Artigo, Renato Sant'Ana - O guizo no pescoço do gato


          Nos desvãos de um soturno engenho de arroz, vivia uma numerosa comunidade de ratos. Comida não faltava, mas a vida ali não era fácil. Tudo por causa da presença de.... Um assombroso gato, desdenhosamente bonito, limpo e atlético, tão astuto quanto folgado...

          De tudo, o mais problemático era que o silencioso bichano tinha um andar macio, suave, aquele jeito elegante e sorrateiro dos felinos. E com tanta leveza de movimentos, era praticamente impossível notar-lhe a aproximação. Quando menos se via... Zaz! Mais um membro da comunidade virava jantar daquele sujeito que, embora muito querido e mimado pelos humanos, era para os ratos só um predador implacável e uma ameaça constante, um ser odioso, a personificação do mal.

          Foi então que o coletivo de roedores fez uma assembleia para discutir o caso. E, ao cabo de tumultuado debate e algumas mordidas recíprocas, aprovou-se uma saída estupenda: pendurar um guizo no pescoço do gato para que, quando o temível animal se aproximasse balançando-o, todos pudessem ouvir o tilintar e fugir a tempo. Só que... Ninguém apontou "quem" nem "como" executaria a tarefa (dois pontos a serem definidos quando se trata de tomar medidas que mudam o destino da comunidade).

          Com aquela inusitada e fantasiosa proposta surgiu o que, desde então, é conhecido como "princípio do guizo no pescoço do gato", que pode ser enunciado assim: não é válida a fórmula de solução de um problema, a qual, embora descrevendo um resultado desejável, não explicita os meios aptos à sua execução ou não prevê um agente capaz de executá-la.

          Embora antiga e bem conhecida, seja esta fábula recontada muitas vezes, refrescando a memória dos velhos e dando conhecimento aos moços, para que jamais se vejam tentados a recorrer a simplificações quando diante de problemas complexos.

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