Este artigo é do "Observatório Brasil Soberano"
Roberto Sallouti, presidente do BTG, afirmou que a volatilidade do mercado deve continuar e que cabe ao investidor “colocar no cenário e trabalhar com isso”. A frase parece pragmática, mas esconde algo maior. Ao tratar a instabili dade como se fosse apenas um número de planilha, ignora que é justamente esse ambiente instável que provoca tarifas, perda de confiança internacional e bloqueia qualquer tentativa de planejamento de longo prazo.
Essa forma de enxergar a situação é útil para o setor financeiro. A
oscilação vira negócio. São operações de câmbio, hedge, crédito mais caro e
intermediações que garantem resultado mesmo quando a economia real anda de lado.
Para os bancos, funciona. Para o país, não. Essa lógica não cria base
produtiva, não sustenta investimento em indústrias e muito menos melhora as
condições de emprego. O que se reforça é a dependência de ganhos rápidos, sem
perspectiva de algo duradouro. Enquanto isso, a conta cai sempre sobre os
mesmos. O pequeno empresário lida com custos imprevisíveis e não consegue se
planejar. O médio adia projetos por que não tem clareza sobre o que vem pela
frente. O trabalhador sente no bolso: comida mais cara, energia subindo,
aluguel pesando e salário sem força. O que para o banco é volatilidade
previsível de mercado, para o povão é vida cada vez mais cara e sem horizonte
de melhora. Ao projetar três anos de instabilidade, Sallouti não lança só uma
previsão. Ele en via um recado. Três anos equivalem a um ciclo político inteiro
e coincidem com períodos de revisão de políticas comerciais em grandes
economias. A leitura exter na é direta: se nem o presidente de um dos maiores
bancos acredita em mudança, é porque o país aceitou a paralisia como regra. A
imagem que fica é de um Brasil condenado a viver em instabilidade permanente, o
que se traduz em barreiras co merciais, desconfiança em investimentos e capital
que prefere esperar. Esse discurso anda junto com a escolha de quem tem poder
no país: preservar arranjos frágeis em vez de corrigir o que está travando a
vida nacional. Não há esforço real para dar previsibilidade, segurança ou
condições para investir de forma produtiva. O que se vê é uma acomodação. E
desta acomodação surgem tarifas externas tratadas como inevitáveis, quando, na
verdade, são consequên cia direta da instabilidade transmitida pelo Brasil. O
problema da fala de Sallouti não está só no conteúdo, mas no efeito. Quando a
principal liderança de um grande banco diz que nada vai mudar, a percepção se
espalha. Investidores de fora assumem que o país não tem disposição para cor
rigir rumos. Empresários de dentro perdem qualquer estímulo para arriscar. E a
sociedade passa a conviver com a ideia de que instabilidade é normal. A
repetição desse discurso reforça a paralisia, e a paralisia vai se
transformando em rotina. Essa naturalização é perigosa porque sustenta a ficção
de que o mercado pode continuar funcionando em meio ao desgaste das
instituições. É uma narrativa confortável para quem sabe se proteger no curto
prazo, mas desastrosa para quem precisa de previsibilidade para viver e
trabalhar. O resultado é um país que se acostuma a administrar crises em vez de
superá-las. Um país que troca perspectiva de futuro por relatórios de risco. E,
no fim, um país que, ao aceitar a instabilidade como destino, acaba se tornando
refém dela
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