Imagine que você tenha tido a má sorte de ser um dos
milhares de brasileiros que tiveram o carro levado por um ladrão. E que o
ladrão já tivesse um receptador e seu carro já tivesse ganhado outra placa,
outro número de chassi e outro documento – tudo falsificado. Você pagou R$ 90
mil pelo carro. O ladrão o vendeu por R$ 45 mil. Meses depois, o ladrão foi
preso. Mas pagou R$ 20 mil a um advogado e o juiz arbitrou R$ 10 mil de fiança
e ele já está em liberdade, podendo furtar o carro que você acabou de comprar
financiado. Você acha justo que ele esteja em liberdade, para furtar mais, e
ainda com saldo de R$ 15 mil no bolso, e que, com o produto do roubo de seu
carro ele tenha pagado advogado, fiança?
Estamos falando de um simples ladrão de carro. Agora
pense num ladrão maior, do dinheiro dos seus impostos, que roube milhões, sob
forma de propina, em negociatas que lesam empresas públicas, como apurou a
Lava-jato. Imagine o ladrão que lesa o dinheiro do povo, superfaturando obras
para pagar políticos, “doar” milhões a partidos políticos. E que depois de
presos, esses corruptos pagam milhões a advogados por um número sem fim de recursos,
com o dinheiro que roubaram do povo, que é dono da Petrobras. Dinheiro da
propina, do superfaturamento, do crime. Produto de crime usado para safar o
criminoso. É um círculo vicioso típico.
Pois agora a deputada Bia Kicis apresentou à Câmara
Federal um projeto de lei que caracteriza o óbvio: advogado que receber
dinheiro produto do crime para defender o criminoso, na verdade incorre no
crime de receptação. É como se a defesa do ladrão fosse paga com o carro que
ele furtou de você, ou com o que recebeu ilicitamente da empresa pública, que é
de todos, vindo dos seus impostos. Tampouco pode a fiança ser paga com o
produto de uma vigarice. É incrível como ninguém havia proposto uma lei assim.
Melhor seria perguntar por que não se denunciava isso?
Assisti a um debate entre dois amigos sobre isso. Um
advogado e um corretor de imóveis. O corretor argumentou que na lei contra
corrupção e lavagem, é enquadrado o corretor que receber um pagamento dinheiro
não declarado, como lavagem de dinheiro. Alega ele que a lei também enquadrava
o advogado, num texto que copiava o código de ética da OAB. Mas foi retirado da
lei. Meu amigo advogado argumenta que não é ele que tem que averiguar a
licitude do que recebe de honorários. Cá entre nós, é fácil saber. Basta verificar
na declaração de renda se o cliente tem rendimento lícito para pagar tais
honorários. Muitos advogados já se manifestaram pelas redes sociais, de que não
aceitam dinheiro sujo, cheirando a crime, pois seriam de fato, cúmplices do
criminoso. Enfim, o assunto agora está nas mãos de nossos representantes no
Legislativo.
Gande Polibio, sempre com textos de fácil compreensão, mas muito explicativos e profundos, eu agradeço.
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