A cronologia das primeiras conversas entre Sérgio
Machado, Jucá, Renan e Sarney, divulgadas esta semana, é esclarecedora. Mais do
que a defesa do fim da delação premiada para presos, vê-se, dia a dia, que o
grampo escancara o planejamento de um acordão para um “golpe”, ensaiado desde a
demissão do ministro da Justiça no final de fevereiro. Mas não contra Lula e
Dilma — e sim contra a Lava-Jato. E com a inédita participação, num primeiro
momento, do PT e do PMDB unidos, se dependesse exclusivamente de Renan Calheiros.
As impactantes gravações de Machado ocorreram por volta
de 10 e 11 de março, uma semana após a condução coercitiva de Lula para depor
na Lava-Jato. Às vésperas, no dia 8, Lula, em sua versão jararaca, se refugiara
em Brasília, onde janta com Dilma e vai no dia 9 à casa de Renan, de quem,
ironicamente, ganha um exemplar da Constituição. No dia 10, o MP de São Paulo
se antecipa a Curitiba e pede a prisão preventiva de Lula (até hoje no STF). No
domingo, 13, o Brasil realiza a maior onda de protestos de sua História —
contra Dilma, Lula, o PT e a favor da Lava-Jato e do juiz Sérgio Moro.
Esse primeiro bloco de fatos se fecha na terça-feira, 15,
quando, em plenário, Renan desiste, por imposição do DE Medo PSD B, de
instalara comissão especial que ele havia cria dopara discutira adoção de um
parlamentarismo tupiniquim. Fica evidente nas fitas que fortalecer o
Legislativo—e a si mesmo, como presidente do Senado — com um parlamentarismo
brando ou branco era o plano Ade Renan. Não só na hipótese sem Dilma e Lula,
ideia com que a oposição simpatizara, mas até mesmo com os dois. A dobradinha
Lula-Dilma contou, muito mais do que se imaginava, coma articulação de Renan.
Entregar o poder presidencialista ao correligionário Temer era o plano B. É por
isso que o PT, ao ouvir agora as fitas de Machado, preserva Renan, enquanto faz
um carnaval contra as declarações de Jucá, aliado de Temer desde a primeira
hora do impeachment, já expelido do governo pela Lava-Jato.
Com o contundente recado das ruas, Renan perde de vez
espaço no PMDB para Cunha, a quem cabe prosseguir com o impeachment na Câmara.
O PT, em desespero, busca uma solução própria. Dilma, que não aceitou licença
ou renúncia, peça-chave do jogo “parlamentarista” coma oposição, anuncia no dia
16 que Lula, com prisão pendente, será ministro da Casa Civil, assumindo o
risco de obstrução da Justiça.
Acusação que ficaria evidente horas depois com a
divulgação, pelo juiz Moro, do grampo com as conversas recentes de Lula,
inclusive com Dilma. Entre tantos outros ataques ao STF e ao MPF, o candidato a
primeiro-ministro diz ao prefeito Eduardo Paes, do PMDB, que ele era a única
chance que o país tinha de parar “esses meninos” da Lava-Jato. As gravações de
Machado, da mesma época mas conhecidas só agora, são o lado B das fitas de
Lula. No dia 17, com Lula já empossado e Moro como nunca na berlinda,
procuradores e juízes divulgam manifesto alertando para o risco de atentados às
investigações, “numa guerra desleal e subterrânea travada nas sombras, longe
dos tribunais”.
Naquela tarde, São Paulo reagiu e rugiu como em dia de
futebol. Mas, no silêncio dos palácios de Brasília, pensava-se que o Lula de
2016 ainda era o de 2003. Que o poder dos políticos era maior do que o do povo.
E que o aperfeiçoamento da democracia contra a corrupção era o mesmo que
“ditadura da Justiça”. Ainda assim, concluiu-se, em 17 de abril, o afastamento
de Dilma, que o PT espertamente chama de golpe para destruir conquistas e
abafar a Lava-Jato. A Temer, herdeiro constitucional da crise, resta torcer
pela economia e rezar para que seu nome não apareça de forma irrefutável na
boca dos delatores.
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