Depois de três anos em retração, a retomada das vendas de
imóveis residenciais teve início em 2017. O crescimento, apesar de modesto no
último ano, derivou da melhora no quarto trimestre e foi impulsionado pelo
mercado paulistano. Melhores condições de crédito, preços de imóveis mais
baixos, elevação de renda real e da confiança do consumidor foram os principais
impulsos para a recuperação da demanda por imóveis residenciais. Os dados do
primeiro trimestre de 2018 reforçam a trajetória positiva das vendas, inclusive
com expansão em maior intensidade. Ainda que existam vetores para moderação na
velocidade de retomada nos próximos meses, como a acomodação da taxa de
desemprego em nível elevado desde o final do ano passado e a interrupção da
melhora dos índices de confiança do consumidor mais recentemente, novas medidas
voltadas à expansão do crédito habitacional foram divulgadas ontem pelo
Conselho Monetário Nacional (CMN) e terão impacto positivo no setor ao longo
dos próximos anos. Assim, esperamos que a moderação no ritmo de retomada seja
temporária, com o crescimento do mercado imobiliário voltando a acelerar em
2019. Por fim, as disparidades regionais devem seguir presentes nos meses à
frente, acompanhando a recuperação distinta das economias locais.
O mercado imobiliário residencial foi reduzido a 50% do
seu volume máximo, atingido em 2013, durante a última recessão brasileira.
Atualmente, encontra-se a 60% do volume de 2013, apesar da melhora recente. O
setor tem se recuperado gradualmente, com crescimento das vendas de 9,4% em
2017, passando para avanço interanual de 22,3% no primeiro trimestre deste ano.
A retomada das vendas foi sustentada por diversos fatores positivos no período.
A expansão da massa real de renda, atrelada à melhora do mercado de trabalho ao
longo de 2017 e à queda da inflação, a queda dos juros e o baixo patamar de
preços de imóveis favoreceram a capacidade de pagamento das famílias
brasileiras no caso dos financiamentos habitacionais. Além disso, houve queda
do endividamento nos últimos anos e do comprometimento de renda desde meados de
2017. Somado a isso, a melhora do ambiente econômico permitiu que a confiança
do consumidor fosse retomada gradualmente, influenciando positivamente a
demanda por crédito de longo prazo, como é o caso do imobiliário. A combinação
desses fatores explica a expansão do número de unidades financiadas neste ano
com recursos da poupança, conforme divulgado pela Associação Brasileira das
Entidades de Crédito Imobiliário (Abecip).
Com o aumento da demanda, as incorporadoras voltaram a
lançar. O volume lançado registrou crescimento de 5,2% em 2017. No primeiro
trimestre de 2018, contudo, os lançamentos recuaram 30%, em um período de
acomodação após a forte expansão observada no último trimestre do ano passado.
Como parte relevante das vendas ocorre na planta (historicamente, em São Paulo,
por exemplo, mais de 65% das vendas ocorrem antes do início das obras), voltar
a lançar também beneficiou a demanda por imóveis novos, tendo seus efeitos nas
vendas no início do ano. De fato, ter um ponto de venda, com corretores e
unidades decoradas, facilita a venda de um imóvel novo. Com isso, os estoques
de imóveis novos foram reduzidos, de 154 mil unidades no final de 2016 para 123
mil unidades no primeiro trimestre deste ano. Considerando o patamar de vendas
de cada período, os estoques passaram de cerca de 23 meses de venda para 17
meses, desde o primeiro trimestre de 2017, reforçando o cenário de um mercado
imobiliário residencial de fato mais ajustado ao novo patamar de demanda.
Estoques mais ajustados recolocam o mercado em um equilíbrio mais favorável às
empresas, com melhora nas perspectivas de preços.
Como é sabido, a recuperação do mercado tem ocorrido de
forma heterogênea entre os municípios pesquisados. A queda de estoque de
imóveis novos, por ora, ocorreu em 13 municípios/regiões metropolitanas (RMs)
das 21 áreas pesquisadas pela CBIC, indicando um quadro mais ajustado nessas
regiões e favorecendo, consequentemente, a recuperação de lançamentos neste
ano. Outras cidades/regiões seguem com elevação de estoques. De qualquer forma,
a preocupação em relação aos estoques excessivos deveria se concentrar no
volume e na participação das unidades que já foram entregues. No Brasil, em
média 31% dos estoques imobiliários estão prontos, 50% estão em construção e
19% estão na planta. Chama atenção, então, que 10 das regiões pesquisadas
possuem mais de 40% dos seus estoques em unidades prontas, o que leva as
incorporadoras a incorrer com custos de IPTU e condomínio, além do esforço de
comercialização, muitas vezes sem ponto de venda no empreendimento.
Olhando nos meses à frente, há vetores claros para
moderação na retomada do mercado imobiliário. A taxa de desemprego parou de
cair, de forma mais evidente, desde novembro de 2017; a criação de vagas no
mercado de trabalho formal (com carteira assinada) tem surpreendido
negativamente nos últimos meses; e a renda real desacelerou neste ano,
comparativamente à velocidade de expansão observada no ano passado. Além disso,
a trajetória de melhora da confiança dos consumidores foi interrompida em maio
e junho deste ano, apresentando ligeira recuperação em julho, mas ainda em
nível bem inferior ao observado no primeiro trimestre.
Por outro lado, ontem foram anunciadas novas medidas de
estímulo ao crédito habitacional, que deverão contrabalancear esses vetores de
moderação a partir de 2019. Entre as alterações divulgadas, o CMN manteve o
direcionamento de 65% dos recursos de poupança para financiamento habitacional,
entretanto, eliminou a regra de que 80% desses recursos sejam utilizados para o
Sistema Financeiro Habitacional (SFH – poupança e FGTS), flexibilizando a
utilização desses recursos. Os financiamentos com recursos de poupança poderão
ter taxas de juros negociadas livremente com os mutuários (a regra atual obriga
o uso da Taxa Referencial – TR como indexador). Com isso, os financiamentos
poderão ser atrelados a índices de inflação, facilitando a securitização dos
ativos e permitindo a contratação de novos financiamentos. Ademais, houve
aumento do limite do valor de imóvel financiado com recursos do FGTS, de R$ 950
mil para R$ 1,5 milhão em nível nacional, no âmbito do SFH. Para recursos de
poupança, não há mais limite no valor de avaliação do imóvel. Em financiamentos
de imóveis até R$ 500 mil, os bancos poderão usar o fator multiplicador de 1,2
no volume de crédito da operação para efeito do atendimento da exigibilidade,
ou seja, a medida estimula os financiamentos para imóveis de menor valor.
Por fim, a resolução do CMN limitou os instrumentos para
fins de vinculação, entre eles as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e os
Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), que não serão mais computados
nos 65% de exigibilidade dos recursos de poupança. Como o vencimento desses
instrumentos é geralmente inferior a seis anos, o Banco Central estima que
essas medidas podem gerar um acréscimo de R$ 80 bilhões no crédito imobiliário
ao longo desse período. Assim, o pacote de ontem deverá manter as condições
favoráveis de oferta de crédito, com impactos a partir de 1º janeiro de 2019,
quando as regras entram em vigor.
As disparidades regionais seguirão presentes. De forma
geral, vemos a região Nordeste e alguns estados do Sudeste com ritmo mais lento
de recuperação econômica, especialmente considerando o mercado de trabalho
bastante folgado, com elevadas taxas de desemprego. Em sentido contrário, as
regiões Sul, Centro-Oeste e Norte, de modo geral, já apresentam retomada mais
clara da atividade e deverão liderar o crescimento da economia brasileira neste
e no próximo ano. Apesar das condições de crédito serem semelhantes em todas as
regiões (e as novas medidas têm impacto nacional), a diferença de criação de
vagas formais esperada para os próximos meses (acompanhando a recuperação da
atividade) deverá determinar as distintas velocidades de retomada no mercado
imobiliário em cada município/região. Como alertamos, o ajuste dos estoques de
imóveis novos segue incompleto em diversas regiões, levando a um esforço
adicional das incorporadoras na venda dessas unidades remanescentes.
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