) dias de
reclusão.
- Regime inicial de cumprimento:
conforme o artigo 33, § 2º, alínea 'b', do Código Penal, deve ser fixado o
regime semiaberto para o início do cumprimento da pena, sendo incabível a
substituição por penas restritivas de direito.
- FERNANDO FERNANDES
- Peculato-desvio (artigo
312 do Código Penal - fatos 8 e 9)
- Soma das penas não
prescritas: 05 (cinco) anos e 05 (cinco) meses de reclusão.
- Regime inicial de cumprimento:
conforme o artigo 33, § 2º, alínea 'b', do Código Penal, deve ser fixado o
regime semiaberto para o início do cumprimento da pena, sendo incabível a
substituição por penas restritivas de direito.
(...)- JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES
- Peculato-desvio (artigo
312 do Código Penal - fatos 8 e 9)
- Soma das penas não
prescritas: 07 (sete) anos, 06 (seis) meses e 11 (onze) dias de
reclusão.
- Regime inicial de cumprimento:
conforme o artigo 33 § 2º, alínea 'b', do Código Penal, deve ser fixado o
regime semiaberto para o início do cumprimento da pena, sendo incabível a
substituição por penas restritivas de direito. (grifei)
A irresignação não
merece acolhida.
O Núcleo
Família Fernandes (PENSANT) era encabeçado por José Antônio
Fernandes, que teria controlado o esquema, encetando as negociações iniciais
(juntamente com dirigentes da UFSM e, muitas vezes, falando em nome da
instituição), ultimado a partilha dos recursos obtidos por meios espúrios para
formação da propina a agentes públicos e políticos e para desvio do dinheiro
público em benefício do enriquecimento ilícito. Teria aproximado a UFSM dos
dirigentes do DETRAN e se beneficiado do esquema mediante empresas
como a PENSANT (subcontratadas).
Dessume-se dos
autos que Ferdinando e Fernando Fernandes, no período contratual de junho/2003
a abril/2007, aparecem com alternância nos quadros societários da PENSANT e da
IGPL. Os réus operacionalizavam o sistema desenvolvido e gerenciado por seu pai
e também faziam a ligação entre os representantes das fundações de apoio e ele.
José Antonio
Fernandes era o chefe do núcleo Família Fernandes e era o sócio administrador
da PENSANT, exercendo gestão sobre a execução dos contratos FATEC/DETRAN, além
de ter ocupado o cargo de Coordenador Geral do Projeto Trabalhando pela Vida.
Ou seja, o sócio-proprietário de empresa contratada pela FATEC era também o
Coordenador Geral do projeto que tinha por fim dar cumprimento ao objeto
contratual firmado entre a FATEC e o DETRAN.
Os embargantes,
segundo consta da denúncia, concorreram diretamente para a indevida dispensa de
licitação e contratação da Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência - FATEC
pelo Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN/RS, por meio dos
Contratos/DETRAN n. 34/2003 e 70/2003, e contratação da Fundação Educacional
para o Desenvolvimento e Aperfeiçoamento do Ensino - FUNDAE com a mesma
autarquia, por meio do Contrato n. 09/2007, para aplicação dos Exames Teórico e
Prático de Direção Veicular.
A conduta típica de
Fernando, Ferdinando e José Antônio consistiu em laborar efetivamente para a
execução do sistema de contratações e subcontratações com dispensa ilegal de
licitação durante todo o período da execução dos contratos (n. 34/2003 e
70/2003 - DETRAN/FATEC e n. 09/2007 - DETRAN/FUNDAE).
Note-se, ainda, dos
autos que os embargantes ofereceram vantagem indevida a Carlos Ubiratan Dos
Santos e Hermínio Gomes Júnior (Fato 12), Flávio Roberto Luiz Vaz Netto (Fato
14), para que os primeiros funcionários públicos efetivassem a formalização dos
Contratos DETRAN/FATEC (34 e 70/2003) e DETRAN /FUNDAE (09/2007), e o último
funcionário público para que intermediasse os interesses da Família Fernandes
junto ao DETRAN/RS, bem assim facilitasse a operação do grupo junto a outros
DETRANS da Federação.
Dessarte, as
condutas imputadas aos réus não se subsumem ao tipo previsto no art. 312 do
Código Penal, valendo destacar que José Antonio, Ferdinando e Fernando
não detinham a posse, disponibilidade ou autoridade sobre os valores. Sabe-se
que, para tais hipóteses, o Código Penal ainda permite a condenação do
funcionário público que, mesmo sem a posse do valor, "o subtrai, ou
concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se da
facilidade que lhe proporciona" o cargo. Ocorre que o elemento central
para consumação de tal tipo penal é que a função pública exercida pelo acusado
lhe proporcione uma particular facilidade que enseje a lesão ao erário público.
Ou o próprio réu goza de tal facilidade e consuma o crime por si próprio, ou se
associe a alguém que detenha tal qualidade e pratica o delito próprio em
coautoria. O certo é que sendo o crime estranho às específicas funções públicas
que desempenha, não poderá o agente ser condenado por peculato de forma
solitária.
Todavia, as
condutas descritas na inicial revelam natureza diversa. A ação descrita pelo
Ministério Público Federal viola diversos bens jurídicos distintos daquele
tutelado pelo tipo do art. 312 do CP, restrito ao patrimônio público tutelado
pelos agentes do Estado. In casu, elementos externos ao DETRAN
cooptaram servidores públicos, realizaram falsidades documentais e articularam
esforços para que licitações fossem indevidamente dispensadas. Perceba-se que
esta pluriofensividade jurídica, bem reconhecida pelo voto do Des. Márcio
Rocha, foi realizada independentemente da função pública exercida por tais
indivíduos. A especialidade dessas condutas deve ser observada para adequado
julgamento da causa.
Nesse diapasão,
deve prevalecer o voto do Vogal que implicou a sua condenação aos crimes de
corrupção ativa e de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação e a
decretação da prescrição da pretensão punitiva relativa ao delito de quadrilha.
Verifica-se que as
penas fixadas pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha foram as mesmas
estabelecidas pela Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina
Cristofani, devendo ser mantidas, verbis:
(...) Ferdinando Francisco
Fernandes
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 5): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 12): 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e
80 (oitenta) dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 14): 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e
80 (oitenta) dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 10 (dez) anos e 06 (seis) meses de
detenção e 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, totalizando 13
(treze) anos de pena privativa de liberdade, no regime inicial
semiaberto, e 440 (quatrocentos e quarenta) dias-multa, no valor unitário de
1 (um) salário mínimo vigente na data dos fatos.
Fernando Fernandes
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 5): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta e
cinco) dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta e
cinco) dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta e
cinco) dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 12): 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e
45 (quarenta e cinco) dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 14): 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e
45 (quarenta e cinco) dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 09 (nove) anos e 09 (nove) meses de
detenção e 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, totalizando 12
(doze) anos de pena privativa de liberdade, no regime inicial
semiaberto, e 210 (duzentos e dez) dias-multa, no valor unitário de 8/10
(oito décimos) do salário mínimo vigente na data dos fatos.
(...) José Antônio Fernandes
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 5): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 06 (seis) meses de detenção e 120 (cento e vinte)
dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 12): 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e
80 (oitenta) dias-multa.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 14): 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e
80 (oitenta) dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 10 (dez) anos e 06 (seis) meses de
detenção e 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, totalizando 13
(treze) anos de pena privativa de liberdade, no regime inicial
semiaberto, e 440 (quatrocentos e quarenta) dias-multa, no valor unitário de
1 (um) salário mínimo vigente na data dos fatos.
Por fim, não há
como acolher o pleito de incidência da continuidade delitiva, pois os
Desembargadores Cláudia e Márcio, que os condenaram por dispensa indevida de
licitação, aplicaram o concurso material. O Desembargador Sebastião Ogê, por
sua vez, jamais analisou a continuidade delitiva de dispensa indevida de
licitação, até porque os condenou por peculato.
Assim, deve ser
negado provimento aos embargos infringentes e de nulidade opostos
por José Antonio Fernandes, Ferdinando Francisco Fernandes e Fernando
Fernandes.
4.2. ALFREDO
PINTO TELLES: O embargante foi condenado pelo cometimento dos delitos
de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação (Fatos 5 e 6) à pena
privativa de liberdade de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de detenção, em regime
semiaberto, e ao pagamento de 110 (cento e dez) dias-multa, à razão de 4/10
(quatro décimos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, tendo sido
decretada a prescrição da pretensão punitiva em relação aos crimes de quadrilha
(art. 288 do CP) e falsidade ideológica (art. 299 do CP), pelo voto exarado pelo
Vogal, Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, o qual absolveu todos os
réus pela prática do crime do crime de peculato-desvio.
O réu pretende a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Revisor que, por entender que
os delitos de locupletamento em dispensa ilegal de licitação restaram
absorvidos pelo crime de peculato-desvio, aplicou pena definitiva de 5 (cinco)
anos e 5 (cinco) meses de reclusão, em regime semiaberto, pelo cometimento
deste delito.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por Jose Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes.
Não há como
prosperar a pretensão do embargante.
Depreende-se da
exordial acusatória que Alfredo Pinto Telles é cunhado de Lair Ferst e aceitou
a proposta para integrar a empresa sistemista NEWMARK TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO,
LOGÍSTICA E MARKETING LTDA. Também foi Lair Antonio Ferst, por sua amizade de
longa data e influência sobre o então Diretor-Presidente do DETRAN/RS, Carlos
Ubiratan Dos Santos, que concorreu diretamente para a indevida dispensa de
licitação e contratação da Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência - FATEC
pelo Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN/RS, por meio dos
Contrato/DETRAN n. 34/2003 e 70/2003, para aplicação dos Exames Teórico e
Prático de Direção Veicular.
Consta dos autos
que o embargante tinha plena ciência das atividades sociais desenvolvidas, em
especial aquelas relativas ao objeto dos Contratos n. 34/2003 e 70/2003 (DETRAN/FATEC),
tendo contribuído dolosamente para a dispensa ilegal de licitação, tanto por
associação, quanto diretamente, pois respondeu à consulta encaminhada pela
FATEC, em 26/6/2003, assinando como representante da NEWMARK TECNOLOGIA DA
INFORMAÇÃO, LOGÍSTICA E MARKETING LTDA. Também assinou o termo de referência
para a prestação dos serviços previamente à formalização do Contrato n.
70/2003, demonstrado participar do ajuste prévio às contratações havidas com
dispensa de licitação.
Outrossim, aponta a
denúncia que Alfredo Pinto Telles foi essencial para a ação dos agentes do
Núcleo Lair Ferst no organograma criminoso e para o funcionamento do esquema
como um todo. Ele, como sócio da empresa anteriormente citada, contribuiu para
que essa fosse inserida na terceirização, celebrando contrato de prestação de
serviços com a FATEC.
As condutas
descritas não se amoldam ao tipo previsto no art. 312 do Código Penal,
ressaltando-se que Alfredo Pinto Telles não detinha a posse, disponibilidade ou
autoridade sobre os valores. Os atos, entretanto, configuram o delito previsto
no art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, tendo o embargante extraído
benefícios da contratação direta indevida, além de caracterizarem os crimes de
quadrilha e falsidade ideológica.
Nesse contexto,
deve prevalecer o voto do Vogal, que implicou a decretação da prescrição da
pretensão punitiva em relação aos delitos de quadrilha (art. 288 do CP) e
falsidade ideológica (art. 299 do CP) e a sua condenação pela prática dos
delitos de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação (Fatos 5 e 6), cujas
penas fixadas pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, no mesmo patamar
estabelecido pela Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani,
devem ser mantidas, verbis:
Alfredo Pinto Telles
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 5): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta
e cinco) dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta
e cinco) dias-multa.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 22): 01 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 25): 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva, antes do acréscimo pela continuidade delitiva.
Soma das penas não prescritas: 06 (seis) anos e 06 (seis)
meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 110 (cento e dez)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos (...) (grifei)
Assim, deve ser
negado provimento aos embargos infringentes e de nulidade opostos
por Alfredo Pinto Telles.
4.3. CARLOS
DAHLEM DA ROSA: Carlos Dahlem da Rosa, por sua vez, foi condenado pela
prática dos delitos de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação (Fatos
5, 6 e 7) à pena privativa de liberdade de 9 (nove) anos e 9 (nove) meses de
detenção, no regime inicial semiaberto, e 255 (duzentos e cinquenta e cinco)
dias-multa, à razão de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à época
dos fatos, nos termos do voto Vogal.
O embargante requer
a prevalência do voto mais favorável proferido pelo Revisor que, por entender
que os delitos de locupletamento em dispensa ilegal de licitação restaram absorvidos
pelo crime de peculato-desvio, aplicou pena definitiva de 6 (seis) anos, 5
(cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime semiaberto, pelo
cometimento deste delito. Subsidiariamente, pede que prevaleça a divergência
aberta pelo Revisor, para o fim de reconhecer-se a incidência do art. 71 do
Código Penal na fração de 1/6.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes.
O recurso não
merece acolhida.
O Núcleo
Carlos Rosa era integrado por Carlos Dahlem da Rosa e Luiz Paulo Rosek
Germano, os quais seriam responsáveis por suposta consultoria jurídica no
âmbito do contrato DETRAN/FATEC, sendo que pelo escritório de advocacia
respectivo receberiam remuneração superfaturada, destinada a distribuir propina
aos dirigentes do DETRAN e a José Otávio Germano, além de gerar o próprio
enriquecimento ilícito. José Otávio Germano e Carlos Rosa teriam participado de
"toda a negociata prévia à assinatura desses contratos", sendo que ao
seu lado, no oferecimento de vantagem indevida a Flávio Vaz Netto, estaria Luiz
Paulo, irmão de José Otávio Germano e amigo de Flávio Vaz Netto, controlando,
ao lado deste, a distribuição do dinheiro da propina, por intermédio do
"laranja" Carlos Rosa.
Narra a denúncia
que Carlos Dahlem Rosa concorreu diretamente para a indevida dispensa de
licitação e contratação da Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência - FATEC
pelo Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN/RS, por meio dos
Contratos/DETRAN n. 34/2003 e 70/2003, e contratação da Fundação Educacional
para o Desenvolvimento e Aperfeiçoamento do Ensino - FUNDAE com a mesma
autarquia, por meio do Contrato n. 09/2007, para aplicação dos Exames Teórico e
Prático de Direção Veicular. Denota-se dos autos a conduta ativa e consciente
do acusado em concorrer para as ilegalidades perpetradas, laborando em busca da
dispensa indevida de licitação a fim de contratar, indiretamente e de forma
dissimulada, com o DETRAN (subcontratação da CARLOS ROSA ADVOGADOS ASSOCIADOS
pela FATEC), em benefício próprio, recebendo valores altos e superfaturados em
contraprestação a serviços pífios, para não dizer inexistentes.
Descreve a exordial
acusatória que o embargante atuou no momento das contratações feitas pelo
DETRAN, do mesmo modo que as demais 'esquemistas', servindo a sociedade de
advogados como instrumento para o futuro desvio de recursos públicos. A
dispensa de licitação somente ocorreu em face da pré-estruturação da fraude no
organograma empresarial que havia sido preparado, com a participação do réu, o
qual atuou decisivamente na aproximação da UFSM/FATEC com a Diretoria do
DETRAN/RS, valendo-se de suas relações com o Diretor-Presidente envolvido e do
seu conhecimento jurídico. Por tal atuação, Carlos locupletou-se
expressivamente com dispensa de licitação fraudulenta, justamente em razão da
posterior subcontratação do seu escritório de advocacia na condição de
sistemista.
Dessarte, as
condutas anteriormente narradas desbordam do delito estampado no art. 312 do
Código Penal, salientando que o embargante, como os anteriores, não detinha a
posse, disponibilidade ou autoridade sobre os valores. Outrossim, denota-se que
ele se beneficiou da contratação direta indevida, caracterizando o tipo
previsto no art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. Os atos do embargante
também configuram o crime de quadrilha.
Deve prevalecer o
voto do Vogal, que implicou a decretação da prescrição da pretensão punitiva em
relação ao crime de quadrilha (art. 288 do CP) e a sua condenação pela prática
dos delitos de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação (Fatos 5 e 6),
cujas penas fixadas pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha, idênticas
às da Des. Cláudia, serão mantidas, verbis:
(...) Carlos Dahlem da Rosa
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 5): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção, e 85 (oitenta e cinco)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção, e 85 (oitenta e cinco)
dias-multa.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção, e 85 (oitenta e cinco)
dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 09 (nove) anos e 09 (nove) meses de
detenção, no regime inicial semiaberto, e 255 (duzentos e cinquenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos
fatos.(grifei)
Por fim, não há
como acolher o pleito de incidência da continuidade delitiva, pois os
Desembargadores Cláudia e Márcio, que o condenaram por dispensa indevida de
licitação, aplicaram o concurso material. O Desembargador Sebastião Ogê, por
sua vez, jamais analisou a continuidade delitiva de dispensa indevida de
licitação, até porque o condenou por peculato, tendo restado expressa a
apreciação da questão no voto da Relatora nos embargos declaratórios (ev.
388), verbis:
CARLOS DAHLEM DA ROSA afirma a ausência de apreciação
da continuidade delitiva entre os contratos DETRAN/FATEC/FUNDAE nos crime da
lei de licitações. Com razão o embargante, havendo omissão a esse
respeito. A tese, porém não é de ser acolhida, pois que se tratando os crimes
da lei de licitação em que condenado de fatos distintos, autônomos, bem
delimitados no tempo entre si, correta é a incidência do concurso material, e
não da continuidade delitiva pretendida, como, inclusive, foi decidido no item
2.2.7 do VOTO2, Evento 260, destes autos.
Assim, deve ser
negado provimento aos embargos infringentes e de nulidade opostos
por Carlos Dahlem da Rosa.
5. A seguir, passo
a analisar os embargos infringentes e de nulidade interpostos pelos embargantes
para os quais prevaleceu o voto proferido pelo Revisor, Desembargador
Federal Sebastião Ogê Muniz e que pretendem a prevalência
do voto do Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha.
5.1. ROSMARI
GREFF ÁVILA DA SILVEIRA: A embargante, servidora da UFSM, restou
condenada à pena de 5 (cinco) anos e 5 (cinco) meses de reclusão, em regime
semiaberto, pelo cometimento do crime de peculato-desvio, o qual absorveu, no
entendimento do Revisor, o delito de locupletamento em dispensa ilegal de
licitação.
Rosmari pede a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Desembargador Federal Márcio
Antonio Rocha, que a absolveu da prática do crime de peculato-desvio e decretou
a prescrição da pretensão punitiva quanto ao delito de quadrilha (art. 288 do
Código Penal).
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
A irresignação deve
ser acolhida.
O Núcleo
UFSM era integrado por Paulo Jorge Sarkis, Dario Trevisan de Almeida e
Rosmari Greff Ávila da Silveira, servidores públicos federais da instituição.
Paulo Jorge Sarkis, então reitor da UFSM, teria agido em conjunto com a FATEC,
notadamente autorizando a utilização da estrutura física da universidade pela
fundação, além de designar os servidores Dario e Rosmari para execução do
Projeto Trabalhando pela Vida junto à FATEC.
Descreve a exordial
acusatória que a atuação da ré se verifica na condição de agente que dava
suporte essencial para as ações de Dario Trevisan de Almeida, sendo
participante ativa das negociações e reuniões, tendo conhecimento das
ilicitudes e auxiliando-o diretamente na operacionalização do contrato
fraudulento.
Dessarte, as
condutas não se enquadram no tipo descrito no art. 312 do Código Penal,
considerando-se que a embargante, como os anteriores, não detinha a posse,
disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da
dispensa irregular de licitação, praticada por terceiros em ato de corrupção.
Resta caracterizado, outrossim, o delito de quadrilha (art. 288 do CP).
Deve prevalecer o
voto do Vogal, cuja pena foi fixada no mesmo quantum estabelecido
pela Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, verbis:
(...) Rosmari Greff Ávila da Silveira
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Rosmari
Greff Ávila da Silveira para sua pena seja reduzida em face da
substituição da punição por peculato para a de quadrilha cuja prescrição, no
entanto, se reconhece.
5.2. ROSANA
CRISTINA FERST: A embargante foi condenada mediante o voto-médio do
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, à pena de 5 (cinco) anos e 5 (cinco)
meses de reclusão, em regime semiaberto, pelo cometimento do crime de
peculato-desvio, o qual absorveu, no entendimento do Revisor, o delito de
locupletamento em dispensa ilegal de licitação.
Rosana pretende a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que a absolveu da
prática do delito de peculato-desvio, decretou a prescrição da pretensão
punitiva relativamente aos crimes de quadrilha (art. 288 do CP) e falsidade
ideológica (art. 299 do Código Penal) e a condenou às penas de 3 (três) anos e
3 (três) meses de detenção, no regime inicial aberto, e 55 (cinquenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos, pelo cometimento do crime de locupletamento em
dispensa ilegal de licitação. A pena privativa de liberdade foi substituída por
prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente
a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente,
deverão ser definidos pelo Juízo da Execução.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
A pretensão merece
prosperar.
O Núcleo
Lair Ferst era encabeçado por Lair Antônio Ferst que, dada sua
inserção e trânsito junto ao poder público, teria atuado no lobby em
favor da UFSM e FATEC perante os dirigentes do DETRAN/RS, a fim de obter o
contrato. Ter-se-ia beneficiado por meio de empresas constituídas por seus
familiares (subcontratadas), bem como efetivado pagamento de propina aos
dirigentes do DETRAN/RS, Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio Gomes Jr., por
intermédio de repasses a empresas titularizadas por "laranjas".
A embargante estava
vinculada ao Núcleo LAIR FERST, de quem é irmã, tendo ingressado no quadro
societário da RIO DEL SUR AUDITORIA E CONSULTORIA LTDA., em 30/6/03 (registro
em 10/7/2003), a convite dele, representando 01% do capital social. Em
alteração contratual datada de 28/8/03 (registro em 22/11/03), aumentou sua
participação no capital social para 99,9%, passando também a exercer
formalmente a administração da sistemista RIO DEL SUR (MIDIAS
DIGITAIS\PR195-MIDIA-01.ZIP\PR195-MIDIA-01, CONTRATOS - VOLUME II, fls. 115 a
117 e 124 a 126, da Ação Penal de Origem). Narra a denúncia que ela, na
qualidade de sócia, contribuiu para que a referida empresa fosse inserida na
terceirização, celebrando os contratos de prestação de serviços com a FATEC,
recebendo valores altos e superfaturados em contraprestação a serviços
praticamente inexistentes. Destaca a exordial acusatória que, embora os
contratos formais com as empresas sistemistas somente tenham sido firmados em
dezembro de 2003, há certeza na contratação já em julho daquele ano, tendo em
vista que, desde então, a FATEC já realizava pagamentos mensais às sistemistas
no percentual destacado, conforme dados da Receita Federal e planilhas obtidas
pela interceptação dos e-mails de Dario Trevisan de Almeida.
Em conseqüência, as
condutas não se enquadram no tipo descrito no art. 312 do Código Penal,
considerando-se que a embargante, como os anteriores, não detinha a posse,
disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da
dispensa irregular de licitação, praticada por terceiros em ato de corrupção,
tendo a ilegalidade sido constatada desde a origem. De outro lado, os atos
demonstram ter a ré extraído benefício da contratação direta indevida,
praticando o delito do art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, além de
configurarem os crimes de quadrilha e falsidade ideológica.
Nesse contexto,
deve prevalecer o voto do Vogal, cujas penas foram fixadas no mesmo quantum estabelecido
pela Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, verbis:
(...) Rosana Cristina Ferst
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 6): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 55 (cinquenta e
cinco) dias-multa.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 24): 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 22 (vinte e
dois) dias de reclusão, prescrita a pretensão punitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 25): 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva antes do acréscimo relativo à continuidade
delitiva.
Soma das penas não prescritas: 03 (três) anos e 03 (três)
meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 55 (cinquenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos.
Substituo a pena privativa de
liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução. Justifico a escolha de tais
penas alternativas, dentre as demais previstas em lei, em razão de seu caráter
ressocializador e sua utilidade social, mantendo a condenada inserida em sua
comunidade, sem restringir-lhe direitos cujo exercício não esteja diretamente
vinculado ao cometimento dos crimes. (grifei)
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Rosana
Cristina Ferst para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenada pela
prática do crime de beneficiar-se de dispensa indevida de licitaçãoà pena de 3
(três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 55
(cinquenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do
salário mínimo vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é
substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos
termos do voto do Vogal prevalecente. Resta prescrita a pretensão punitiva
relativa aos delitos de quadrilha e falsidade ideológica.
5.3. DENISE
NACHTIGALL LUZ: A embargante foi condenada mediante o voto-médio do
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, à pena de 06 (seis)
anos, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime semiaberto,
pelo cometimento do crime de peculato-desvio, o qual absorveu, no entendimento
do Revisor, o delito de locupletamento em dispensa ilegal de licitação.
Denise objetiva a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que a absolveu da
prática do delito de peculato-desvio, decretou a prescrição da pretensão
punitiva relativamente ao delito de quadrilha (art. 288 do Código Penal) e a
condenou às penas de 3 (três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime
inicial aberto, e 80 (oitenta) dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro
décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pelo cometimento do crime
de locupletamento em dispensa ilegal de licitação. A pena privativa de
liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação
pecuniária no valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo
cumprimento e destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da
Execução.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados quando
da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
Assiste razão à ré.
Descreve a denúncia
que a embargante, à época dos fatos, era esposa de Ferdinando Francisco
Fernandes, nora, portanto, de José Antonio Fernandes e teria atuado como
consultora jurídico-legal para viabilização e implementação do esquema
criminoso operado pela família FERNANDES. Participou da atividade delitiva em
seus primórdios, desde a contratação do escritório do falecido advogado Régis
Ferretti no qual laborava. Quando o referido causídico faleceu, o contrato
passou a ser de responsabilidade do seu escritório de advocacia, renomeado para
NACHTIGALL LUZ ADVOGADOS ASSOCIADOS. Aponta a inicial que a empresa PENSANT
CONSULTORES LTDA., obtida a celebração do contrato DETRAN e FATEC, foi
contratada na condição de sistemista para a supervisão e o gerenciamento do
contrato. Denise Nachtigall Luz, nora de José Antônio e esposa de Ferdinando,
auxiliava diretamente a este, agindo em negociações, aconselhamentos e
assessoria jurídica por intermédio do citado de escritório de advocacia
regiamente remunerado. Segundo os documentos apreendidos na sede da sistemista
PENSANT CONSULTORES LTDA. (Equipe POA 01 - PENSANT: Correspondência datada de
dezembro de 2004 do Coordenador do Projeto DETRAN-RS/FATEC, encaminhando
contratos, relatórios, acordo e termo) e documentação apreendida com a acusada
DENISE NACHTIGALL LUZ (Equipe POA 03 - NACHTIGALL LUZ), a remuneração mensal
era de R$ 12.000,00 (doze mil reais) para a realização de atividades de
advocacia e consultoria ao 'Programa Trabalhando pela Vida!' da FATEC.
Nas alegações
finais, o MPF salienta que a embargante atuava sempre de forma subordinada e
diretamente vinculada aos integrantes da empresa PENSANT, mesmo quando estava
'exercendo a advocacia'. Ressalta que a sua conduta remonta ao início das
contratações com o DETRAN, sendo que os contratos com as sistemistas RIO DEL
SUR E NEW MARK foram por ela elaborados, certamente com o aval da PENSANT,
conforme se pode verificar das minutas de contrato entre RIO DEL SUR E NEW MARK
e a FATEC encontradas em seu computador 7688.doc e 7686.doc, constante do
cd/dvd do Laudo 587/08 (apreensão no escritório Nachtigall Luz Advogados -
Equipe POA 03). Destaca a existência de semelhanças gritantes entre os
pareceres apreendidos nos equipamentos de DENISE NACHTIGALL LUZ, de sua
autoria, e aqueles efetivamente apresentados ao DETRAN/RS, como de autoria de
Alexandre Dornelles Barrios (advogado contratado do DETRAN, atuando em
assessoria a Hermínio Gomes Júnior, Diretor Administrativo e Financeiro daquela
autarquia).
Denota-se dos autos
da ação penal a conduta ativa e consciente da ré em concorrer para as
ilegalidades perpetradas, laborando em busca da dispensa indevida de licitação
a fim de contratar, indiretamente e de forma dissimulada, com o DETRAN
(subcontratação das sistemistas PENSAT, IGPL, NACHTIGALL LUZ ADVOGADOS
ASSOCIADOS), em benefício próprio e de sua família, recebendo valores altos e
superfaturados em contraprestação a serviços praticamente inexistentes,
restando, portanto, configurada a prática do delito previsto no art. 89,
parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, além do crime de quadrilha (art. 288 do
CP). Outrossim, não há falar no cometimento do crime previsto no art. 312 do
Código Penal, considerando-se que a embargante, como os anteriores, não detinha
a posse, disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os quais são
decorrentes da dispensa irregular de licitação, praticada por terceiros em ato de
corrupção, tendo a ilegalidade sido constatada desde a origem.
Por conseguinte,
deve prevalecer o voto do Vogal, cujas penas foram fixadas no mesmo quantum estabelecido
pela Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, verbis:
(...) Denise Nachtigall Luz
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 80 (oitenta)
dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 03 (três) anos e 03 (três)
meses de detenção, no regime inicial aberto, e 80 (oitenta) dias-multa, no
valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos.
Substituo a pena privativa de
liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução. Justifico a escolha de tais
penas alternativas, dentre as demais previstas em lei, em razão de seu caráter
ressocializador e sua utilidade social, mantendo a condenada inserida em sua
comunidade, sem restringir-lhe direitos cujo exercício não esteja diretamente
vinculado ao cometimento dos crimes. (grifei)
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Denise
Nachtigall Luz para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenada por
beneficiar-se de dispensa indevida de licitação à pena de 3 (três) anos e
3 (três) meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 80 (oitenta)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é substituída por
prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente
a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente,
deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do voto do Vogal
prevalecente. Resta prescrita a pretensão punitiva relativa ao delito de
quadrilha.
5.4. DARIO
TREVISAN DE ALMEIDA: O embargante foi condenado por voto-médio do
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz à pena de 08 (oito) anos, 07
(sete) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime fechado, pela prática do
delito de peculato-desvio, em continuidade delitiva, o qual absorveu, no
entendimento do Revisor, o delito de locupletamento em dispensa ilegal de
licitação.
Dario requer a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que o absolveu da
prática do delito de peculato-desvio, decretou a prescrição da pretensão
punitiva no tocante aos delitos de quadrilha (art. 288 do Código Penal) e falsidade
ideológica (art. 299 do Código Penal) e o condenou às penas de 3 (três) anos e
3 (três) meses de detenção, no regime inicial aberto, e 80 (oitenta)
dias-multa, no valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente
à data dos fatos, pelo cometimento do crime de locupletamento em dispensa
ilegal de licitação. A pena privativa de liberdade foi substituída por
prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente
a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente,
deverão ser definidos pelo Juízo da Execução.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
A irresignação
merece acolhida.
Consta dos autos
que o réu, na qualidade de professor da UFSM e diretor da COPERVES (Comissão
Permanente de Vestibular), vinculada às fundações de apoio da UFSM, implementou
os contratos entabulados pelo DETRAN com a FATEC (n.s 34/2003 e 70/2003) e
FUNDAE (n. 07/2007).
O Núcleo
UFSM era integrado por Paulo Jorge Sarkis, Dario Trevisan de Almeida e
Rosmari Greff Ávila da Silveira, servidores públicos federais da instituição.
Paulo Jorge Sarkis, então reitor da UFSM, teria agido em conjunto com a FATEC,
notadamente autorizando a utilização da estrutura física da universidade pela
fundação, além de designar os servidores Dario e Rosmari para execução do
Projeto Trabalhando pela Vida.
Por sua atuação destacada
no Projeto Trabalhando pela Vida!, como ele próprio denominou,
recebia 'por fora' vantagem indevida da empresa PENSANT
CONSULTORES LTDA. (leia-se Família Fernandes) a quem prestava contas de seus
atos e decisões. Denota-se que, a par de coordenar o projeto na parte da
prestação de serviços (habilitação de condutores), conforme ajustado com os
demais integrantes do esquema criminoso, quando houve a substituição da FATEC
pela FUNDAE, o embargante, ciente de que perderia (por conta de demissão) alguns
de seus colaboradores diretos no Projeto TV, instou-os a criar uma empresa para
continuar desenvolvendo os instrumentos (softwares) atinentes à
preparação de condutores, inclusive para outros órgãos de trânsito do país. Por
conta da sua relevante participação no esquema conseguiu que a empresa (PAKT
EXCELÊNCIA EM PROJETOS S/C) constituída por Luciana Balconi Carneiro e outros
três funcionários, viesse a prestar serviços para a FUNDAE.
A conduta típica do
acusado consistiu em laborar efetivamente para a execução do sistema de
contratações e subcontratações com dispensa ilegal de licitação, durante todo o
período da execução dos contratos (n. 34/2003 e 70/2003 - DETRAN/FATEC e n.
09/2007 - DETRAN/FUNDAE), da qual se beneficiou, não se subsumindo, portanto, ao
tipo contido no art. 312 do Código Penal, ressaltando-se que o embargante, como
os anteriores, não detinha a posse, disponibilidade ou autoridade sobre os
valores, os quais são decorrentes da dispensa irregular de licitação, praticada
por terceiros em ato de corrupção, tendo a ilegalidade sido constatada desde a
origem. Restaram também configurados os crimes de quadrilha e falsidade
ideológica (arts. 288 e 299, abmos do CP).
Deve, portanto,
prevalecer o voto proferido pelo Desembargador Federal Márcio Antonio
Rocha, verbis:
(...) Dario Trevisan de Almeida
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção e 80 (oitenta)
dias-multa.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 28): 02 (dois) anos de reclusão e 100 dias-multa,
prescrita a pretensão punitiva.
Soma das penas não prescritas: 03 (três) anos e 03 (três)
meses de detenção, no regime inicial aberto, e 80 (oitenta) dias-multa, no
valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos.
Substituo a pena privativa de
liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da
Execução. Justifico a escolha de tais penas alternativas, dentre as demais
previstas em lei, em razão de seu caráter ressocializador e sua utilidade
social, mantendo o condenado inserido em sua comunidade, sem restringir-lhe
direitos cujo exercício não esteja diretamente vinculado ao cometimento dos
crimes (grifei).
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Dario
Trevisan de Almeida para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação à pena de 3
(três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial aberto, e 80
(oitenta) dias-multa, no valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário
mínimo vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é substituída
por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor
equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação,
respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do
voto do Vogal. Está prescrita a pretensão punitiva relativa aos delitos de
quadrilha e falsidade ideológica.
5.5. SILVESTRE
SELHORST: O embargante foi condenado por voto-médio do Desembargador
Federal Sebastião Ogê Muniz à pena de 05 (cinco) anos e 05 (cinco) meses
de reclusão, em regime semiaberto, pela prática do delito de peculato-desvio,
em continuidade delitiva.
Silvestre pretende
a prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que o absolveu da
prática do delito de peculato-desvio e decretou a prescrição da pretensão
punitiva quanto ao crime de quadrilha (art. 288 do Código Penal). Pede,
sucessivamente, que prevaleça o voto da Relatora, no tocante ao afastamento da
valoração negativa da vetorial circunstâncias do crime e à aplicação do quantum de
3 (três) meses à vetorial consequências. Requer, ao fim, alternativamente:
a) em sendo mantida a valoração
negativa da vetorial "circunstâncias", seja atribuída a ela o quantum
de 3 meses, mesmo valor a ser atribuída à vetorial "consequências",
de forma a fixar a pena base em 2 anos e 6 meses. A pena provisória também em 2
anos e 6 meses, na ausência de agravantes e atenuantes e a pena definitiva em 4
anos e 2 meses em face da aplicação da majorante de 2/3 pela continuidade
delitiva;
b) em sendo afastada a valoração
negativa da vetorial "circunstâncias", seja atribuído o quantum de 3
meses somente à vetorial "consequências", de forma a fixar a pena
base em 2 anos e 3 meses. A pena provisória também em 2 anos e 3 meses, na
ausência de agravantes e atenuantes e a pena definitiva em 03 anos e 09 meses
em face da aplicação da majorante de 2/3 pela continuidade delitiva.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio, Ferdinando
e Fernando Fernandes (item 2.1).
Os embargos devem
ser parcialmente providos.
O embargante, à
época dos fatos, era o Secretário-Executivo da FATEC, depreendendo-se dos autos
que ele exercia o comando da fundação de apoio, possuindo poderes de gestão
para saques, assinaturas de contratos como, por exemplo, se infere do
depoimento de Carlos Ubiratan dos Santos (Vol. 21, fls. 121, da Ação Penal de
Origem), e que teria participado do esquema desde as tratativas iniciais.
O Núcleo Fundacional tem como integrantes Luiz Carlos de
Pelegrini, Rubem Höher, Silvestre Selhorst e Helvio Debus Oliveira Souza.
Consta dos autos a
posição de Silvestre Selhorst como parte do esquema delitivo, especialmente por
sua participação na formação dos contratos que permitiram a implementação do
esquema criminoso e na distribuição dos lucros ilicitamente obtidos pela
quadrilha, o que traduz o dolo específico inerente ao tipo de quadrilha ou
bando, ou seja, a finalidade associativa para o fim de cometer crimes.
A propósito, o escólio
de Guilherme de Souza Nucci, in Código Penal Comentado, Ed.
RT, 13ª edição:
(...) associar-se significa reunir-se
em sociedade, agregar-se ou unir-se. O objeto da conduta é a finalidade do
cometimento de crimes.
(...) como já visto, o elemento subjetivo
específico é exigido neste tipo penal, devendo configurar-se como a vontade de
realizar crimes determinados, e não o singelo agrupamento de pessoas que não
tem a menor noção do irão fazer. Por outro lado, para se concretizarem a
estabilidade e a permanência, devem os integrantes do bando pretender realizar
mais de um delito.
O crime de
peculato-desvio, nos termos do art. 312 do CP, é próprio do servidor público e
é necessário que este detenha a posse, disponibilidade ou autoridade sobre os
valores, com a habilidade de promover o desvio destes, hipótese não
caracterizada na espécie.
Dessarte, deve
prevalecer o voto proferido pelo Vogal, Desembargador-Federal Márcio Antonio
Rocha, cuja pena foi fixada no mesmo quantum estabelecido pela
Relatora, Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, verbis:
Silvestre Selhorst
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado parcial provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos
por Silvestre Selhorst para substituir o voto que lhe
condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta
condenado pelo crime de quadrilha que, no entanto, resta prescrito.
5.6. LUIZ
CARLOS DE PELLEGRINI: O embargante foi condenado mediante voto-médio
do Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz à pena de 5 (cinco)
anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, em regime
semiaberto, pela prática do delito de peculato-desvio, em continuidade
delitiva, o qual absorveu, no entendimento do Revisor, os delitos de
locupletamento em dispensa ilegal de licitação.
Luiz requer a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que o absolveu da
prática do delito de peculato-desvio, decretou a prescrição da pretensão
punitiva quanto ao crime de quadrilha (art. 288 do Código Penal) e o condenou
às penas de 3 (três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial
aberto, e 53 (cinquenta e três) dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois
décimos) do salário mínimo vigente na data dos fatos, pelo cometimento do crime
de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação. A pena privativa de
liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação
pecuniária no valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo
cumprimento e destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da
Execução. Pede, ainda, o prequestionamento de vários dispositivos
constitucionais e infraconstitucionais.
Pleiteia, ao fim,
alternativamente:
(...) c) Seja dado provimento ao
recurso para o fim de ABSOLVER o embargante do delito previsto no art. 89, §
único da Lei nº 8.666/93 (FATO 07);d) Seja dado provimento ao recurso para o
fim de ABSOLVER o embargante do delito previsto no art. 312 do CP (FATO 09);
seja dado provimento ao recurso para o fim de prevalecer o entendimento da Des.
Fed. CLÁUDIA C. CRISTOFANI que compreendeu pela ilegitimidade jurídica de
incidir, em desfavor do embargante, as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP)
"culpabilidade" e "circunstâncias dos crimes", e determinou
a incidência de 03 meses para cada vetorial aplicada, mantendo a condenação
pela prática de peculato-desvio em 03 anos e 04 meses de reclusão;
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
O recurso comporta
parcial provimento.
Inicialmente,
impende destacar que não há como absolver o embargante do delito previsto no
art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93, pois tanto a Relatora como o
Vogal o condenaram por este crime, tendo o Revisor apenas entendido que o
citado delito restaria absorvido pelo peculato.
O embargante, na
época dos fatos, era o Diretor-Presidente da FATEC, tendo papel importante no
esquema criminoso, em razão, primeiramente, da sua aquiescência com a
operacionalização do projeto DETRAN na forma como estabelecida por seus
idealizadores (Lair Antonio Ferst, José Antonio Fernandes e Paulo Jorge Sarkis)
e na substituição da FATEC pela FUNDAE para a continuidade do referido
projeto. Sua colaboração se extrai de duas circunstâncias, quais sejam:
apoiar a troca da FATEC pela FUNDAE e atuar para a contratação da FUNDAE pelo
DETRAN e na subsequente vinculação entre FUNDAE e FATEC. Sabe-se que a
substituição das fundações de apoio teve por escopo afastar o NÚCLEO LAIR FERST
do esquema delitivo. A atuação dolosa do acusado e a cumplicidade com a FAMÍLIA
FERNANDES, visando à contratação DETRAN/FUNDAE e FUNDAE/FATEC.
Dessume-se dos
autos também que o acusado concorreu para a prática do ilícito, possibilitando,
inclusive, que fossem realizadas as subcontratações diretas, beneficiando-se da
dispensa da licitação em relação ao contrato DETRAN-FUNDAE nº 09/2007.
As condutas não se
enquadram no tipo descrito no art. 312 do Código Penal, considerando-se que o
acusado não detinha a posse, disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os
quais são decorrentes da dispensa irregular de licitação, praticada por
terceiros em ato de corrupção, tendo a ilegalidade sido constatada desde a
origem. De outro lado, os atos demonstram ter o embargante extraído benefício
da contratação direta indevida, praticando o delito do art. 89, parágrafo
único, da Lei nº 8.666/93. Restou configurado, ainda, o crime de quadrilha
(art. 288 do CP).
Nesse contexto,
deve prevalecer a condenação estabelecida no voto do Vogal, cuja pena foi
fixada no mesmo quantum estabelecido pela Relatora,
Desembargadora Federal Cláudia Cristina Cristofani, verbis:
(...) Luiz Carlos de Pellegrini
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Beneficiar-se de dispensa
indevida de licitação (artigo 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93
- fato 7): 03 (três) anos e 03 (três) meses de detenção, e 53 (cinquenta e
três) dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 03 (três) anos e 03 (três)
meses de detenção, no regime inicial regime aberto, e 53 (cinquenta
e três) dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário
mínimo vigente na data dos fatos.
Substituo a pena privativa de
liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da
Execução. Justifico a escolha de tais penas alternativas, dentre as demais
previstas em lei, em razão de seu caráter ressocializador e sua utilidade
social, mantendo o condenado inserido em sua comunidade, sem restringir-lhe
direitos cujo exercício não esteja diretamente vinculado ao cometimento dos
crimes. (grifei)
Assim, deve ser
dado parcial provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos
por Luiz Carlos de Pellegrini para absolvê-lo da prática do
delito de peculato-desvio e condená-lo à pena de 3 (três) anos e 3 (três) meses
de detenção, no regime inicial regime aberto, e 53 (cinquenta e três)
dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente
na data dos fatos, pela prática do crime de beneficiar-se de dispensa indevida
de licitação. A pena privativa de liberdade é substituída por prestação de
serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente a 30 (trinta)
salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente, deverão ser
definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do voto do Vogal. Está prescrita a
pretensão punitiva relativa ao delito de quadrilha.
5.7. FLÁVIO
ROBERTO LUIZ VAZ NETTO: O embargante foi condenado mediante voto-médio
do Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz à pena de 08 (oito) anos, 07
(sete) meses e 10 (dias) de reclusão, em regime fechado, pela prática do delito
de peculato-desvio, em continuidade delitiva, o qual absorveu, no entendimento
do Revisor, os crimes de dispensa ilegal de licitação e corrupção passiva.
Flávio requer a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Vogal, que o absolveu da
prática do delito de peculato-desvio, decretou a prescrição da pretensão
punitiva quando ao crime de quadrilha (art. 288 do Código Penal) e aplicou a
pena de 07 (sete) anos e 04 (quatro) meses de pena privativa de liberdade, em
regime inicial semiaberto, e 300 (trezentos) dias-multa, no valor unitário de 1
(um) salário mínimo vigente à data dos fatos, pelo cometimento dos crimes de
dispensa indevida de licitação e corrupção passiva.
Pede, ao fim,
sucessivamente, a redução da pena - a qual quer que seja aplicada no mínimo
legal, devendo ser excluída a causa de aumento relativa à continuidade delitiva
-, e a incidência do regime inicial de cumprimento da pena mais benéfico.
Deixo de
transcrever os respectivos votos, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por José Antonio,
Ferdinando e Fernando Fernandes (item 2.1).
A irresignação
merece parcial acolhida.
De início, não cabe
cogitar da absolvição do embargante da prática de todos os crimes, pois nenhum
dos votos exarados foi nesse sentido.
De outro lado,
narra a denúncia que Flávio, Diretor-Presidente do DETRAN/RS em 2007,
viabilizou a segunda fase do esquema de desvios ilegais de dinheiro público
quando assinou a rescisão contratual com a FATEC (Apenso I, Vol. II, fls. 168 a
169, da Ação Penal de Origem) e o instrumento de contratação da FUNDAE (Apenso
03, fls. 40 a 48, da Ação Penal de Origem), na condição de Diretor-Presidente
do DETRAN/RS. O réu figurou na segunda fase do esquema delitivo como
destinatário de dinheiro público desviado, a título de contraprestação pela
dispensa de licitação que originou a contratação da FUNDAE, além de ter
concorrido para o desvio de verbas públicas aos demais integrantes do esquema
delitivo, igualmente favorecidos.
Depreende-se dos
autos que o acusado tinha conhecimento de que o contrato com a FATEC possuía
irregularidades, estava ciente da subcontratação das sistemistas, e foi
informado de que a FUNDAE subcontrataria a FATEC para a execução dos serviços.
Ademais, o Contrato n. 09/2007 não observava o disposto no art. 24, XIII, Lei
n. 8.666/93, pois não havia conexão entre o objeto contratual e as finalidades
de pesquisa, ensino e extensão. O embargante, na qualidade de Procurador do
Estado, certamente conhecia o entendimento do Tribunal de Contas da União sobre
a necessidade de pertinência entre o objeto do contrato e as finalidades
dispostas no citado diploma legal.
Verifica-se que a
conduta do embargante se subsume aos tipos previstos nos arts. 288 e 317, ambos
do Código Penal, e 89, caput, da Lei nº 8.666/93, sendo o desvio de
verbas mera consequência.
O dano à
Administração, vale dizer, o dano aos princípios que regem a Administração, já
ocorreu, em decorrência da prática dos delitos acima destacados.
Não há, assim, como
aplicar à espécie, data vênia, o entendimento preconizado pelo Revisor,
Desembargador Federal Sebastião Ogê Muniz, no sentido da absorção dos demais
delitos pelo crime de peculato-desvio, devendo prevalecer o voto vogal, cujas
penas fixadas no mesmo patamar estabelecido pela Relatora, serão mantidas:
(...) Flávio Roberto Luiz Vaz Netto
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Dispensa indevida de
licitação (artigo 89, caput, da Lei nº 8.666/93 - fato 4): 04
(quatro) anos e 04 (quatro) meses de detenção e 200 (duzentos) dias-multa.
- Corrupção passiva (artigo
317 do Código Penal - fato 20): 03 (três) anos de reclusão e 100 (cem)
dias-multa.
Soma das penas não prescritas: 04 (quatro) anos e 04 (quatro)
meses de detenção e 03 (três) anos de reclusão, totalizando 07 (sete)
anos e 04 (quatro) meses de pena privativa de liberdade, no regime inicial
semiaberto, e 300 (trezentos) dias-multa, no valor unitário de
01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos.
Assim, deve ser
dado parcial provimento aos embargos infringentes e de nulidade
interpostos por Flávio Roberto Luiz Vaz Netto para substituir
o voto que lhe condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em
que resta condenado pelos crimes de dispensa indevida de licitação e corrupção
passiva às penas de 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses de detenção e 03
(três) anos de reclusão, respectivamente, totalizando 07 (sete) anos e
04 (quatro) meses de pena privativa de liberdade, no regime inicial semiaberto, e
300 (trezentos) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo
vigente à data dos fatos, nos termos do voto do Vogal. Está prescrita a
pretensão punitiva relativa ao delito de quadrilha.
6. Por fim, passo a
apreciar os embargos infringentes e de nulidade interpostos pelos embargantes
para os quais prevaleceu o voto proferido pela Relatora, Desembargadora
Federal Cláudia Cristina Cristofani e que pretendem a
prevalência do voto do Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha.
6.1. PATRICIA
JONARA BADO DOS SANTOS: Patricia Jonara Bado dos Santos, esposa do
corréu Carlos Ubiratan dos Santos (Diretor-Presidente do DETRAN/RS), foi
condenada à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de
reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, além de 85 (oitenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente
à data dos fatos, substituída por duas penas restritivas de direito,
consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária,
estipulada em 30 (trinta) salários mínimos, pela prática do crime de
peculato-desvio, mediante o voto-médio da Relatora, Desembargadora Federal
Cláudia Cristina Cristofani, assim vazado:
4.2.21. PATRÍCIA JONARA BADO DOS
SANTOS - Fato 08
Consta dos autos que PATRÍCIA JONARA
BADO DOS SANTOS, esposa do corréu CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS concorreu para o
desvio de recursos públicos, em proveito próprio e alheio, decorrentes dos
Contratos n. 034/2003 e n. 070/2003 (DETRAN/FATEC).
PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS anuiu
e juntou-se ao esquema criminoso ao viabilizar, informalmente, a constituição
da empresa NT PEREIRA ME, a qual administrava, e beneficiando-se dos repasses
do dinheiro público, individual e conjuntamente com seu esposo. Isto se dava da
seguinte forma: a NEWMARK, contratada pela FATEC (recebendo recursos do DETRAN,
portanto), pagava por serviços supostamente prestados pela firma individual NT
PEREIRA, de NILZA TEREZINHA PEREIRA, amiga de PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS.
O instrumento de contrato da NEWMARK
e NT PEREIRA foi firmado em 02/08/2004, e nele não consta ao preço acertado
pelos serviços (Caixa 11, fls. 946 a 947, da Ação Penal de Origem), porém,
consta a emissão de 33 (trinta e três) notas fiscais, no intervalo de 09/2004 a
05/2007, cujo somatório corresponde a aproximadamente R$ 2.500.000,00 (dois
milhões e quinhentos mil reais). É bastante claro que a empresa NT PEREIRA ME
foi constituída com o fim exclusivo de viabilizar o escoamento do dinheiro
público, a pedido do casal CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS e PATRÍCIA JONARA BADO
DOS SANTOS, não tendo prestado quaisquer serviços à Newmark, senão vejamos:
a) NILZA TEREZINHA PEREIRA afirmou em
seu depoimento que foi a amiga PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS quem lhe sugeriu
a constituição da firma individual NT PEREIRA ME, na qual NILZA PEREIRA nunca
trabalhou (fls. 19 a 20, Vol. 8, da Ação Penal de Origem). Isso foi confirmado
por PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS (fls. 284, Vol. 5, da Ação Penal de Origem)
e pelas testemunhas Claudemir Machado, Sarita de Aguiar Leffa, Vanda Regina da
Rosa Machado e Marina dos Santos, que conhecem NILZA TEREZINHA PEREIRA há
bastante tempo, as quais declararam que a atividade profissional da corré
consistia em vender cosméticos e atuar como massagista, tarefas que não guardam
qualquer relação com processamento/digitação de dados ou reparação/instalação
de equipamentos de informáticas, objeto da firma em questão. Demonstra-se,
assim, que a NT PEREIRA foi criada apenas para viabilizar fluxo ilícito de
valores.
b) O registro da firma individual NT
PEREIRA ME foi feito em 15/07/2004, poucos dias antes do contrato firmado com a
NEWMARK (02/08/2004 - fls. 948, Caixa 11, da Ação Penal de Origem), ou seja,
direcionado para tal contratação.
c) O endereço fornecido à Junta
Comercial para viabilizar o registro da firma NT PEREIRA ME era o mesmo
endereço residencial de ALEXANDRE DORNELLES BARRIOS (Rua Visconde do Herval, n.
350, apto 1803, Porto Alegre/RS). Ou seja, tratava-se de endereço meramente
fictício, emprestado pelo também corréu nestes autos (fato admitido pelo
mesmo), evidenciando que a firma individual não possuía uma sede. A
inexistência de sede própria não sofreu alterações posteriormente, pois a NT
PEREIRA ME supostamente funcionava no mesmo endereço do escritório de advocacia
de PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS (Rua dos Andradas, 1091, Conj. 51, Porto
Alegre/RS), conforme declaração da corré durante o inquérito.
d) A única cliente da NT PEREIRA ME,
ao longo de quase 3 (três) anos, foi a NEWMARK, situação admitida por PATRÍCIA
JONARA BADO DOS SANTOS ao depor perante a Procuradoria-Geral do Estado (fls.
117, Vol. 21, da Ação Penal de Origem).
e) A NT PEREIRA ME possuía apenas 3
(três) funcionários (embora que em consulta ao Cadastro Nacional de Informações
Sociais (CNIS), a NT PEREIRA apresentou apenas 01 (um) registro de empregado,
no período compreendido entre agosto de 2005 e fevereiro de 2008 - fls. 263 a
736, Vol. 195, da Ação Penal de Origem). São eles: Sandra de Freitas Plautz,
Vanderlei Plautz e Suzana Rafaelli (fls. 3189, Vol. 13, da Ação Penal de
Origem), fato confirmado por PATRÍCIA DOS SANTOS em depoimento prestado a PGE
(fls. 117, Vol. 21, da Ação Penal de Origem). Conforme declarado por PATRICIA
JONARA BADO DOS SANTOS perante a autoridade policial, a última era sua
secretária e os primeiros eram empregados na Fazenda de São Francisco de Paula
(fls. 232, Vol. 8, da Ação Penal de Origem). PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS,
além de administradora de fato da NT PEREIRA ME, atuava como advogada e sócia
de empresa organizadora de eventos. Pois, se a NT PEREIRA ME não tinha
empregados atuando no objeto contratado pela NEWMARK, a proprietária não
residia no local de sua sede, e a administradora possuía mais 02 (duas)
atividades paralelas, evidentemente que nenhum serviço era prestado.
f) Os funcionários da NEWMARK sabiam
da existência da NT PEREIRA ME, mas não conseguiram explicitar quais serviços
ela prestava, como se vê nos depoimentos de Naira Joceane Prestes e Luis Felipe
Tonelli (fls. 23 a 33, Vol. 11, da Ação Penal de Origem).
g) EDUARDO REDLICH JOÃO, que,
trabalhando junto ao escritório de contabilidade de MARCO AURÉLIO DA ROSA
TREVIZANI, auxiliava na escrita da NT PEREIRA, disse que a relação negocial
entre a NT PEREIRA e NEWMARK era exclusivamente para a emissão de notas
fiscais, da primeira contra a segunda. Veja-se (Vol. 161, fls. 220 a 235, da
Ação Penal de Origem - grifos nossos):
JUÍZA: O senhor sabe se havia
alguma relação de negócios, entre as empresas PRS Azevedo, NT Pereira e
Newmark, Rio Del Sur?
RÉU: Elas emitiam
exclusivamente notas, contra as empresas do grupo Newmark, Rio Del Sur.
JUÍZA: A NT Pereira e a PRS Azevedo?
RÉU: Sim.
JUÍZA: Recorda se elas tinham algum
outro cliente, além dessas duas empresas?
RÉU: Não, elas só emitiam notas
contra a Rio Del Sur e Newmark.
JUÍZA: Recorda a movimentação
financeira delas, da PRS e da NT Pereira?
RÉU: Cinquenta mil, setenta
mil, a movimentação mensal.
JUÍZA: A movimentação mensal?
RÉU: Mensal, uma nota emitida.
JUÍZA: Recorda da área de atuação
dessas empresas?
RÉU: Era também genérica
também, prestação de serviços, não tinha nada especifico. (...)
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: Quanto a
efetiva prestação de serviços por essas empresas, o senhor sabe se elas
efetivamente prestavam serviços, ou se também era algo formal, apenas
documentado para saque de dinheiro?
RÉU: No meu entendimento é
que serviços não existia, não era uma empresa que faturava, a Doutora Patrícia
é advogada, se eu não me engano ela... Não existia prestação de serviços,
acredito que não houvesse prestação de serviços.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: O
senhor sabe se essas empresas tinham funcionários?
RÉU: Nenhuma delas tinha
funcionários. (...)
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: O
senhor pode me dizer, em relação a Nilza Teresinha, ela comparecia ao
escritório de contabilidade?
RÉU: Nunca, nunca apareceu,
nunca vi ela.
h) De acordo com o e-mail enviado por
PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS ao esposo CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS, datado de
16/10/2007, havia a necessidade urgente de CARLOS UBIRATAN tratar com LAIR
ANTONIO FERST e MARCO AURÉLIO DA ROZA TREVIZANI o fechamento da NT PEREIRA. Daí
se extrai que a pessoa jurídica se tornou dispensável quando o esquema ilícito
sofreu alteração, no primeiro semestre de 2007.
Eis porque é fácil concluir que a NT
PEREIRA ME não operava no objeto de seu contrato e, por via de consequência,
também não prestava qualquer serviço à NEWMARK, descontada a emissão de notas
fiscais frias, as quais relembro que atingiram o montante de cerca de R$
2.500.000,00 (dois milhões e meio de reais). É certo que o numerário que recebia
por conta do 'contrato' firmado com a NEWMARK era destinado ao casal CARLOS
UBIRATAN DOS SANTOS, PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS e à própria NILZA
TEREZINHA PEREIRA. Tal afirmação encontra provas nos seguintes elementos:
a) Nota fiscal emitida pela AYO-TUR
AGENCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA para a NT PEREIRA, relativa à compra de
passagens aéreas (Porto Alegre - Toronto - Porto Alegre) e reserva de hotéis em
Nova Iorque e em Toronto, no Canadá (Caixa 15, fls. 126 a 131, da Ação Penal de
Origem), para viagem no período de 29/03/2007 a 21/04/2007. Embora o pagamento
tenha sido feito com dinheiro da NT PEREIRA a viagem foi feita por CARLOS
UBIRATAN DOS SANTOS e PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS, com direito a passeio de
charrete, almoço em restaurante francês e jantar em pub inglês, conforme
anotações na agenda de PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS, no exato período em que
marcada a viagem (fls. 447, Caixa 13, da Ação Penal de Origem).
b) Diversas notas fiscais de compras
de materiais de construção ou similares (Caixa 11, fls. 24, 57, 62, da Ação
Penal de Origem), emitidas para a NT PEREIRA PROCESSAMENTO DE DADOS ME, mas com
endereço de entrega dos bens na Rua Dom Pedro II, n. 1551, apto 401,
Higienópolis, Porto Alegre, imóvel em que até hoje reside o casal CARLOS
UBIRATAN e PATRÍCIA e que estava em reforma à época das emissão das referidas
notas (o casal se mudou em 24/09/2006 - Caixa 13, fls. 508 e 511).
Relativamente ao mesmo imóvel, constam diversos pagamentos de IPTU e
condomínio, em planilhas de despesas da NT PEREIRA, apreendidas na residência
do casal (fls. 538 a 540, Caixa 13, da Ação Penal de Origem). Relaciono algumas
notas fiscais, apenas para exemplificar, pois foram apreendidos inúmeros
documentos semelhantes. Interessa notar que o imóvel na Rua Dom Pedro II, n.
1551, apto 401, foi adquirido a partir de valores da NT PEREIRA. Segundo CARLOS
UBIRATAN DOS SANTOS, em seu interrogatório judicial, e também pela defesa
técnica, tratou-se de empréstimo, no valor de R$ 550.000,00. Nada mais longe da
verdade e a prova dos autos contrapõe a tese defensiva, principalmente em face
do crime de corrupção, o qual será apreciado na sequência.
c) Aquisição de fazenda na cidade de
São Francisco de Paula, registrada em nome da NT PEREIRA (fls. 374 a 392, Caixa
13, da Ação Penal de Origem), a qual nunca foi utilizada pela referida empresa
ou por sua proprietária formal (NILZA TEREZINHA PEREIRA, conforme depoimento à
fl. 3460, Vol. 14, da Ação Penal de Origem). Juntamente com a documentação de
compra da propriedade rural, existe 'Certidão de inteiro teor', em cujo
cabeçalho consta N.T. PEREIRA - PROCESSAMENTO DE DADOS ME, atestando que
PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS (esposa de CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS) era
administradora da empresa, sendo remunerada com o valor de R$ 2.500,00 mensais,
demonstrando sua plena ciência das atividades que envolviam a pessoa jurídica.
Tal escritura foi apreendida na casa do casal CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS e
PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS, esta que formalmente seria 'mera empregada' da
NT PEREIRA, fato que questionável se considerarmos o motivo de tal documento
estar na posse e residência de 'simples funcionária'.
d) Gastos registrados à mão na
contabilidade da NT PEREIRA, fazendo menção a 'São Chico', demonstram que
valores teoricamente repassados a NILZA TEREZINHA PEREIRA, a título de
distribuição de lucros, eram utilizados na manutenção da propriedade em São
Francisco de Paula, utilizada apenas pelo casal PATRÍCIA e UBIRATAN (ex. fls.
295, Caixa 11, da Ação Penal de Origem). Daí se conclui que o imóvel pertencia,
de fato, ao casal, embora adquirida com os valores ilegalmente repassados à NT
PEREIRA.
e) Em conversa telefônica entre
PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS e sua secretária, ocorrida em 07/11/2007 (um
dia depois da deflagração da fase ostensiva da investigação), a corré
praticamente confessou a prática do ilícito, na medida em que claramente fala
que se prejudicou ao ter transferido planilhas para computador apreendido pela
Polícia Federal, nos seguintes termos (constante da mídia contendo conversas
integrais de CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS):
TELEFONE NOME DO ALVO
5132077889 CARLOS UBIRATAN-NUFIN-SMA
INTERLOCUTORES/COMENTÁRIO
MNI X PATRICIA
DATA/HORA INICIAL DATA/HORA FINAL
DURAÇÃO
07/11/2007 18:42:32 07/11/2007
18:47:14 00:04:42
Resumo/Transcrição do Diálogo pelo
MPF:
Secretária: Dra, depois a Sra. fala
com a Lisie se a Sra tiver acesso a algum computador;
Patrícia: Qual o computador que tem
aí?
Secretária: O meu
Patrícia: O teu voltou?
Secretária: Não, ele não chegou a ir
Patrícia: Não acredito
Secretária: Sim
Patrícia: a troco de que?
Secretária: Não sei, eles não
quiseram levar
Patrícia: Que ótimo, essa eu não
sabia
Secretária: É Deus na minha vida Dra.
Patrícia
Patrícia: Que pena que eu
passei as planilhas para o meu computador, eu mesmo me ferrei
Secretária: É, eles não quiseram
levar, acho que não tinha muito importância. Tava tudo aqui na frente, e eles
não carregaram, aí eles deixaram ali no cantinho. Acho que desistiram e não
quiseram levar, e quando olhei tava no chão e daí coloquei de volta. Eu fiquei
surpresa né, e peguei e liguei de novo, já que ninguém veio buscar.
Patrícia: Que tá acontecendo com a
Lisie?
Secretária: Ela tá preocupada, queria
saber como andam as coisas
Patrícia: Não faz muito que eu vim lá
da conversa com o Carlos Ubiratan, ele tá bem, acho que essa noite sai
Secretaria: Foi isso que eu falei,
que achava que ele iria sair de madrugada, por casa dos repórteres e tal
Patrícia: vamos dar uma preservada
nele
Secretária: Ohh Dra., essa noite eu
sonhei que a Lisie tava chegando aqui
Patrícia: Ah, não acredito, que coisa
boa
Secretária: eu sonhei que ela tava
voltando para o Brasil. Aí eu pensei, mas a troco de quê eu sonhei com ela se
agente nem se fala?
Patrícia: Mas eu to apreendendo que
quando agente sonha, agente tem que prestar bastante atenção nos sonhos. Ela tá
fazendo a documentação de naturalização dela lá (...)
Secretária: Eu já passei a informação
pra ela, disse pra ela ficar tranqüila e que depois a Sra fala com ela.
Patrícia: Tá
Secretária: Oh Dra, meu telefone tá
grampeado
Patrícia: Todos estão grampeados
Secretária: Daí todas as bobagens que
eu falo com meus amigos eles ficam ouvindo
Patrícia: risos... eles estão ouvindo
nossa conversa aqui também, então é assim Secretária: que vergonha, eles devem
tá rindo da minha cara.
Patrícia: Isso faz parte, eles sabem
que é assim mesmo...Não é um mundo tão democrático, que você por ir e vir sem
que as pessoas fiquem sabendo.
As tais planilhas que teriam ferrado
a corré, nas suas palavras, integra o Laudo 249/2008, arquivo de Excel
exportado como 21021, e desse arquivo pode-se extrair que o teor das planilhas
apenas confirma tudo o que foi dito sobre o esquema de desvio operado pelo
casal: a NT PEREIRA foi criada e funcionou apenas para possibilitar a prática
de ilícitos, inclusive o peculato, já que, por meio da firma, pagava-se, por
exemplo, anuidade da OAB, cartão de crédito, conta de celular, todos de CARLOS
UBIRATAN DOS SANTOS; materiais para a propriedade de São Francisco de Paula;
despesas com supermercado em São Francisco de Paula; gasto de PATRÍCIA JONARA
BADO DOS SANTOS com documento de veículo, etc.
f) listagem, sem assinatura, dos
depósitos feitos a NILZA PEREIRA, no ano de 2006, totalizando R$ 110.550,00,
bem como outra lista, nominada 'PATRÍCIA BADO - 2006', no valor de R$
521.486,59 (quase todas as prestações referem-se à rubrica imóvel - Caixa 13,
fls. 540, da Ação Penal de Origem).
g) planilhas, denominadas 'DESPESAS
NT', referentes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2007, em que gastos
pessoais de PATRÍCIA aparecem cobertos, como, por exemplo, cartão de crédito
(ITAUCARD) e telefone pessoal, bem como despesas de IPTU e de condomínio do
imóvel em que residia com CARLOS UBIRATAN (fls. 539, Caixa 13, da Ação Penal de
Origem);
h) aquisição de sala comercial onde
funcionavam, conjuntamente, NT PEREIRA e o escritório de advocacia de PATRÍCIA
(Nilza referiu essa aquisição em seu interrogatório policial);
i) Constata-se, também, que parte do
valor pago pelo apartamento do casal SANTOS, localizado na Rua Dom Pedro II,
saiu da própria NT PEREIRA (o que parece estar desvinculado do valor
alegadamente emprestado a CARLOS UBIRATAN). De fato, a parcela que foi paga em
20 de novembro de 2006 (R$ 31.117,75), conforme comprovante de transferência
apreendido (fls. 561, Caixa 13, da Ação Penal de Origem), no Livro Razão da NT
PEREIRA, foi contabilizado como distribuição de lucros para NILZA PEREIRA.
Contudo, em verdade, configurava uma parcela do referido apartamento, ou seja,
fica claro que o dinheiro pago pela sistemista NEWMARK à NT PEREIRA era
destinado Ao casal CARLOS UBIRATAN e PATRÍCIA JONARA, sendo que NILZA PEREIRA
recebia uma remuneração pequena por emprestar seu nome (fls. 302, Caixa 11, da
Ação Penal de Origem).
j) PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS
simulava contratos de locação com a NT Pereira, em que alugava bens de sua
propriedade à empresa a fim de justificar o repasse de valores em seu benefício
e dar uma aparência de legitimidade ao seu enriquecimento ilícito. É exemplo
disso o Contrato de locação de veículo, de 02/01/2006, GM S10 EXECUTIVE, placas
IMO2934, valor mensal de R$ 1.200,00 (DVD 03 - Caixa 15 - Volume 01 - fls. 616
a 617); Contrato de locação de linha telefônica, de 02/01/2006, valor mensal de
R$ 200,00 (DVD 03 - Caixa 15 - Volume 01 - fls. 622 a 623, da Ação Penal de
Origem). A simulação dos contratos é evidente, uma vez que a única pessoa que
utilizava os bens locados era justamente a própria PATRÍCIA, porquanto era quem
administrava a empresa de fachada.
l) Dados bancários que comprovam
transferências da N.T. PEREIRA para a conta bancária de PATRÍCIA JONARA BADO
DOS SANTOS, em valores muito superiores àqueles declarados pela corré como
percebidos em razão de suas supostas atividades de gestão na NT PEREIRA (R$
2.500,00 ao mês, conforme fls. 232, Vol. 8, da Ação Penal de Origem). Os
referidos dados bancários estão localizados no Vol. 62, mídia 'AP62-MIDIA-01',
arquivo 'Ofício 2007-132 - Alexandre Dornelles Barrios.xls', na planilha
referente a PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS 'BCO.341-AG.0280-CC.37192-3', da
Ação Penal de Origem - vide tabela da fl. 734 da sentença, onde se verificam
transferências de R$ 15.000,00; 11.500,00; 6.000,00; e 3.800,00, todas nos
meses de 05/2006 a 08/2006).
As provas elencadas são irrefutáveis,
demonstrando a patente concorrência de PATRÍCIA JONARA BADO DOS SANTOS para o
desvio de verba da autarquia estadual de trânsito em benefício próprio e
alheio, mediante sucessivos repasses de recursos pagos pelo DETRAN/RS (FATEC -
NEWMARK - NT PEREIRA - PATRÍCIA/CARLOS UBIRATAN - NILZA PEREIRA).
Relembro que PATRÍCIA JONARA BADO DOS
SANTOS influenciou sua amiga, NILZA TEREZINHA PEREIRA, a registrar a firma
individual NT PEREIRA, a qual administrava, que foi contratada pela NEWMARK. No
entanto, o ajuste era, em verdade, uma forma de viabilizar o repasse de propina
a CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS, não obstante também tenha proporcionado o
enriquecimento ilícito de PATRÍCIA DOS SANTOS e NILZA PEREIRA. Veja-se o
depoimento de PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS (fls. 284, Vol. 05, da Ação Penal
de Origem):
QUE é amiga de NILZA TERESINHA
PEREIRA há vários anos; QUE pediu a NILZA TERESINHA PEREIRA que constituísse
uma empresa em nome dela; QUE NILZA TERESINHA PEREIRA nunca atuou na empresa, a
qual sempre foi administrada pela interrogada; QUE NILZA TEREZINHA nunca vai a
empresa e não sabe nem mesmo o endereço da empresa; (...) QUE a empresa NEWMARK
é a única cliente da NT PEREIRA
A existência do dano será aferida
quando da quantificação do dano e o superfaturamento foi esclarecido quando da
análise da materialidade do delito de peculato, antes referido. A natureza da
verba pública já foi esclarecida em tópico anterior, bem assim a ilicitude das
contratações com dispensa de licitação, e alegação de que os contratos eram
vantajosos para o Estado não se sustentam porque tal condição não autoriza a
dispensa do certame.
A conduta típica de PATRICIA JONARA
BADO DOS SANTOS, portanto, consistiu basicamente em viabilizar e manter o
sistema de contratações ilegais, notadamente envolvendo a sistemistas NEWMARK e
NT PEREIRA, e, por meio desse esquema meticulosamente organizado conjuntamente
com outros corréus, operar o desvio de recursos públicos estaduais, dando
destinação ilícita à verba (distribuição de propina a agentes públicos e
enriquecimento ilícito próprio e dos demais integrantes do grupo) durante todo
o período da execução dos contratos (nº 034/2003 e 070/2003 - DETRAN/FATEC).
Agindo assim, PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS concorreu para o desvio de
recursos do DETRAN/RS.
Nessas condições, mantenho a
condenação de PATRICIA JONARA BADO DOS SANTOS pela prática do delito tipificado
no art. 312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio).
(...) 2.18. PATRÍCIA JONARA BADO DOS
SANTOS pela prática do delito de Peculato-Desvio (Fato 08) à pena
privativa de liberdade de 03 (três) anos e 09 (nove) meses de reclusão, a ser
cumprida em regime inicial aberto, além de 85 (oitenta e cinco) dias-multa, no
valor unitário de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes
em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 30
(trinta) salários mínimos, nos termos da fundamentação.
Patrícia pede a
prevalência do voto mais favorável do Desembargador Federal Márcio Antonio
Rocha, que a absolveu da prática do crime de peculato-desvio e decretou a
prescrição da pretensão punitiva quanto aos delitos de quadrilha (art. 288 do
Código Penal) e falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal), mediante os
seguintes fundamentos:
(...) Crimes de corrupção ativa e
passiva e de licitações. Não consunção.
A Exma. Relatora afasta as teses
defensivas que buscam considerar os crimes de corrupção absorvidos pelo peculato,
mantendo, em geral, as condenações proferidas na sentença, com exceção do réu
Carlos Dahlem da Rosa, que absolve do delito de corrupção ativa (fatos 12 e 14)
e dos réus Silvestre Selhorst e Rubem Höher, que absolve do delito de corrupção
passiva (fato 20).
O Exmo. Revisor, no ponto, entende
que os crimes de corrupção devem ser absorvidos pelos crimes de peculato, sob o
fundamento de que as vantagens indevidas oferecidas e prometidas aos servidores
públicos correspondiam a uma parcela do dinheiro público que por eles viria a
ser desviado, em proveito próprio e em proveito de terceiros, concluindo que as
vantagens indevidas se confundem com o produto do peculato-desvio.
Neste ponto, com a vênia do Exmo.
Revisor, acompanho a Exma. Relatora nos pontos em que mantém
as condenações pelos crimes de corrupção ativa e passiva, destacando que a
oferta de vantagem indevida é um conceito amplo, abarcando não apenas o
oferecimento de dinheiro em espécie, mas outras formas de locupletamento
ilícito, como, no caso, a realização de contratos decorrentes dos serviços
públicos cuja licitação foi indevidamente dispensada, bem como subcontratações,
e pagamentos de valores a esses títulos, ou, ainda, outros favores prometidos
ou recebidos, cuja oferta, pelo particular, ou a aceitação, pelo agente
público, sejam irregulares.
A corrupção, no caso, apresenta
tipicidade autônoma, violando sistema de proteção fundada em cláusulas
constitucional (art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988) e legal
(Lei 8.666/96) expressas, impondo dever inafastável de todo administrador
público efetuar a contratação de serviços mediante licitação. O afastamento
irregular do processo licitatório, afastando o regime de proteção legal da
Administração, causa lesão jurídica complexa, sendo evidente a
pluriofensividade do crime em questão. Primeiro, o crime ofende o dever lisura
dos servidores públicos no exercício de suas funções, que para tanto deve
operar segundo os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade, eficiência. Inferem-se diretamente de tais princípios
a proibição de praticar atos sem que o interesse público seja a meta essencial,
a proibição de praticar atos com parcialidade, buscando o favorecimento de
terceiros; a proibição de praticar atos sem finalidade pública e sem que exista
boa-fé. Segundo, o crime ofende o dever de, através de licitação, promover a
concorrência entre os diversos interessados, ferramenta essencial para a
obtenção da melhor oferta em prol dos interesses envolvidos. Terceiro, ausente
o devido processo licitatório, e esboroada a sua publicidade inerente,
afasta-se por completo a possibilidade do cidadão acompanhar e controlar o ato
administrativo, enfraquecendo o Estado e a participação da Sociedade no
controle da Administração.
A existência desse farto e robusto
conjunto de interesses a serem defendidos recomenda, com propriedade, que se
sancione com a punição criminal, todo aquele que, buscando interesses escusos,
promova a contratação de serviços públicos sem o processo legal de licitação.
Por outro lado, se para efetuar a
dispensa ilegal de licitação, o servidor público ainda se beneficia
pessoalmente, em ato de corrupção ativa ou passiva, acaba por violar outro
interesse juridicamente tutelado, ligado à necessária probidade no desempenho
de qualquer cargo ou função pública.
Configurados os crimes de corrupção e
licitatórios. Daí porque não são miscíveis em um único tipo penal, sob a
invocação de princípio consuntivo, ações criminosas que violam interesses
jurídicos tão amplos quanto específicos, voltados de um lado, à proteção da
lisura nos processos de aquisição de bens e serviços, de outro lado, ao
asseguramento da probidade pública. Isso impõe que, efetuada a dispensa ilegal
de licitação, mediante ato de corrupção, ficam configurados crimes sob dois
aspectos, no licitatório os crimes de dispensa irregular de licitação e de
beneficiar-se da dispensa irregular; e no da probidade do servidor público, os
atos de corrupção passiva e ativa.
Afastamento do crime de
peculato-desvio. Seguindo o mesmo raciocínio anterior, fica claro que se o
funcionário é corrompido ou se corrompe, e com isso afasta o processo
licitatório em benefício de terceiro, todo o dano causado à Administração já
ocorreu, sendo de menor importância, para fins penais, os destinos que se dá à
receitas advindas de um contrato assim fraudado. Há no meu entender, inversão
de valores pretender-se que tudo fosse resumido ao crime de peculato, cuja
objetividade jurídica é essencialmente de proteção da propriedade, olvidando-se
que foram cometidas ações criminosas violadoras de interesses inafastáveis, e
anteriores, ou seja, a ofensa à imposição licitatória e ao execramento jurídico
da corrupção passiva e ativa.
Suficientemente defendido o interesse
coletivo com a incidência de tais tipos penais, ou em outras palavras, a esse
ponto já esboroada a ordem jurídica de modo irreparável, não há espaço para a
punição pelo peculato-desvio, pois, a uma, desviar o produto ilicitamente
obtido seria mero exaurimento dos crimes anteriores, a duas, pela absoluta
ausência, no caso, dos elementos constitutivos do tipo penal. Com efeito, o
crime de peculato, sob a modalidade de desvio, por ser próprio do servidor
público, depende de que o próprio funcionário tenha a habilidade de promover o
desvio de valores. (Peculato - Art. 312 - Apropriar-se o
funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou
particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito
próprio ou alheio).
No caso em referência, conforme bem
exposto pelo voto da Exma Relatora, verbis: 'A ilegalidade das
contratações se verifica pelo vício de origem, já exposto, tratando-se de
avenças nulas. Relembrando, os contratos FATEC/DETRAN (34/2003 e 70/2003) e
FUNDAE/DETRAN (09/2007) são viciados pela indevida dispensa de licitação, dos
delitos penais subjacentes, o que contamina as contratações posteriores. Não
fosse isso suficiente, as subcontratações para a 'prestação' dos serviços não
foi expressamente autorizada pelo contratante (DETRAN), de modo que todas as
sistemistas operaram ilegalmente pela violação ao disposto no art. 72 da Lei n.
8.666/93.'
Frente a esse quadro, o amealhamento
de vantagens advindas de contratos ilícitos, ressalvadas as falsidades e tipos
penais outros, obtidos por meio de corrupção, configuram além dos tipos da
corrupção passiva e ativa qualificados, apenas o crime de beneficiar-se de
dispensa indevida de licitação, razão por quê, com a devida vênia, e lamentando
por abrir divergência quanto aos votos anteriores da Relatoria e da Revisão,
voto por absolver todos os réus dos crimes de peculato-desvio.
A insurgência
merece trânsito.
O Núcleo
Detran era estabelecido no âmbito da autarquia estadual. Na primeira
fase, teria como integrantes Carlos Ubiratan dos Santos, Patrícia Jonara Bado
dos Santos, Nilza Terezinha Pereira, Hermínio Gomes Júnior, Pedro Luis Saraiva
Azevedo, Alexandre Dornelles Barrios e Gilson Araújo de Araújo. Carlos Ubiratan
teria atuado no sentido de dispensar indevidamente a licitação nas duas
primeiras oportunidades (junho e dezembro de 2003), como diretor-presidente do
Detran, para contratar a FATEC e, juntamente com sua esposa, Patrícia Jonara, e
com a participação de Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, teriam
criado a empresa de fachada NT Pereira (com auxílio de sua titular, Nilza
Terezinha Pereira), destinada a distribuir propina ao casal. Hermínio Gomes
Júnior, então diretor administrativo-financeiro do DETRAN, teria atuado na
execução dos contratos, autorizando o pagamento das faturas emitidas pela FATEC
antes mesmo de seu prazo final, tendo recebido como contrapartida vantagens
financeiras por intermédio da empresa de fachada PLS Azevedo (constituída com
auxílio de seu cunhado, Pedro Luís Saraiva Azevedo), com a participação de Lair
Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani. Alexandre Barrios seria responsável
pela emissão de pareceres, no DETRAN, nos termos solicitados pelos dirigentes.
Gilson Araújo de Araújo teria posição estratégica, de modo que, após corrompido
pelos integrantes da família Fernandes, teria passado a agir conjuntamente com
os mesmos, tendo as funções de ser elo de ligação daquela família com as diretorias
do DETRAN/RS e, ainda, por ter vínculo com a Associação Nacional dos DETRANS,
auxilia-la na apresentação do esquema a outros DETRANS. Na segunda fase,
passaria a integrar o núcleo o demandado José Otávio Germano, que teria atuado
na coordenação de Flávio Roberto Luiz Vaz Netto (o novo diretor-presidente do
DETRAN) e Antônio Dornéu Cardoso Maciel, no sentido do rompimento do contrato
com a FATEC e contratação da FUNDAE.
Narra a denúncia
que a ré foi determinante na obtenção de recursos ilícitos para Carlos
Ubiratan. O acusado tinha livre disponibilidade da empresa NT PEREIRA
PROCESSAMENTO DE DADOS por meio da sua esposa, Patrícia Jonara, que a
administrava de fato. A citada empresa supostamente prestava serviços a NEWMARK
TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO, LOGÍSTICA E MARKETING LTDA., embora tenham ocorrido
pagamentos pela RIO DEL SUR. A empresa de fachada servia para a distribuição de
valores a Carlos Ubiratan e à embargante, muitas vezes de forma simulada.
Os atos atribuídos
à ora embargante não configuram o crime previsto no art. 312 do Código Penal,
caracterizando, outrossim, os tipos descritos nos arts. 288 e 299, ambos do
Código Penal, razão pela qual deve prevalecer o voto proferido pelo Vogal,
cujas penas, fixadas no patamar estabelecido pela Relatora devem ser mantidas,
bem como a decretação da prescrição da pretensão punitiva, verbis:
(...) Patrícia Jonara Bado dos Santos
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 25): 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva, antes do acréscimo relativo à continuidade
delitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 26): 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze)
dias de reclusão, prescrita a pretensão punitiva.
Não há dúvidas de
que a Patrícia, além de integrar o grupo criminoso, executou atos ilícitos.
Ocorre que tais atos estão relacionados a posterior ocultação e dissimulação do
patrimônio espúrio, o que, potencialmente, poderia configurar crime de lavagem
de dinheiro, forte na Lei 9.613/98. Entretanto, o Ministério Público
Federal não realizou a adequada descrição fática e tipificação jurídico-penal
em desfavor da acusada, o que obsta que este Colegiado, na atual fase
processual, realize as necessárias adequações.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Patrícia
Jonara Bado dos Santos para substituir o voto que lhe condenou
por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenada pelos
crimes de quadrilha e falsidade ideológica, relativamente aos quais, no
entanto, já foi reconhecida a prescrição, nos termos do voto do Vogal.
6.2. HÉLVIO
DEBUS OLIVEIRA SOUZA: O embargante, Secretário-Executivo da FUNDAE,
restou condenado à pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses
e 22 (vinte e dois) dias de reclusão e 45 (quarenta e cinco) dias-multa, no
valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes em
prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 15
(quinze) salários mínimos, pela prática do delito de peculato-desvio, por meio
do voto-médio proferido pela Relatora, nestes termos:
(...) 4.2.11. HELVIO DEBUS OLIVEIRA
SOUZA - Fato 09
Consta dos autos que HÉLVIO DEBUS
OLIVEIRA DE SOUZA concorreu para o desvio de recursos públicos, em proveito
próprio e alheio, decorrentes do Contrato n. 09/2007 (DETRAN/FUNDAE).
O acusado ostentava o cargo de
Secretário-Executivo da FUNDAE e era contratado pela fundação por sua empresa
S3 Contabilidade. Narrou, em seu interrogatório, que, por meio da referida
sociedade familiar, prestava serviços de contabilidade à FUNDAE há muitos anos.
Por isso, quando a PENSANT CONSULTORES LTDA. migrou da FATEC para a FUNDAE, a
FAMÍLIA FERNANDES aproximou-se de HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA DE SOUZA, integrando-o
ao esquema criminoso que gerenciava.
Nesse sentido, segundo relatório da
Polícia Federal, DARIO TREVISAN DE ALMEIDA declarou durante o inquérito
policial que 'a escolha das 'sistemistas' DOCTUS, NACHTIGALL LUZ, IGPL e GCPLAN
foi favorecida pela ação de JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES e FERDINANDO
FERNANDES, o mesmo ocorrendo em face dos indivíduos HÉLVIO DEBUS SOUZA e
RUBEM HOHER, por parte da FUNDAE (fl. 3321, Vol. 14, da Ação Penal de Origem).
Daí se extrai a aliança firmada entre HELVIO DE SOUZA e a FAMÍLIA FERNANDES.
A cooperação do acusado para o desvio
de verbas públicas está evidenciada pelos seguintes elementos probatórios.
a) Memória da reunião realizada em
29/10/2007, na sede da PENSANT, que contou com a participação de JOSÉ
FERNANDES, FERDINANDO, Francene e Diogo, onde foram debatidos assuntos que
envolviam a participação de HELVIO no esquema delitivo (Caixa 13, fls. 312, da
Ação Penal de Origem - grifos nossos):
- Item 1: Ferdinando conta como foram
as tratativas em Santa Maria com Hélvio e com o Rubem. Ele não emitiu as NF's
porque a FUNDAE estava sem disponibilidade financeira.
- Item 3: Ferdinando repassa proposta
da FATEC. Mantém o contrato atual e um fixo de 125, sendo 110 de despesa. Quita
os 60 atrasado, 30 em novembro e trinta em dezembro e este mês cumpre 110 dos
125. Os 15 o Hélvio e o Rubem darão um jeito. Esta solução
será mantida por 120 dias até que uma empresa de inteligência comece a prestar
os serviços.
- Item 10: Planos pedagógicos:
realizar reunião específica para tratar. Diz respeito a elaboração dos planos
dos cursos da FUNDAE na Fazenda Santa Marta que o Hélvio sugeriu contratar a
FATEC.
b) Anotação manuscrita por JOSÉ
FERNANDES, datada de 17/10, apreendida nos autos (Caixa 17, Vol. 1, fls. 153,
da Ação Penal de Origem), explicitando os temas que seriam tratados na reunião
do dia 29/10/2007 (antes referida), constando os nomes de JOSÉ FERNANDES (JAF),
RUBEM, FERDINANDO, DIOGO e HÉLVIO. Ou seja, havia relação entre o acusado e os
membros da FAMILIA FERNANDES.
c) Depoimento de DARIO TREVISAN DE
ALMEIDA, que afirmou ser HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA DE SOUZA subordinado da FAMÍLIA
FERNANDES (fl.1332, Vol.6, da Ação Penal de Origem - grifos nossos):
(...) fica bastante claro que tanto
RUBEM quanto HÉLVIO conquanto prestam serviços para FUNDAE, sendo que RUBEM é o
coordenador das atividades junto ao DETRAN, enquanto HÉLVIO faz a
contabilidade, se subordinam a FERDINANDO FERNANDES muito mais do que
propriamente à FUNDAE (...)
d) A S3 Contabilidade, sociedade
familiar de HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA DE SOUZA foi contratada pela FUNDAE como
sistemista para o contrato DETRAN (Caixa 1, fls. 498 a 500, da Ação Penal de
Origem), enquanto o acusado foi alçado ao cargo de Secretário-Executivo da
FUNDAE por indicação de JOSÉ FERNANDES, como antes referido. Note-se que a
referida sociedade familiar já prestava serviços há anos à fundação, razão pela
qual o acusado fruía da confiança dos gestores da FUNDAE, o que possivelmente
facilitou a operação do esquema delitivo à margem do conhecimento dos gestores
da FUNDAE. De fato, com o tempo a relação de fidúcia se desconstruiu, e Mário
Gaiger encaminhou a HÉLVIO DE SOUZA, em 21/08/2007, ofício em que determinava
'A partir desta data V.S. só está autorizado a fazer pagamentos por serviços de
terceiros que estejam contratados pela FUNDAE', além de solicitar dados
relativos a toda a movimentação financeira concernente ao Projeto DETRAN,
documento que também foi encaminhado por cópia para RUBEM HOHER e para a
PENSANT (POA 01, item 23, da Ação Penal de Origem).
e) HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA DE SOUZA
retirou-se do quadro societário da S3 Contabilidade em 30/05/2007, conforme
alteração do contrato social, registrada em 28/06/2007 (MIDIAS
DIGITAIS\PR195-MIDIA- 01.ZIP\PR195-MIDIA-01, CONTRATOS - VOLUME I, fls. 7 a 16,
da Ação Penal de Origem), porém, continuava atuando como sócio da pessoa
jurídica, como se pode verificar pelos e-mails interceptados pela Polícia
Federal, os quais foram enviados ao endereço eletrônico
helvio@s3contabilidade.com.br em datas posteriores à retirada do acusado do
quadro societário da S3 Contabilidade (31/08/2007, 27/09/2007 e 21/10/2007),
quando já se encontrava no cargo de Secretário-Executivo da FUNDAE, o que,
aliás, o próprio acusado corrobora, ao afirmar que no seu entender não havia
total incompatibilidade entre o cargo exercido na FUNDAE e o trabalho de
contabilidade, que continuava exercendo na S3 Contabilidade apenas em relação
'a seus clientes particulares' (isto consta das razões de apelo, inclusive).
f) A planilha demonstrativa, onde
consta que em agosto de 2007 a S3 Contabilidade perceberia, no contrato DETRAN,
R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), sendo que metade deste valor (R$ 20.000,00 -
vinte mil reais), estava destinado a 'despesas operacionais', o que na
linguagem do grupo criminoso, significava a propina paga aos agentes públicos
(Caixa 13, fls. 98, da Ação penal de Origem). É óbvio, em uma situação regular,
inexiste razão para uma sociedade contribuir, a título 'despesas operacionais',
com 50% da contraprestação dos seus serviços, a não ser que seja para algum fim
ilícito, como no caso dos autos, retribuir a oportunidade de participar de um
esquema criminoso altamente lucrativo e formar a 'reserva de propina'do grupo.
Nesse andar, HELVIO também contribuiu para o desvio de dinheiro público em
benefício de terceiros (agentes públicos destinatários da propina).
g) Na sede da S3 Contabilidade (Caixa
4, da Ação Penal de Origem) foram encontrados os contratos firmados entre as
empresas PENSANT, IGPL, NACHTIGALL LUZ e a FUNDAE, devidamente assinados,
rasgados e datados de 03/04/2007, ou seja, momento anterior à rescisão
DETRAN/FATEC (09/04/2007 - Apenso I, Vol. II, fls. 168 a 169) e à contratação
DETRAN/FUNDAE (Contrato 09/2007). Daí se infere que HÉLVIO DEBUS OLIVEIRA DE
SOUZA aderiu ao esquema criminoso na sua gênese, participando das ações prévias
às contratações ilícitas.
h) Intercepções telefônicas (mídia 4,
Vol. 118, fl. 30553, da Ação Penal de Origem) como seguem:
* 06/08/2007 (13:52:14), HÉLVIO X
FERDINANDO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 57 a
58, da Ação Penal de Origem): A conversa menciona percentuais de filantropia
prometidos por JOSÉ FERNANDES, bem como pagamento dos prestamistas, em especial
a DOCTUS, de Ricardo e RUBEM HOHER. Extrai-se a verdadeira gestão de FERDINANDO
quanto aos assuntos da FUNDAE e a notável subordinação de HELVIO DE SOUZA em
relação à FAMÍLIA FERNANDES.
* 06/08/2007 (15:22:45), HÉLVIO X
DENISE (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 59 a 60,
da Ação Penal de Origem): Falam sobre a troca de notas fiscais para regularizar
pagamentos irregulares, bem como HELVIO DE SOUZA demonstra temor de que o
Ministério Público perguntasse por determinada nota. Evidencia a integração do
acusado ao esquema criminoso, alterando a contabilidade da FUNDAE com a troca
de notas fiscais a fim de mascarar os pagamentos ilícitos efetuados às
sistemistas.
* 07/08/2007 (18:26:52), RUBEM X
HÉLVIO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 71/72,
da Ação Penal de Origem): Os corréus RUBEM e HÉLVIO debatem sobre a alteração
de notas fiscais a fim de regularizar o pagamento indevido de honorários
advocatícios, sendo que HÉLVIO DE SOUZA diz que vai anular as notas anteriores
e lançar como adiantamento. Possivelmente em referência ao diálogo anterior
(HELVIO X DENISE), pois menciona que DENISE LUZ poderá explicar melhor.
* 13/08/2007 (16:17:41), HÉLVIO X
FERDINANDO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 92,
da Ação Penal de Origem): HELVIO DE SOUZA relata que o MP fez outras
solicitações e FERDINANDO FERNANDES pede para mandar cópia para DENISE LUZ e
para ele, combinando de conversar mais sobre o assunto. Daí se extrai a
cumplicidade entre os interlocutores, que combinavam a forma de responder ao
Ministério Público, certamente para ocultar as ilegalidades cometidas.
* 14/08/2007 (09:29:55), HÉLVIO X HNI
(autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 92 a 93, da
Ação Penal de Origem): O diálogo trata das requisições do Ministério Público.
São elencadas pelos interlocutores as sistemistas ligadas ao esquema,
especificadas aquelas que não seriam pagas pela FUNDAE (NEWMARK, RIO DEL SUR e
CARLOS ROSA) e aquelas efetivamente contratadas pela referida fundação
(PENSANT, IGPL e NACHTIGALL LUZ). Revela o total conhecimento e conivência do
acusado em relação às sistemistas e ao desvio das verbas públicas.
* 15/08/2007 (09:51:09), HELVIO X
RUBEM (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 189 a
190, da Ação Penal de Origem): HELVIO diz a RUBEM que é muito incômodo 'por
este valorzinho', afirmando que sobra na nota R$ 12.000,00 (refere-se,
obviamente, aos R$ 40.000,00 recebidos mensalmente pela S3 Contabilidade, já
com o abatimento dos descontos habituais e da parcela atinente à contribuição
para propina dos agentes públicos cúmplices - R$ 20.000,00) somado ao seu
salário de R$ 4.000,00 na FUNDAE. É claro o descontentamento do acusado com o
valor que lhe coube dos recursos desviados do DETRAN, recebidos por meio da
sistemista S3 Contabilidade, sociedade sua e de seus irmãos.
* 16/08/2007 (10:29:55), HELVIO X
DENISE (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 193, da
Ação Penal de Origem): Trata-se das respostas aos questionamentos do Ministério
Público, ambos interlocutores preocupados em formular versões convincentes a
fim de encobrir as ilegalidades perpetradas no projeto DETRAN. DENISE afirma
que está trabalhando nessa questão e planeja a realização de reuniões para
debater pessoalmente com o grupo, evidentemente para ter mais subsídios na
elaboração das manifestações ao órgão ministerial.
* 21/08/2007 (11:39:37), HELVIO X
IPOJUCAM (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 203 a
205, da Ação Penal de Origem): HELVIO diz que Mario o teria proibido de efetuar
pagamentos e quem não possuísse contrato com a FUNDAE (referência ao ofício
antes citado). IPOJUCAM fala que teria que fazer contratos rapidamente (GCPLAN
X FUNDAE), e que não entende como prestam serviços para o DETRAN porque não
teriam contrato com a FUNDAE, seriam 'quarteirizados'. HELVIO diz que o sistema
é simples e explica a manobra utilizada para justificar os pagamentos
realizados aos 'prestamistas parceiros', ou seja, àquelas sociedades que não
possuem vínculo contratual com a fundação. Resta clara a participação e
conhecimento de todo o esquema criminoso pelo acusado, o qual tinha plena
ciência de que efetuava ilegalmente pagamentos às sistemistas que sequer
possuíam contrato com a FUNDAE, e sabia a maneira de como justificar tais
pagamentos.
* 21/08/2007 (12:15:43), HELVIO X HNI
(autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 205 a 206, da
Ação Penal de Origem): HELVIO e HNI conversam sobre valores e depósitos
bancários, HELVIO pede para depositar quantias em sua conta e o interlocutor
HNI fala que 'está pensando no dinheiro do pessoal lá...os 20 mil'. A
referência é explícita à contribuição da S3 Contabilidade para a propina
destinada aos agentes públicos integrantes do esquema, já referida.
* 29/08/2007 (18:57:12), RUBEM X
HELVIO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 4, fls. 282 a
283, da Ação Penal de Origem): Versa sobre as tratativas prévias à assinatura
dos contratos com as sistemistas (03/09/2007), inclusive do percentual que
caberia à PENSANT. Ademais, HÉLVIO diz que 'só iria faltar o 'tiro de
misericórdia' que seria o professor ZÉ FERNANDES vir aqui trazer aquela pactuação
de gaveta que teria ficado lá. RUBEM diz que isso aí iriam rasgar tudo'.
Referência clara aos documento encontrados na sede da S3 Contabilidade,
rasgados, já referidos.
* 18/09/2007 (16:27:52), HÉLVIO X
RUBEM (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 5, fls. 61, da
Ação Penal de Origem): Os corréus mencionam a existência de uma nota fiscal
para pagamento da execução do contrato firmado 'em dois de quatro e primeiro
termo aditivo'. RUBEM diz que o termo aditivo 'é por causa dos seis por cento',
e que 'DENISE vai dar uma examinada par ver se não é o caso de cancelar o
contrato e fazer um novo'. Possível referência aos contratos encontrados
rasgados e apreendidos na sede da S3 Contabilidade, já referidos.
* 18/10/2007 (19:27:53), HÉLVIO X
FERDINANDO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 5, fls. 314
a 315, da Ação Penal de Origem): Os interlocutores combinam reunião na FUNDAE
com a participação de SILVESTRE, RUBEM, HELVIO e FERDINANDO. Ao final, HELVIO
diz 'para eles não tomar nenhuma atitude que a parceria está mantida...'.
Extrai-se a cumplicidade entre os integrantes do esquema.
* 28/09/2007 (15:17:15), HELVIO X
RUBEM (áudio em mídia acautelada em Secretaria). O diálogo indica que RUBEM
transportava a propina e a efetiva contribuição de HELVIO DE SOUZA para tal
pagamento, pois que HELVIO entregou os 'papéis' (sua parte na propina) para
RUBEM levar até Porto Alegre. Veja-se (grifos nossos):
Élvio - Alô!
Rubem - Élvio?
Élvio - Oi Rubem.
Rubem - Tudo bom? Como é que tá?
Élvio - Tudo bem e tú?
Rubem - Tudo numa boa? Tu tem aquele
material pra mim levar pra Porto Alegre?
Élvio - Eu entreguei pro Ferdinando
ontem.
Rubem - Ata, então tá ótimo.
Élvio - Eu entreguei as cópias da,
da, das notas tudo, a única coisa que falta é os balanço, mas ai eu posso
mandar por e-mail pra ele.
Rubem - Tá, eu digo aquele do
banco.
Élvio - Do banco?
Rubem - Grana. Eu digo....
Élvio - Quando é que tú vai pra Porto
Alegre?
Rubem - Eu vou domingo, segunda-feira
cedo.
Élvio - Tá, passa, passa
aqui que eu te entrego esses papéis ai
Rubem - Eu posso passar agora?
Élvio - Pode, eu to aqui.(...)
A defesa sustenta a falta de prova da
prática delitiva por parte do acusado. As provas da concorrência dolosa do réu
para os desvios de recursos do DETRAN (peculato-desvio) foram plenamente
apresentadas acima, inexistindo dúvida a militar em favor de HÉLVIO DEBUS
OLIVEIRA DE SOUZA.
A atuação de HELVIO DEBUS OLIVEIRA DE
SOUZA era, em verdade, muito mais voltada ao enriquecimento ilícito dos seus
integrantes, bem assim ao pagamento de propina, do que à prestação de serviços
de contabilidade no âmbito dos contratos firmados entre a FUNDAE e o DETRAN.
Tal afirmação é tranquilamente extraída das provas dos autos, antes arroladas,
e prescinde de perícia técnica para sua demonstração, restando a materialidade
delitiva comprovada em tópico próprio.
A conduta típica de HELVIO DEBUS
OLIVEIRA DE SOUZA, portanto, consistiu em laborar efetivamente para a execução
do sistema de contratações e subcontratações com dispensa ilegal de licitação
e, por meio desse esquema meticulosamente organizado conjuntamente com outros
corréus, operar o desvio de recursos públicos estaduais, dando destinação
ilícita à verba (distribuição de propina a agentes públicos e enriquecimento
ilícito próprio e dos demais integrantes do grupo) durante todo o período da
execução do contrato (n. 09/2007 - DETRAN/FUNDAE). Agindo assim, HELVIO DEBUS
OLIVEIRA DE SOUZA concorreu para o desvio de recursos do DETRAN/RS.
Nessas condições, mantenho a
condenação de HELVIO DEBUS OLIVEIRA DE SOUZA pela prática do delito tipificado
no art. 312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio).
Hélvio pede a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Desembargador Federal Márcio
Antonio Rocha, que o absolveu da prática do crime de peculato-desvio e decretou
a prescrição da pretensão punitiva em relação ao delito de quadrilha (art. 288
do Código Penal), o qual deixo de transcrever, pois os fundamentos restaram
declinados quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por
Patrícia Jonara Bado dos Santos.
O recurso deve ser
provido.
O Núcleo
Fundacional tem como integrantes Luiz Carlos de Pelegrini, Rubem
Höher, Silvestre Selhorst e Helvio Debus Oliveira Souza. O embargante
participou da segunda fase do esquema criminoso.
Descreve a inicial
acusatória que Hélvio teria sido nomeado Secretário-Executivo da FUNDAE
por indicação da família Fernandes, muito embora prestasse serviços de
contabilidade à fundação há muitos anos. Aponta que o réu, juntamente com Rubem
Höher, teve participação destacada e fundamental para a prática dos ilícitos,
pois operacionalizou o esquema criminoso dentro da fundação. A atuação do
acusado também foi indispensável no locupletamento obtido pelo grupo criminoso
decorrente da dispensa de licitação do DETRAN em face da FUNDAE. Contratada,
essa fundação terceirizou todo o 'operacional' dos serviços para a FATEC, que
vinha, até então, realizando os serviços. Assim, a atuação de Hélvio, como
dirigente da fundação de apoio, foi determinante para a concretização da ilegal
contratação, uma vez que se configura na própria instrumentalização da dispensa
de licitação. A dispensa de licitação para contratação da FUNDAE foi levada a
efeito sem qualquer consideração quanto aos custos da execução do contrato.
Assim, em razão da sua atuação no esquema criminoso, entre as datas de 15 de
maio de 2007 a 6 de novembro de 2007, quando a Fundação para o Desenvolvimento
e Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura - FUNDAE já se encontrava contratada
pelo Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN/RS, por meio do Contrato nº
09/2007, a conduta do réu Hélvio foi determinante para que houvesse o
locupletamento em razão da dispensa de licitação. Hélvio, que era prestador de
serviço da FUNDAE, passou a ser empregado da fundação. Além disso, logo em
seguida, por intermédio de sua empresa de contabilidade, S3 CONTABILIDADE
CONSULTORIA E ASSESSORIA LTDA., passou a trabalhar para a PENSANT, como
contratado da fundação (sistemista/prestamista). Todas as 'sistemistas', dentre
elas a S3 CONTABILIDADE CONSULTORIA E ASSESSORIA LTDA., mantêm relação de
subordinação com a PENSANT, a qual repassa os recursos, junto com as demais
empresas, para pagamento de propina aos dirigentes, que acobertam o esquema e
mantêm a espúria contratação mediante dispensa de licitação, com subcontratação
de 'sistemistas'.
Dessarte, as
condutas atribuídas ao ora embargante não configuram o crime previsto no art.
312 do Código Penal, considerando-se que o acusado não detinha a posse,
disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da
dispensa irregular de licitação, praticada por terceiros em ato de corrupção,
caracterizando, outrossim, o tipo descrito no art. 288 do Código Penal, razão
pela qual deve prevalecer o voto proferido pelo Vogal, cuja pena, fixada no
patamar estabelecido pela Relatora quanto ao citado crime, deve ser mantida bem
como a decretação da prescrição da pretensão punitiva, verbis:
Helvio Debus Oliveira Souza
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Helvio
Debus Oliveira Souza para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de quadrilha que, no entanto, está prescrito, nos termos do
voto do Vogal.
6.3. LUIZ
PAULO ROSEK GERMANO: Luiz Paulo Rosek Germano, advogado que trabalhava
no mesmo escritório do corréu Carlos Dahlem da Rosa, foi condenado à pena
privativa de liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois)
dias de reclusão, em regime aberto, e 90 (noventa) dias-multa, no valor
unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de
serviços à comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 25 (vinte e cinco)
salários mínimos, pela prática do delito de peculato-desvio, mediante o
voto-médio proferido pela Relatora, Cláudia Cristina Cristofani, nos seguintes
termos:
Apela o sentenciado Luiz Paulo Rosek
Germano, condenado pelos delitos de peculato e quadrilha, e absolvido quanto
aos demais.
Dentre outros argumentos de apelo
(Evento 46), afirma ocorrência de lesão ao princípio da correlação, porque:
'Ademais, segundo a denúncia, o
recorrente seria o 'consultor' de Flávio Vaz Netto nos contratos firmados pelo
DETRAN com as fundações (fl. 46, 67, 112, 145, da denúncia), tendo acompanhado
aquele servidor estadual em várias reuniões, como 'integrante do Núcleo CARLOS
ROSA', responsável pela 'distribuição de propina aos dirigentes do DETRAN'
(denúncia, fl. 67); teria 'concorrido para a nova contratação ilegal da FATEC e
da FUNDAE' (denúncia, fl. 106, 111) efetuada por Flávio Vaz Netto (denúncia,
fl. 137); e teria 'oferecido vantagem indevida a Flávio Vaz Netto para que
praticasse atos de ofício com infringência de dever funcional' (denúncia, fl.
162, 164, 179), tendo 'acompanhado os integrantes da FAMÍLIA FERNANDES e PAULO
JORGE SARKIS na empreitada de ofertar o modelo de fraude a outros DETRANs do
Brasil' (denúncia, dl. 164). Ainda conforme a denúncia, destinatários da
'propina' seriam os 'dirigentes do DETRAN/RS ' (também nas fls. 125, 138 e 181
da denúncia) - e ninguém mais'. A defesa foi inteiramente desenvolvida em vista
dessas acusações '.
Ainda segundo o apelo, o Ministério
Público modificou as acusações em alegações finais, destacando que:
'Assim, passou a dizer que Luiz Paulo
teria 'dado vazão ao desvio de recursos públicos em proveito próprio e de seu
irmão JOSÉ OTÁVIO GERMANO' (fls. 56.122, 56.123); que teria 'atuado na proteção
e controle sobre o esquema milionário de desvio' (fls. 56.122, 56.12 3); que
teria 'prospectado outros DETRAN's no Brasil para expandir a fraude' (fls.
56.122, 56.123); que teria depositado junto a doleiros os valores desviados em
favor do 'jurídico' (fls. 56.122, 56.123); que teria sido 'colocado no
escritório CARLOS ROSA com o intuito de 'vigiar o 'laranja' CARLOS ROSA' (fls.
56.122, 56.123); e que seria o repassador da ' propina ' para o seu irmão
Deputado Federal José Otávio Germano (fls. 56.122, 56.123). '
Segundo ele, ainda, a discrepância
entre denúncia e razões finais se devia a uma razão estratégica: 'a tardia
imputação ao acusado LUIZ PAULO de conduta associada à atribuída ao seu irmão
JOSÉ OTÁVIO integrou estratégia desenhada no início da operação DETRAN pela PF
e pelo MPF de evitar que essa associação produzisse o deslocamento do caso da
jurisdição federal de Santa Maria para o Supremo Tribunal Federal, em Brasília,
em razão da prerrogativa de foro de que é titular o seu irmão José
Otávio.'
LUIZ PAULO ROSEK GERMANO alegadamente
possuía vínculos profissionais (trabalhava no mesmo escritório) e de amizade
com o corréu CARLOS DAHLEM DA ROSA, especialmente no período da contratação
DETRAN X FUNDAE, além de relacionamento com o também corréu FLAVIO ROBERTO LUIZ
VAZ NETTO, o que confirmou em seus depoimentos (Vol. 9, fls. 1972 a 1976; Vol.
21, da Ação Penal de Origem). |Mais do que isso é extraído dos autos, como uma
planilha apreendida em computador da PENSANT, onde estão registradas viagens
custeadas pela referida empresa, realizadas por LUIZ PAULO ROSEK GERMANO, na
companhia de CARLOS DAHLEM DA ROSA, DENISE NACHTIGALL LUZ e FERDINANDO
FRANCISCO FERNANDES, nos dias 16, 17 e 18 de janeiro de 2006 (Vol. 95, fl.
24963, da Ação Penal de Origem). Daí se extrai que o acusado também mantinha
relações com a FAMÍLIA FERNANDES - inclusive desde antes da assinatura do
Contrato DETRAN/FUNDAE (em 04/2007).
A denúncia narrou a sua colaboração e
assessoria para a trama contratual, e por este fato foi condenado - 'blindagem
do esquema, como insiste a defesa.
Relembre-se ter sido o apelante
absolvido quanto aos delitos de dispensa de licitação e de corrupção,
resultando procedentes apenas os pedidos de condenação aos delitos de peculato
e quadrilha, o que, na prática, acaba por esvaziar a alegação de lesão ao
princípio da correlação. Se a denúncia refere que a promessa de vantagem
indevida vertia a Flávio Vaz Netto, ao invés de José Otávio Germano, a questão
restou superada com a absolvição pelo crime de corrupção. Por igual, a acusação
de interferência nos contratos que corporificaram inicialmente o esquema
restou, segundo o juízo de primeiro grau, não comprovada, resultando na
absolvição pelo delito de dispensa de licitação. Apenas a colaboração do
apelante para a sustentabilidade e expansão do esquema delitivo foi
punibilizada (participação no peculato desvio e quadrilha), e, no ponto, a
denúncia permite a defesa.
No que pertine à adesão ao esquema
organizado (quadrilha) para desviar dinheiro público (peculato), narra a
denúncia que houve viagens com o intuito de levar a participação para outros
Estados da Federação, dando perfeita margem para atuação defensiva.
O desenho da participação do apelante
foi suficientemente delineado na denúncia, de cuja narrativa não se exige
absoluta precisão, aliás, especialmente ante a complexidade da relação
criminosa estabelecida - um verdadeiro 'contrato relacional' entre os
integrantes.
Assim, na porção em que resultou
condenação, o que foi dito em alegações finais está contido nos termos da
inicial. Havia justa causa para lastrear a narrativa inicial, consubstanciado
no relacionamento e atividades do apelante ligadas aos corréus - Carlos Rosa,
em cujo escritório laborava; a família Fernandes, com quem efetivamente viajou;
Flávio Vaz Netto, a quem alertou que haveria investigação dos contratos junto
ao Tribunal de Contas, orientando defesa jurídica enquanto fraudes ainda
estavam sendo perpetradas, colaborando para a preservação do engenho jurídico;
contato com doleiro. Em tese, ao contribuir para o esquema, obviamente prestou
colaboração para que o dinheiro público fosse desviado de sua finalidade,
alcançado por diversos envolvidos.
Afasta-se, portanto, a alegação de
desrespeito ao princípio da correlação.
O apelante refere nunca ter mantido,
de forma direta ou indireta, relação jurídica com o DETRAN, a UFSM, ou outras
entidades públicas, sendo FATEC e FUNDAE pessoas jurídicas de direito privado -
logo, a subcontratação independia de licitação. E, ainda que fosse exigível a
licitação, houve prestação dos serviços - e, havendo tal contraprestação, de
peculato desvio não se trata, mas de remuneração do contrato.
Deste tópico já se tratou, afirmando
a necessidade da licitação e a natureza da verba desviada, quando do exame da
materialidade delitiva, ao qual me reporto.
Prosseguindo em seu apelo, o réu
alega que a condenação não se sustenta porque calcada em escutas telefônicas
ilícitas. Segundo o raciocínio da própria sentença, diz, se a interceptação foi
invalidada pelo STF, em relação a José Otávio Germano, igualmente inservíveis
em relação a Luiz Paulo.
Contudo, a sentença não se valeu de
conversas travadas pelo apelante com José Otávio Germano para a condenação
pelos delitos de quadrilha e peculato, mas sim calcou-se em e-mails e trechos
de outras conversas grampeadas, encetadas com diversos interlocutores, o que
passa distante da nulidade proclamada pelo STF - particularmente, teria por
válidas as escutas, em relação a Luiz Paulo, mesmo as travadas com seu irmão
José Otávio, pois a decisão do STF é clara ao ressalvar a validade da
interceptação quanto aos demais corréus. Porém, a r. sentença não as utiliza e
absolve parcialmente o apelante, optando, em excesso de zelo, por não se valer
da prova.
Agora, da decisão do STF que infirma
a validade de escutas que envolveram, acidentalmente, o exercente de mandato
com prerrogativa de foro - nulidade que, extreme de dúvidas, se deu
exclusivamente em relação à sua pessoa - para que se compreenda que é
inservível toda e qualquer interceptação encontrável nos autos, mesmo não
envolvendo o interlocutor fortuito, é passo que não se pode dar senão às custas
do sacrifício desnecessário de princípios constitucionais de proteção coletiva
- não somente o direito à segurança pública e moralidade administrativa, como
também os que tutelam o próprio direito de ação, dependente que é da capacidade
do juízo de produzir ou autorizar a produção de provas à revelia da vontade do
implicado para poder decidir litígios.
Não há qualquer nulidade na prova,
portanto.
Indo adiante, observa-se insurgência
em face da terminologia utilizada pela sentença, que conclui que o apelante,
advertindo Flávio Vaz Netto, Diretor do DETRAN/RS até a deflagração da Operação
Rodin, teria colaborado para a 'blindagem' da empreitada ilícita. Diz que o
verbo blindar não é núcleo de tipo penal e que a atuação está indefinida, e
procedida depois de consumado o delito.
Consta dos autos que LUIZ PAULO ROSEK
GERMANO (vulgo BUTI) concorreu para o desvio de recursos públicos, em
proveito próprio e alheio, decorrentes do Contrato n. 09/2007 (DETRAN/FUNDAE).
First things first, é indubitável que
o apelante conhecia as irregularidades que envolviam as fundações defendidas
pelo escritório de Carlos Rosa, onde trabalhava, e tinha ciência da
ilegalidade. Ao menos, soube de investigações através de Cesar Viterbo Matos
Santolin, Auditor Substituto de Conselheiro do Tribunal de Contas do RS,
repassando as informações a Flávio Vaz Netto e, posteriormente, aconselhando-o
sobre como acertar as coisas. No curso das conversas demonstra conhecimento da
trama e articula intervenção dos envolvidos - soluções traumáticas ou não para
acertar as contas, envolvendo ou não o 'pensador' (Fernandes, Pensant), como se
vê das interceptações.
Não há exatamente condenação pela
'blindagem' como núcleo do tipo, por óbvio, senão como a forma com que se deu a
participação do apelante, nos exatos termos do art. 29, do CP: 'quem, de
qualquer modo, concorre para o crime...'.
Por óbvio, o partícipe, aquele que
não realiza o núcleo do tipo, presta sua colaboração ao evento ilícito de
diversas formas não nucleares - inclusive contribuindo para blindá-lo. O
'batedor' que acompanha, na estrada, o motorista do caminhão carregado de
substâncias entorpecentes; ou o motorista do carro que, durante o assalto,
espera e conduz o assaltante em sua fuga, não realizam, ele próprios, o núcleo
do tipo de tráfico de drogas ou de roubo, e nem por isso não serão implicados.
A sentença justamente busca desenhar o quê, no caso, se compreendeu por
contribuição para a perpetuação de ilícitos em andamento - alerta de
investigação e consultoria para a ocultação, continuação e perpetuidade de empresa
ilícita, vale dizer, blindagem.
Veja-se o conteúdo das interceptações
telefônicas destacadas pelo juízo singular (mídia 4, Vol. 118, fl. 30553, da
Ação Penal de Origem - grifos nossos):
- 07/08/2007 (19:42:57), LUIZ PAULO
GERMANO (BUTI) X FLAVIO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol.
4, fls. 72/73): O acusado fala ao corréu FLAVIO que Santolin (Cesar Viterbo
Matos Santolin - Auditor Substituto de Conselheiro do Tribunal de Contas do
Estado do RS) lhe falou sobre a existência de um processo, no Tribunal de
Contas do Estado, envolvendo o contrato DETRAN X FUNDAE. Note-se que o
denunciado recebeu informação privilegiada e alertou FLAVIO VAZ NETTO
sobre possíveis problemas ao esquema envolvendo o referido contrato, tendo em
conta as ilegalidades que estavam sob apuração na Corte de Contas.
- 07/08/2007 (19:44:18), LUIZ PAULO
GERMANO (BUTI) X FLAVIO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol.
4, fls. 73/74): Prosseguindo a conversa anterior, LUIZ PAULO GERMANO
explica que houve uma representação no Tribunal de Contas concernente às
fundações (FATEC e FUNDAE), existindo farta documentação instruindo o
respectivo processo, cujo objeto é possíveis irregularidades na subcontratação
de terceiros para realizarem os serviços que deveriam ter sido executados pela
estrutura própria da fundação de apoio. A clara intenção do acusado
era alertar FLAVIO sobre o procedimento instaurado e possível investigação pelo
referido órgão, no intento de preservar o esquema orquestrado para o desvio de
recursos do DETRAN/RS, preparando respostas elaboradas ardilosamente para os
possíveis questionamentos do Tribunal de Contas. E tal conclusão é
perfeitamente lógica se for considerada a orientação de FLAVIO para que fosse
falsamente informado ao Tribunal de Contas do Estado que não havia empresas
sistemistas, e que a fundação executava diretamente o contrato com o DETRAN.
É manifesto, pois, o dolo de LUIZ
PAULO GERMANO em contribuir para a blindagem do sistema fraudulento que estava
em plena operação.
- 10/10/2007 (11:41:04), JOÃO X
FLAVIO (autos da quebra de sigilo nº 2007.71.02.004243-6; Vol. 5, fls. 219): No
diálogo, JOÃO diz que 'passou todo o processo para o cara, que disse que já
tinha conversado com o BUTI'. Logicamente, os interlocutores estavam falando do
processo em tramitação no Tribunal de Contas - que estava apurando
irregularidades nos contratos do DETRAN com as fundações -, e que já estaria
com o membro julgador daquela Corte de Contas. Percebe-se que o acusado
(BUTI) já havia conversado (intercedido) com o julgador, demonstrando seu
empenho e atuação em proteger o esquema ardiloso e defender seus integrantes,
especialmente FLAVIO VAZ NETTO, utilizando-se de seus contatos, conhecimento e
influência políticos. (...)
- 08/08/2007 (13:08:39), FLAVIO X
BUTI (mídia 4, anexada ao Vol. 118, fl. 30553, dos autos):
(...) FLÁVIO: Na verdade são questões
pretéritas, tá...eh...prá minha...eh...sorte...eh...as providências adotadas
estão rigorosamente dentro da perspectiva da-da Corte...
BUTI: Ahã...
FLÁVIO: Tá... por tanto o que eles
querem saber é exatamente o que não estava dentro do que está hoje, depois te
explico mais, evidentemente isso vai demandar...eh..um cuidado aí, na
formulação jurídica disso né, prá que essas coisas sejam...
(...)
FLÁVIO: É, devo te dizer que eles vão
ter que forçar muito a barra porque ..eh...eu acho que tá bem construído tudo,
viu Buti...
BUTI: É, eu acho...eu acho que sob
ponto de vista jurídico não há maior fragilidade que...que pudesse estimular
alguma...né?
(...)
FLÁVIO: Não, é amanhã...amanhã ele
imagina que passe isso, não é, aí vão abrir prazo aí, prá-prá o órgão se
manifestar...
BUTI: Ahã...
FLÁVIO: E aí então é que começa o
nosso trabalho aí...de-de-de construção da-da-da tese, aí...
(...)
BUTI: Se tu tem essa percepção....é
uma percepção de quem tá lá dentro, né...a gente não tem essa percepção tando
aqui fora.
FLÁVIO: Não, não eu te isso isso com
segurança, viu...
BUTI: É, tu tá passando uma
segurança, exatamente.
(...)
BUTI: (....) deixa, quando
chegar...quando chegar na minha mesa eu resolvo não, né, acho que tem que fazer
um acompanhamento (....)
(...)
FLÁVIO: Gostaria muito que tu me
ajudasse nesse processo, se tu tiver disponibilidade, eu...
BUTI: Não, tenho...tenho, por certo
tenho, tô a tua disposição, tô a tua disposição...
A conversa entre os corréus confirma
que LUIZ PAULO GERMANO auxiliou FLAVIO VAZ NETTO a construir uma tese
fantasiosa, inverídica, para justificar as contratações ilegais entre DETRAN,
fundações e sistemistas, em resposta ao Tribunal de Contas do Estado, buscando,
assim, manter o sistema fraudulento e encobrir as ações criminosas dos seus
integrantes. Está nítida a relação próxima de amizade e cumplicidade entre os
corréus, sendo que o acusado laborou manifestamente em auxílio de seu comparsa
FLAVIO para resolver uma situação de iminente ameaça ao esquema podre do qual
eram integrantes.
- 14/08/2007 (20:29:30), BUTI X
FLAVIO (mídia 4, anexada ao Vol. 118, fl. 30553, dos autos):
Flávio: Alô, oi.
Buti: É o Buti, Flávio.
(...)
Buti: É, mas eu não... não gravei,
não tinha gravado. Olha aqui, hã... tudo bem... hã... duas coisas, a primeira
delas eu tô com um documento pra pra te dar, tá... hã... e segundo tava vendo
se nós podíamos nos encontrar pra eu te entregar... hã... eu não sei como é que
tão os teus compromissos amanhã...
Flávio: Eu tô, eu tô embarcando agora
pra Santa Maria... esse voo da NHT, e amanhã minha pauta é resolver o assunto
esse que eu te relatei ontem lá no Grêmio.
(...)
Buti: Tá, o seguinte, é.... o assunto
é um... hã é um... tu sabe qual é né?
Flávio:Deve ser o o o ... não, não
sei.
Buti: Não sabe? Tá. É... na verdade é
um documento lá que que tá na Fundação
Flávio:Tá, ok.
Buti: E e aí os caras precisam
informar a documentação e o cara de lá pelo que eu percebi tá um pouco arredio,
dizendo que não é competência dessa instituição fazer isso em relação à
Fundação, etc, e não ta querendo dar os documentos, e na verdade todos os
envolvidos tem que informar relatórios etc etc etc e aí eu precisava falar
contigo pra gente discutir juridicamente e tecnicamente o melhor procedimento
porque eu acho que esses caras não podem fazer o suposto enfrentamento que tão
querendo fazer, embora talvez até
tenham algum fundo de de razão,
entendeste?
Flávio:Tá, eu posso pautar isso
amanhã.
Buti: Pois é, tu vais falar com o
professor lá, o...
Flávio:É, é vou falar com o cara que
conduz essas coisas...
Buti: É, então tu fala com ele isso,
nós tamos de posse do... do do ofício esse, tá, e que é um requerimento na
verdade... é, o cara assinou prazo cinco dias e.... e aí nós só tínhamos que
fazer esse... adequar o que procedeu, não é o caso de... de....
Flávio: Mas a esse documento eu tenho
acesso amanhã lá.
Buti: É, não, por certo... não é caso
de de manifestação, entendeu, porque não tá se pedindo manifestação a cerca de
nada, é um requerimento que quer documentos: contratos, relatórios, etc... tá,
e o cara de lá com quem tu vai te encontrar amanhã tá dizendo 'olha, essa
instituição não tem competência pra requerer isso pra nós, nós não somos
vinculados' aquela coisa toda, né.
Flávio: Sim...
Buti: E... mas de qualquer maneira
existe lá um procedimento que ninguém se deu conta de ir lá saber, investigar
como é que surgiu, né, quem é que deu início a isso, enfim, tem uma série de de
particularidades que precisavam ser apuradas, né tchê.
Flávio: Sim, e aí?
Buti: Não, aí ... deixa eu conversar
um pouco pra ver que... o que nós fazia, o que nós recomendaríamos, entendeste,
mas tu não tá aí amanhã, eu acho que o melhor é tu tomar a par disso lá, né,
tomar ciência disso lá e e se tu conseguir me ligar lá dum telefone no final...
Flávio: Humhum
(...)
Buti: Tá? Mas te te intera do
documento esse amanhã lá.
Flávio: Não, amanhã de manhã já tomo
ciência disso.
Buti: Tá bom, um abraço.
O diálogo revela importante
articulação entre os corréus para preparar a defesa do esquema criminoso
perante órgãos de fiscalização (Ministério Público Federal/Tribunal de Contas
do Estado), planejando uma versão técnico-jurídica convincente, porém falsa, do
sistema operado pela fundação de apoio e sistemistas, no intento de criar uma
aparência de legalidade e legitimidade às ações criminosas. E isso se confirma
pela declaração de FLAVIO de que estava indo a Santa Maria resolver um assunto
e iria informar-se sobre a questão com outro integrante do grupo ('o
professor').Logo, eis a essencial contribuição de LUIZ PAULO GERMANO para o
desvio de recursos do DETRAN e, portanto, para a prática delitiva, uma vez que
se dedicou a arquitetar a blindagem do esquema, buscando criar um cenário
ardiloso, ilusório aos olhos dos órgãos fiscalizatórios:
- 14/08/2007 (20:43:52), HNI X FLAVIO
(mídia 4, anexada ao Vol. 118, fl. 30553, dos autos):
Flávio: Alô.
Carlos Rosa: Oi.
(...)
Carlos Rosa: Tá, o Buti falou contigo
agora, né?
Flávio: Falou, falou... combinei que
amanhã eu tomo ciência dessas coisas lá em Santa Maria...
Carlos Rosa: Tá.
Flávio: E converso com ele na
quinta-feira, ou amanhã mesmo.
Carlos Rosa: Tá, é falta de (??) lá?
Flávio: Não, não, eu tô indo só pelo
outro assunto, mas vou chamar ele também né, evidentemente.
Carlos Rosa: Claro... eu falei com
ele hoje tá...
Flávio: Sim.
Carlos Rosa: E falei também com o
outro, o parceiro aquele, o pensador e marquei pra quinta-feira me encontrar
com ele, mas ele... o pensador acha que tem uma solução, viu.
Flávio: Nós tamo o quê?
Carlos Rosa: Tem uma solução pro...
menos... é... menos traumática... mas eu vou... mas amanhã tu te inteirando a
ele a gente... no teu retorno a gente... (...)
Os interlocutores mencionam a
conversa (transcrição anterior) que FLAVIO VAZ NETTO manteve com LUIZ PAULO
GERMANO (BUTI), bem como é referida uma conversa com o 'parceiro, o pensador',
que, logicamente, trata-se de JOSÉ FERNANDES, um dos principais idealizadores e
executores do esquema. Está clara, portanto, a ligação do acusado a toda essa teia criminosa
que se formou com o único objetivo de garantir o sucesso e permanência da
prática delitiva, sempre buscando a continuidade dos desvios de recursos do
DETRAN e impunidade dos agentes do crime.
- 15/08/2007 (20:48:19), BUTI X
FLAVIO (mídia 4, anexada ao Vol. 118, fl. 30553, dos autos):
Buti: Te inteiraste de algumas
informações?
Flavio: Me inteirei, me inteirei.
Buti: ah
Flavio: É, na verdade, é eles
imaginam lá que esteja havendo ajuda aí do, do...
Buti: Vamos fazer o seguinte o, amanhã
tu vai tá ai em Porto Alegre?
(...)
Flavio: Pra tirar, pra tirar o sono
por enquanto só o cara da Miss.
Buti: Aham, é, eu imagino, eu
imagino.
Flavio: Tá, fora isso o resto tá tudo
ok.
Buti: E lá tá administrado?
Flavio: Tá, esse assunto tá, me
parece que tá bem, não, não vi maiores, e ficou combinada uma ação articulada
também.
Buti: Ta (...)
Novamente, LUIZ PAULO GERMANO e
FLAVIO VAZ NETTO conversam, de forma velada, sobre o momento de crise que
estava passando o grupo criminoso, buscando soluções para as questões que
estavam ameaçando o esquema, inclusive foi mencionado um dos grandes perigos a
toda estrutura criminosa, qual seja, 'o cara da miss' (LAIR FERST), que foi
excluído de um contrato altamente lucrativo (rescisão DETRAN/FATEC e
FATEC/SISTEMISTAS) e não estava conformado com seu afastamento, 'tirando o
sono' dos demais integrantes. Resta demonstrado, mais uma vez, o total
conhecimento do esquema pelo acusado, bem como sua efetiva concorrência para o
crime de peculato, sempre articulando e se empenhando na defesa do sistema
ilícito de contratações ilegais das sistemistas (no âmbito do Contrato DETRAN X
FUNDAE), utilizando-se não somente de seus contatos e influência política, mas
também de seu conhecimento jurídico.
- 12/09/2007 (07:57:46), BUTI X HNI
(áudio em mídia acautelada em Secretaria e disponibilizada à parte):
Carlos Rosa - Opa, tudo bem.
Buti - Tudo, e com o amigo?
(...)
Buti - Passou o dia na boca do monte?
Carlos Rosa - Bah
(...)
Carlos Rosa - É. Vem cá, eu preciso
do telefone do, do, do Flávio aquele que tu tem. Eu tô sem minha agenda do meu
telefone.
Buti - Tá, só um pouquinho.
(...)
Carlos Rosa - Tá, tu vai passar lá no
escritório?
Buti - Ah, eu ia me encontrar com
vocês mais tarde, eu vou passar no escritório mais uma hora, por aí.
(...)
Carlos Rosa - Eu prefiro, eu quero te
mostrar um documento lá, ai a hora que tu chega do foro pro escritório, eu a
partir das duas e meia estou no escritório.
(...)
Buti - tu quer me deixar,
pessoalmente?
Carlos Rosa - Não, é (...)
A conversa confirma o grau de
intimidade e parceria entre LUIZ PAULO GERMANO e os demais integrantes do
esquema, especialmente FLAVIO VAZ NETTO e CARLOS ROSA, sempre mantendo cuidado
com as palavras em suas conversas telefônicas, pois nunca falavam aberta e
especificamente sobre os assuntos de que tratavam (p. ex., mencionam um
'documento', sem entrar em detalhes). Tal postura demonstra a ilicitude das
atividades desempenhadas regularmente pelos referidos componentes do grupo, que
adotavam um procedimento sistemático para não se comprometerem em suas
comunicações telefônicas.
Para que se saiba no que consiste a
'blindagem', não custa esclarecer alguns pontos sobre como esta se deu.
A contribuição do apelante gira em
torno da Representação 0035/2007, de julho de 2007, elaborada pelo
Procurador-Geral Substituto Geraldo Costa Camino, destinada ao Gabinete da
Presidência do Tribunal de Contas do RS - segundo Santolin soube em reunião, o
Ministério Público, através de auditores do TCE, noticiaram a abertura de uma
inspeção extraordinária no DETRAN, que alcançaria fatos pretéritos, versando
sobre a dispensa de licitação das fundações vinculadas à UFSM, mais
especialmente sobre a subcontratação das chamadas prestamistas (poder-se-ia
cogitar da prática de advocacia administrativa pelo servidor público Cesar
Santolin, ao vazar o conteúdo de informações que teve acesso na qualidade de
funcionário público, ainda não divulgadas, alertando previamente os
envolvidos).
Flávio Vaz Netto refere, em diálogo
com o próprio Santolin, que lhe é benéfica a investigação pretérita, pois a
partir daí o que fora feito no passado restaria como que 'zerado', e ele teria
maior poder de pressão para acertar as coisas. O Diretor do Detran, porém, ao
invés de denunciar a situação e os implicados ao Tribunal de Contas, opta por
encobrir o esquema, 'preservar lá em RIBA' (como dito pelo interlocutor) e
'zerar o passivo' (como dito por Flávio, 08/08/2007, 12:25:21, HNI x FLAVIO),
mantendo a aparência de legalidade do esquema ilícito. Na qualidade de Diretor
do órgão deveria reportar fidedignamente as atividades ao TCE, como determinam
imperativos constitucionais e legais, diga-se de passagem. A essa empreita
contou com o auxílio de Luiz Paulo, e a ela se dedicou o apelante.
Os diálogos, aos quais me reporto, em
seu conjunto não são republicanos, mas se revestem de articulações e meias
palavras, referências codificadas, pouco claras, suspeitas. Se preocupam com
grampos no telefone (10/08/2007, 16:05:2007, Barbara x Flavio X Coronel).
Panoramicamente a 'blindagem' - para usar a palavra - compreende a realização
inclusive de 'teatro', em que Rubem Hoher, arquiteta maquiar um escritório,
combinando com Dario de dizer que em sua sala colocariam um ou dois
funcionários 'falsos', uniformizados, atuando estar a trabalhar no objeto
contratual, que na verdade não era realizado pela FUNDAE (23/8/2007, 13:59:44,
Rubem X Ricardo).
Paralelamente, corréus tramavam - e o
Prof. Dario Trevisan de Almeida estava ciente de - irregularidades com
prestamistas, procedendo acerto de contabilidade criativa - 'vão ver que mágica
vão fazer' (Rubem) e 'apagar' da contabilidade o 'abacaxi das notas do
Barrionuevo' (07/08/2007, 11:47:19, Ferdinando x Rubem).
Enfim, não seria 'atípico' o
enquadramento da conduta procedido pela sentença, por se tratar de co-autoria,
no que não há condenação por crime inexistente, o que malferiria o princípio da
anterioridade penal.
Dito isso, para que sejam preservadas
as demais atuações de corréus que foram condenados mesmo sem perfazer o núcleo
do tipo, parece não haver provas suficientes à condenação do apelante, deixando
o conjunto dúvida quanto à natureza de sua participação na organização
criminosa e no peculato desvio - se com dolo e fora dos limites do exercício
regular do direito de praticar a advocacia (art. 23, III, do CP), indo pela
tese defensiva.
É verdade que, demonstrada a
tipicidade - ou a adesão ao tipo, como no caso do partícipe - o ônus da prova
da causa excludente da antijuridicidade é do réu. Trilhando-se a linha
defensiva, o problema estaria em estabelecer se a atuação do advogado se deu no
exercício regular da advocacia. Porque o Estatuto da OAB, Lei nº8.906, de
04/07/1994, estabelece que:
Art. 34. Constitui infração
disciplinar:
XVII - prestar concurso a clientes ou
a terceiros para realização de ato contrário à lei ou destinado a fraudá-la;
XXV - manter conduta incompatível com
a advocacia.
Ainda, o depoente, na fase de
inquérito policial, não se posicionou como advogado de Flávio nessa situação,
mas admite ter realizado alguns aconselhamentos - o que se pode aceitar como
extensão de sua posição de advogado em outro processo, de improbidade
administrativa.
Mais do que isso, o MM Juiz enumera,
como lastro probatório, as escutas telefônicas e e-mails comprovando viagens
pagas pela Pensant. A conduta do réu, assim como a prova produzida, está no
limite do aceitável para viabilizar o trânsito condenatório.
Quanto aos e-mails, releva atentar
para a análise realizada pelo Ministério Público Federal quanto à conduta de
LUIZ PAULO ROSEK GERMANO (fls. 56.190 a 56.108 a 56.257, Vol. 219 e 220, da
Ação Penal de Origem - grifos nossos):
(...) Mas para que não reste
nenhuma dúvida sobre a participação do acusado Luiz Paulo Rosek Germano nas
tratativas referentes à fraude e à quadrilha, bem como de que efetivamente
participou de reuniões referentes às Fundações, inclusive naquelas
preparatórias à viagem para Goiás, cabe referir o documento abaixo:
Localizada nas mídias apreendidas:
Arquivo: Message0060
Caminho completo:
RDPOA3_1\Part_1\NONAME-NTFS\Documents and Settings\Denise Luz\Configurações
locais\Dados de aplicativos\Microsoft\Outlook\Outlook.pst>>Pastas
particulares>>Topo de pastas particulares>>Caixa de
entrada>>Message0060
Tipo de arquivo: E-mail Message
Assunto: '13HS REUNIAO ASSUNTO
FUNDAE'
Data de criação: 10/1/2006 12:16:09
Data da última modificação: 10/1/2006
12:16:09
Data do último acesso: Não disponível
Tamanho (em bytes): 4.966
(VER fl. 1651 da Sentença)
E ressalte-se que Luiz Paulo viajou
conjuntamente com Denise Nachtigall Luz, Ferdinando Fernandes e Carlos Rosa
para Goiás com o fito de realizar reuniões conjuntas para tratar da
contratação do DETRAN de Goiás, conforme email que consta da mídia
apreendida nos computadores de Denise Nachtigall Luz e de Ferdinando Fernandes
(arquivo 68831.htm28), o qual foi enviado por Rodrigo Rosa de Souza, com cópia
para Luiz Paulo Rosek Germano e Carlos Rosa, em resposta a email enviado por
Denise Nachtigall Luz para Carlos Rosa e Luiz Paulo Rosek Germano, tratando da
contratação do DETRAN de Goiás pela FUNDAE:
Data do email: 10/1/2006 09:47:25
De: Rodrigo Rosa de Souza
Para: 'Luiz Paulo Germano';
deniseluz@regisferretti.com.br
Exportado como: 10335.html
Anexos:
Message0060>>ATT00008.ics
28 ferdinandofernandes 2\export e
nachtigall_ferretti\export
E outras reuniões também foram
marcadas sobre o mesmo assunto29: 29 email registrado sob nº 116214.html -
mídia apreendida em Nachtigall Luz Advogados Associados.
Mas extremamente elucidativo é o
seguinte email30: 30 email registrado sob nº 22668.html - mídia apreendida em Nachtigall
Luz Advogados Associados Obs. Documento reproduzido às fls.
1652 a 1654 da sentença.
Neste email verifica-se a grande
preocupação de Luiz Paulo Rosek Germano em não aparecer vinculado ao trabalho
desenvolvido pelo grupo criminoso em Goiás, não autorizando a veiculação de seu
sobrenome ou ainda da utilização de seu nome em documentos
escritos. (...).'
E-mail enviado por Denise Luz, em
1/2/2006, para Ferdinando Fernandes, tendo como título RES: 'Of. Ao Diretor
Técnico do DETRAN-GO', foi transcrito pela sentença (fls. 1654). Esclarece que
Luiz Paulo atuou sim no aconselhamento jurídico para a contratação da FATEC
pela UEG e DETRAN-GO. Do texto se lê:
'O Dr. Luiz Paulo não autoriza a
divulgação do sobrenome dele. Deixou claro que sua participação é apenas como
advogado, restringindo sua atuação ao trabalho jurídico e pediu, expressamente,
que quando apresentado fosse usado somente o nome, sem sobrenome, e que não
constasse, de qualquer modo, em documentos escritos...
Eu, o Prof. Sarkis e o Diretor Técnico
do DETRAN já conversamos especificamente sobre isso, após eu e o Dr. Luiz Paulo
termos conversado com o mesmo direto técnico. O debate sobre o consórcio está
superado. Também nunca ficou combinado com a UEG que seria fechado o consórcio,
ficou combinado que avaliaríamos e nos reuniríamos para a definição do modelo
jurídico e assinatura dos contratos.'
O apelante alega que fez a viagem por
compromissos com congresso de Direito Administrativo e caso em andamento em
Brasília. Alega não saber quem pagou a viagem, e que tais e-mails não foram
enviados por ele.
A explicação não dá conta de infirmar
a prova. Ao que tudo indica, a consultoria foi efetivamente prestada. A viagem
foi realizada e o seu motivo consta dos e-mails. Seu custeio teve relação com a
assessoria contratual. E, como anteriormente dito, o apelante sabia que havia
irregularidades na contratação.
Flávio Vaz Netto era amigo e cliente
do apelante, que atuava como seu advogado desde que foi aforada em face da
primeira ação de improbidade administrativa pela compra de um helicóptero,
quando Secretário de Transportes. O que pende em desfavor do apelante são
escutas telefônicas em que debatem a possível defesa perante o Tribunal de
Contas, conversações bastante vagas, se forem excluídas as ilações formuladas
pelo Digno Magistrado sentenciante. Denotam o aconselhamento para apresentação
de documentos e o acenar da formulação de estratégia de defesa. Os contratos em
investigação seriam os pretéritos, parte do período relativo ao tempo em que o
apelante sequer fazia parte do escritório de advocacia de Carlos Rosa. Contudo,
o desvio ainda estava em andamento na época em que os fatos acima narrados se
deram, tendo ocorrido interferência capaz de assegurar a sua continuidade.
Desvendar a ilegalidade pretérita conduziria ao aprofundamento da situação
presente, igualmente ilícita.
Como dito acima, não é dado ao
advogado concorrer para a fraude, e a exclusão da antijuridicidade somente se
dá se o exercício de direito é regular.
A conduta do advogado é levemente distinta
da do conselheiro (consigliere), que concorre para a ilegalidade em andamento.
Este parece ser o ponto em que a atuação do advogado deixa de ser regular.
No caso dos atos, muito embora não se
tenha evidências do aconselhamento permanente da organização pelo apelante, há
intervenções pontuais que refogem do código de ética profissional. Sequer a
posição de advogado propriamente dita ficou bem comprovada pelo apelante - que
na esfera policial afirmou ser quase que um 'garoto de recados'. Deveria ter juntado
contratos de honorários. Ao negar a relação jurídica com as empresas e
fundações, acabou por renunciar a tese defensiva (exercício regular de Direito)
e a possibilidade de invocar a legislação que assegura os direitos do advogado.
A sentença tem suficiente respaldo probatório.
Nessas condições, mantenho a
condenação de LUIZ PAULO ROSEK GERMANO pela prática do delito tipificado no
art. 312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio).
Luiz requer a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Desembargador Federal Márcio
Antonio Rocha, que o absolveu da prática do crime de peculato-desvio e decretou
a prescrição da pretensão punitiva em relação ao delito de quadrilha (art. 288
do Código Penal), o qual deixo de transcrever, pois os fundamentos restaram
declinados quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por
Patrícia Jonara Bado dos Santos.
A insurgência
merece trânsito.
O Núcleo
Carlos Rosa era integrado por Carlos Dahlem da Rosa e Luiz Paulo Rosek
Germano, os quais seriam responsáveis por suposta consultoria jurídica no
âmbito do contrato DETRAN/FATEC, sendo que pelo escritório de advocacia
respectivo receberiam remuneração superfaturada, destinada a distribuir propina
aos dirigentes do DETRAN e a José Otávio Germano, além de gerar o próprio
enriquecimento ilícito. José Otávio Germano e Carlos Rosa teriam participado de
"toda a negociata prévia à assinatura desses contratos", e que ao seu
lado, no oferecimento de vantagem indevida a Flávio Vaz Netto, estaria Luiz
Paulo, irmão de José Otávio Germano e amigo de Flávio Vaz Netto, controlando,
ao lado deste, a distribuição do dinheiro da propina, por intermédio do
"laranja" Carlos Rosa.
Aponta o Parquet na
inicial acusatória que a conduta do embargante, na fraude, "está
intimamente associada com a conduta de Carlos Dalhen da Rosa, também denunciado
neste processo, mas também com a conduta do 'jurídico', a quem se destinava
significativa parte dos valores desviados e entregues a Carlos Dahlem da Rosa.
Os valores eram repassados às empresas sistemistas, incluído aí o escritório de
advocacia Carlos Rosa Advogados, e posteriormente sacados em dinheiro e
entregues aos destinatários." Destaca o MPF que o acusado seria o
consultor de Flávio Vaz Netto nos contratos firmados pelo DETRAN com as fundações
(fl. 46, 67, 112, 145, da denúncia), tendo acompanhado aquele servidor estadual
em várias reuniões e que teria 'concorrido para a nova contratação ilegal da
FATEC e da FUNDAE' (denúncia, fl. 106, 111) efetuada por Flávio Vaz Netto
(denúncia, fl. 137), tendo acompanhado os integrantes da Família Fernandes e
Paulo Jorge Sarkis na empreitada de ofertar o modelo de fraude a outros DETRANs
do Brasil.
Nesse contexto, os
atos atribuídos ao ora embargante não configuram o crime previsto no art. 312
do Código Penal, considerando-se que o acusado não detinha a posse,
disponibilidade ou autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da
dispensa irregular de licitação, praticada por terceiros em ato de corrupção,
caracterizando, outrossim, o ilícito descrito no art. 288 do Código Penal,
razão pela qual deve prevalecer o voto proferido pelo Vogal, cuja pena, fixada
no patamar estabelecido pela Relatora quanto ao citado crime, deve ser mantida
bem como a decretação da prescrição da pretensão punitiva, verbis:
Luiz Paulo Rosek Germano
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Luiz
Paulo Rosek Germano para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de quadrilha que, no entanto, está prescrito, nos termos do voto do
Vogal.
6.4.PAULO JORGE
SARKIS: O embargante, Reitor da UFSM durante parte da primeira fase do
esquema criminoso, foi condenado à pena privativa de liberdade de 5 (cinco)
anos de reclusão, em regime semiaberto, e 200 (duzentos) dias-multa, no valor
unitário de 01 (um) do salário mínimo vigente à data dos fatos, pela prática do
delito de peculato-desvio, por meio do voto-médio da Relatora, sob a seguinte
fundamentação:
Consta dos autos que PAULO JORGE
SARKIS concorreu para o desvio de recursos públicos, em proveito próprio e
alheio, decorrentes dos Contratos n. 34/2003, n. 70/2003 (DETRAN/FATEC) e n.
09/2007 (DETRAN FUNDAE), este último em análise por apelo do Ministério Público
Federal.
PAULO JORGE SARKIS era Reitor da
Universidade Federal de Santa Maria durante parte da primeira fase do esquema
criminoso, que envolveu a contratação FATEC/DETRAN e foi imprescindível para a
implantação do esquema que propiciou a prática do peculato em comento. Iniciou
sua atuação na aproximação entre FATEC e DETRAN, justamente na condição de
representante máximo da UFSM. Após sua saída da reitoria, passou a prestar
serviços à PENSANT, bem como exercer o cargo de 'Coordenador de Projetos
Especiais' na FUNDAE.
Depreende-se dos autos que LAIR
ANTONIO FERST conhecia PAULO JORGE SARKIS antes de julho de 2003, o que foi
referido alhures nestes autos. Munido dessa relação, LAIR compareceu no
gabinete do reitor da UFSM, na condição de interlocutor do DETRAN, para
oferecer à universidade a prestação dos serviços de que a autarquia estadual
necessitava, qual seja, a elaboração e aplicação das provas teóricas e práticas
para fins de habilitação veicular, adotando, na sequência, a posição de
interlocutor da UFSM/FATEC para a relação com o DETRAN. É o que se extrai do
Ofício n. GAB/623-05, de 28/07/2005, de CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS para PAULO
JORGE SARKIS (Caixa 11, fls. 520 a 521, da Ação Penal de Origem):
De outra parte, este signatário
estranhou referências ao Servidor da FATEC/UFSM Lair Ferst (...). Porém,
é importante lembrar que o referido servidor é o mesmo que em nome da Fundação
iniciou e concluiu as tratativas que levaram ao estabelecimento da parceria
DETRAN/FATEC, sendo que inclusive foi recebido neste Gabinete juntamente com
Vossa Excelência.
Formatado o esquema delitivo pela
FAMÍLIA FERNANDES (amiga de longa data de PAULO JORGE SARKIS e parceira
comercial de LAIR ANTONIO FERST, pois que à época trabalhavam juntos no projeto
da ANATEL), PAULO JORGE SARKIS avocou para si as negociações (desbordando as
funções de seu cargo de reitor), pois que passou a atuar praticamente como representante
da FATEC, estando, ainda, consciente das subcontratações que seriam realizadas.
É bem verdade que Ronaldo Morales firmou o instrumento vinculativo
FATEC/DETRAN, mas a prova carreada aos autos faz concluir em sentido contrário.
Inclusive deve ser lembrado que PAULO JORGE SARKIS consta como testemunha do
Contrato n. 34 entre a FATEC e o DETRAN.
Nessa linha de raciocínio, o arquivo
encontrado em computador apreendido na sede da PENSANT é claro ao apontar PAULO
JORGE SARKIS como pessoa 'responsável pela operacionalização da contratação'
(fls. 24.935, Vol. 95, da Ação Penal de Origem). Também o depoimento de Ronaldo
Morales, Presidente da FATEC à época do contrato, afirmou que a 'negociação
para a realização do contrato foi feita diretamente entre o SJS/RS e o Reitor
da UFSM, na Fatec todo o procedimento já chegou pronto, posto que negociado
diretamente pela reitoria, que nessa parte inicial de negociação, quem se
envolveu por parte da UFSM foi o reitor' (fls. 04 a 06, Apenso VI, da Ação
Penal de Origem). No mesmo sentido o depoimento de DARIO TREVISAN DE ALMEIDA
(fls. 12, Apenso VI, da Ação Penal de Origem - grifos nossos):
Relata que tendo em vista ser o
primeiro contrato, o ex-Reitor manteve contato direto com a direção do DETRAN de forma mais freqüente que o
atual, tendo a negociação anterior sido realizada com participação direta do
ex-Reitor.
Conquanto haja fortes indicativos de
que SARKIS interferia no funcionamento da FUNDAE (v.g. conversas telefônicas
mencionadas pelo Ministério Público Federal nos memoriais e print screen do
site da FUNDAE, em que SARKIS aparece como Coordenador de Projetos Especiais da
fundação - fv. 64, vol. 01, PCD 2007.71.02.004243-6), inexistem elementos
suficientes para concluir que atuava com vistas a desviar dinheiro público.
Note-se que a FUNDAE não possuía contrato apenas com o DETRAN, de modo que não
necessariamente as interferências de SARKIS estavam relacionadas ao Contrato
09/2007.
Da mesma forma, embora estejam
comprovados contatos entre SARKIS e VAZ NETTO, muito provavelmente referentes
ao Contrato n. 09/2007, o 'aconselhamento' que seria prestado pelo ex-Reitor da
UFSM também não é elemento suficiente para comprovar a prática do peculato.
Na primeira fase do esquema
criminoso, à ativa inserção de SARKIS nas negociações iniciais, soma-se a
conduta por ele adotada ao longo da relação contratual FATEC/DETRAN, bem como,
após sua saída da reitoria, sua atuação privada junto à FUNDAE e à sistemista
PENSANT. Sua postura demonstra a intenção em proteger e manter o sistema
formatado por JOSÉ ANTONIO FERNANDES que viabilizou o desvio de verbas
públicas. Veja-se a missiva apreendida na sede da PENSANT, onde o corréu JOSÉ
ANTONIO FERNANDES indica que PAULO JORGE SARKIS era de sua confiança, um
cúmplice dos sigilos que gostaria de preservar para si na qualidade de
Coordenador do Projeto DETRAN, o que, definitivamente é inaceitável em se
tratando de prestação de serviço público, conquanto com essa ideia (de sigilo)
PAULO JORGE SARKIS tranquilamente compactou, além de determinar os plenos
poderes pleiteados por JOSÉ ANTONIO FERNANDES (Caixa, 17, Vol. 1, fls. 50 a 51,
da Ação Penal de Origem). Ainda, o depoimento de Tadeu Carlos da Silveira que
comprova a estreita relação entre SARKIS e FERNANDES (Vol. 21 da Ação Penal de
Origem - grifos nossos):
(...) que conforme documento
lavrado pelo Reitor Paulo Jorge Sarkis quem mandava no projeto era o
Coordenador e o Gestor (...); deste modo, competia à FATEC prover as
necessidades do projeto, isto é, fazer o serviço de despachante, sem nenhuma
ingerência no projeto propriamente dito; (...) questionado acerca dos valores
repassados pelo DETRAN à FATEC esclarece o depoente que do total do faturamento
mensal aproximadamente 2,5% era destinados à Fundação e 7;5% à Universidade
Federal de Santa Maria; que tais percentuais foram acertados pelo Reitor Sarkis
com o Professor Morales; (...) que 90% era destinado e administrado
pelo Coordenador do Projeto; que tal montante era administrado no âmbito
interno do projeto, sobre o qual a FATEC não tinha qualquer ingerência, em
virtude do próprio comunicado oriundo do Reitor Paulo Jorge Sarkis;
Ou seja, na primeira e na segunda
fase do esquema, o mecanismo utilizado para o desvio dos recursos públicos
seguiu o mesmo modus operandi, em um primeiro momento contratando a FATEC que,
por sua vez, contratava sistemistas e, em um segundo momento, contratando a
FUNDAE e respectivas sistemistas, ambas fundações de apoio ligadas à UFSM, e
sempre com dispensa indevida de licitação. Especificamente a FUNDAE, sem
condições de realizar as atividades contratadas pelo DETRAN/RS (aplicação dos
exames teóricos e práticos de direção veicular), acabou terceirizando a parte
operacional justamente para a própria FATEC.
A par do relatado, também comprovam a
autoria do delito em comento:
a) E-mail subscrito por JOSÉ ANTONIO
FERNANDES para DARIO TREVISAN DE ALMEIDA, onde diz 'estou acertando detalhes
com o Reitor para que a rotina de relações nos contratos com o Detran e com a
Anatel tenham um caráter institucional', ou seja, não era o representante da
fundação de apoio quem tratava assuntos relativos à entidade com o Reitor, e
sim um sistemista (PENSANT/JOSÉ FERNANDES). Ainda destaca que 'tudo deve ser do
conhecimento do Professor Reitor' (fls. 198 a 199, Vol. 24, da Ação Penal de
Origem).
b) Correspondência enviada por JOSÉ
ANTONIO FERNANDES a PAULO JORGE SARKIS, datada de 23/08/2005, ou seja, enquanto
este ainda ocupava a Reitoria, onde se queixa do comportamento do Presidente da
Fatec, em embate envolvendo questões políticas e não institucionais. JOSÉ
FERNANDES menciona, na mesma missiva, a não realização de pagamentos à PENSANT,
de onde se extrai que é comum nessa relação a questão de empresa privada ser
discutida com o Reitor (Caixa 17, item 5, PENSANT, da Ação Penal de Origem).
c) O teor do ofício n. 525/2005-GR,
enviado por PAULO JORGE SARKIS para José Otávio Germano, datado de 25/07/2005
(Caixa 11, fls. 520 a 521, 524, da Ação Penal de Origem), comprova a ciência do
acusado acerca dos detalhes da execução dos contratos firmados entre FATEC e
DETRAN, tendo acesso, inclusive, à ata de reunião realizada na sede da FATEC,
com a presença de LAIR ANTONIO FERST. Veja-se (grifos nossos):
Mais recentemente, em 15/07/2005, o
Trabalhando pela Vida! recebeu a visita do Diretor Técnico do DETRAN-RS, Cel.
Hoffmeister acompanhado do interlocutor da Secretaria, Sr. Lair Ferst.
Na última sexta-feira (22/07/2005),
recebi em meu Gabinete o Sr. Lair FErst, oportunidade que me transmitiu várias
informações em nome de V.Sa.
Posteriormente o Sr. Lair Ferst e o
Dr. Gelson G. da Costa participaram de reunião com o Secretário Executivo de
nossa Fundação de Apoio - Fatec e técnicos e auxiliares da equipe de
Coordenação Geral do projeto, onde foram tratados vários assuntos, que
constam em ata anexa, para conhecimento de V.Sa.
Brevemente pretendo visitá-lo e faço
portador desta o nosso conterrâneo e digno Conselheiro do Tribunal de Contados
do Rio Grande do Sul, Dr. João Luiz Vargas.
d) Carta subscrita por PAULO JORGE
SARKIS a José Otávio Germano, explicando as referências a LAIR ANTONIO FERST no
ofício anterior, após provocação de CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS (Caixa 17, Vol.
5, fls. 55 a 56, PENSANT, da Ação Penal de Origem):
Por razão de lealdade a Vossa
Senhoria e ao Diretor Presidente do DETRAN-RS temos sido rigorosos para
protegê-los de qualquer inconsistência na qualidade do trabalho que prestamos e
nas rotinas de relacionamentos. Foi por esta razão que relatamos no
Ofício n. 525/2005-GR a visita e os assuntos tratados pelo Sr. Lair Ferst no
dia 22 de julho de 2005 no meu Gabinete (...).
As atribuições do estimado Lair Ferst
em nome da FATEC referem-se exclusivamente às relações com a ANATEL, a partir
de 01 de junho de 2004. Tratar assunto do DETRAN, cujo contrato teve início em
julho de 2003, descontextualiza suas atribuições e permite inferir, pelo
conteúdo de suas manifestações, ser interlocutor em outra temática conforme
consta em Ata, e que no futuro poderá ser utilizado politicamente contra nossas
instituições.
(...)
É motivo de orgulho para todos nós. O
prédio recentemente inaugurado no Campus da UFSM, que abriga o Projeto e
emprega 141 (cento e quarenta e uma) pessoas com carteira assinada, média de
remuneração de R$ 2.000,00 (dois mil reais), provavelmente seja a maior folha
de pagamento de Santa Maria na área privada. É mérito de Vossa Senhoria, do
DETRAN-RS, da UFSM e também do LAIR.
e) Comunicações escritas entre DARIO
TREVISAN DE ALMEIDA e a FAMÍLIA FERNANDES, encontrados na residência de PAULO
JORGE SARKIS (Caixa 5, fl. 103 a 107, da Ação Penal de Origem) onde há a
solicitação para que as faturas relativas ao contrato DETRAN fossem pagas no
primeiro dia útil (já referido a autoria de CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS e
HERMÍNIO GOMES JÚNIOR que esses pressionavam os pagamentos antecipados dessa
contratação, que pelos termos das avenças deveria ocorrer até o 10º dia).
Também há referências às despesas do Projeto TV e a expansão do projeto para
outros Estados. Esses documentos serem encontrados em poder de PAULO JORGE
SARKIS, que não era emissor nem destinatário, e, teoricamente, nada tinha a ver
com tais questões, indica o seu grau de inserção no esquema delitivo, bem assim
a ciência das ilicitudes cometidas.
Ainda, dentre esses documentos
apreendidos com PAULO JORGE SARKIS, o e-mail de DARIO DE ALMEIDA com o seguinte
teor (grifos nossos):
Em outra ocasião, perguntei ao
Ferdinando como deveria proceder para obter autorização para uso dos recursos
referentes ao aprovisionamento. O Ferdinando esclareceu que o Reitor
faria isso.
E a resposta de JOSÉ FERNANDES a
DARIO, datada de 25/11/2005, repassando dados financeiros do contrato (saldo,
faturas a receber, adiantamentos), e mencionando questionamentos de SARKIS,
referentes ao TV!:
Antes de viajar para Maceió, o
Reitor me questionou sobre os saldos de recursos do projeto e porque de não
terminar a obra, pois não fica bem inaugurá-la com tapume na presença do
Governador.
f) O depoimento de Jefferson Fischer
Sperb indica que o acusado acompanhou o período contratual exasperando as
atribuições que detinha na condição de Reitor da UFSM, veja-se (fls. 24 a 29,
Vol. 8, da Ação Penal de Origem - grifos nossos):
JOÃO BATISTA HOFFMEISTER comunicou ao
Declarante que DARIO havia solicitado ao Reitor da Universidade Federal
de Santa Maria - UFSM, PAULO JORGE SARKIS, que este intercedesse junto ao
Presidente do DETRAN, CARLOS UBIRATAN, visando afastar o Declarante da Chefia
da Divisão de Habilitação, porém, UBIRATAN teria defendido o cargo do
Declarante pelo bom trabalho que o mesmo estava realizando; QUE,
inclusive,o Reitor SARKIS teria agendado uma reunião com o Presidente UBIRATAN,
cuja finalidade seria exatamente afastar o Declarante de sua função dentro do
DETRAN.
g) PAULO JORGE SARKIS, antes e após
deixar o cargo de Reitor da UFSM (gestão de 1997 a 2005), recebeu da PENSANT,
além de outras verbas, pagamentos identificados como Investimento DETRAN. É o
que se extrai do arquivo, onde constam as despesas, intituladas Investimentos
Projetos Detrans (fls. 187 a 188, Vol. 95, da Ação Penal de Origem):
Data Origem Valor
31/10/2005 Tasul/Cesna - Reitor R$
3.350,00
Jan/2006 Prof. Sarkis R$ 13.000,00
Jan/2006 Aluguel mensal Corolla -
Prof. Sarkis R$ 5.000,00
h) As anotações de ROSMARI DA
SILVEIRA relativas à data de 08/03/2006, escritas em reunião na PENSANT, na
página de 31/08 (agenda de 2005), de onde se extrai que PAULO JORGE SARKIS
estava empenhado na ampliação do esquema para os demais DETRANs do país (Caixa
03, Vol. 13, da Ação Penal de Origem):
O Sarkis vai levar o contrato de
Goiás. O Sarkis tá levando a proposta do Bco de questões. Quem vai nos
contratar vai ser a FENASEG. Sarkis tá levando 27 propostas (1 p/ cada estado,
p/ entregar para o Horácio pegar a assinatura de cada um. 9 já assinaram certo,
podendo chegar a 16.
i) PAULO JORGE SARKIS recebia valores
mensais e também eventuais pela atuação junto aos Projetos Detrans, além de ter
suas despesas de viagem pagas pelas PENSANT (Planilha da Caixa 13, fls. 102, da
Ação Penal de Origem). É que se extrai da ata de reunião realizada na sede da
PENSANT em 05/11/2007, item 17 (Caixa 13, fls. 91, da Ação Penal de Origem -
grifos nossos):
Revisão conta corrente Sarkis:
verificar como foi feita a transferência do carro do Sarkis. Está
documentada a compra e venda? Se não, é necessário documentar. Verificar
o pagamento de notas da Sarkis Engenharia, deverá ser acertado
novembro e dezembro de 2006, subtraindo o valor dos alugueis pagos até novembro
de 2007. A transferência da locação deve ser providenciada com urgência. O
restante do acerto deverá ser feito com a Fundae. Pelas contas do Sarkis:
Pro-Jovem 1.000 p/ mês = 9.000; Detran 2.000 p/mês = 18.000; Gravataí e Viamão
1.000 p/ mês = 9.000. No total seriam 4.000 p/ mês x 9 meses = 36.000,00 a
serem pagos pela Fundae.
j) PAULO JORGE SARKIS atuou junto à
PENSANT em outras frentes (Pacto pelo Rio Grande, por exemplo), daí
beneficiando-se, consoante afirmado pelo próprio corréu em interrogatório.
k) Print screen do site da FUNDAE, em
que SARKIS aparece como Coordenador de Projetos Especiais da fundação - fv. 64,
vol. 01, PCD 2007.71.02.004243-6), confirmando sua permanência no esquema que
ele próprio se empenhou em organizar, mas agora não mais integrante no lado
público na organização, mas atuando nas fundações e nas empresas privadas
'prestadoras de serviços' subcontratados.
l) Contatos entre SARKIS e VAZ NETTO,
Diretor do DETRAN, referindo-se ao Contrato n. 09/2007, em que aquele presta
'aconselhamento' a este.
m) Planilha de fluxo de despesas da
PENSANT indicando que repassava, indiretamente, valores a SARKIS através do
pagamento de alugueres de um apartamento, o que ocorreu no período dos Fatos 8
e 9 (DVD 03, Caixa 13, fl. 104). O teor de tal planilha encontra-se anexado em
planilha encontrada nos e-mails de FERDINANDO FERNANDES (objeto de
interceptação telemática Processo 2007.71.02.004243-6, interceptado e-mail de
FERDINANDO em 23/10/2007, nome do arquivo 'Re_Acerto.eml'). Tais referências à
diferenças de pagamentos devidos ao réu por conta do projeto DETRAN, conforme
item 17 da ata de reunião interna realizada dia 08/11/2007 na sede da PENSANT,
encontram-se também manuscritas na agenda pessioal de JOSÉ ANTONIO FERNANDES,
na página do dia 05/11/2007 (DVD, caixa 13, fls. 210/251 - apreensão na
residência de JOSÉ ANTONIO), mesma data em que realizada a reunião interna na
sistemista PENSANT.
A cooperação do acusado para o desvio
de recursos do DETRAN (peculato-desvio) foi plenamente evidenciada pelo
conjunto probatório apresentado não havendo falar em ausência de dolo, pois que
claramente PAULO JORGE SARKIS claramente se inseriu e cooperou com o esquema
delitivo.
A conduta típica de PAULO JORGE
SARKIS, portanto, consistiu em laborar efetivamente para a execução do sistema
de contratações e subcontratações com dispensa ilegal de licitação e, por meio
desse esquema meticulosamente organizado conjuntamente com outros corréus,
operar o desvio de recursos públicos estaduais, dando destinação ilícita à
verba (distribuição de propina a agentes públicos e enriquecimento ilícito
próprio e dos demais integrantes do grupo) durante todo o período da execução dos
contratos (n. 34/2003 e 70/2003 - DETRAN/FATEC e n. 09/2007 - DETRAN/FUNDAE).
Inexistem, então, dúvidas do cometimento, por parte do réu, dos Fatos 8 e 9 a
ele imputados, atuando também na esfera privada em prol dos interesses de seu
amigo JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES, recebendo, por meio de seu vínculo como consultor
em uma das empresas deste (PENANT CONSULTORES LRDA), e por meio do cargo de
'Coordenador de Projetos Especiais' na FUNDAE, dinheiro público desviado
durante a vigência de todos os contratos tratados na denúncia. Especificamente
após sua presença na Reitoria da UFSM, com seu conhecimento e sua reputação,
suficientemente demonstrado que passou a atuar no lado privado do esquema,
inclusive para na tentativa de angariar outros DETRANs, em outras unidades
federativas, para aplicar esquema idêntico. Agindo assim, PAULO JORGE SARKIS
concorreu para o desvio de recursos do DETRAN/RS.
Nessas condições, mantenho a
condenação de PAULO JORGE SARKIS pela prática do delito tipificado no art.
312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio - Fato 08) e dou provimento
ao apelo do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para condená-lo pelo delito tipificado
no art. 312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio - Fato 09).
Paulo pede a
prevalência do voto mais favorável, proferido pelo Desembargador Federal Márcio
Antonio Rocha, que o absolveu da prática do crime de peculato-desvio, decretou
a prescrição da pretensão punitiva quanto ao delito de quadrilha (art. 288 do
Código Penal) e o condenou, pelo crime de corrupção ativa, à pena de 2 (dois)
anos e 3 (três) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, e 45 (quarenta
e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário-mínimo vigente à época
dos fatos, com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos, o qual deixo de transcrever, pois os fundamentos restaram declinados
quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por Patrícia Jonara
Bado dos Santos.
O Núcleo
UFSM era integrado por Paulo Jorge Sarkis, Dario Trevisan de Almeida e
Rosmari Greff Ávila da Silveira, servidores públicos federais da instituição.
Paulo Jorge Sarkis, então reitor da UFSM, teria agido em conjunto com a FATEC,
notadamente autorizando a utilização da estrutura física da universidade pela
fundação, além de designar os servidores Dario e Rosmari para execução do
Projeto Trabalhando pela Vida.
Segundo o Parquet na
exordial acusatória, os agentes desse núcleo também tiveram efetiva
participação nos momentos que antecederam a contratação das fundações com
dispensa indevida de licitação, já que era essencial a utilização da estrutura
da Universidade Federal de Santa Maria para operacionalizar o serviço e dar
credibilidade à Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência - FATEC. O réu Paulo
Jorge Sarkis assinou, inclusive, contratos com a FATEC, na condição de Reitor
da UFSM, dando 'aval' nas avenças, juntamente com o líder da facção criminosa
'Família Fernandes'. A participação do embargante no esquema é evidente desde
antes da contratação da FATEC pelo DETRAN/RS, uma vez que todo o 'projeto
criminoso' foi viabilizado pela inserção da autarquia federal (UFSM), sendo que
este agente público federal participou das reuniões de organização da quadrilha
no contrato DETRAN/RS, afiançando que a UFSM teria condições de assumir a
realização dos serviços contratados pelo DETRAN/RS. A participação do então
Reitor Paulo Jorge Sarkis também se deu pela influência que exercia sobre a
FATEC, em razão de sua condição de professor e Reitor da Universidade Federal
de Santa Maria - UFSM, bem como porque agia diretamente envolvido pela amizade
que mantinha com José Antônio Fernandes. Por tal razão restou beneficiado,
posteriormente, pelos agentes do 'Núcleo Família Fernandes'. Continua o MPF na
denúncia que o acusado, em atuação concertada com os demais
réus, concorreu para nova contratação ilegal da FATEC, quando o Departamento
Estadual de Trânsito - DETRAN/RS contratou, novamente, a Fundação de Apoio à
Tecnologia e Ciência - FATEC, por meio do Contrato/DETRAN nº 70/2003, para
aplicação dos Exames Teórico e Prático de Direção Veicular. Destacou que, em
data não precisa do mês de abril de 2007 e também nos meses subseqüentes, até
novembro de 2007, o réu, agora já não mais na condição de reitor da UFSM, mas
de integrante ostensivo da equipe de consultores da PENSANT e da FUNDAE,
continuou atuando na organização criminosa, logrando, pela terceira vez,
concorrer para a contratação ilegal da FATEC, quando o Departamento Estadual de
Trânsito - DETRAN/RS contratou, dessa feita, a Fundação para o Desenvolvimento e
Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura - FUNDAE, por meio do Contrato/DETRAN
nº 09/2007, para aplicação dos Exames Teórico e Prático de Direção Veicular.
Dessarte, as
condutas atribuídas ao ora embargante desbordam do tipo previsto no art. 312 do
Código Penal, considerando-se que o acusado não detinha a posse,
disponibilidade ou autoridade sobre os valores, configurando, de outro lado, o
crime descrito nos arts. 288 e 333, ambos do Código Penal, razão pela qual deve
prevalecer o voto proferido pelo Vogal, cuja pena deve ser mantida, bem como a
decretação da prescrição da pretensão punitiva, verbis:
Paulo Jorge Sarkis
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Corrupção ativa (artigo
333 do Código Penal - fato 12): 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, e
45 (quarenta e cinco) dias-multa.
Registro que não há prescrição com
base no prazo reduzido pelo art. 115 do Código Penal, pois a primeira
condenação do réu, na sentença, ocorreu quando ele ainda não tinha implementado
o requisito etário, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. PRESCRIÇÃO. CONTAGEM
DO LAPSO PELA METADE (ART. 115 DO CP). IMPROCEDÊNCIA. RÉU QUE CONTAVA COM MENOS
DE 70 ANOS NA DATA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRECEDENTE DA TERCEIRA SEÇÃO.
(...) 1. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos de
Divergência em Recurso Especial n. 749.912/PR, pacificou o entendimento de que
o benefício previsto no artigo 115 do Código Penal não se aplica ao réu que
completou 70 anos de idade após a data da primeira decisão condenatória (AgRg
no AREsp n. 771.411/SP, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe
11/12/2015). (...) (AgRg no AREsp 332.735/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS
JÚNIOR, 6ª Turma, julgado em 16/02/2016)
Soma das penas não prescritas: 02 (dois) anos e 03 (três)
meses de reclusão, no regime inicial aberto, e 45 (quarenta e cinco) dias-multa,
no valor unitário de 01 (um) salário mínimo vigente à data dos fatos.
Substituo a pena privativa de
liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 20 salários mínimos, cujo cumprimento e destinação,
respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução. Justifico a
escolha de tais penas alternativas, dentre as demais previstas em lei, em razão
de seu caráter ressocializador e sua utilidade social, mantendo a condenada
inserida em sua comunidade, sem restringir-lhe direitos cujo exercício não
esteja diretamente vinculado ao cometimento dos crimes.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos
por Paulo Jorge Sarkis para substituir o voto que lhe
condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta
condenado pelo crimes e quadrilha e de corrupção ativa, este à pena
de 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, no regime inicial
aberto, e 45 (quarenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 01 (um)
salário mínimo vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é
substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 20 salários mínimos, cujo cumprimento e destinação,
respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução. Está prescrita a
pretensão punitiva relativa ao delito de quadrilha. Tudo nos termos do voto do
Vogal.
6.5. EDUARDO
WEGNER VARGAS: Eduardo Wegner Vargas, sócio da sistemista IGPL
INTELIGÊNCIA EM GESTÃO PÚBLICA LOCAL LTDA., foi condenado à pena privativa de
liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de
reclusão, em regime inicial aberto, e 40 (quarenta) dias-multa, no valor
unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de
serviços à comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 25 (vinte e cinco)
salários mínimos, pela prática do crime de peculato-desvio, segundo o voto-médio
proferido pela Relatora, verbis:
4.2.7. EDUARDO WEGNER VARGAS - Fato
09
Consta dos autos que EDUARDO WEGNER
VARGAS concorreu para o desvio de recursos públicos, em proveito próprio e
alheio, decorrentes do Contrato n. 09/2007 (DETRAN/FUNDAE).
O acusado, na condição de sócio da
sistemista IGPL - INTELIGÊNCIA EM GESTÃO PÚBLICA LOCAL LTDA., desde 02/06/2007
(MIDIAS DIGITAIS\PR195-MIDIA-01.ZIP\PR195-MIDIA-01, CONTRATOS - VOLUME I, fls.
159 a 183, da Ação Penal de Origem), agindo conjuntamente com os integrantes da
FAMÍLIA FERNANDES, foi responsável pelo desvio de recursos públicos estaduais
através da referida empresa, por meio da subcontratação realizada entre FUNDAE
e a IGPL. O desvio ocorreu em benefício próprio e de terceiros, incluindo seu
pai JOÃO LUIS DOS SANTOS VARGAS.
A cooperação do acusado para o desvio
de verbas públicas está evidenciada em elementos de prova carreados aos autos,
devendo ser ressaltado que a sistemista IGPL era uma das maiores colaboradoras
para a formação da propina paga ao Dirigente de DETRAN (oculta sob a
denominação de 'despesas operacionais'), conforme se verifica da planilha
apreendida na residência de JOSÉ ANTONIO FERNANDES (Caixa 13, fls. 98, da Ação
Penal de Origem). Para além disso, também comprovam a autoria do delito:
a) Ata de reunião 0017, realizada em
05/11/2007, entre JOSÉ FERNANDES, FERDINANDO, FRANCENE, FERNANDO e JLV (JOÃO
LUIZ VARGAS) (Caixa 13, fls. 90 e 91, da Ação Penal de Origem), de onde se
extrai no item 1 da Ata, que EDUARDO VARGAS (EV) iria à sede da IGPL para
tratar de pendências com FERNANDO FERNANDES, e que este providenciaria a
distribuição de lucros a EDUARDO VARGAS (R$ 10.000,00), originados do Contrato
DETRAN/FUNDAE (pauta da reunião). É clara a relação entre o acusado e os
integrantes da FAMÍLIA FERNANDES, e que, na verdade, eram estes que dominavam e
comandavam as atividades da IGPL. Infere-se, ainda, o repasse de recursos
públicos a EDUARDO WEGNER VARGAS (R$ 10.000,00), sob o disfarce de distribuição
de lucros, e pagos inicialmente às sistemistas ligadas aos FERNANDES. Cumpre
destacar, ainda, a participação de JOÃO LUIZ VARGAS (pai do denunciado) na
reunião, identificado pelas iniciais JLV.
b) Ata de reunião realizada em
30/10/2007, entre JOSÉ FERNANDES e EDUARDO WEGNER VARGAS (Caixa 13, fls. 340,
da Ação Penal de Origem): Observe-se que manuscrita no topo da ata, que refere
a 'extratos de junho, julho e agosto: R$ 30.000,00 (12/07/07, 21/08/07 e
19/09/07); R$ 20.000,00 (30/10/07)'. Referência a valores pagos a EDUARDO
WEGNER VARGAS pela IGPL. No item 1 desta mesma ata está consignado que EDUARDO
VARGAS irá ao escritório da IGPL conhecer suas dependências, ficando definido
que fará expediente um dia da semana em Porto Alegre e cinco dias na região de
Santa Maria para fiscalizar 'in loco' os projetos da IGPL. Verifica-se que
EDUARDO não possuía mínimo interesse, conhecimento e participação efetiva nas
atividades da IGPL, porquanto sequer conhecia as dependências da referida
empresa após quatro meses do seu ingresso no respectivo quadro societário (02/06/2007).
Extrai-se daí que sua presença na sociedade era apenas formal, com o único fim
de contribuir para a efetivação dos desvios de verbas públicas, compondo o
quadro societário da sistemista e participando, de forma inexpressiva, da
execução das atividades societárias da IGPL no projeto DETRAN.
Veja-se, ainda, neste mesmo
documento, a existência de deliberações sobre várias providências direcionadas
a conferir aparência de legalidade aos pagamentos efetuados a EDUARDO WEGNER
VARGAS, bem como àqueles a serem realizados pelo acusado, tudo a fim de ajustar
a contabilidade dos atos ilícitos praticados. Note-se que a PENSANT/FAMÍLIA
FERNANDES se imiscui inclusive em relações pessoais ou particulares de seus
associados, pois não consta dos autos que a mesma tenha interesses, expertise
ou negócios que justifiquem a intermediação feita em operações comerciais
envolvendo veículos ou o agronegócio (grifos nossos):
Item 3: Terá de ser feito um
'termo aditivo de transferência' do arrendamento do campo, que deixará de ser
do pai (com firma reconhecida), Eduardo fará pagamento ao arrendante com cheque
nominal.
Item 4: Camionete: Verificar no nome
de quem está a camionete Nova e a Ranger. Se estiver no nome do JLV
fazer um contrato de compra e venda que ficará registrado em cartório (contrato
de transferência de propriedade do JL para o Eduardo). Eduardo passa a pagar as
prestações direto de sua conta. As multas deverão ir para CNH dele.
Item 5: Planificar depósitos e
cheques emitidos por EV desde julho de 2007 (...)
Item 6: O gado deverá ser vendido
para o Eduardo, conforme contrato de compra e venda e NF de produtor. Procurar
casar com os cheques emitidos e dinheiros repassados.
c) E-mail enviado por EDUARDO WEGNER
VARGAS a FERDINANDO FERNANDES, em 25/06/2007, informando que, conforme
orientação, as notas saíram em nome da FUNDAE e solicita orientação de como
proceder, o que revela o comando e rigoroso controle que a FAMÍLIA FERNANDES
detinha sobre as atividades envolvendo o objeto contratado entre FUNDAE e IGPL
(Caixa 17,Vol. 1, fls. 523, da Ação Penal de Origem).
d) Depósitos de valores em benefício
de EDUARDO WEGNER VARGAS, cujos comprovantes foram apreendidos na sede da
sistemista PENSANT: em 22/08/2007 (R$ 30.000,00); em 09/07/2007 (R$ 10.000,00);
em 12/07/2007 (R$ 30.000,00) (Caixa 17, Vol. 05, fls. 443, 486 e 487, da Ação
Penal de Origem). Também foram reveladas operações bancárias de transferências
de numerário a EDUARDO WEGNER VARGAS, pela IGPL - Inteligência em Gestão
Pública Local Ltda.: em 06/11/2007 (R$ 10.000,00) e em 30/10/2007 (R$
20.000,00) (PCD nº 2008.71.02.001931-5, fls. 198 a 199, da Ação Penal de
Origem). Extrai-se daí que o denunciado, além de laborar para o desvio de
dinheiro público em benefício de terceiros (FAMÍLIA FERNANDES), também auferiu
considerável proveito da prática criminosa.
e) EDUARDO WEGNER VARGAS destinou
parte dos recursos desviados a seu pai (JOÃO LUIZ DOS SANTOS VARGAS), em
16/07/2007, no valor de R$ 15.985,50, conforme transferência eletrônica
revelada pela quebra de sigilo bancário promovida judicialmente (PCD nº
2008.71.02.001931-5, fls. 76 e 197, da Ação Penal de Origem).
A defesa aduziu que o denunciado
nunca teve vínculo ou trabalhou no projeto DETRAN, porque atuava em outros
projetos da FUNDAE pela IGPL. Não obstante a alegação, a defesa não logrou
êxito em demonstrar seus argumentos, pois a participação exclusiva do réu em
projetos diversos ao do DETRAN, ou em qualquer outro projeto, aliás, não foi
evidenciada de forma convincente.
Releva notar que EDUARDO WEGNER
VARGAS só integrou o quadro societário da sistemista IGPL porque assim o
decidiu o NÚCLEO FAMÍLIA FERNANDES (LENIR FERNANDES cedeu 20 cotas do capital
social a EDUARDO, em junho de 2007) e, como referido, tal grupo sempre esteve
no comando do esquema criminoso envolvendo o DETRAN. O íntimo relacionamento do
acusado com o referido grupo foi demonstrada nos autos, cuja aproximação foi
mediada por seu pai, JOÃO LUIZ DOS SANTOS VARGAS, que também fora sócio da
IGPL. Convém ressaltar, ainda, que a ligação criminosa entre EDUARDO WEGNER
VARGAS e seu pai ao NÚCLEO FAMÍLIA FERNANDES foi amplamente evidenciada no
exame da autoria do crime de quadrilha, ao qual reporto, sendo na participação
na IGPL apenas a forma, já usual no esquema delitivo operado pela FAMÍLIA
FERNANDES, para a distribuição das verbas obtidas ilicitamente.
A conduta típica de EDUARDO WEGNER
VARGAS, portanto, consistiu em laborar efetivamente para a execução do sistema
de contratações e subcontratações com dispensa ilegal de licitação e, por meio
desse esquema meticulosamente organizado conjuntamente com outros corréus,
operar o desvio de recursos públicos estaduais, dando destinação ilícita à
verba (distribuição de propina a agentes públicos e enriquecimento ilícito
próprio e dos demais integrantes do grupo) durante todo o período da execução
do contrato (n. 09/2007 - DETRAN/FUNDAE). Agindo assim, EDUARDO concorreu para
o desvio de recursos do DETRAN/RS.
Nessas condições, mantenho a
condenação de EDUARDO WEGNER VARGAS pela prática do delito tipificado no art.
312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio).
Eduardo pretende a
prevalência do voto mais favorável proferido pelo Desembargador Federal Márcio
Antonio Rocha, que o absolveu da prática do crime de peculato-desvio e decretou
a prescrição da pretensão punitiva em relação ao delito de quadrilha (art. 288
do Código Penal), o qual deixo de transcrever, pois os fundamentos restaram
declinados quando da apreciação dos embargos infringentes interpostos por
Patrícia Jonara Bado dos Santos.
Os embargos devem
ser providos.
Narra a denúncia
que o embargante estava associado ao grupo PENSANT para o recebimento da
propina destinada ao ex-conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e seu pai,
João Luis Vargas, por conta do auxílio prestado à empreitada criminosa. A
partir do primeiro contrato do DETRAN/FATEC e posteriormente DETRAN/FUNDAE,
José Antonio Fernandes estabeleceu várias medidas para ocultar a percepção das
vantagens indevidas delineadas no Projeto DETRAN. Entre elas, já na segunda
fase do esquema criminoso, determinou que fosse realizada nova alteração do
contrato social da empresa IGPL - Inteligência EM Gestão Pública Ltda. Na
ocasião, sua esposa Lenir Beatriz Da Luz Fernandes cedeu 20 (vinte) quotas do
capital social para Eduardo Wegner Vargas, em 2 de junho de 2007, pelo
valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), com plena e total quitação na data
de 06 de junho de 2007. Ressalta o MPF que, na data da alteração contratual, e
desde 7 de maio de 2007, o acusado exercia estágio remunerado, através do CIEE,
com carga horária de 12 horas semanais, reduzida para 4 horas semanais a partir
de 1º de outubro de 2007, para realizar as atividades afetas ao curso de
Engenharia Civil da UFSM (8º semestre) percebendo bolsa-auxílio de R$ 250,00
(duzentos e cinquenta reais) mensais até 14 de janeiro de 2008, data da
rescisão do contrato de estágio. Salienta, ainda, que o acusado era muitíssimo
bem remunerado pela PENSANT CONSULTORES LTDA., sem que efetivamente exercesse
labor lícito compatível com tal remuneração para aquela empresa, ou para a IGPL
- INTELIGÊNCIA EM GESTÃO PÚBLICA LTDA., restando claro que tinha plena ciência
do caráter ilícito dos valores percebidos da empresa em que figurava como
pretenso sócio.
Em consequência,
deve prevalecer o voto proferido pelo Desembargador Márcio Antonio Rocha, pois
a conduta atribuída ao ora embargante não configura o delito previsto no art.
312 do Código Penal, eis que ele não detinha a posse, disponibilidade ou
autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da dispensa irregular de licitação,
praticada por terceiros em ato de corrupção, caracterizando, no entanto, o
crime do art. 288 do Código Penal, cuja pena deve ser mantida, bem como a
decretação da prescrição da pretensão punitiva, verbis:
Eduardo Wegner Vargas
- Quadrilha (artigo 288
do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão, resta
prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Eduardo
Wegner Vargas para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de quadrilha que, no entanto, está prescrito, nos termos do voto do
Vogal.
6.6. MARCO
AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI: O embargante, sócio administrador do
escritório de contabilidade TREVIZANI ASSESSORIA E CONSULTORIA CONTÁBIL LTDA.,
que elaborava a contabilidade das sistemistas RIO DEL SUR, NEWMARK, PLS AZEVEDO
e NT PEREIRA, restou condenado à pena privativa de liberdade de 3 (três) anos e
9 (nove) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, além de 75
(setenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do
salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída por duas penas restritivas
de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação
pecuniária, estipulada em 10 (dez) salários mínimos, pela prática do crime de
peculato-desvio, pelo voto-médio da Relatora, por meio dos subseqüentes
fundamentos:
4.2.19. MARCO AURÉLIO DA ROSA
TREVIZANI - Fato 08
Consta dos autos que HERMÍNIO GOMES
JÚNIOR concorreu para o desvio de recursos públicos, em proveito próprio e
alheio, decorrentes dos Contratos n. 34/2003 e n. 70/2003 (DETRAN/FATEC).
MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI, na
condição de sócio administrador do escritório de contabilidade TREVIZANI
ASSESSORIA E CONSULTORIA CONTÁBIL LTDA., elaborava a contabilidade das
sistemistas RIO DEL SUR, NEWMARK, PLS AZEVEDO e NT PEREIRA, na qual dissimulava
o desvio de verbas públicas do DETRAN em favor próprio e de terceiros.
A cooperação do acusado para o desvio
de verbas públicas está evidenciada nos autos, pelos seguintes elementos
probatórios:
a) Notas ficais da M.M. PUBLICIDADE,
PROMOÇÕES E REPRESENTAÇÕES LTDA., as quais foram emitidas por MARCO AURÉLIO
TREVIZANI e pagas pela PLS AZEVEDO, com o único objetivo de ajustar a
contabilidade da empresa e justificar, falsamente, a retirada de valores da
pessoa jurídica. Com efeito, consta da contabilidade da PLS AZEVEDO o pagamento
de notas ficais da MM PUBLICIDADE, PROMOÇÕES E REPRESENTAÇÕES LTDA., relativas
a supostas prestações de serviços em favor da primeira, que, no ano de 2006,
superam o montante de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais).
Obviamente, a MM PUBLICIDADE, PROMOÇÕES E REPRESENTAÇÕES LTDA. não prestou
quaisquer serviços em favor da PLS AZEVEDO, sendo que as quatro notas fiscais
da MM PUBLICIDADE, encontradas no escritório de contabilidade do corréu MARCO
AURELIO DA ROSA TREVIZANI, são ideologicamente falsas e serviram unicamente
para ajustes contábeis na empresa de HERMÍNIO GOMES JÚNIOR e de seu cunhado
PEDRO LUIS SARAIVA (DVD 03, Caixa 15, Vol. 01, fls. 627 a 630, da Ação Penal de
Origem).
Sabe-se que tais notas fiscais são
pelo menos ideologicamente falsas (se não também materialmente falsas) pelo
depoimento de Leônidas Moraes Junior, sócio-gerente da empresa MM Publicidade
Promoções e Representações Ltda., que afirmou (Vol. 70, fls. 150 a 154, da Ação
Penal de Origem):
(...) em 2006, a empresa estava
inativa; que o ramo da empresa era publicidade e propaganda; que não se
recorda de ter prestado serviço à PLS Azevedo; que o faturamento da empresa
sempre ficava na média de cinco ou seis mil reais; que não conhece a PLS
Azevedo, tampouco Pedro L. S. Azevedo; que as notas fiscais apreendidas não
foram por ele emitidas, e que apresentou as notas originais para comparação.
b) No interrogatório, MARCO AURÉLIO
DA ROSA TREVIZANI, confirmou que a empresa MM PUBLICIDADE PROMOÇÕES E
REPRESENTAÇÕES LTDA. foi sua cliente (Vol. 161, fls. 238 a 259, da Ação Penal
de Origem).
c) As notas falsas lançadas no livro
contábil diário da sistemista RIO DEL SUR (Caixa 7, Vol. 1, fls. 334, 337 e
460, da Ação Penal de Origem), que registraram altos valores em pagamento à
prestação de serviços de 'auditoria e consultoria' pela empresa GRIFFO PRODUÇÕES
FOTOGRÁFICAS LTDA., o que, em uma relação comercial regular não faz o menor
sentido, pois não há identidade, sequer semelhança, entre a descrição do
serviço e o aparente objeto social da empresa (serviços fotográficos). Daí se
extrai que de fato trata-se de registro fraudulento de despesa na contabilidade
da RIO DEL SUR, promovido pelo escritório de contabilidade do acusado.
d) EDUARDO REDLICH JOÃO, o qual era
empregado do escritório de contabilidade de MARCO AURÉLIO TREVIZANI (e corréu
nestes autos) figurou como testemunha no ato constitutivo da RIESUL ENG. LTDA.
(Vol. 7, fls. 425 a 429, da Ação Penal de Origem), denominação posteriormente
alterada para RIO DEL SUR, ou seja, umas das principais sistemistas envolvidas
no esquema de dispensa ilegal de licitação e desvio de verbas públicas em
apreço. Também foi testemunha do distrato celebrado entre RIESUL e RTI do
Brasil Ltda. (Caixa 7, Vol. 11, fls. 435 a 441, da Ação Penal de Origem), o
qual foi firmado por LAIR ANTONIO FERST representando a RIESUL, o que demonstra
a relação prévia de EDUARDO com um dos organizadores da prática criminosa em
análise.
e) Certidão relativa à escritura da
simulada compra de uma fazenda em São Francisco de Paula pela empresa NT
PEREIRA, na qual EDUARDO REDLICH JOÃO e MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI são
testemunhas, em nome da NT PEREIRA (fls. 376, Caixa 13, da Ação Penal de
Origem), datada de 14/10/2005, declarando que a ré PATRÍCIA era administradora
da referida empresa, e que recebia R$ 2.500,00 mensais como remuneração, o que,
inclusive, é ideologicamente falso, como se vê no exame da autoria de PATRÍCIA
JONARA BADO DOS SANTOS e NILZA TEREZINHA PEREIRA.
f) Em seu interrogatório judicial,
MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI falou do início das atividades das sistemistas
RIO DEL SUR, NEWMARK, PLS AZEVEDO e NT PEREIRA, bem como de seu contato com
LAIR FERST. Confirmou que era o responsável técnico pelo escritório, e que
assinava toda a contabilidade das empresas envolvidas, as quais eram suas
clientes, o que demonstra sua total ciência e atuação na escrituração contábil
de tais empresas. Declarou que cobrava da PLS Azevedo e NT Pereira o valor de
um salário mínimo e da RIO DEL SUR e NEWMARK dois salários e meio (Vol. 161,
fls. 238 a 259, da Ação Penal de Origem). No entanto, foi apreendido extrato da
conta-corrente da PLS Azevedo ME, datado de 23/11/2006, onde foi registrado
'pagamento cheque 000252', no valor de R$ 12.000,00, constando, ao lado, a
anotação a caneta 'Marco (notas)' (Caixa 11, POA 18, da Ação Penal de Origem)
indicando provável remuneração ao denunciado pela emissão das indigitadas notas
'frias'.
g) Anotação na agenda de PATRÍCIA
JONARA BADO DOS SANTOS, datada de 26/02/2007, de pagamento a MARCO AURÉLIO, no
valor de R$ 9.198,54. Por outro lado, na caixa da NT PEREIRA, há comprovação de
pagamento de honorários para MARCO no valor de R$ 503,00/mês, o que é
condizente com os valores pagos pela RIO DEL SUR e NEWMARK ao mesmo contador
(Caixa 13, POA 15, da Ação Penal de Origem). Existe, ainda, documento contábil
com registro de pagamento de cheque da NT Pereira, no valor de R$ 6.600,00, com
a anotação 'MARCO - N.F. pg.'. Também foram apreendidas faturas de prestação de
serviços pelo escritório TREVIZANI ASSESSORIA E CONSULTORIA CONTÁBIL LTDA à RIO
DEL SUR, no valor de R$ 24.100,00 (07/07/2004) e R$ 27.400,00 (21/06/2004).
(Caixa 7, Vol. 1, p. 782 a 784, da Ação Penal de Origem), entenda-se, valores
muito superiores aos pagos pelos serviços de contabilidade realizados
regularmente. Daí se extrai que MARCO TREVIZANI recebia altas quantias para
manipular e dar aparência de regularidade à contabilidade das empresas
envolvidas no sistema de contratações ilegais e desvio de recursos do
DETRAN/RS, revelando sua participação dolosa na prática do delito em comento.
h) Apreensão de um bilhete de ROSANA
FERST a MARCO TREVIZANI (01/03/04, Caixa 7, Vol. 1, fls. 31, da Ação Penal de
Origem), informando que despesas da compra de carro foram lançadas como
adiantamento, documento que demonstra o conhecimento e atuação do acusado na
contabilidade forjada das sistemistas NEWMARK e RIO DEL SUR.
i) EDUARDO REDLICH JOÃO, em seu
interrogatório afirmou (Vol. 161, fls. 218 a 235, da Ação Penal de Origem -
grifos nossos):
Constituiu a firma individual Eduardo
Redlich João a pedido de MARCO, e que não possuía nenhum propósito específico; que a firma nunca operou na
realidade, apenas emitiu notas fiscais em face das empresas de LAIR (NEWMARK e
RIO DEL SUR); que emitiu as notas fiscais a pedido de MARCO, sendo
que era este quem mantinha contato com as sistemistas; que
acredita que foram emitidas outras notas fiscais por empresas que também não
prestaram os serviços consignados; que a emissão das notas, sem a
respectiva prestação de serviço, tinha como objetivo o saque de dinheiro; que
foi MARCO quem realizou a declaração retificadora à Receita Federal, logo após
a deflagração da operação; que não existiu prestação de serviços pelas
empresas PLS Azevedo e NT Pereira, e que nenhuma tinha funcionários.
Infere-se que EDUARDO REDLICH JOÃO,
ex-empregado do acusado, foi categórico em afirmar que MARCO AURÉLIO DA ROSA
TREVIZANI estava ciente e participou ativamente da emissão de notas fiscais
ideologicamente falsas, atestando a prestação de serviços que, de fato, não
ocorram. Também confirmou que MARCO TREVIZANI era remunerado pelo 'serviço' de
emitir as notas fiscais falsas. De dizer ainda, que a emissão de notas frias
era apenas um dos modos pelos quais o acusado praticava do delito de
peculato-desvio, de sorte que não o conforta a assertiva de que 'a necessidade
de fraude (...) descaracteriza o peculato'.
A defesa sustenta que o
peculato-desvio deve ser desclassificado para crime de estelionato. A conduta
típica do peculato-desvio praticada pelo réu foi detalhadamente apresentada,
sendo indicados os elementos de prova relacionados ao crime e à respectiva
autoria, portanto, porque praticado o delito de peculato por todos os seus
elementos, de sorte que não cabe a desclassificação pretendida.
Ainda cumpre destacar que era o
responsável técnico pelo escritório e, por isso, possui obrigação de zelar pela
lisura das atividades desempenhadas em tal estabelecimento, descabendo atribuir
responsabilidade penal 'à equipe'.
No tocante ao argumento de bis
in idem, envolvendo os mesmos fatos imputados nos delitos de falsidade
ideológica e peculato, a proteção do bem jurídico tutelado é diversa, o que por
si só afasta a ocorrência da dupla punição. O mesmo raciocínio deve ser
aplicado em relação falsidade ideológica, que é crime autônomo e será apreciado
em seguida, não havendo falar que é crime-meio para o crime de peculato.
A conduta típica de MARCO AURÉLIO DA
ROSA TREVIZANI, portanto, consistiu em laborar efetivamente para a execução do
sistema de contratações e subcontratações com dispensa ilegal de licitação e,
por meio desse esquema meticulosamente organizado conjuntamente com outros
corréus, operar o desvio de recursos públicos estaduais, dando destinação
ilícita à verba (distribuição de propina a agentes públicos e enriquecimento
ilícito próprio e dos demais integrantes do grupo) durante todo o período da
execução dos contratos (n. 34/2003 e 70/2003 - DETRAN/FATEC). Agindo assim,
MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI concorreu para o desvio de recursos do
DETRAN/RS.
Nessas condições, mantenho a
condenação de MARCO AURÉLIO DA ROSA TREVIZANI pela prática do delito tipificado
no art. 312, caput, do Código Penal (Peculato-Desvio).
Marco Aurélio pede
a prevalência do voto mais favorável proferido pelo Desembargador Federal
Márcio Antonio Rocha, que o absolveu da prática do crime de peculato-desvio e
decretou a prescrição da pretensão punitiva em relação aos delitos de quadrilha
(art. 288 do Código Penal) e falsidade ideológica (art. 299 do Código Penal), o
qual deixo de transcrever, pois os fundamentos restaram declinados quando da
apreciação dos embargos infringentes interpostos por Patrícia Jonara Bado dos
Santos.
A irresignação
merece prosperar.
O Núcleo
Detran foi estabelecido no âmbito da autarquia estadual. Na primeira
fase, teria como integrantes Carlos Ubiratan dos Santos, Patrícia Jonara Bado
dos Santos, Nilza Terezinha Pereira, Hermínio Gomes Júnior, Pedro Luis Saraiva
Azevedo, Alexandre Dornelles Barrios e Gilson Araújo de Araújo. Carlos Ubiratan
teria atuado no sentido de dispensar indevidamente a licitação nas duas
primeiras oportunidades (junho e dezembro de 2003), como diretor-presidente do
Detran, para contratar a FATEC e, juntamente com sua esposa, Patrícia Jonara, e
com a participação de Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, teriam
criado a empresa de fachada NT Pereira (com auxílio de sua titular, Nilza
Terezinha Pereira), destinada a distribuir propina ao casal. Hermínio Gomes
Júnior, então diretor administrativo-financeiro do DETRAN, teria atuado na
execução dos contratos, autorizando o pagamento das faturas emitidas pela FATEC
antes mesmo de seu prazo final, tendo recebido como contrapartida vantagens
financeiras por intermédio da empresa de fachada PLS Azevedo (constituída com
auxílio de seu cunhado, Pedro Luís Saraiva Azevedo), com a participação de Lair
Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani.
Relata a denúncia
que, no desenvolvimento desses ajustes contratuais e contábeis, imprescindíveis
ao funcionamento do esquema criminoso, Alfredo Pinto Telles e Lair Antônio
Ferst, bem assim os demais integrantes do Núcleo FERST, contaram sempre com a
atuação fiel do acusado como contador e de seu funcionário Eduardo Redlich
João. Destaca que notas fiscais fraudulentas utilizadas para ajustes contábeis
na NEWMARK foram apreendidas na TREVIZANI ASSESSORIA E CONSULTORIA, escritório do
réu. Aponta que, tanto a PLS AZEVEDO ME, quanto a NT PEREIRA, por onde escoava
a propina aos dirigentes do DETRAN/RS, também tinham o embargante como
contador, sendo ambas 'contratadas' da NEWMARK TECNOLOGIA, tendo havido ainda
nota fiscal de prestação de serviços emitidas a RIO DEL SUR AUDITORIA, no mês
de janeiro de 2005.
Depreende-se dos
autos que o embargante fazia os ditos ajustes (lançamentos) na contabilidade
das empresas, com emissão de notas fiscais 'frias' de modo que
o montante das receitas (recursos públicos oriundos via FATEC pela suposta
prestação de serviços) e das despesas se encontrassem no balanço contábil.
Assim, verifica-se a sua participação na distribuição dos lucros advindos das
atividades ilícitas praticadas pelos demais integrantes do grupo criminoso, no
seu caso, sob a direção de Lair Antonio Ferst e seus associados.
Nesse diapasão, os
atos, cuja prática é atribuída ao ora embargante, não se subsumem ao tipo
previsto no art. 312 do Código Penal e sim às hipóteses descritas nos arts. 288
e 299 do Código Penal, porquanto o acusado não detinha a posse, disponibilidade
ou autoridade sobre os valores, os quais são decorrentes da dispensa irregular
de licitação, praticada por terceiros em ato de corrupção.
Deve prevalecer,
portanto, o voto do Vogal, mantendo-se a pena fixada, bem como a decretação da
prescrição da pretensão punitiva, verbis:
Marco Aurélio Trevizani
- Quadrilha (artigo
288 do Código Penal - fato 1): 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 25): 02 (dois) anos, 01 (um) mês de reclusão,
prescrita a pretensão punitiva, antes do acréscimo relativo à continuidade
delitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 26): 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze)
dias de reclusão, prescrita a pretensão punitiva.
- Falsidade ideológica (artigo
299 do Código Penal - fato 27): 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze)
dias de reclusão, prescrita a pretensão punitiva.
Assim, deve ser
dado provimento aos embargos infringentes e de nulidade interpostos por Marco
Aurélio Trevizani para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelos
crimes de quadrilha e de falsidade ideológica que, no entanto, estão
prescritos, nos termos do voto do Vogal.
7. Conclusão.
7.1. Ferdinando
Francisco Fernandes: voto médio recorrido: 13 (treze) anos de pena
privativa de liberdade, no regime inicial semiaberto, e 440 (quatrocentos e
quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente na
data dos fatos, pela prática dos crimes de beneficiar-se de dispensa indevida
de licitação e corrupção ativa. Recurso a que se nega provimento.
7.2. Fernando
Fernandes: voto médio recorrido: 12 (doze) anos de pena privativa de
liberdade, no regime inicial semiaberto, e 210 (duzentos e dez) dias-multa, no
valor unitário de 8/10 (oito décimos) do salário mínimo vigente na data dos
fatos, pela prática dos crimes de beneficiar-se de dispensa indevida de
licitação e corrupção ativa. Recurso a que se nega provimento.
7.3. José
Antônio Fernandes: voto médio recorrido: 13 (treze) anos de pena
privativa de liberdade, no regime inicial semiaberto, e 440 (quatrocentos e
quarenta) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente na
data dos fatos, pela prática dos crimes de beneficiar-se de dispensa indevida
de licitação e corrupção ativa. Recurso a que se nega provimento.
7.4. Alfredo
Pinto Telles: voto médio recorrido: pena de 6 (seis) anos e 6 (seis)
meses de detenção, em regime semiaberto, e pagamento de 110 (cento e dez)
dias-multa, à razão de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à época
dos fatos, tendo sido decretada a prescrição da pretensão punitiva em relação
aos crimes de quadrilha (art. 288 do CP) e falsidade ideológica (art. 299 do
CP). Recurso a que se nega provimento.
7.5. Carlos
Dahlem da Rosa: voto médio recorrido: pena de 9 (nove) anos e 9 (nove)
meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 255 (duzentos e cinquenta e
cinco) dias-multa, à razão de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à
época dos fatos, nos termos do voto Vogal, pela prática do crime de
beneficiar-se de dispensa indevida de licitação. Recurso a que se nega provimento.
7.6. Rosmari
Greff Ávila da Silveira: voto médio recorrido: pena de 5 (cinco)
anos e 5 (cinco) meses de reclusão, em regime semiaberto, pelo cometimento do
crime de peculato-desvio. Recurso provido para que sua pena seja reduzida, em
face da substituição da punição por peculato para a de quadrilha cuja
prescrição, no entanto, se reconhece.
7.7. Rosana
Cristina Ferst: voto médio recorrido: pena de 5 (cinco) anos e 5
(cinco) meses de reclusão, em regime semiaberto, pelo cometimento do crime de
peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenada pela
prática do crime de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação, à pena de
3 (três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 55
(cinquenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do
salário mínimo vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é
substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e
destinação, respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos
termos do voto do Vogal prevalecente. Resta prescrita a pretensão punitiva
relativa aos delitos de quadrilha e falsidade ideológica.
7.8. Denise Nachtigall Luz: voto
médio recorrido: pena de 06 (seis) anos, 05 (cinco) meses e 15
(quinze) dias de reclusão, em regime semiaberto, pelo cometimento do crime de
peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe condenou
por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenada por
beneficiar-se de dispensa indevida de licitação à pena de 3 (três) anos e 3
(três) meses de detenção, no regime inicial semiaberto, e 80 (oitenta)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é substituída por
prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente
a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente,
deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do voto do Vogal
prevalecente. Resta prescrita a pretensão punitiva relativa ao delito de
quadrilha.
7.9. Dario Trevisan de
Almeida: voto médio recorrido: pena de 08 (oito) anos, 07 (sete)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime fechado, pela prática do delito de
peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe condenou
por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de beneficiar-se de dispensa indevida de licitação à pena de 3 (três)
anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial aberto, e 80 (oitenta)
dias-multa, no valor unitário de 6/10 (seis décimos) do salário mínimo vigente
à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é substituída por prestação de
serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor equivalente a 30 (trinta)
salários mínimos, cujo cumprimento e destinação, respectivamente, deverão ser
definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do voto do Vogal. Está prescrita a
pretensão punitiva relativa aos delitos de quadrilha e falsidade ideológica.
7.10. Silvestre
Selhorst: voto médio recorrido: pena de 05 (cinco) anos e 05 (cinco)
meses de reclusão, em regime semiaberto pela prática do delito de
peculato-desvio. Recurso provido em parte para substituir o voto que lhe
condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta
condenado pelo crime de quadrilha que, no entanto, está prescrito.
7.11. Luiz
Carlos de Pellegrini: voto médio recorrido: pena de 5
(cinco) anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de reclusão, em regime
semiaberto, pela prática do delito de peculato-desvio. Recurso provido em parte
para absolvê-lo da prática do delito de peculato-desvio e condená-lo à pena de
3 (três) anos e 3 (três) meses de detenção, no regime inicial regime aberto, e
53 (cinquenta e três) dias-multa, no valor unitário de 2/10 (dois décimos) do
salário mínimo vigente na data dos fatos, pela prática do crime de beneficiar-se
de dispensa indevida de licitação. A pena privativa de liberdade é substituída
por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor
equivalente a 30 (trinta) salários mínimos, cujo cumprimento e destinação,
respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução, nos termos do
voto do Vogal. Está prescrita a pretensão punitiva relativa ao delito de
quadrilha.
7.12. Flávio
Roberto Luiz Vaz Netto: voto médio recorrido: pena de 08 (oito)
anos, 07 (sete) meses e 10 (dias) de reclusão, em regime fechado, pela prática
do delito de peculato-desvio. Recurso provido em parte para substituir o
voto que lhe condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que
resta condenado pelos crimes de dispensa indevida de licitação e corrupção
passiva às penas de 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses de detenção e 03
(três) anos de reclusão, respectivamente, totalizando 07 (sete) anos e 04
(quatro) meses de pena privativa de liberdade, no regime inicial semiaberto, e
300 (trezentos) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo vigente
à data dos fatos, nos termos do voto do Vogal. Está prescrita a pretensão
punitiva relativa ao delito de quadrilha.
7.13. Patrícia Jonara Bado dos
Santos: voto médio recorrido: pena privativa de liberdade de 3 (três)
anos e 9 (nove) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto,
além de 85 (oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 8/10 (oito
décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída por duas penas
restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e
prestação pecuniária, estipulada em 30 (trinta) salários mínimos, pela prática
do crime de peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe
condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta
condenada pelos crimes de quadrilha e falsidade ideológica, relativamente
aos quais, no entanto, já foi reconhecida a prescrição, nos termos do voto
do Vogal.
7.14. Helvio
Debus Oliveira Souza: voto médio recorrido: pena privativa
de liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de
reclusão e 45 (quarenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 6/10 (seis
décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída por duas penas
restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e
prestação pecuniária, estipulada em 15 (quinze) salários mínimos, pela prática
do delito de peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe
condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta
condenado pelo crime de quadrilha que, no entanto, está
prescrito, nos termos do voto do Vogal.
7.15. Luiz
Paulo Rosek Germano: voto médio recorrido: pena privativa de
liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 22 (vinte e dois) dias de
reclusão, em regime aberto, e 90 (noventa) dias-multa, no valor unitário de
4/10 (quatro décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos, substituída
por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à
comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 25 (vinte e cinco) salários
mínimos, pela prática do delito de peculato-desvio. Recurso provido para
substituir o voto que lhe condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais
favorável, em que resta condenado pelo crime de quadrilha que, no entanto, está
prescrito, nos termos do voto do Vogal.
7.16. Paulo
Jorge Sarkis: voto médio recorrido: pena privativa de liberdade
de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime semiaberto, e 200 (duzentos)
dias-multa, no valor unitário de 01 (um) do salário mínimo vigente à data dos
fatos, pela prática do delito de peculato-desvio. Recurso provido para para
substituir o voto que lhe condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais
favorável, em que resta condenado pelo crimes de quadrilha e de corrupção
ativa, este à pena de 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, no regime
inicial aberto, e 45 (quarenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 01
(um) salário mínimo vigente à data dos fatos. A pena privativa de liberdade é
substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no
valor equivalente a 20 salários mínimos, cujo cumprimento e destinação,
respectivamente, deverão ser definidos pelo Juízo da Execução. Está prescrita a
pretensão punitiva relativa ao delito de quadrilha. Tudo nos termos do voto do
Vogal.
7.17. Eduardo Wegner Vargas: voto
médio recorrido: pena privativa de liberdade de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e
22 (vinte e dois) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 40 (quarenta)
dias-multa, no valor unitário de 4/10 (quatro décimos) do salário mínimo
vigente à data dos fatos, substituída por duas penas restritivas de direito,
consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária,
estipulada em 25 (vinte e cinco) salários mínimos, pela prática do crime de
peculato-desvio. Recurso provido para substituir o voto que lhe condenou por
peculato-desvio pelo que lhe é mais favorável, em que resta condenado pelo
crime de quadrilha que, no entanto, está prescrito, nos termos do voto do
Vogal.
7.18. Marco
Aurélio Trevizani: voto médio recorrido: pena privativa de
liberdade de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de reclusão, a ser cumprida em
regime inicial aberto,rodin além de 75 (setenta e cinco) dias-multa, no valor
unitário de 2/10 (dois décimos) do salário mínimo vigente à data dos fatos,
substituída por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de
serviços à comunidade e prestação pecuniária, estipulada em 10 (dez) salários
mínimos, pela prática do crime de peculato-desvio. Recurso provido para
substituir o voto que lhe condenou por peculato-desvio pelo que lhe é mais
favorável, em que resta condenado pelos crimes de quadrilha e de falsidade
ideológica que, no entanto, estão prescritos, nos termos do voto do Vogal.
7.19. Resultado
final: Desse modo, restam condenados ao cumprimento de pena os réus
Ferdinando Francisco Fernandes, Fernando Fernandes, José Antônio Fernandes,
Alfredo Pinto Telles, Carlos Dahlem da Rosa, Rosana Cristina Ferst, Denise
Nachtigall Luz, Dario Trevisan de Almeida, Luiz Carlos de Pellegrini, Flávio
Roberto Luiz Vaz Netto e Paulo Jorge Sarkis. Os demais, tiveram a sua
punibilidade extinta pela prescrição.
8. DISPOSITIVO:
Isso posto, voto
por NEGAR PROVIMENTO aos embargos infringentes opostos por Alfredo Pinto
Telles, Carlos Dahlem da Rosa, José Antonio Fernandes, Ferdinando Francisco
Fernandes e Fernando Fernandes; DAR PARCIAL PROVIMENTO aos embargos
infringentes e de nulidade interpostos por Silvestre Selhorst, Luiz Carlos de
Pellegrini e Flávio Roberto Luiz Vaz Netto para que prevaleça o voto proferido
pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha; e DAR PROVIMENTO aos embargos
infringentes e de nulidade opostos por Rosmari Greff Ávila da Silveira,
Patricia Jonara Bado dos Santos, Hélvio Debus Oliveira Souza, Luiz Paulo Rosek
Germano, Eduardo Wegner Vargas, Marco Aurélio da Rosa Trevizani, Paulo Jorge Sarkis,
Rosana Cristina Ferst, Denise Nachtigall Luz e Dario Trevisan de Almeida para
que prevaleça o voto proferido pelo Desembargador Federal Márcio Antonio Rocha.
Documento eletrônico assinado por LEANDRO PAULSEN, Desembargador
Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de
dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A
conferência da autenticidade do documento está disponível no
endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante
o preenchimento do código verificador 40000750134v221 e do
código CRC baaac5f1.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): LEANDRO PAULSEN
Data e Hora: 19/12/2018, às 18:25:11
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