Na sessão que julgou a ação de Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental (ADPF) do PCdoB contra a Lei do Impeachment, o Supremo
também deu sua “pedalada”. Com isso, feriu gravemente o princípio
constitucional do devido processo legal. O erro de procedimento (“error in
procedendo”) agora precisa ser reconhecido e corrigido pela Corte.
Registra-se aqui, na Tribuna da Internet, outra
anomalia neste julgamento. A primeira foi a omissão dos ministros a respeito
dos efeitos do julgamento, se pretéritos (“ex tunc”) ou se apenas para o futuro
(“ex nunc”). Mas com a percepção agora de mais uma gravíssima irregularidade,
que vai exposta e explicada a seguir, aquela questão sobre a modulação dos
efeitos deixa até de ter importância.
ERA SÓ JULGAMENTO DE LIMINARES
A Lei 9882/99 é a que regula e dispõe sobre o processo e
julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Lei curta,
com 14 artigos apenas. Ela estabelece dois ritos, dois caminhos a percorrer.
Um, quando o autor da ação requer que os pedidos formulados sejam concedidos
por antecipação, através de liminar em Medida Cautelar, até que o mérito seja
julgado. Outro, sem pedir liminar.
Quando há Medida Cautelar com pedido de liminar – como
foi o caso da ação do PCdoB –, o ministro relator submete o(s) pedido(s) de
liminar(es), ou seja, a Medida Cautelar, ao Pleno da Corte, após ouvir no prazo
de 5 dias todas as partes contra as quais a ação foi dirigida. E o plenário se
reúne em sessão e decide, pela concessão ou pelo indeferimento da(s)
liminar(es).
Foi este o caso da ADPF do PCdoB contra a Lei do
Impeachment. Na ação, o partido, por meio de Medida Cautelar Incidental, pediu
várias liminares.
NÃO HAVIA JULGAMENTO DE MÉRITO
Afinal de contas – e é aí que se praticou a “pedalada” –
aquela sessão plenária dos dias 16 e 17 do corrente mês de dezembro examinava e
julgava, exclusivamente, a concessão ou não das liminares. Para isso a sessão
foi convocada, foi aberta e instalada. Não era uma sessão para julgar o mérito.
Esta ficaria para uma outra data, muito mais adiante, após cumprido o rito que
a lei prevê para que a ADPF tivesse prosseguimento após o pronunciamento da
Corte sobre as liminares.
Diz o artigo 6º da referida lei que, após a Corte
apreciar o(s) pedido(s) de liminar(es), o relator volta a dar prazo de 10 dias
para que as partes contrárias se manifestem, pela segunda vez, podendo arguir
tudo quanto lhe seja legítimo em sua defesa. E somente após o decurso deste
prazo de 10 dias para que as partes acionadas apresentem suas contestações é
que o relator apresentará seu relatório com pedido de dia para julgamento
final, o julgamento de mérito. A conferir:
“Artigo 6º – Apreciado o pedido de liminar, o relator
solicitará as informações às autoridades responsáveis pela prática do ato
questionado, no prazo de 10 dias”.
“Artigo 7º – Decorrido o prazo das informações o relator
lançará o relatório, com cópia a todos os ministros, e pedirá dia para
julgamento”.
UMA ‘PEDALADA” E TANTO
E isso aconteceu? A resposta, induvidosamente, é
negativa. Mas por uma “pedalada” que partiu do ministro presidente Ricardo
Lewandowski, o STF transformou aquele julgamento preliminar, que tinha a única
a exclusiva finalidade de examinar e decidir sobre as liminares na Medida
Cautelar, em julgamento de mérito, em julgamento final, derradeiro e
irrecorrível!!! Meu Deus, onde estamos?
A pedalada foi bem no finalzinho da sessão do dia 17,
quando o ministro Ricardo Lewandowski se dirigiu ao ministro Fachin, relator, e
sugeriu que aquela sessão fosse convertida em julgamento de mérito, ou seja, em
decisão final. E na última linha da Ata se lê: “Ao final, o Tribunal, por
unanimidade, convertou o julgamento da medida cautelar em julgamento de
mérito”.
Errado. Isso não poderia ter acontecido. Foi uma
“pedalada”. Uma “pedalada” e tanto. Nem os ministros estavam preparados para
estudar a causa, consultar legislações e regimentos internos, da Câmara e do
Senado, e proferir um voto com inteiro e completo conhecimento da causa. Todos
foram para a sessão para examinar e decidir apenas e tão somente a respeito das
liminares requeridos na Medida Cautelar. Meramente cautelar. Meramente liminar.
Daí o prevalecimento daquela mutilação que o ministro Barroso fez na leitura do
Regimento interno da Câmara, quando não leu a parte final do dispositivo que
estendia “às demais eleições” o voto secreto.
É PRECISO CORRIGIR O QUE ESTÁ ERRADO. E JÁ.
É preciso ingressar com Embargo de Declaração ou mesmo
Mandado de Segurança para que esta histórica anomalia, este erro notável não
prevaleça. E com quatro pedidos:
1) para que a Corte declare e reconheça que aquele
julgamento proferido em sede de mera Medida Cautelar jamais poderia ter sido
convolado em julgamento de mérito;
2) para que a Corte, em consequência, exclua da Ata
aquela parte que anota “Ao final, o Tribunal, por unanimidade, converteu o
julgamento da medida cautelar em julgamento de mérito”;
3) para que a Corte declare que os resultados das
votações prevalecem no que se refere às liminares concedidas:
4) para que a Corte volte a restabelecer, a partir da
votação sobre os pedidos de liminares, o curso regular do processo da ADPF do
PCdoB, avançando-se nas fases seguintes e previstas nos artigos 6º e 7º da Lei
nº 9882, de 1999.
Somente assim, finalmente, o Supremo estará fazendo
Justiça.
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