Só falta um plano de governo para ser executado a partir
de 1.º de janeiro. É um detalhe muito mais importante no Brasil do que na
Suíça. Talvez por falta de imaginação, o governo suíço gasta menos do que
arrecada e entrará em 2019 sem um grande, premente e emocionante problema
financeiro e econômico.
Quanto ao plano do novo governo brasileiro, ou inexiste
ou continua disfarçado por uma porção de promessas obscuras, como a de vender
estatais para diminuir a dívida pública. As demais providências parecem estar
em ordem. O terno da posse foi experimentado, as preces foram acertadas e a
lista de convidados e desconvidados foi aprontada. Poderá aparecer até o
primeiro-ministro de Israel, atraído provavelmente pela curiosidade. Como serão
esses estranhos e raros seguidores do estranho e raro Donald Trump? Afinal,
quase nenhum governo de país com algum peso econômico havia prometido, até
agora, seguir tão fielmente o exemplo trumpista e mudar a embaixada de Tel-Aviv
para Jerusalém. Enfim, com carro aberto ou fechado, a festa poderá ser um
sucesso. Ponto básico: um novo Brasil será prometido, livre do esquerdismo
dominante desde a primeira missa, celebrada, em estilo moderninho, diante de
índios pelados. Seria o celebrante um adepto da Teologia da Libertação?
Recebida a faixa, pronunciados os juramentos e assinados
os papéis, será preciso enfrentar os fatos. Não está claro, ainda, como o novo
governo cuidará de suas contas no primeiro ano de mandato. Será um período
crucialmente importante, num país atolado em crise fiscal, com déficit primário
estimado em R$ 139 bilhões, dívida pública acima de 75% do produto interno
bruto, uma das mais pesadas do mundo, e desemprego pouco abaixo de 12% da força
de trabalho.
Sem poder adiar o reajuste do funcionalismo, forçada a
suportar os efeitos em cascata da revisão salarial do Judiciário e de outras
bombas fiscais, como os incentivos à indústria automobilística, a equipe
econômica terá de batalhar muito para respeitar o teto de gastos e a regra de
ouro (proibição de tomar empréstimos para cobrir despesas de custeio).
Dois funcionários do atual governo, convocados para a
nova turma, devem ter boas noções de como atravessar esse atoleiro. Um deles é
Esteves Colnago, ministro do Planejamento na gestão de Michel Temer. O outro é
Mansueto Almeida, secretário do Tesouro.
Graças a esses e a outros técnicos, o Brasil chegou ao
fim de 2018 sem um desastre completo nas contas públicas, apesar das bombas
fiscais armadas no Congresso, no Judiciário e até em algumas áreas do
Executivo. Foi um trabalho dificultado pela fragilidade política do presidente,
acuado por denúncias desde a manobra do procurador Rodrigo Janot com os irmãos
Batista, controladores da J&F. A maior parte da nova equipe, incluído o
ministro da Economia, Paulo Guedes, tem pouca ou nenhuma experiência na
administração pública e nas negociações com parlamentares. Se prensas e
caneladas funcionarão, como sugeriu mais de uma vez o futuro ministro, só se
saberá mais tarde. Será uma novidade se funcionarem.
Mas antes de qualquer prensa será preciso decidir pelo
menos o roteiro básico da política econômica. Promete-se, por exemplo, manter
apenas o Imposto de Renda sobre o salário, eliminando os demais tributos sobre
a folha de pagamentos. A intenção pode ser muito boa, mas falta explicar como
será compensada a receita perdida. Faltam respostas claras e ninguém parece
haver pensado muito sobre o assunto, como se percebe em reportagem no Globo de
sexta-feira.
Entre as alternativas ainda aparece uma possível exumação
da aberrante Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
Alguns membros do novo governo parecem fascinados por essa ideia, tanto quanto
o presidente e seu ministro da Educação pelo tema da sexualidade na escola
fundamental. Mas mesmo com a exumação a conta ficaria desequilibrada.
Sendo obscuro esse ponto, igualmente obscura tem de ser a
proposta de reforma tributária. Não basta prometer simplificação, nem discutir
o assunto sem cuidar do destino do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS), de competência estadual. Boa parte das distorções do sistema
está associada a esse tributo. Pode-se pensar, como já se mencionou, num único
imposto nacional sobre o valor agregado, com absorção do ICMS, mas ninguém
disse como funcionará nem como será a negociação com os governos estaduais.
Quanto à venda de estatais para reduzir a dívida pública,
é uma conversa sem muito sentido. Há razões excelentes, como ganho de
eficiência, para privatizar várias empresas, mas tem pouco sentido vincular
essa ideia à solução da dívida, exceto como complemento. Liquidar ativos para
reduzir endividamento é política às vezes seguida por empresas, mas só como
parte de uma estratégia de ajuste. Não adianta recorrer a isso se as contas
primárias do governo continuarem no vermelho e faltar dinheiro para o pagamento
de juros.
A dívida inevitavelmente voltará a crescer. Como será o
ajuste ninguém explicou. A reforma da Previdência será essencial, mas nem o
projeto está claro. Exemplo: a mudança será fatiada, como pareceu admitir o
presidente? A recém-anunciada ideia de ouvir especialistas para desenhar a
reforma é boa, mas veio com atraso, embora sugerida há tempos por analistas.
Fora dessa pauta, há alguns pontos claros. A política
externa será alinhada ao trumpismo e contrária, portanto, aos ideais de uma
ordem multilateral e razoavelmente civilizada. A política educacional terá como
prioridade (nenhuma outra foi até hoje indicada) a salvação ideológica e moral
da infância e da juventude. Ah, o futuro ministro da Cidadania, Osmar Terra,
propôs limitar a venda de bebidas alcoólicas para conter a violência. Apesar
das dificuldades, um governo de ideias ambiciosas.
*Rolf Kuntz é jornalista.
Planos de governo bons e claros, claríssimos mesmo tinham os outros candidatos que foram preteridos pelos eleitores, não é mesmo Rolf Kuntz?
ResponderExcluirO plano e só patrolar o petismo, o resto nao interessa.
ResponderExcluirUM ARTIGO DESTITUÍDO DE PIEDADE E DE SENSIBILIDADE, DESTRUINDO AS ILUSÕES ALHEIAS...
ResponderExcluirPuxa vida! Lá vem esse tal de Rolf querer estragar a festa dos bolsomistas com um pouco da realidade dos números!
Eles estão tão felizes, deixe-os assim nesse sono inebriante...
Aonde estava este tal de Rolf, quando nos governos lula e Dilma desrespeitaram seus planos de governo e não cumpriram nada do que foi prometido,levando o país ao caos?
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