Nação dividida e caudilhismo boleiro, por Facundo Cerúleo

Desce sobre o planeta azul a cerração da estupidez que cancela o futuro. E do jeito que vai, por muitos anos não haverá nenhuma conquista, ao menos nenhuma de alta significação, que título regional é coisa muito medíocre. Claro está que estou falando da gente gremista, que faria bem em se unir para fazer frente ao poderio de clubes do centro do país que, por meio da profissionalização de suas gestões, tendem a ganhar tudo, deixando os demais na condição de mera periferia. Mas, união não há!

E a coisa anda mesmo estranha. A "nação tricolor" está dividida. Eu sei, a fauna é plural, cada cabeça é meia sentença, realmente tem de tudo, mas é possível apontar dois extremos na bipolaridade da "nação".

No flanco mais obscuro do espectro gremista, está uma galera que, sendo "pura paixão" (como dizem e até promovem os doutos da imprensa), reage emocionalmente e sem conexão com a realidade: esse pessoal está sendo chamado de renatista por tratar o técnico do Grêmio, Renato Portaluppi, como se ele fosse um misto de Winston Churchill, Albert Einstein e Papai Noel. Não é interessante? É um inédito "caudilhismo boleiro".

Incapaz de olhar com objetividade os fatos, mas influente nos rumos do clube, essa gente obtusa empurra apaixonadamente o Grêmio para trás. Os renatistas não veem, por exemplo, que o Grêmio atravessou 2023 sem uma única jogada ensaiada. Qual time profissional não tem jogadas ensaiadas? O caudilho sequer pensou um esquema para maximizar o aproveitamento de um gênio como Luis Suárez. No entanto, apesar de tantas evidências da falta de profissionalismo na condução de um grupo orçado em milhões, os palermas negam os fatos e permanecem agarrados às suas crenças imbecis - que a mídia sabe explorar muito bem.

Noutro extremo está uma galera que busca separar emoção e razão, minoria que detesta a irracionalidade do renatismo. Diante do Grêmio real, essa turma pensa, faz diagnósticos e imagina soluções buscando usar critérios objetivos em vez de ser levada por sentimentos de simpatia ou antipatia, o que não garante acertar sempre, claro, mas tem o mérito de saber que boas decisões nascem do discernimento, não da paixão. Na falta de termo melhor, vou classificar essa minoria como pragmática.

Os renatistas são mesmo muito esquisitos: acreditam na infalibilidade do caudilho, justificam tudo que ele faz e reagem contra quem o critica. Evocando um passado fantasioso em que ele figura como um mago que distribui felicidade, tratam como se a "nação" tivesse uma dívida para com ele. É o cúmulo da irracionalidade!

Já os pragmáticos estão desiludidos. Não acreditam numa direção que, no começo, fez uma porção de coisas boas mas que, depois, jogou tudo fora ao entregar o time a um técnico que fala muito, treina pouco e treina mal, que não assume seus erros mas transfere a outros a culpa pelos fracassos da equipe (inclusive queimando garotos da base, o que lesa o patrimônio do clube), o tipo que se acha muito malandro só porque (por conveniência ou burrice, não sei) a imprensa cai na lábia dele.

Como se vê, o caudilhismo é muito mais do que desvario de cabeças ocas, conjugando massa manipulável, imprensa que desinforma para favorecer interesses escusos, e políticos com motivações egoístas. Para se manter, o caudilhismo precisa da propagação de narrativas que alimentam crenças irracionais com efeitos nefastos tanto na política (a famigerada eleição do pátio) quanto na vida de cada um: "Quem aceita passivamente as narrativas da astúcia tem a vida controlada por interesses alheios."

Os pragmáticos repudiam a imprensa que fomenta a irracionalidade do renatismo (esta coluna também!) rejeitando esta combinação letal que é, vale repetir, imprensa tendenciosa e interesseira, massa manobrável e um líder egocêntrico e manipulador: é a caricatura de um regime populista. Como fenômeno visto em abstrato, o populismo não é novo nem localizado: aqui o vemos a atrasar um clube, alhures a arruinar países. Não é mesmo interessante? A sociologia da mediocridade tem ensinamentos muito úteis (ao menos para quem é honesto no exercício do pensar...).

Alguém imagina que, nessa batida, o Grêmio tem mínima chance de fazer frente a clubes que estão profissionalizando suas gestões?

Para quem acha que vai algum exagero aqui, indico a entrevista do médico Márcio Bolzoni, concedida em 2022. Muita coisa é revelada ali! Inclusive sobre a demissão de todo o corpo técnico do Grêmio (o que alavancou o rebaixamento de 2021), sobre milhões torrados em contratações que foram um fracasso total e um treinador que não sabe fazer treino técnico e tático. Ah, e vão encontrar entre os entrevistadores gente que hoje faz a apologia do caudilho. Quem tiver um mínimo de capacidade crítica será tomado pela maior indignação!


Veja a entrevista no link:

https://www.youtube.com/watch?v=0ZYB9N3NVq4


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