Marcus Vinicius Gravina
Cidadão brasileiro – OAB-RS 4949
A sabatina realizada no Senado cumpre um mandamento da Constituição Federal. Serve para analisar se o indicado pelo presidente da República possui notável saber jurídico e moral ilibada para assumir o cargo.
A revelação, em detalhes, do que aconteceu no dia 21.02.2017, demonstra que foi das mais polêmicas dos últimos anos, quando se tratou do quesito, moral ilibada do indicado, hoje ministro Alexandre de Moraes. Assisti o vídeo da transmissão ao vivo da TV Senado para todo o Brasil, para conhecer os seus propósitos de ministro do STF e se ele caiu em alguma contradição no passar do tempo. Asseguro que não será uma fake news. Tem amparo na Constituição, nos direitos e garantias individuais do cidadão. Busquei as informações em fonte de água límpida, cristalina, sem escamoteios.
A CCJ do Senado foi presidida pelo Sen. Edison Lobão, tendo por relator o Sen. Eduardo Braga. Antes do indicado ser chamado, foram levantadas três questões de ordem pedindo a baixa do expediente para informações complementares, diante de volumosa e insistentes matérias da imprensa, desairosas à reputação do candidato ao STF. Computaram-se muitos abaixo-assinados, de diretório acadêmico do Direito, das entidades da chamada sociedade civil organizada ou coletivos organizados contrários e individuais. O senador Randolfe Rodrigues e as senadoras Vanessa Grazziotin e Gleise Hoffmann foram os autores das visões premonitorias das questões de ordem. Os senadores Aloysio Nunes Ferreira e Aécio Neves, em contradita, fizeram a defesa da indicação do presidente Michel Temer. Os pedidos de diligência dos senadores contrários à nomeação, foram derrotados.
Com a palavra o indicado, Alexandre de Moraes, leu um longo discurso de apresentação. E durante a sabatina, se saiu bem ao responder os itens que voltaram à tona referentes às questões de ordem. De sua parte, referiu extensa lista de apoios institucionais a sua candidatura, relacionados ao judiciário e da administração pública, em que atuou como Ministro e Secretário da Justiça e dos transportes de São Paulo.
Isto tudo, antes de ser ministro do STF. Acontece que durante estes anos de atuação no Supremo, acumularam-se críticas e denúncias de que a sua ardorosa promessa e o firme compromisso, com toda a consistência de um juramento à Nação, teriam sofrido percalços que os desviaram do caminho traçado pela Constituição Federal.
À evidência disto, para inúmeros juristas brasileiros e de colegas do STF, é de que estariam em decisões monocráticas com violação do devido processo legal, abertura e condução de inquéritos inconstitucionais, dificultação de acesso aos autos a advogados, tratamento desumano ou degradante do 8 de janeiro, com prisões sem audiências de custódia e de censura à livre manifestação de pensamento, à liberdade de consciência e de outros direitos fundamentais dos cidadãos. Mais, alguns atos de aparente vingança pessoal, na anulação da Graça e indultos concedidos pelo ex-presidente e de prisão de oficial do Exército, com menosprezo ao Estatuto dos Militares.
Não afirmo que tais fatos - abertamente discutidos pelo povo nas ruas - possam ou devam ser, primeiro, verdadeiros e depois, ilegais. Certamente, em uma CPI da Toga ou, num eventual processo de impeachment, com amplo direito de defesa, a apuração da verdade seria concretizada, Não há outra maneira legal de se saber e agir, frente ao subjetivismo dos ministros do STF.
Cheguei a pensar em um “recall”. Neste caso, o Senado/CCJ faria um convite ou convocação aos ministros para ouvi-los e submetê-los a uma espécie de conserto de seus questionáveis serviços prestados à Nação. Reparem a hipótese de um retardamento demasiado dos seus relatórios ou pedidos de vista a processos que acabam prescrevendo. Eles, acima de tudo, são funcionários públicos e a liberdade que proclamam possuir, não é absoluta e deverá haver lei para fazê-los descer das alturas a fim de cumprirem, integralmente, com a suas obrigações judiciais no plano onde se encontra o povo.
Fala-se muito do “poder mágico” do Regimento Interno do STF. Pois, aproveito para afirmar que o Regimento Interno da Suprema Corte não é lei, quanto muito possui força de lei para regular, internamente, a atividade daquela Corte. Trata-se, de uma mera “disposição autonômica” na lição do eminente jurista e professor gaúcho, Ruy Cirne Lima (Princípios de Direito Administrativo Brasileiro, 1954, Sulina). É elaborado pelos próprios destinatários, prescrito para uso interno da Corte do STF. Não é uma disposição erga omnes capaz de autorizar ministro do STF a instaurar “inquérito do fim do mundo” sem iniciativa do Ministério Público. A falta deste entendimento é a causa do atual de abuso do ativismo judicial em todas as frentes, destacando-se o da transformação em pretensos legisladores complementares da CF e demais leis. É escandalosa e ameaçadora a ingerência de ministros do STF na votação do PL 2630/2020 – lei do cala-boca.
Agora, vejam trechos do seu juramento ao Senado, e se o ministro Moraes mudou seu pensamento e a sua postura de magistrado. Todo o cidadão tem o direito de analisar se há contradições do juramento, face à atuação inquietante de suas falas ameaçadoras através da mídia e de decisões judiciais, das quais não cabem recursos:
“As lições de respeito ao ideal republicano e a ética constitucional sempre me pautaram . O poder soberano é do povo brasileiro.”
O chamado ativismo judicial, um tema importante, atual, cuja discussão cresce no Brasil, neste momento. “ Não são poucos, no Brasil e no exterior, os doutrinadores que apontam enorme perigo à democracia e à vontade popular na utilização exagerada do ativismo judicial. Ronald Dworki, o ativismo pode ser uma forma virulenta de pragmatismo jurídico. Um juiz ativista ignoraria o texto da Constituição, a história de sua promulgação, as decisões anteriores da Suprema Corte que buscaram interpretá-la e as duradouras tradições de nossa cultura política. O ativista ignoraria tudo isso para impor a outros poderes do Estado seu próprio, ponto de vista sobre o que a justiça exige.”
Citou Martin Luther King defensor do amplo significado de liberdade individual, intelectual, na liberdade de pensamento, na liberdade de expressão, na liberdade de crença e cultos religiosos e na liberdade de escolha, o indicado ao STF, e em tom solene proferiu seu juramento, reafirmando: “desaparecendo a liberdade, desaparecerá o debate de ideias, a participação popular nos negócios políticos do Estado, quebrando-se o respeito ao princípio da soberania popular. Uma nação livre só se constrói com liberdade, e a liberdade só existirá onde houver um Estado democrático de direito.”
Quem tiver lido este artigo, tire suas conclusões. A minha é de que, depois da posse deste ministro no STF, a história do Brasil terá um capítulo à parte sobre o nosso Cardeal Richelieu, do século XXI. Quanto à premonição dos senadores autores das questões de ordem, por mais investigação, aconteceu e a crise institucional do Brasil, passou a ter um descontrolado reforço.
Caxias do Sul, 9.05.2023
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