Artigo, Fábio Jacques, exclusivo - Entendendo a narrativa

Observando à distância, mais especificamente de Verona na Itália, o que vem ocorrendo no Brasil, fico um tanto quanto abismado com as narrativas que passaram a fazer parte do dia a dia do brasileiro. Algumas são fáceis de decifrar porque primam pela incongruência, mas outras exigem de mim uma pesquisa mais aprofundada para conseguir interpretá-las ou até mesmo entendê-las.

Não tenho a mínima condição de saber exatamente o que algumas pessoas querem dizer com suas afirmações e, por isso, me obrigo a ir atrás de outros esclarecimentos que me ajudem a torná-las um pouco mais palatáveis. Cito um caso específico.

A ministra do STF, Rosa Weber proferiu durante o seminário da ADJC a seguinte frase:

“O presidente Franklin Roosevelt, em 8 de dezembro de 1941, perante o Congresso Norte-Americano, ao reagir ao ataque aéreo japonês , deflagrado na véspera contra as Forças Navais Norte-Americanas em Pearl Harbor, no Havaí, disse que aquela data, 7 de dezembro de 1941, pelo caráter traiçoeiro da agressão, viveria eternamente na infâmia. Para nós, o 8 de janeiro de 2023 será eternamente o dia da infâmia. E não deixaremos ser esquecido, na defesa da democracia constitucional e do Estado democrático de Direito”.

Fiquei elucubrando se seria possível, uma ministra do STF fazer algum paralelo entre um relógio antigo e alguns vidros e móveis quebrados ou danificados, e a destruição de 19 navios, 180 aviões e a morte de mais de 2.400 militares e civis norte-americanos. Seria quase (estou exagerando), equiparar a morte do cinegrafista da Band, Santiago Ilídio Andrade, atingido na cabeça por um rojão, com a bomba de Hiroshima.

Não pude acreditar que a ministra tivesse feito este comparativo à primeira vista absurdo, mas, procurando ir um pouco mais a fundo no pronunciamento, cheguei à conclusão de que talvez a ministra não esteja completamente errada. Senão vejamos:

O presidente Roosevelt, que na época desempenhava apenas um papel de coadjuvante de sua aliada Inglaterra, protegendo alguns navios de sua frota, queria participar ativamente na guerra o que lhe seria extremamente benéfico economicamente, mas não encontrava motivos plausíveis para tal. Esperava que algum submarino alemão torpedeasse um de seus navios, mas Hitler dera ordens para que nenhum barco americano fosse atingido evitando assim dar motivo para a entrada dos americanos na guerra. 

O Japão, por seu lado, evitava qualquer confronto com os americanos para não lhes fornecer argumentos bélicos principalmente porque praticamente todo o petróleo usado pelos nipônicos no seu esforço de guerra contra a China e outras ilhas do Pacífico, provinham dos Estados Unidos.

 Como não conseguisse argumentos, e tendo mais de 70% da população americana contrária à participação dos Estados Unidos na guerra tanto na Europa como no Pacífico, Roosevelt suspendeu o fornecimento de combustível ao Japão o que provocou uma reação violenta por parte das forças japonesas. Roosevelt esperava um ataque a algum navio ou a alguma base americana no Pacífico, mas, em função da longa distância, jamais à sua armada no Havaí. Mas foi o que aconteceu, e, ainda que contra todas as suas expectativas, Roosevelt conseguiu seu almejado argumento para entrar na guerra tanto contra o Japão como contra a Alemanha o que o tornaria o grande líder mundial pós-guerra.

A quem beneficiou o ataque a Pearl Harbor? Aos japoneses é que não foi.

Olhando por este prisma, talvez a ministra tenha pretendido, com razão, dizer que o 8 de janeiro se tornaria para sempre o dia da infâmia.

Não foi armado nenhum sistema de proteção dos edifícios dos três poderes, Lula disse que as portas foram abertas por dentro, o general Dutra afirmou que as pessoas pensavam que o exército as estava protegendo e foram dormir sendo todas presas no dia seguinte. Os que estavam no acampamento na frente do QG do exército foram convidados a entrar nos ônibus para irem a um lugar seguro e acabaram no campo de concentração da PF. Muitos militares e ex-ministros de Bolsonaro, não alinhados com a esquerda foram presos e continuam presos até hoje, sem julgamento e até mesmo sem acusação formal, para citar apenas alguns fatos. Ao mesmo tempo, o general, ministro do GSI, continuou tranquilo em seu posto até o vazamento pela CNN das imagens de sua presença em meio aos vândalos o que o levou a pedir demissão, mas, continua livre leve e solto. O ministro da Justiça, mesmo tachando o quebra-quebra como um atentado terrorista à democracia e ao estado democrático de direito, “permitiu que as imagens de seu ministério fossem apagadas”. E tudo parece que vai ficar por isso mesmo.

As marchas e contramarchas relativas à CPMI do 8 de janeiro que, por não poder evitar, o governo se apossou da maioria dos membros, da presidência e da relatoria, somadas aos fatos citados anteriormente e a inúmeros outros que deixo de mencionar porque são do conhecimento de todo mundo, me levam a pensar que foi pensando nestes eventos escabrosos que a ministra 

Rosa Weber resolveu classificar o dia 8 de janeiro como o Dia da Infâmia. Nunca se viu acontecimento semelhante na história do Brasil e creio que jamais voltaremos a ver.

Se foi este o pensamento da ministra, acho que ela está plena de razão. Se não foi, então nada me resta do que pedir “vênias” a ela por meu erro de interpretação. Aliás, vênia me lembra “pecado venial”, o que não se aplica neste caso porque o pecado foi mortal.

Da pior espécie.

 

Fabio Freitas Jacques. Engenheiro e consultor empresarial, Diretor da FJacques – Gestão através de Ideias Atratoras e autor do livro “Quando a empresa se torna azul – o poder das grandes ideias”.


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