Análise, Roger Stiefelmann Leal, Gazeta do Povo - Força Nacional de Segurança Pública e os ataques aos Poderes da República

Ainda em 7 de janeiro de 2022, foi

anunciado nas redes sociais pelo Ministro

da Justiça o auxílio da Força Nacional de

Segurança Pública. Àquela altura, ele

disse que “assinei agora Portaria

autorizando a atuação, em face de

ameaças veiculadas contra a

democracia”. Mais tarde, foi noticiado

que a articulação e a escalada do

movimento que resultou nas

atrocidades ocorridas em Brasília no

dia 8 de janeiro foram acompanhadas

com antecipação aos órgãos de

segurança, em especial aqueles que

integram o SISBIN (Sistema Brasileiro

de Inteligência), que, por sua vez,

conta com ampla participação do

Ministério da Justiça.

A Portaria anunciada pelo Ministro

mostra não apenas sua ciência quanto

aos riscos que tais movimentos

representavam, mas também a

percepção sobre a necessidade de

reforçara segurança na Esplanada dos

Ministérios e na Praça dos Três

Poderes.

O apoio policial planejado não foi

eficiente. Tais falhas reclamam

rápida apuração e esclarecimento,

A Força Nacional de Segurança Pública

não constitui unidade ou instituição

policial específica. Trata-se de

instrumento interfederativo levado a

efeito mediante a cooperação entre

Estados-membros. Seu emprego, a ser

realizado de modo episódico e

planejado, implica a mobilização de

integrantes – que receberam do

Ministério da Justiça treinamento

especial para atuação conjunta – das

Polícias Federais e dos órgãos de

segurança dos estados que tenham

aderido ao programa de cooperação

federativa.

rápida apuração e esclarecimento,

inclusive para evitar que voltem a

ocorrer no futuro.

Sua atuação não contempla qualquer

tarefa ou competência privativa ou

reservada. É uma força policial de

apoio, voltada a reforçar as ações

desenvolvidas pelos órgãos estaduais

de segurança pública. A definição da

de segurança pública. A definição da

esfera de competência da Força

Nacional, conforme o art. 2° do Decreto

5.289/2004, reflete claramente sua

função de apoio e auxílio. Segundo o

Ministro Alexandre de Moraes, tratase de “apoio às atividades; sempre

auxílio, sempre apoio”.

Seu emprego, como autorizado, “para

auxiliar na proteção da ordem pública e

do patrimônio público e privado entre a

Rodoviária de Brasília e a Praça dos

Três Poderes” implica avaliação que

considera necessário o apoio dos

órgãos de segurança pública do Distrito

Federal em face das ameaças

detectadas com antecipação.

O anúncio sobre o emprego da Força

Nacional foi precedido por outra

mensagem que, além de aludir a

orientações repassadas à Polícia

orientações repassadas à Polícia

Federal em face de suposta “guerra”

que impatriotas dizem querer fazer em

Brasília, confirma ter mantido contato

com o governador do Distrito Federal e

o Ministro da Defesa.

O caráter cooperativo que informa o

emprego da Força Nacional requer a

solicitação ou o consentimento do

respectivo governador da unidade

federativa que receberá o auxílio.

Segundo observado em julgado do STF,

“não é aceitável, sob pena de ferir a

autonomia do ente estadual, que as

tropas da Força Nacional de Segurança

Pública sejam enviadas sem que haja

prévia solicitação expressa do

respectivo governador de Estado ou do

Distrito Federal”. Com base nessa

posição, a Corte considerou

inconstitucional disposição que

legitimava o envio da Força Nacional

legitimava o envio da Força Nacional

por mero requerimento de Ministro de

Estado.

Tais circunstâncias sugerem que a

interlocução entre o Ministro da Justiça

e o governador do Distrito Federal

tenha ensejado a manifestação exigida

para licitamente acionar a Força

Nacional. Permitem presumir, assim,

comportamento ativo e diligente do

governador no sentido de obter crucial

reforço policial de modo a fazer frente

ao iminente ataque às instituições. Sem

sua tempestiva intervenção, o auxílio

sua tempestiva intervenção, o auxílio

não poderia ter sido anunciado e

autorizado.

A urgência do caso era patente. O

emprego da Força Nacional, anunciado

já durante o sábado, dia 7 de janeiro,

foi autorizado para atuação nos dias 7,

8 e 9 de janeiro. No mesmo dia 7, nota

publicada pelo Ministério da Justiça

confirmou haver “planejamento

definido pela Diretoria da Força

Nacional” que definia “o contingente a

ser disponibilizado”, dado que não

poderia ser divulgado. Tomando-se em

consideração que a publicidade dos

atos administrativos é pressuposto de

sua eficácia jurídica, supunha-se que a

autorização ministerial seria veiculada

às pressas via edição extra do Diário

Oficial da União.

Em 30 de março de 2020, o uso da

Em 30 de março de 2020, o uso da

Força Nacional foi autorizado a atuar

em face da pandemia a partir do

mesmo dia 30 em sessão extra do Diário

Oficial veiculada naquele dia. No dia 06 de

janeiro de 2023, também houve

autorização veiculada em sessão extra para

emprego imediato da Força por 90 dias

em ações de combate ao crime

organizado, ao narcotráfico e aos

crimes ambientais, na calha do Rio

Negro e Solimões. Outros vários outros

casos semelhantes.


Os graves ataques às sedes dos poderes

em Brasília não mereceram, contudo, a

mesma presteza. A portaria ministerial

sobre o emprego da Força Nacional de

Segurança Pública somente foi

publicada no Diário Oficial do dia 10 de

janeiro, após transcorrido o prazo

autorizado para atuação das tropas. Os

anúncios levados a efeito no dia 7 de

janeiro evidenciam razoável

consciência das autoridades quanto aos

riscos decorrentes da movimentação

realizada pelos grupos que

protagonizaram os graves atentados de

8 de janeiro. Também indiciam, ante o

acionamento da Força Nacional de

Segurança Pública, compreensão

acerca da necessidade premente de

reforço e auxílio aos órgãos locais de

segurança para conter a ação de tais

grupos.

No entanto, a maior parte do

contingente da Força Nacional enviado

teria chegado tarde demais. A

autorização para seu emprego foi

publicada, como se viu, apenas em 10

de janeiro. O apoio policial planejado

não foi eficiente. Consoante um

experiente partícipe da vida nacional, o

Estado falhou. Tais falhas reclamam

rápida apuração e esclarecimento,

inclusive para evitar que voltem a

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inclusive para evitar que voltem a

ocorrer no futuro.

Roger Stiefelmann Leal é doutor em

Direito do Estado, professor de Direito

Constitucional na Faculdade de Direito da

Universidade de São Paulo. Visiting

Scholar na Harvard Law School (2019).



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