Delação de Palocci à PF implica Ambev
A reportagem é do Estadão de hoje.
Ex-ministro petista afirma que empresa fez ‘pagamentos
indevidos’ a Lula e Dilma para impedir aumento de imposto para bebidas
alcoólicas
Rafael Moraes Moura e Breno Pires / BRASÍLIA
Decisão sigilosa do ministro Edson Fachin,
do Supremo Tribunal Federal, diz que o ex-ministro Antonio
Palocci relatou em seu acordo de delação premiada à Polícia Federal
“pagamentos indevidos” da Ambev aos ex-presidentes Luiz Inácio
Lula da Silva e Dilma Rousseff e a ele próprio. É a primeira vez
que a multinacional de bebidas aparece nas investigações da Lava Jato. O
interesse da empresa, de acordo com o documento de Fachin, era impedir o
aumento de imposto (PIS/Cofins) sobre bebidas alcoólicas.
No despacho, ao qual o Estado teve acesso, não
há menção a data ou a valores que supostamente foram desembolsados pela
empresa. Os detalhes da delação de Palocci estão em outros documentos, os
anexos, que estão sob sigilo. Fachin determinou a remessa de 11 desses anexos à
Justiça Federal de São Paulo. As acusações do ex-ministro, incluindo as que se
referem à Ambev, estão agora sob análise da força-tarefa da Lava Jato em São
Paulo.
A Procuradoria da República de São Paulo requereu que os
casos relatados por Palocci sejam concentrados na 6.ª Vara Federal Criminal,
especializada em crimes financeiros e lavagem de dinheiro. “Numa avaliação
inicial, o MPF entende que todos os casos incluem lavagem de dinheiro”,
informou ao Estado a força-tarefa da Lava Jato.
O acordo de colaboração premiada de Palocci foi
homologado por Fachin em outubro do ano passado. A negociação foi feita
com a Polícia Federal, após o Ministério Público Federal recusar a proposta
apresentada pela defesa do ex-ministro de Dilma e Lula.
Além do suposto pagamento de propina pela Ambev, o
documento do Supremo relaciona outros episódios narrados por Palocci, como o
pagamento de vantagem indevida por parte de bancos, o suposto desembolso de R$
3,5 milhões do governo do ex-ditador líbio Muamar Kadafi para a
campanha de Lula no ano de 2002 e a destinação de dinheiro de empreiteiras, via
caixa 2, para campanhas petistas.
Consultoria. Em sua decisão, assinada em 11 de
abril, Fachin observou que Palocci “elabora descritivo geral da organização
criminosa integrada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) com objetivo de obter
vantagens indevidas de grupos empresariais em contrapartida à prática de atos
de ofício em prol dos interesses das empresas”.
A Ambev foi uma das empresas que contrataram os serviços
da empresa de consultoria de Palocci, a Projeto Consultoria Empresarial e
Financeira Ltda., por um período de três anos, para prestação de serviços de
consultoria, via análises de cenários e conjuntura. Em um relatório da Receita
Federal produzido em outubro de 2016, constam pagamentos que somam R$ 1,21
milhão da cervejaria à empresa do ex-ministro.
Embora a decisão de Fachin não relacione o suposto
pagamento de vantagem indevida pela Ambev a um episódio específico, durante o
governo de Dilma alguns aumentos de impostos anunciados para o setor de bebidas
foram postergados. Em abril de 2014, por exemplo, o governo federal anunciou um
aumento de tributos sobre as chamadas bebidas frias que entraria em vigor em
junho daquele ano – mas a data foi adiada. Na época, o então ministro da
Fazenda, Guido Mantega, disse que a maior tributação de refrigerantes,
cervejas e energéticos entraria em vigor no início de setembro, e mesmo assim
de maneira escalonada.
A decisão foi anunciada depois de reunião de Mantega com
representantes de empresas de bebidas, hotéis e bares. Naquela ocasião, Mantega
disse que fez um “pacto com o setor” para não haver aumento de preços durante a
Copa do Mundo, que ocorreu no Brasil naquele ano.
O juiz Danilo Pereira Júnior, da 12.ª Vara Federal de
Curitiba, autorizou nesta semana a progressão de pena de Palocci para o
regime aberto. Segundo a decisão, ele permanecerá com tornozeleira eletrônica.
COM A PALAVRA, A AMBEV
“A Ambev esclarece que as alegações relatadas são falsas
e incoerentes. Falsas porque nunca fizemos pagamentos de qualquer natureza para
obtenção de vantagens indevidas. E incoerentes porque, desde 2015, o setor de
bebidas sofreu um grande aumento da carga tributária referente a PIS/Cofins, da
ordem de 60%, contradizendo tudo o que foi alegado.”
COM A PALAVRA, O PT
O PT informou, por meio de nota, que Palocci “fez um
negócio milionário com a Lava Jato para sair da cadeia com muito dinheiro em
troca de mentiras”. “Nada do que ele diga sobre o PT merece crédito, muito
menos por meio de supostos vazamentos direcionados politicamente”, afirmou o
partido.
COM A PALAVRA, LULA
A assessoria de Lula disse que Palocci “é apenas um
instrumento da Lava Jato para atacar (o ex-presidente) com mentiras e
narrativas que não podem ser confirmadas por testemunhas ou por documentos”.
COM A PALAVRA, DILMA
A assessoria de Dilma informou que aguardaria a
publicação da reportagem para, eventualmente, se manifestar sobre o assunto.
COM A PALAVRA, PALOCCI
O advogado Tracy Reinaldet, que defende Palocci, afirmou
que a delação de seu cliente ainda está sob sigilo. “Por tal razão, a defesa do
ex-ministro não comenta fatos específicos e não confirma ou infirma a
veracidade destes.”
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