Artigo, Fernando Albrecht, Jornal do Comércio - Os kerbs e a devoção à cerveja

Nos anos 1950, meu pai visitou os pais dele na Alemanha, então como bom alemão fez uma visita à famosa cervejaria Hofbrauhaus de Monique. Por acaso encontrou um conhecido, morador do Vale do Caí, e então sentaram na mesa esperando que uma alemoa do porte de um panzer servissem enormes canecas de cerveja de um litro, seis em cada mão. Até a Darcy Pacheco Soluções de Peso passaria trabalho. Quando ela depositou a caneca na frente do conhecido, ele gesticulou fazendo "nein, nein! com o dedinho balançando de um lado para o outro como um pêndulo . Ele queria um chope como o nosso, de 300 ml. Ela o olhou com pena. Na tradução, falou assim:

    - Tsk Tsk Tsk. Quando cresceres, volte aqui para beber em caneca e não em copo miniatura.

  Até contam que quando mais de três alemães se encontram, dá guerra ou rodada de cerveja. Nos kerbs, a loira bebida reinava. Kerb, na origem, significa colheita, mas pelo menos no Vale do Caí era dia do padroeiro da localidade. Nunca havia baile aos sábados, porque o padre vigário (sem ofensa, sem ofensa...) temia que os fiéis matassem a missa dominical. Por isso a festa era nos domingos e os bailes se estendiam até terça-feira.

  A largada era após a missa das 8h. Findo o culto, uma bandinha começa a tocar. Lembro em especial de uma valsinha chamada "Amor de pobre", mui linda a melodia. O séquito ia para o salão de baile. Em lá chegando, os esperava uma garrafa de cerveja pendura no teto do alto pé direito. A moral era quem tirasse a garrafa teria que pagar uma rodada para todos os presentes. E brigavam por isso, imagina.

  O sistema funcionava bem. Assim que os casais entravam na pista, um funcionário do dono do salão pregava uma fitinha com alfinete no paletó, era o pedágio. Nas mesas ao redor a ordem era deixar as garrafas nas mesas, uma espécie de campeonato. Vindas de longe em estradas precárias, as mulheres vinham de pés descalços ou de tamancos, com o sapato social nas mãos. Ali começava o namoro, o casamento. Cada "marca", como se dizia, era tocada duas vezes pela bandinha. Flor da Serra e tricolor (de Taquara) eram as melhores, na minha opinião.

  Quando a bandinha precisava tomar um ar - misturado com cerveja - dois ou três tocavam tangos. Era hora de botar comida no estômago. Em dependência anexa, serviam linguiça fervida, cuca e café bem forte. Vocês não têm ideia como aquilo fazia bem à alma, minha Nossa Senhora! Certa vez um amigo de infância tirou uma vizinha para dançar, meio que uma boa ação. Não era nenhuma Marlene Dietrich, mas vá lá. Ela recusou.

     - Não danço, porque se danço eu sôô e se sôô eu fedo.      



 

Fernando Albrecht

Editor Começo de Conversa (página3)

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