A decretação da prisão de João Santana, o poderoso
marqueteiro das campanhas presidenciais de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma
Rousseff, é um dos desdobramentos mais graves de toda a Operação Lava Jato.
Embora a força-tarefa tenha enfatizado que seu trabalho, ao menos por ora, não
é investigar campanhas eleitorais, o nexo entre Santana e o desvio de dinheiro
da Petrobras para financiar a eleição de petistas salta aos olhos.
Seja lá que versão os magos da impostura a serviço do PT
inventarão agora para explicar o que fizeram Santana e seus encalacrados
clientes, o fato é que está por um fio a linha de defesa de Dilma a respeito da
lisura de sua campanha – ela insiste em que o financiamento da campanha
eleitoral foi considerado legal pelo Tribunal Superior Eleitoral e, por essa
razão, tudo o mais seria irrelevante. Tal alegação, como hoje está mais claro
do que nunca, faz troça da inteligência alheia e não pode ser aceita sem
ressalvas pela Justiça.
Batizada de “Operação Acarajé”, em alusão ao termo que
alguns investigados usavam para se referir à propina, a nova redada da Polícia
Federal teve como alvos João Santana e a Odebrecht. A empreiteira teria usado
empresas offshore para movimentar contas ocultas no exterior e depositar US$
7,5 milhões na conta de outra offshore, que seria do marqueteiro.
O dinheiro, pago em diversas parcelas entre 2012 e 2014,
seria proveniente da Petrobras e serviria para quitar despesas de campanhas do
PT de 2008 a 2012. O intermediário da transação seria Zwi Skornicki,
representante do estaleiro Keppel Fels, de Cingapura, que entre 2003 e 2009 fez
negócios com a Petrobras no valor total de US$ 6 bilhões. Skornicki, apontado
pelo ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco como o operador do repasse de US$ 40
milhões para diretores da estatal e para o PT, foi um dos presos na operação.
O cerco a João Santana leva a Lava Jato a uma nova
dimensão. Atinge o estrategista das agressivas campanhas petistas das eleições
presidenciais de 2006 a 2014, que ajudaram a criar o clima de antagonismo que
hoje cinde o país. A cada novo sucesso de Santana, consolidava-se sua aura de
gênio eleitoral e, com ele, a lamentável certeza de que não se ganha eleição no
Brasil sem apelar ao marketing agressivo.
Foi assim que Santana amealhou notoriedade. É
inesquecível sua estratégia na eleição de 2014, que Dilma venceu depois de
agredir todos os seus adversários. A arrogância dos petistas ficou
especialmente clara nas palavras do marqueteiro, que declarou, um ano antes do
pleito, que “a Dilma vai ganhar no primeiro turno, em 2014, porque ocorrerá uma
antropofagia de anões” – uma referência aos outros candidatos. “Eles vão se
comer, lá embaixo, e ela, sobranceira, vai planar no Olimpo”, arrematou
Santana, talvez movido pela confiança de quem sabia que a campanha petista
tinha enorme vantagem sobre as demais porque podia contar com a incalculável
pecúnia proveniente da roubalheira na Petrobras.
Como se sabe, no entanto, o prognóstico do confiante
Santana não se confirmou – Dilma teve de apelar às táticas de atemorização do
marqueteiro para vencer um duro segundo turno. O custo desse sucesso imoral
está sendo pago em dolorosas prestações até hoje, na forma de grande
impopularidade.
Enquanto isso, Santana continuou a posar de guru dos
candidatos “progressistas” latino-americanos. No momento em que se expediu o mandado
de prisão contra o marqueteiro, ele estava na República Dominicana, onde
coordenava a campanha à reeleição do companheiro Danilo Medina, que desde
sempre contou com o apoio de Lula e cujo governo, logo após uma visita do
chefão petista em 2013, entregou uma obra de R$ 2 bilhões à Odebrecht, com
crédito do BNDES.
Medina provavelmente terá de encontrar outro marqueteiro,
porque o poderoso Santana, principal conselheiro tanto de Dilma como de Lula em
momentos de crise, tem contas a acertar com a Justiça. Desde já, porém, pode-se
dizer que a importância do avanço da Lava Jato contra Santana não está nos
apuros desse personagem, e sim na evidência inapelável de que, nas campanhas
eleitorais petistas, “fazer o diabo” não era mera força de expressão.
Tags: campanha
eleitoral, doações, editorial do Estadão, João Santana
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