Desde o início de setembro, manchas de óleo apareceram em
mais de 100 praias do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba,
Pernambuco e Alagoas. De helicóptero, o Ibama monitorou as manchas e projetou
sua trajetória rumo ao sul.
“Desde 24 de setembro, quando as primeiras manchas
apareceram em Sergipe, o Ibama estava monitorando a situação no estado”,
segundo Amilcar. “Mas na quinta-feira [03/10], o negócio saiu do controle
completamente. Praias que estavam limpas ficaram sujas em todo o litoral. Agora,
não tem previsibilidade. E se continuar como está, teremos que decretar
situação de emergência no estado.”
Apenas poucas horas depois da entrevista de Amilcar à DW,
o governo sergipano declarou o estado de emergência. Atualmente, Sergipe é
considerado o estado mais afetado pelas misteriosas manchas de petróleo.
O óleo tem causado estragos no litoral sergipano. Na
noite de quinta para sexta-feira, a maré poluiu a costa norte do estado,
afetando em particular as praias da Reserva Biológica Santa Isabel, no
município de Pirambu, cerca de 50 quilômetros ao norte de Aracaju. A região,
que vive basicamente do turismo, amanheceu com as praias repletas de manchas de
petróleo.
Em 30 anos, nunca houve nada parecido, segundo Adaílton,
proprietário de um quiosque na praia de Pirambu, que estava coberta com
pequenas manchas de óleo. A poluição misteriosa tem afugentado a clientela,
reclama: “Não tem como não afetar. As pessoas pisam na areia, e depois esse
negócio não sai do pé.” Nos últimos dias, o volume de negócios de seu quiosque
caiu pela metade. “Os clientes me ligam para desfazer a reserva. E vão para
outras praias. É prejuízo mesmo.” Ele não conseguirá sobreviver financeiramente
muito tempo essa situação, comenta.
O pescador Sivaldo também tem motivos para reclamar: “As
pessoas não comem o peixe assim. Se veem que tem óleo, não comem. Tem que
soltar o bicho, se ainda estiver vivo”, disse. Normalmente, Sivaldo costuma
pescar em mar aberto. Mas desde que o mar está repleto de manchas de óleo, tem
puxado a rede de pesca pelas ondas na praia. Mas agora a rede de pesca também
está suja de petróleo. “Nunca vi um negócio destes na minha vida.”
Em perigo estão também as tartarugas na Reserva Biológica
Santa Isabel, em Pirambu. Com sede no local, o Projeto Tamar monitora mais de
50 quilômetros de litoral até a foz do Rio São Francisco. As manchas chegaram
justamente no período reprodutivo das tartarugas-olivas, as menores entre as
tartarugas marinhas no Brasil. No domingo, o Projeto Tamar comunicou que
suspendeu a soltura dos filhotes em Pirambu.
Com a chegada das manchas mais para o sul do litoral
nordestino, outras áreas reprodutivas das tartarugas são afetadas. No sábado,
funcionários do Projeto Tamar em Mangue Seco – a primeira praia baiana na
divisa com Sergipe – encontraram o primeiro espécime morto devido ao óleo.
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chegou a
Aracaju nesta segunda-feira para acompanhar de perto a situação. No sábado, o
presidente Jair Bolsonaro determinou que o Ministério da Justiça, por meio da
Polícia Federal (PF) e o Ministério da Defesa, por meio da Marinha, do Exército
e da Aeronáutica, investiguem as manchas, junto com técnicos do Ministério do
Meio Ambiente, ou seja, o Ibama e o ICMBio.
Bolsonaro sinalizou urgência: ele quer ver resultados em
48 horas. A repentina pressa do governo surpreende, pois durante todo um mês
ele não fez nada. E, assim, a boataria está a todo vapor. A Petrobras informou
ter analisado o óleo e descartado que provenha de suas operações. Mas, devido
às inúmeras plataformas da empresa no litoral sergipano, a associação com as
perfurações no alto-mar aparentam ser inevitáveis.
Há quem suspeite de uma ligação com o acidente na
refinaria Abreu e Lima, localizada no município de Ipujuca, ao sul de Recife.
No fim de agosto, um vazamento atingiu uma área de 4,5 hectares e causou a
morte de animais e danos ambientais. Segundo a Petrobras, contudo, o óleo
vazado não atingiu o mar. Além disso, o óleo que vazou da refinaria seria mais
leve que o encontrado nas praias.
Adriano Pires, sócio fundador e diretor do Centro
Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), também descartou uma conexão entre o
vazamento em Abreu e Lima e as manchas nas praias. “Isso foi em agosto, há
muito tempo”, disse o economista em entrevista à DW.
Segundo Pires, a substância apresenta propriedades
típicas do petróleo venezuelano, mas ele diz não acreditar num acidente numa
plataforma venezuelana, pois nesse caso as costas mais ao norte da América do
Sul teriam sido poluídas.
No entanto o petróleo pode ter vazado de um navio
petroleiro de passagem na movimentada rota entre o sul do Caribe e a Ásia, que
corre ao longo da costa do Nordeste. “Um navio voltando de uma exportação
venezuelana limpou o tanque na área e despejou a carga no oceano antes de
carregar a próxima. Sendo assim, o navio estaria voltando para a Venezuela”, é
uma das possíveis explicações, de acordo com Pires.
Na praia em Aracaju, o pescador amador Marcos afirmou
acreditar numa explicação semelhante. “Não é petróleo novo. Isso provavelmente
é de limpeza de navios. Pois o petróleo, quando novo, é oleoso. Ele não é um
plástico, como este que está chegando aqui”, analisa, amassando um punhado da
substância viscosa.
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