Rodrigo Zeidan - O Brasil está quebrado, mas não falido

Professor da New York University Shangai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ


Pela primeira vez em pouco mais de dois anos, o presidente acertou: o Brasil está quebrado. Por causa disso, o ano de 2021 será mais um ano de desemprego e os preços em alta. Só há uma meta para o ano que se inicia: sobreviver ao vírus e à crise econômica.


É difícil quebrar um país, e, diferentemente do que insinua o presidente, não há como uma nação quebrar por causa de eventos externos. A bancarrota nacional é sempre endógena, resultado da incapacidade de um governo em articular a confiança necessária para renegociar dívidas internas ou externas.


Se o mercado para uma empresa desaparece, não há o que fazer a não ser liquidar ativos, pagar o que puder e fechar as portas.



 

Contudo, a maioria das falências não é causada por mudanças disruptivas de mercado, mas acontece em empresas teoricamente rentáveis, por incompetência gerencial em se adaptar a um choque qualquer. Isso gera desconfiança dos detentores de dívidas na capacidade da empresa em honrar suas dívidas e inviabiliza a continuação das atividades.


O Brasil está quebrado, mas não é por falta de recursos. Um governo, se bem gerido, tem algum controle sobre seus custos públicos, receitas (tributos) e até mesmo sobre a taxa de crescimento nominal de sua dívida (Selic). Assim, qualquer dívida pública, mesmo externa, pode ser rolada, from que a sociedade acredite no plano de refinanciamento.


O atual descalabro das contas públicas não é o resultado da pandemia e do teto de gastos. Todos os governos mundiais se endividaram para sustentar famílias e empresas afetadas pela pandemia, e, nos que há limites formais de gastos públicos, estes foram temporariamente suspensos.



 

O déficit dos EUA em 2020 foi de US $ 3,8 trilhões, 15% do PIB (Produto Interno Bruto), e a previsão é que o rombo das contas públicas seja de 6% ao ano, em média, até 2030.


Nos países emergentes, o déficit público foi, em média, de 10,6% do PIB em 2020, exatamente o mesmo valor que no Brasil (aqui, o déficit nominal, que inclui informações e juros, atingiu 15% do PIB).


O Orçamento russo para 2020, aprovado em 2019, previa um superávit de 0,8% nas contas públicas e teve que ser revisto para o governo não descumprisse como leis locais. O PIB na Índia, país muito mais pobre que o Brasil, caiu 9,5%, o déficit público explodiu e nem assim o governo local quebrou.


Choques externos aleijam, mas falta de credibilidade mata. Quem sobreviveu à década de 1980 passou por ciclos de promessas, desajustes e caos; cada vez que um plano econômico fracassava, um índice voltava mais forte.


O caso brasileiro lembra o da Turquia, onde as desavenças entre o presidente da República e o banco central foram o estopim da crise cambial de 2018. Com. Em alta e sem confiança, a economia turca continua patinando desde então.

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