Saib ao que muda na reforma trabalhista com a queda da MP


Leia o exaustivo trabalho de reportagem que o site G1 publica hoje sobre as mudanças:

Contratos anteriores à nova lei
Texto original da reforma - A reforma trabalhista não estabelecia que as novas regras valeriam para contratos firmados anteriores à entrada em vigor da lei.
Alteração feita pela MP - A medida provisória previa que a nova lei se aplicaria integralmente para contratos que já estavam vigentes. Esse trecho perde a validade.
Para Estêvão Mallet, a queda da MP não impede que algumas regras da nova lei trabalhista se apliquem aos contratos vigentes, desde que direitos adquiridos sejam respeitados.
 “Podem até valer, mas ressalvados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”, explicou.
 O advogado Maximiliano Garcez, representante da Associação Latino-Americana de Advogados Laboralistas no Brasil, diz que a retroatividade é “inconstitucional” e fere a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
 Para o procurador do Ministério Público do Trabalho Paulo Joarês, sem a MP, o argumento de que as novas regras não valem para os contratos anteriores à lei fica “mais forte”.
 “Se precisou de uma MP dizendo que se aplicava aos contratos antigos, é porque, pela lei, não deve se aplicar. Será preciso esperar os tribunais superiores adotarem uma posição”, afirmou.

Jornada de 12 por 36 horas
Texto original da reforma - A reforma trabalhista criou a possibilidade de jornadas de 12 horas de trabalho seguidas de 36 horas de descanso serem negociadas diretamente entre empregador e empregado por acordo individual escrito.
Alteração feita pela MP - A MP restringia essa possibilidade a empresas e trabalhadores do setor de saúde. Para as demais categorias, a medida exigia que a negociação fosse feita por meio de convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Segundo o advogado trabalhista Carlos Eduardo Cardoso, com a perda da validade da proposta, passa a valer a regra inicial.
“O que vale é o que está na reforma trabalhista – acordo individual e para qualquer setor. Agora, existe aí uma discussão jurídica sobre o cabimento da aplicação dessa regra geral porque contraria alguns argumentos relacionados à segurança do trabalho. Acredito que essa matéria ainda vai ser alvo de bastante discussão”, afirmou Cardoso.

Grávidas e lactantes
Texto original da reforma - A nova legislação também alterou regras para o trabalho de gestantes e lactantes em locais insalubres. A reforma determinou que, no caso de gestantes, o afastamento do local de trabalho só será obrigatório em casos de atividades com grau máximo de insalubridade. Em locais de insalubridade média e mínima, a lei permitiu o trabalho de grávidas, a não ser que sejam apresentados atestados médicos. Lactantes serão afastadas de atividades insalubres em qualquer grau se apresentarem atestado médico recomendando o afastamento no período.
Alteração feita pela MP - A MP estabelecia o afastamento da grávida de qualquer atividade insalubre enquanto durar a gestação – o padrão deixaria de ser a permissão para o trabalho e passaria a ser o afastamento. Mas o texto da medida provisória abria a possibilidade de a gestante trabalhar em locais de graus médio ou mínimo de insalubridade, desde que, voluntariamente, apresentasse atestado médico que autorizasse a atividade.
Antes da reforma trabalhista, as trabalhadoras grávidas eram obrigatoriamente afastadas de locais insalubres, independentemente do grau de insalubridade.
No caso da lactante, tanto a reforma quanto a MP previam a necessidade do atestado para permitir o afastamento, sendo o trabalho da lactante autorizado inclusive no caso de atividades com insalubridade máxima.
Para o advogado trabalhista e professor da Fundação Getúlio Vargas Paulo Sérgio João, a MP era “desnecessária” nesse ponto, uma vez que, na avaliação dele, trata-se de uma questão de “bom senso” do empregador.
“Nenhum empregador em sã consciência vai permitir trabalho [de gestantes e lactantes] em local insalubre. Acho que a lei não forma cultura. Não é razoável, se a atividade é insalubre, que a empregada continue trabalhando. Isso vai se ajustar, as pessoas terão responsabilidade sobre seus atos”, opinou.
Para a advogada Ester Lemes, no entanto, a possibilidade de trabalho em local insalubre é “grave”.
“Sem a MP, as grávidas poderão ser dirigidas para qualquer local de trabalho, inclusive insalubres [de graus médio e mínimo]. Um ponto grave, porque, se ela se recusar, ela vai ser advertida? Vai ser suspensa? Vai ser demitida?”, questionou.
Maximiliano Garcez também criticou a mudança promovida pela lei, que chamou de “grotesca”.
“Essa questão das gestantes e lactantes é uma das questões mais grotescas, fere a dignidade da pessoa humana”, declarou.

Autônomo e exclusividade
Texto original da reforma - A reforma trabalhista criou a possibilidade de cláusula de exclusividade para a contratação de trabalhadores autônomos.
Alteração feita pela MP - A medida provisória proibiu a cláusula, mas, como vai perder a validade, a possibilidade de cláusula de exclusividade vai voltar a valer.
Na avaliação da advogada Ester Lemes, a exclusividade “cairá em desuso”. “É muito complicado, porque uma pessoa não pode ser exclusiva e não ter um vínculo. A partir do momento que é exclusivo, passa a ser subordinado à empresa”, opinou.
Para Estêvão Mallet, nesse ponto, a medida provisória era “desnecessária”. “Sem a MP, fica mais claro – pode haver exclusividade”, disse.
A nova lei trabalhista também prevê que o autônomo não tem a qualidade de empregado, mesmo que preste serviço a apenas uma empresa.

Dano extrapatrimonial
Texto original da reforma - A nova lei trabalhista estabeleceu critérios para reparos de danos morais, à honra, imagem, intimidade, liberdade de ação, autoestima, sexualidade, saúde, lazer e à integridade física. Pela texto aprovado da reforma, o pagamento de indenizações dessa natureza vai variar de 3 a 50 vezes o último salário recebido pelo trabalhador ofendido.
Alteração feita pela MP - A medida provisória mudava o padrão para o pagamento de indenizações. A proposta estabelecia que o valor poderia variar de 3 a 50 vezes o teto do benefício pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) – atualmente em R$ 5,6 mil. O valor, de acordo com a MP, variaria conforme a natureza da ofensa, de leve a gravíssima. Como a medida vai perder a vigência, a base de cálculo voltará a ser o último salário recebido pelo trabalhador ofendido.
Para a especialista Ester Lemes, o texto da MP era melhor nesse aspecto porque gerava menos distorções.
“Por exemplo: em uma empresa, temos um diretor que ganha R$ 10 mil e uma outra empregada que ganha R$ 2 mil. O diretor receberá uma indenização maior do que a empregada que recebeu o mesmo dano. Situações iguais com valores diferentes”, comparou.
Estevão Mallet concorda que o texto da MP era melhor, mas, para ele, o parâmetro deveria considerar uma série de fatores.
 “Uma conjugação que levasse em conta o salário, a condição econômica, vários outros fatores, se há reincidência ou se não há reincidência, se é uma lesão que permite reparação ou não”, afirmou.
“Sem a MP, volta a regra antiga, o que prejudica trabalhadores que ganham pouco”, disse o procurador Paulo Joarês.
“É um absurdo. A MP realmente melhorava. Agora, quem ganha mais tem um valor de dignidade maior do que quem ganha menos”, criticou o advogado Paulo Sérgio João.

Representação dos empregados
Texto original da reforma - Pela reforma trabalhista, no caso de empresa com mais de 200 empregados, pode ser eleita uma comissão para representar o conjunto de trabalhadores em negociações com empregadores.
Alteração feita pela MP - A medida provisória assegurava que a comissão não substituiria a função do sindicato de defender os direitos e os interesses da categoria, o que reiterava a participação dos sindicatos em negociações coletivas de trabalho.
Carlos Eduardo Cardoso disse que a inclusão que a MP pretendia fazer era para agradar sindicalistas em troca de apoio à reforma, mas que, na prática, não produziria efeitos.
 Estêvão Mallet lembra que a representação dos trabalhadores é uma prerrogativa dos sindicatos que está na Constituição. “A nova lei trabalhista não pode transferir essa representação para a comissão”, avaliou.

Trabalho intermitente
Texto original da reforma - A reforma trabalhista incluiu, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a modalidade de jornada intermitente, em que o trabalho não é contínuo e a carga horária não é fixa. Pela proposta, o empregador deverá convocar o empregado com pelo menos três dias de antecedência. A remuneração será definida por hora trabalhada e o valor não poderá ser inferior ao valor da hora aplicada no salário mínimo. O empregado terá um dia útil para responder ao chamado. Depois de aceita a oferta, o empregador ou o empregado que descumprir o contrato sem motivos justos terá de pagar à outra parte 50% da remuneração que seria devida.
Alteração feita pela MP - A MP excluiu a multa de 50% da remuneração em caso de descumprimento contratual. E estabeleceu que empregador e trabalhador intermitente poderiam fixar em contrato o formato da reparação no caso de cancelamento de serviço previamente agendado. Como a MP vai perder a validade, a multa voltará a existir. A MP também estabelecia que, até 31 de dezembro de 2020, o empregado demitido que foi registrado por meio de contrato de trabalho por prazo indeterminado não poderá prestar serviços para o mesmo empregador por meio de contrato de trabalho intermitente pelo prazo de 18 meses a partir da data da demissão do empregado. Com a queda da MP, essa quarentena deixará de existir.
Para Estêvão Mallet, a multa é um “exagero” da reforma trabalhista. “É uma sanção muito exagerada e muito desproporcional, que a medida provisória eliminava”, declarou.
Apesar disso, ele acredita que, na prática, serão raras as vezes em que a cobrança da multa vai acontecer.
“Acho difícil que um empresário contrate um advogado, acione a Justiça para receber um valor irrisório da multa, por exemplo, R$ 80. Acho que a intenção do legislador era gerar um efeito pedagógico. Mas, na prática, se um trabalhador não aparecer para trabalhar, o que vai acontecer é que ele não será mais convocado por aquela empresa”, projetou.
Segundo Ester Lemes, a MP trazia uma "segurança maior" para os empregados porque a empresa não poderia demiti-los e contratá-los imediatamente como intermitentes. "Com a MP, tinha uma carência para recontratar de 18 meses. Agora, poderão demiti-los e contratar diretamente como intermitentes”, explicou.
Para o procurador Paulo Joarês, sem a MP, há uma “insegurança muito grande” para o trabalhador intermitente. “O governo terá que fazer algum decreto para tentar regulamentar isso”, avaliou.

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